twenty. deciding
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O resto do jantar passou-se rápido, sussurros eram tudo que havia após a interação entre Demetria e Amarantha. Meros murmúrios tão baixos que era quase impossível escutar, mesmo todos ali obtissem audição feérica; Além de olhos que deixavam transparente o quão curiosos estavam, desejando testemunhar o próximo embate da fêmea acompanhada do terrível Grão-senhor da Corte Noturna e da general de olhar cruel que se mantinha estranhamente em silêncio. Ao fim da refeição, Nostrus agradeceu profundamente a todos por suas presenças ali e então, as Cortes se dispersaram, todas seguindo para as alas que estavam instalados até o Solstício. Lionel não deixou de notar em como os machos da Outonal, filhos de Beron, haviam lançado olhares preenchidos por uma promessa silenciosa de vingança na direção de Demetria que ainda mantinha uma taça de vinho em uma de suas mãos e um suave sorriso nos lábios rosados.
O ex-espião segurou uma risada ao ver os olhos verde-prata cintilando em uma falsa inocência, sentindo uma onda de nostalgia viajar por seu corpo. Há muito tempo, quando Lionel estava perdido, Demetria se movia pela Cidade Escavada com aquele brilho inocente no olhar que jamais desaparecia, nem mesmo socos, tapas e pontapés lhe faziam perder aquele brilho inocente pertencentes a uma fantasia que vestiu até finalmente colocar seu grandioso plano de conquistar a Corte dos Pesadelos em prática. E mesmo sabendo que não devia, às vezes, Lionel sentia falta daquela versão de Demetria. Da malícia fantasma que espreitava em cada sorriso e piscar inocente, a forma que manipulava todos em sua volta como uma mestre dos fantoches, interpretando um furioso lobo que clamava revolução na pele de um mero cordeiro.
Ele sorriu para a lua prateada em seu pico no céu escuro enquanto se sentava no chão de mármore polido do quarto que descansava naquela corte. Passando as mãos por seus cabelos escuros e suspirando, respirando fundo, absorvendo o ar frio da madrugada e o silêncio que apenas se interrompia com o suave chocar das ondas contras as pedras ao redor do Palácio Beira-mar. Tudo estava tão calmo que nem parecia que, ao nascer do sol, iria se iniciar uma das comemorações mais belas de Prythian, algo que ele rezava silenciosamente para Amarantha não arruinar com toda sua crueldade implacável.
Sua história com a general se iniciou quase quatrocentos anos atrás, quando ele não passava de um mero bastardo que havia deixado suas origens para trás em uma busca incansável por poder, em uma época que Lionel ainda utilizava seu nome de batismo, ele conheceu Amarantha e Clythia. As irmãs que dividiam uma sede de sangue insaciável e uma crueldade jamais vista. Amarantha, a mais velha, possuía cabelos vermelhos iguais ao sangue de seus inimigos e era perigosamente ardilosa. Clythia, a mais nova mas não menos letal, possuía uma magia bruta, intensa e incontrolável que destroçava todos no caminho das irmãs. Juntas, elas eram as mais poderosas e cruéis generais que havia em Hybern.
As duas devastavam campos de batalha inteiros sem sequer derramar uma gota de suor, seus nomes eram temidos e todos tinham consciência que se Clythia e Amarantha colocassem os pés em um combate, a derrota estava garantida. Durante a guerra, elas eram incomparáveis e imparáveis. Porém, a relação entre as irmãs foi lentamente se destruindo com o envolvimento de Clythia e Jurian. E claro que Lionel esteve sempre por perto, vendo os acontecimentos se desenrolarem, sendo um mero espectador até que se viu obrigado a interferir. Por fim, não foi necessário muito para fazer com que Jurian finalmente decidisse dar um fim na vida de Clythia utilizando o veneno feérico que havia roubado das tropas hybernianas e depois, blindar o humano com poderosos feitiços para que sobrevivesse a uma batalha mano-a-mano com a ira de Amarantha, o que não aconteceu.
Claro que tudo planejado em sua mente não ocorreu como planejava e o feérico teve que fugir para as terras de Prythian, arranjando um lugar na Corte Noturna como espião e mudando seu nome. Transformando sua vida o suficiente para se manter escondido da ira mortal daquela general, cuja morte da irmã foi causada indiretamente por Lionel, ou como odiava ser chamado Calabar, o traidor.
