Sophie
Aqueles três tinham muito o que discutir, Sophie pensou em prestar atenção para conseguir algo útil, mas eles só queriam alguém para xingar. Sophie aprendeu cinco palavrões em solariano, as princesas são de Solarian, mas não teve oportunidade de praticar a pronúncia delas. Ainda.
A única informação que Sophie conseguiu em toda essa discussão foi que Hank é de Cyrus, e que ele é o protegido do General Urano. Foi o que a Akemi disse.
Depois de muito, muito tempo o grupo ficou separado. As gêmeas ficaram perto da escada como vigias, Hank perto do rio que contornava o grande salgueiro, de braços cruzados e os pés separados um do outro, como um segurança.
Os três ficaram se encarando o tempo todo, Akemi estava de lado segurando a sua espada e Emi sentada com uma perna esticada para frente. Sophie estava deitada com a cabeça sobre a mochila, com um pé balançando e lendo a embalagem dos biscoitos que trouxe. Conseguia sentir a espada da Akemi, uma pulseira que Emi usava e as armas do Hank, um dos truques que aprendeu com sua avó.
O que mais a incomodava era um pingente de prata que estava no caule da árvore, lá dentro. Sophie observou o interior da caverna com mais atenção para ver se tinha mais alguma coisa digna de atenção.
A caverna era enorme e iluminada por algum tipo de fungo verde água, o Salgueiro tinha seis metros de altura e realmente parecia ser feito de bronze, por alguma razão tinha grama e flores no chão mesmo sem sol. A fonte de luz do lago provavelmente é a mesma do teto. Nenhum som além da água pingando em algum lugar mais a fundo.
Os quatro estavam na mesma quando eles escutam algum dos animais da floresta uivando lá fora. Em segundos, eles escutam alguma coisa rosnando lá em cima e a casinha lá de cima sendo derrubada.
Emi e Akemi se viram e Hank pega a arma e aponta para entrada, Sophie levanta o mais rápido que consegue, pronta para se defender.
Aquele demônio branco que atacou Sophie antes abriu um buraco enorme na parede, a boca dele estava salivando. Hank estava com os olhos arregalados, admirado com a presença daquela criatura demoníaca. Emi e Akemi já estavam prontas para atacar, Sophie transformou seus braceletes em uma lâmina.
- NÃO!! NÃO FAZ ISSO!! - Hank gritou. - É O DUMPLING!!
As gêmeas olham para ele perplexas.
- O quê? - Akemi pergunta.
O lobo vira a cabeça para ela, ainda rosnando e a boca bem aberta.
- Esse é o Dumpling. - Hank repete.
- Impossível! - Contestou Emi.
- É ele. Ele desapareceu logo depois do Vitor morrer... - Hank começa a explicar, mas Emi o interrompe.
- Não, estou dizendo que não é possível que ele seja tão grande.- Ela gesticula para o animal. - Ele não pode ter crescido tanto.
- Ele é! A raça dele cresce muito rápido. - Hank explica. - Não machuca ele!
Sophie franziu a testa, olhando confusa para eles e a criatura (Dumpling??), queria poder lançar outra estaca contra o lobo e fazê-lo correr antes que ele decida fazer um lanchinho.
- Não entendo. Que bicho é esse? - Sophie pergunta
Hank suspirou irritado e olha para Sophie como se ela fosse obrigada a saber a identidade daquele animal.
- Dumpling é o lobo do Vitor, ele desapareceu há anos, só encontraram um buraco perto do muro, reviraram a cidade procurando ele e nada. - Hank conta.
Sophie tentou não rir, aquele demônio branco era um bichinho de estimação. Ela tentou imaginar ele brincando com o príncipe, o animal era enorme, incrivelmente peludo e os dentes amarelos afiados. Ele olhava ferozmente para todos, principalmente para Hank.
O metidinho levanta as mãos em sinal de paz para o Dumpling, o animal se aproxima abrindo mais a boca mostrando os dentes.
- Oi, garotão. - Hank fala devagar com o bicho.- Você está enorme, hein?
Dumpling começa a farejar, a poucos metros de Hank, tentando reconhecê-lo. Ele saiu um pouco da defensiva e se aproximou mais.
- Está tudo bem, somos seus amigos, não vamos te machucar. - Hank diz estendendo a mão, Dumpling se aproxima a farejando. - Isso. Amigos. Lembra de mim? Sente falta dele, não é?
