Capítulo 6
Enya se mantinha sentada sobre o estofado aconchegante do parapeito da janela de sua suíte, sua respiração continuava calma e serena, enquanto seus olhos observavam a movimentação das folhas laranjas do outono.
Não ousara voltar a casa que antes morava, não pediu para que Eris a levasse até lá. Nunca suportaria todas as lembranças enchendo sua mente, não conseguiria ver diante de seus olhos todas as conquistas que teve com ele.
Por isso, se manteve em um dos muitos quartos que a propriedade de Eris tinha. Ela não desejava ter se afastado dele, mas precisava disso, precisava se afundar em uma banheira e ele precisava resolver assuntos urgentes.
Não se acostumará ainda com o novo posto que Eris ocupava em sua corte, sempre via Beron como um homem soberbo e arrogante, que defenderia seu poder com unhas e dentes, matando qualquer um que ameaçasse tomar seu poder.
O imaginar apodrecendo de baixo da terra, quase a fazia sorrir, mas já não mais se lembrava de como fazia algo assim.
Ela não sabia mais qual era o sentimento de felicidade.
Junto de seus pensamentos, o dia a acompanhava, e então a noite chegava, com as poucas estrelas do outono no topo do céu noturno.
Enya estava livre.
Mas já não mais sabia como viver, talvez, tivesse ficado tempo demais na escuridão, fazendo com que a luz a irrite, talvez ela esteja cansada e só queira continuar em um sono completamente ds morte, talvez ela só esteja finalmente quebrada.
A coração de fogo só queria seu descanso.
O som repetitivo de passos leves batendo contra o piso, chegaram até seus ouvidos sensíveis, pensará que provavelmente era mais alguém querendo dizer o quanto sentia muito.
Ela não precisava disso, se lembrar a cada minuto do martírio e da dor que passará por todos os malditos anos em que estava presa. Não precisava se lembrar dele, de seu consorte, que ele, ao seu lado já não mais comandava.
A sensação era sufocante, desesperadora e dolorida.
Sua mente perturbada, até mesmo ousou pensar que a opção de ficar presa, seria mais tentadora do que a liberdade. Lá ela estava ocupada demais com a dor, para se preocupar com as lembranças que agora a redeavam.
Então seria mais fácil fugir como uma covarde da realidade que estava prestes a engoli-lá e a levar para a escuridão.
Seu corpo se moverá rapidamente, abrindo o guarda roupa, retirando a primeira capa que virá em sua frente.
Ela se cobriu com o manto preto de veludo, colocando o capuz sobre sus cabeça, sua mão tocou o parapeito e o corpo tomará impulso.
Enya pulará a janela, tão ardilosa e silenciosa como a assassinsa que um dia foi.
****
Cassian colocou uma mão sobre sua bochecha, inclinando a cabeça para o lado enquanto balançava o garfo sobre a comida, estranhamente se sentia sem apetite. Se sentia estranho desde que virá os olhos vermelhos de Enya o encarando após acordar de seu sono da morte.
Sua história e o fato dela ter permanecido por tanto tempo lá, atiçou a curiosidade de todos, que se sentiam frustrados por nenhuma informação conseguir.
Rhysand que se sentia tão curioso quanto os outros, levantou o rosto quando sentirá o toque suave na barreira de Velaris, alguém atravessará e ousou pensar, que esse alguém já estivesse a um bom tempo dentro de seu território.
Cassian se levantou rapidamente, algo assim era uma distração para si, algo que o tiraria de todos os pensamentos frustrados, Azriel o acompanhou, caminhando juntos para fora, enquanto ignoravam o frio que fazia ambos se arrepiarem.
Rapidamente estavam na fronteira da barreira, onde a neve tocava o chão do pico montanhoso.
— Essa pessoa poderia ter escolhido outro dia para invadir. — Cassian resmungou. — Está frio para um caralho.
Azriel repuxou seus lábios em um pequeno sorriso, sabia que fazia um bom tempo desde que algum xingamento saiu da boca do general, e agora ele não estava completamente como antes, mas podia se dizer que estava no caminho de se encontrar.
— Claro... — Azriel respondeu em um murmúrio. — Porque os invasores vão escolher vir em um dia de sol e pássaros cantantes para que você se sinta melhor.
Cassian sorrirá de lado, o divertimento em seu rosto demonstrando o quanto a ideia de Azriel o agradou.
— A gente poderia trocar um diálogo com eles... Quem sabe eles aceitem vir em um dia de sol e pássaros cantantes?
O espião fez uma careta, parando de andar lançando um olhar indignado ao seu amigo.
— Você está mesmo falando sério? — Perguntou baixo.
— Sim. — Respondeu Cassian dando de ombros.
Azriel suspirou balançando a cabeça, voltando a andar, se aproximando de onde suas sombras sussurravam o paradeiro de alguém.
Mas ele parou ao ver quem ali estava, Cassian e Azriel a olhavam, ambos reconhecendo e enchendo seus olhos com a beleza da pequena fêmea.
Cassian respirou fundo, seu subconsciente reconhecendo o cheiro suave de imediato, quase podia ver o fogo crepitando, quase podia ver as flores do outono somente no cheiro que baterá contra seu rosto após a brisa balançar a capa preta de veludo.
— Pode ir embora. — Ele diz para Azriel que já tinha percebido quem era.— Eu lido com ela.
— Você não vai assustar a garota, vai?— Perguntou o espião com os braços cruzados.
— Você já olhou para ela?! — Cassian sussurrou um grito silencioso. — Só de olhar naqueles olhos você se treme todo, eu não a assusto... Ela que me assusta.