─ Parece pensativo.─ Um grunhido soou atrás do de cabelos castanhos, ele não se atreveu a olhar para o rosto encouraçado, pontudo e cinzento daquela coisa em algum lugar dentro do cômodo.─ Pensando nas traições que cometeu ao longo dos anos, Calabar?
Lionel riu.
─ Também senti sua falta, Attor.─ Ele se indignou a lançar um olhar para a escuridão do quarto, sentindo que aquelas orbes cruéis em suas costas.─ E sobre sua pergunta, estava apenas pensando em Clythia. Ainda me lembro do jeito que Jurian entupiu ela com veneno e a destroçou para que Amarantha procurasse os pedaços dela por todo o continente. Me pergunto se ela realmente conseguiu achar todas as partes de sua pequena e iludida irmã.
Attor rosnou em meio a escuridão, um sorriso surgiu nos lábios grão-feérico.
─ Como sempre, tão comunicativo.─ Disse alegremente, soprando uma risada que não durou muito, as sombras escureceram as feições do ex-espião lhe dando uma aparência sombria.─ Agora, me diga o que aquela vadia imunda lhe mandou dizer à mim.
A coisa se moveu, se expondo, as asas se alongando atrás de si e o rabo serpenteando pelo chão. Um sorriso cruel brotou no rosto encouraçado, deixando as presas em evidência.
─ Minha senhora apenas deseja que saiba o quão feliz está por reencontrar aquele que ceifou sua irmã.─ Lionel emitiu um estalar de língua.─ E que saiba o quão preparada ela está para destroçar você da mesma maneira que orientou para que Jurian fizesse com Clythia. Minha senhora quer deixar claro que sofrerá o dobro que o tolo humano passou nas mãos dela.
O ex-espião apoiando suas mãos no piso frio, se erguia com um sorriso presunçoso e sem nenhum resquício de medo em suas feições. Lionel enfiou as mãos nos bolsos da calça de tecido fino que vestia, piscando os olhos.
─ Sua senhora apenas falou o que eu já sabia que iria fazer quando colocasse suas patas de porca em mim.─ Outro estalo.─ Não é novidade, então, diga à ela que falhou na tentativa de me aterrorizar.
Attor soltou uma risada; ou algo tentou mas acabou soltando um barulho esganiçado que poderia facilmente causar pesadelos até no mais corajoso dos homens.
─ Vejo que também sabe que minha senhora mal consegue dormir, pensando em uma coisa, consegue adivinhar, traidor?─ A coisa sibilou e ao receber o silêncio de Lionel em resposta, ele sorriu. Igual a uma cobra.─ Ela não consegue dormir, pois sempre está imaginando com o momento que lhe fará sofrer. No momento que lhe arrancará o que lhe é importante.
A pele do grão-feérico empaliceu, sua boca se pressionou em linhas finas e olhos piscaram, como se desejasse que as palavras do Attor fossem mentiras. Como se sentisse o medo se alastrando por todo seu corpo. Um mero não por si, mas por ela. Aquela pequena fêmea.
─ Qual é o nome dela mesmo?─ Unhas se afundaram na pele de Lionel. Suas próprias unhas causando feridas em sua pele.─ Demetria.─ Ronronou e foi uma das coisas mais horríveis que o ex-espião já escutou.─ Minha senhora não para de pensar no momento que destroçará seu corpo completamente.
Quase caindo de joelhos, Lionel reuniu toda coragem que tinha para grunhir na direção da besta.
─ Diga a ela que se tocar em Demetria, não irá lidar apenas com minha fúria, mas sim, a de um povo inteiro.─ Os olhos da coisa apenas cintilaram, perigosos, antes que ela desse passos para trás, escorregando para dentro de uma sombra e sumindo dali.
Não durou muito para que o ex-espião caísse no chão, as mãos espalmando o piso gelado e pensamentos conflituosos, cheios de culpa preenchendo sua mente. Pela Mãe, Demetria jamais deveria ter ameaçado Amarantha em frente de tantas pessoas. Ele jamais deveria ter feito o que fez no passado. Jamais. Nunca. Mas, ele o fez e após anos fugindo, finalmente teria que lidar com aquilo. Não havia escolhas. Não havia escapatórias.
E, ali, Lionel decidiu o que faria.