Dumpling começa a se aproximar mais, encostando o focinho na palma da mão de Hank, o focinho era grande como uma bola de basquete, e abaixa a cabeça. Hank passa a mão na cabeça dele e o animal relaxa um pouco e faz um som de cachorro chorando. Sophie sentiu um pouco de dó do animal, só um pouco.
"A Besta do mosaico". Dumpling tem o próprio mosaico no palácio de Denver. Sophie se lembrou do que Michael disse sobre cada rei de Denver ter uma consigo. Ela também lembrou do que ele disse sobre elas morrerem com os reis. Isso é estranho. Se o rei dele morreu, por que o lobo ainda está vivo? Como poderia estar?
Dumpling se aproxima mais de Hank.
- Isso, isso. - Hank continua fazendo carinho nele. - Como você veio parar aqui?
- Deve ter vindo atrás do colar.- Sophie comenta desfazendo as próprias lâminas.
- Que colar?- Hank pergunta.
- Aquele ali.- Sophie diz indo em direção ao caule do salgueiro, ela cria uma faca nova para poder abrir a árvore e alcançar o colar. Sophie o atrai com cuidado, primeiro a corrente e depois o pingente. A peça levita na frente dela e Sophie estende a mão para pegar, mas alguém aparece atrás dela, pega o pingente e sussurra próximo a ela.
- Isso não pertence a você.- Duas vozes disseram.
Sophie pula de susto e olha para trás.
Atrás dela, tinha um rapaz azul como o céu noturno e com chifres, ele a observava, mostrando um sorriso de canto, seu cabelo era preto e estava imundo e embaraçado. Usava uma camisa social verde musgo de manga comprida esfarrapada, sua calça, que deveria ter sido o conjunto de um belo terno acabou no mesmo estado que a camisa. Sophie não é a única que está surpresa com a aparição repentina dele, mas Hank deu um passo hesitante em direção ao outro rapaz.
- Vitor... - Hank disse.
O sorriso do estranho se alarga, seus olhos estavam tomados por uma luz verde clara fantasmagórica.
- Em breve, sim.- Ele responde, duas vozes saíam de sua boca, uma masculina e uma feminina, causava arrepios.
- Como isso é possível?- Emi murmura.
O "Futuro Vitor" olha para a princesa com aqueles olhos assustadores, ele mostra um sorriso convencido e arrogante. Ainda mais arrogante que o do Hank.
- Até parece que eu permitiria que meu afilhado morresse na minha presença.- As vozes daquele rapaz respondeu. - Eu o salvei poucos instantes antes dele dar seu último suspiro.
- Espera aí, quem é você? - Sophie pergunta.
- No momento, duas pessoas.- As vozes respondem.- Ao mesmo tempo que sou meu afilhado, ele também sou eu.
Sophie franziu a testa e olhou de um lado para o outro, raciocinando a informação.
- Você é a madrinha do rei de Denver.- Sophie disse cruzando os braços.
"Eles" assentem.
- Então você possui... A pessoa que estamos vendo agora?- Sophie pergunta.
- Correto, lady Zander. - As vozes responderam.
- É Hauser. Não sou a porcaria de uma lady.- Sophie diz se virando, irritada.- Por que você está possuindo ele?
- Para curá-lo.- "Eles" respondem levantando a camisa, mostrando uma cicatriz do tamanho de um melão, deixava uma mancha clara em sua pele escura.- O rapaz perdeu o estômago, tive de criar outro. Sua regeneração não iria curar isso antes da morte chegar, então eu impedi que ela chegasse.
- Você o salvou.- Hank disse, ainda em choque.
- Correto.
- Por que o manteve escondido?- Akemi perguntou. - Por que não avisou à mãe dele?
As vozes começam a rir, o corpo do rei inclina a cabeça para trás.
- A mãe dele foi incapaz de protegê-lo, nunca confiei naquela mulher. - As vozes respondem. - Esconder o meu afilhado dos inimigos que o perseguiam e daquela mulher foi o melhor que podia-se fazer. Sou a madrinha dele, apenas quero protegê-lo.
Emi finalmente se levanta do chão.
- Você tem noção de que isso poderia ter provocado uma guerra entre dois Impérios? - Emi pergunta.
- Hein? - A Madrinha franze o nariz.
- Os lordes de Íris desconfiam que foi minha mãe que armou o assassinato dele! - Akemi troveja apontando para o corpo do Vitor.