Azriel sorriu de lado, as sombras escondendo o entusiasmo em seu rosto, ele sentia algo crescendo dentro de seu irmão, e estava feliz por isso.
Ele logo sumiu com suas sombras, e esperava realmente que Cassian não a assustasse com piadas idiotas.
****
Enya podia ouvir as vozes sussurradas a sua volta, o som tão claro atormentando sua cabeça sensível.
Ela sabia e até esperava que alguém aparecesse ali, mas deveria pensar que ambos os dois guerreiros, deveriam querer que ela soubesse de suas presenças, já que estavam tão barulhentos e não parecia que algum tentou manter o som baixo.
Ao contrário do que Cassian pensou, a figura encapuzada não se mexerá, mas permecanecerá imóvel, observando as estrelas que o céu de Velaris tinha em abundância.
Ela realmente sempre soube da cidade, desde o momento em que ela podia ser vista por todos, até o momento em que fora escondida de olhos curiosos e perigosos.
Por anos guardará um segredo que não era seu, nunca desejou ver essa cidade destruída, assim poderia apreciar a beleza que a cidade carregava. Mas havia uma pessoa que sabia, uma pessoa que ela contará, um alguém que ela confiava. Seu igual de todas as maneiras, Drake, seu parceiro.
Quando podiam, ou assim que tivessem vontade, atravessavam para o pico das montanhas que o território dos sonhos cercava, ambos apreciando a companhia um do outro enquanto olhavam as estrelas.
Uma parte de si, quase podia sentir uma fagulha dentro de si, algo reconfortante, mesmo que fosse um fiapo de luz, era algo. Era uma emoção que Enya sentia a anos atrás.
Mas a Enya que ali agora estava, não sabia como sentir isso.
Não sabia sentir nada.
Cassian se aproximou a passos lentos e cautelosos, tentando não fazer movimentos bruscos para que a mulher sentada não o atacasse a qualquer momento.
Ele se sentou em uma pedra ao lado da dela, a olhando com seus olhos castanhos.
O capuz que usava estava meio caído pela posição em que sua cabeça se encontrava.
Então ele conseguia ver o rosto pálido, com as bochechas coradas pelo frio, os lábios entre abertos, seu nariz pequeno e arrebitado levemente vermelho, as sardas que ele particularmente tinha achado fofas.
E seus olhos vermelhos, brilhando com o reflexo das estrelas neles.
Ela não disse nada, não se importou com o macho que se sentou do seu lado, ela apenas continou olhando as estrelas.
— É... Oi. — Ele disse.
Ela não se moveu, nem um movimento que deixasse a mostra que ela se quer tivesse o ouvido falar.
Ela piscou e continou a olhar para as estrelas.
— Você gosta de vinho? — Perguntou. — É bom nessa época que é tão frio.
Ela não tinha respondido.
Cassian sorriu quando uma ideia veio a sua mente, sorriu tão largo como se tivesse acabado de descobrir o maior dos segredos de Enya.
— Aaaah... — Ele diz e ri. — Você é muda?
Enya piscou, quando a pergunta tinha chegado até ela. E isso foi uma reação.
— Claro que é. — Ele se levanta. — Posso ir lá em casa e procurar papel e caneta... Sabe algumas sacerdotisas da biblioteca não gostam muito de mim, mas elas se comunicam dessa maneira, a gente podia tentar né? — Ele a olha. — Você sabe escrever? Porque, vai saber, pode ser que você não saiba... Você acredita que Feyre não sabia? É verdade, Rhys que a ensinou...
Enya tirou os olhos do céu e moveu sua cabeça devagar na direção do homem que tagarelava ao seu lado.
— Mas pensando bem... Eu não tenho papel nem caneta em casa... Muito menos no meu quarto. HÁ! JÁ SEI!
Ele gritou e começou a andar pela neve, com um sorriso bobo nos lábios.
Enya apoiou seu punho fechado em baixo do queixo, enquanto obserava Cassian andar para um lado e para o outro.
Ele pegou um pequeno graveto e o ergueu no ar com um olhar vitorioso.
— Olha... — Ele disse se sentando ao lado dela de novo. — Você pode escrever com esse graveto na neve!
Ela levantou os olhos e o olhou, seus olhos brilhando em um pequeno fiapo de diversão.
— Eu sei! Uma ótima ideia né?
Ela não disse nada, nenhum ruído ou som, nem mesmo um movimento com a cabeça para o responder.
Ela pegou o graveto e ele sorriu ao ver uma reação dela para ele.
Mas ela não fez nada, apenas encostou a ponta do graveto no chão.
— Aaah... — Cassian disse desapontado.— Você não sabe escrever.
Enya voltou seu olhos para o chão, e moveu o graveto devagar.
Não sou muda, e sim. Eu sei escrever.
Cassian sorriu mais uma vez para as letras pequenas que Enya tinha acabada de desenhar na neve.
— Não é muda? — Ele indagou. — Então... Por que não fala?
Ela abaixou o graveto mais uma vez. Lembrando-se dos gritos dolorosos que soltava no começo de tudo, então escreveu:
Talvez, seja porque eu não tenha nada a dizer.
Cassian colocou a mão no queixo e assentiu.
— É... Uma boa resposta para minha pergunta. Mas voltando a primeira pergunta... Você gosta de vinho? Está um frio do caralho hoje, estou me tremendo todinho aqui.
Ela não disse nada de novo, não sorriu, não demonstrou nada, apenas seus olhos em um brilho contido.
Sim, eu gosto de vinho.
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