Sentada em frente a uma penteadeira, ainda com o vestido escolhido pelo Grão-senhor para si naquela noite, Demetria se mantinha concentrada em desmanchar o penteado feito pelas gêmeas mestiças e retirar o excesso de pó prateado de seus ombros e rosto sob o olhar atento do Rhysand que acompanhava cada movimento feito pela fêmea.
─ Quer me falar algo, Grão-Senhor?─ Ela questionou, seus dedos retirando as pequenas argolas ao longo de suas orelhas arqueadas, e as colocando sob a superfície lisa do móvel, sem direcionar um olhar na direção do macho.
O meio-illyriano ergueu uma de sobrancelhas, encostando as costas contra o acolchoado do sofá e espreitando seus olhos estrelares por um momento, antes de abrir um sorriso gatuno e passar delicamente seus dedos pela lapela do seu casaco escuro.
─ Você realmente não teme nada e nem ninguém, não é mesmo?─ Ronronou. Demetria apenas piscou, virando-se para poder mirar seus olhos verde-prata no belo homem de cabelos azuis escuros.
─ E eu deveria?─ Questionou, as mãos adentrando em seus fios castanhos na busca de alguma presilha perdida, os olhos cintilando.
─ Aquela conversa, ─ Ele piscou, inclinando a cabeça para o lado.─ Amarantha matou pessoas por muito menos. Há histórias sobre a última pessoa que ousou falar com ela daquela maneira.
─ Divertido. Fale mais.─ Murmurou suavemente, uma de suas mãos tocaram o tecido escuro do vestido de forma leve, puxando a saia para revelar saltos pratas.
─ Não é nada interessante.─ Estalou a língua.─ Apenas o típico, olhos arrancados e corpo dilacerado, imagino que seja exatamente que aquele mente maquiavélica esteja pensando em fazer com você.
Demetria soprou uma risada, retirando os saltos de forma lenta e cuidadosa, completamente ciente do olhar estrelar que começava a ganhar um brilho predatório.
─ E, imagino que isso se trata de um simples aviso.─ Mirou seus olhos verde-prata no macho.─ Para que eu perceba as consequências de irritar um demônio, acho que se esqueceu de uma coisa, Grão-senhor.
Rhysand piscou, abrindo um sorriso preguiçoso, pressionando o polegar contra sua têmpora direita.
─ Pode me dizer o que esqueci, querida?─ Ronronou, por fim. Demetria levantou-se do banco em que estava sentada, os pés descalços se arrastando pelo chão polido na direção do Senhor da Noite que aumentou seu sorriso.
─ Esquece-se que nunca dou um passo sem pensar duas vezes. Que sempre planejo antecipadamente cada decisão tomada.─ Proferiu, um brilho perigoso surgindo na imensidão verde respingada com prateado, espirais negros se manisfestando.─ Esquece-se que também há um demônio bem aqui em sua frente. Então, se Amarantha quiser me destroçar, ficarei feliz em vê-la tentar me quebrar.
Novamente, Rhysand se viu preso naqueles olhos. Nefastos, assim como a mulher que os possuía. Se afogando nas águas verdes até alcançar a escuridão que havia ali. Sempre espreitando, apenas esperando pelo momento que seja liberta.
Piscando os olhos, o Senhor da Noite despertou antes que aquelas garras o alcançassem e analisando rapidamente a pele da fêmea que lhe mirava um olhar questionador e sobrancelhas franzidas. Ao perceber que os espirais negros haviam sumido, Rhysand se permitiu sorrir ladino.
─ Já lhe disse o quão deliciosamente bonita estava nessa noite?─ Demetria apenas revirou os olhos, colocando uma mecha de seu cabelo atrás de sua orelha pontuda e dando as costas para o macho.
─ Eu sempre estou.─ Movimentou sua cabeça, apenas o suficiente para que pudesse fitar o Grão-Senhor pelo canto dos olhos.─ Agora, me ajude a tirar o maldito vestido.
Rhys não pensou muito, antes de descruzar suas pernas em um movimento rápido para parecer casual, mesmo que tivesse caminhado da forma mais lenta possível até sua parceira, suas mãos se apertando levemente em punhos.
─ É exatamente como pensava, era apenas questão de tempo até me pedir para tirar suas roupas.─ Ronronou, as pontas dos dedos deslizando pelos ombros desnudos da fêmea, se deliciando com o grunhido solto pela boca rosada que tanto observava e do pequeno fato que todos os pelos dela haviam arrepiado com o seu toque.