"Por que eles pensariam isso? Minha avó deixou claro desde o início que foi a minha mãe. Esse pessoal é idiota?" Sophie pensou.
- E isso importa para mim? - A Madrinha desdenha.
- Deveria, se você dá valor à paz no seu país. - Emi diz apontando o dedo no rosto da entidade.
A Madrinha apenas dá de ombros e volta a olhar para Dumpling entediada.
- Denver sempre permanecerá de pé.- As vozes dizem, tentando ajeitar um pouco o cabelo do príncipe/rei. Como se estivesse fazendo carinho no afilhado. Sophie achou aquilo muito estranho.
- Você é uma velha ignorante, hein? - Sophie comentou cruzando os braços.
Eles voltam a olhar para Sophie com os olhos arregalados.
- Como ousa falar comigo dessa maneira? - As vozes sibilam.
- Não é menos do que você merece. - Sophie dá de ombros.- Lá fora tem uma mãe que pensa que o filho está morto e ela com certeza está sofrendo por isso. - Sophie aponta para a porta. - Esse demônio gigante aí estava chorando de saudade do dono - Ela diz apontando para Dumpling - E o Hank ficou se culpando pela morte do Vitor desde o começo. - Sophie aponta para Hank. - Essas duas eu não sei o que elas querem e eu não ligo porque não fui com a cara delas. - Sophie diz apontando para as gêmeas. - E eu aposto que o seu afilhadinho não gostou nem um pouco de você ter mantido ele assim.
- Eu mediria as palavras se fosse você, Dama de Ferro. - As vozes advertem.
- Que bom que não somos a mesma pessoa.- Sophie rebate.
Eles se aproximam de Sophie lentamente, ela não vacila diante o olhar assustador deles. A luz nos olhos com certeza representa a Madrinha possuindo o corpo do próprio afilhado.
- Seu destino será cruel.- As vozes sussurram em um tom mais cortante.- Quando abrir os olhos, já terá perdido um dos seus. Você não quer se envolver nos problemas do Oeste por enquanto, mas quando os insatisfeitos com a história vierem, a puxarão para o meio deles. Queira ou não.
- Isso foi uma ameaça?- Sophie pergunta encurtando a distância entre eles.
- Foi uma profecia. Tenha paciência, essa marca sempre estará no seu corpo. Não importa quantos você queira matar por ela estar aí.
Sophie não acreditava em profecias, mas ficou incomodada por aquelas vozes terem mencionado a cicatriz dela. "Como eles sabem disso? Nunca disse nada para ninguém sobre a existência dela."
As mãos do rei tremem compulsivamente, ele fecha os olhos com força e se afasta de Sophie até tombar em Dumpling, que ficou logo atrás dele. Sua respiração fica desregulada, o rei abre os olhos de novo, mas eles estão tomados pela cor vermelha agora.
- Eu sabia...- Uma terceira voz diz, se adicionando com as outras duas. - Também nunca confiei em você...
- Salvei a vida dele.- As três vozes responderam, mas os olhos ficaram verdes de novo.- Logo, ele mesmo te dirá.
Sophie arregala os olhos ao perceber que a terceira voz era a da mãe de Vitor. A voz da Imperatriz Miriam.
- Emi, isso é incrível.- Akemi diz para a irmã, segurando seu braço.
- Tem duas pessoas possuindo o Vitor e você diz que é incrível?- Emi pergunta incrédula.
Akemi apenas assente.
- Certo.- Os olhos verdes voltam e fazem o rei sorrir. - Vamos embora desse templo.
O corpo ainda treme um pouco, mas sobe as escadas sem se importar com a destruição que Dumpling causou ao entrar. Hank e as princesas o seguem, Sophie ficou alguns segundos assimilando o que aconteceu.
Realmente tinha algo valioso para Magnólia ali. Algo muito, muito valioso. Para muita gente.
Não sobrou nenhum resquício do pequeno templo, Dumpling derrubou tudo. A Madrinha do rei seguia na frente com o lobo ao seu lado, a muralha formada pelas árvores se abre em um arco e o grupo passa por debaixo dele. Sophie pensou em algo e se repreendeu por isso no minuto seguinte, mas depois pensou de novo.
Vitor é o único filho da imperatriz Miriam Minori. A governante do Império Íris, tem o exército mais poderoso do mundo inteiro, sem contar que é a maga mais poderosa do mundo. E a "inimiga mortal" de Sophie que com certeza quer esfolar sua mãe viva.