─ Apenas desabotoe e me deixe em paz.─ Resmungou ela, mexendo os ombros como se tentasse afastar os dedos do Grão-senhor de si, o que claramente não funcionou, pois da forma mais vagarosa, Rhys moveu a ponta de seus dedos até a borda do vestido, tamborilando nos botões por um momento.
─ Sempre tão doce, minha querida Demetria.─ Sussurrou, soprando na nuca da fêmea que rapidamente se enrijeceu, uma risada escapou do macho. Recebendo um rosnado como resposta, ele iniciou a desabotoar o vestido com lentidão, apenas para provocá-la.
Não soube exatamente quanto tempo demorou naquela pequena brincadeira, apenas sabia que quando finalmente acabou, seus olhos estrelares observaram cada pedaço de pele exposto pela abertura que se abriu após desatacar a parte detrás da roupa. Demetria o lançou um olhar ameaçador, uma de suas mãos coladas no busto do vestido, mantendo ele firme ali para que não revelasse ainda mais partes de sua pele.
Ela não disse nada, o olhou. Rhysand tinha certeza que milhares formas de matá-lo e esconder seu corpo estavam passando por sua mente brilhante. Demetria crispou os lábios, parecendo prestes a rosnar algo para ele quando uma batida na porta soou. Ambos respiraram fundo e se viraram para a porta.
─ Quero seu general fora daqui quando eu sair daquele banheiro.─ Foi a única coisa que disse, dando as costas para ele e adentrando no quarto de banho, sem nem lançar um último olhar.
Demetria trajava um pijama azul-escuro e seus curtos fios estavam úmidos, além de exalar um cheiro forte de jasmim. Seus olhos verde-prata fitaram o Senhor da Noite já vestido adequadamente para uma futura bela noite de sono, encarando aquele céu noturno da Corte Estival com o cenho franzido.
─ O que ele lhe disse?─ Perguntou, se aproximando da cama, os dedos tocando os lençóis macios com suavidade. Rhysand virou-se para ela, piscando os olhos, ainda despertando de seus pensamentos.
─ Parece que há illyrianos retornando para as montanhas.─ Disse ele, prestando atenção em como Demetria arrancava os lençóis e até a fronha para poder se deitar entre eles e adentrar no mundo dos sonhos. Ela encarou o Grão-senhor por alguns segundos, antes de soltar um pequeno suspiro.
─ Eles não estão trancados em minha cidade.─ Ela se sentou na cama.─ Se quiserem voltarem para as montanhas, estão livres para ir, a Cidade Escavada sempre estará aberto para quem a procura.
Franzindo o cenho, Rhysand se aproximou da cama que dividiria com a fêmea. Aquelas palavras...
─ O que quer dizer?─ Questionou, mas apenas recebeu o silêncio como resposta. Demetria já estava afundando sua cabeça no travesseiro e puxando os lençóis para que a cobrisse. Mas, antes de fechar os olhos, ela virou para ele e disse:
─ Ouse fazer mais uma gracinha e a Corte Noturna terá que arranjar um novo Grão-senhor, está me entendendo?─ Um sorriso surgiu nos lábios rosados quando Rhys maneou a cabeça lentamente, exatamente como um cachorro muito bem adestrado.─ Bom, menino. Talvez eu lhe dê biscoitos quando acordar.
Ele riu enquanto a fêmea escondia o rosto no travesseiro e fechava os olhos, prestes a se entregar ao mundo dos sonhos, embora soubesse que não estaria completamente em um estado de inconsciência. Não quando estava dormindo ao lado do Grão-senhor mais poderoso que já existiu.
─ Que demônio mais cruel.─ Sussurrou, risonho. Também deitando-se e tomando o cuidado de virar as costas para a fêmea, resistindo ao desejo de acolher ela em seus braços. Os olhos estrelares estavam prestes a se fechar quando algo passou pela janela, sua forma sendo refletida no chão ao mover-se em frente a lua prateada.
Aquela coisa tinha asas claramente encouraçadas e voava em direção a um lugar ou alguém. Considerando aquela aparição como algo insignificante, entregando-se ao sono.
Porém, mal imaginava Rhys que aquele era Attor. O dos servos mais cruéis de Amarantha. Uma besta que iria aterrorizar milhares vidas, caso o plano da general de Hybern fosse completado.
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