Sophie imaginou o quanto sua avó poderia barganhar com Vitor em suas mãos.
"Mas isso é muito errado" pensou.
Mesmo que a Imperatriz fosse aquela estátua de pedra na TV ou em qualquer outro lugar em que apareça, ela com certeza deve ter sofrido com a "morte" do filho. Sophie ficou ouvindo isso durante uns dois meses, o príncipe ficou em Solarian por um mês e foi atacado na volta para casa.
"Imagina você esperando seu filho voltar de viagem e ele morrer no caminho?"
Sem contar que ele também devia estar morrendo de saudade da mãe. Anos longe da mãe devem ter sido terríveis, Sophie sabe como é essa sensação. Saudade da família e não poder fazer nada para ir até eles.
É certo fazer isso, separar uma mãe e um filho que não se veem há anos e piorar ainda mais a situação?
Mas Sophie devia algo à ele? Parte do que ela sofreu foi por culpa dele. Aqueles policiais vieram até o alojamento de Sophie no Campo da Ilha de Maya por causa do que aconteceu com ele.
Tudo o príncipe, o príncipe, o príncipe, o maldito príncipe. Por quase um ano, Sophie realmente o culpou por tudo. "A culpa é dele por não ter sobrevivido." Dizia com raiva, mas parou com esse pensamento. A culpa não é dele se a avó de Sophie queria deixar a mãe dele irritada.
Sophie não tinha nada a ver com essa briga entre os Zander e os Minori, ele provavelmente também não.
- Tem uma casa que antes era usada pelos protetores que Vitor colocou na Floresta Sagrada para impedir a caça dos animais quando ele não está.- As duas vozes dizem apontando para um canto da noite escura. - Vamos passar a noite lá.
...
Era realmente uma casa, estava um pouco empoeirada, mas Hank abriu as janelas para que a poeira saísse. Dumpling não conseguiu subir por motivos óbvios, ele ficou fazendo vigia ao redor deles. Não que Sophie esperasse que alguém os atacasse ali.
Ela dormiu na sala, as gêmeas dormiram perto da cozinha e Hank dormiu no dormitório onde os guardas ambientais ficavam. Sophie estava quase caindo no sono quando ouve seu comunicador soltar um chiado.
- Tio Tyr?- Sophie sussurrou.
- Não.- A voz de Magnólia respondeu.
Sophie levanta rápido e vai para fora da casa, não viu Dumpling em lugar nenhum.
- Vovó, o que houve?- Ela perguntou.
- O general Urano pegou seu tio.- Sua avó respondeu.
Se o comunicador não ficasse preso em Sophie, ela teria deixado cair.
- Como isso aconteceu?- Sophie conseguiu perguntar.
- Oh, minha querida.- Magnólia diz com a voz cansada.- Seu tio estava indo ajudar você, mas o Febe o alcançou antes.
- O que eu posso fazer?- Sophie nunca imaginou que essas palavras poderiam sair de sua boca, mas ela gostava do Tio Tyr. Com certeza ele iria morrer depois que a Imperatriz Miriam arrancasse tudo o que ele sabia sobre o que a avó pretendia.
- Você descobriu algo na Floresta?- Magnólia perguntou com a voz doce.
"Ah, se descobri." Sophie quase disse, mas algo a impediu. Ela poderia muito bem dizer que o príncipe está vivo e que ele poderia ser usado, mas não conseguiu dizer.
- O templo foi destruído.- Sophie responde.
- O quê?- Magnólia pergunta, claramente irritada.
- Não restou nada.- Sophie dá de ombros.- Parece até que apodreceu.
Algo quebra do outro lado do comunicador.
- Saia daí, Sophie.- Magnólia ordena, sua calma sumiu.- Vou mandar a sua tia Héstia te buscar.
- Por que nunca minha mãe?- Sophie acaba perguntando.
- Tenho planos maiores para ela.- A voz doce voltou.- Volte para a capital e espere sua tia.
- Certo, vovó.- Sophie diz rápido.- Beijinho.
Ela desliga rápido, precisaria de muito tempo para pensar o que fazer. Precisava pensar no que fazer para conseguir escapar de tudo isso, sua família maluca e dessa guerra prestes a acontecer. Sua cicatriz parecia agir como um alarme.
"Essa marca sempre estará no seu corpo. Não importa quantos você queira matar por ela estar aí."
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