Edmund
A névoa encobria Marillion como um manto azul claro poucos instantes antes do sol nascer, o senhor Edmund já tinha acordado a essa hora. Ele observava um dos vários jardins do Wildknight, costumava admirar o lobo branco do rei andando por ali. Quando o animal não acompanhava o seu mestre, ele descansava no maior jardim do palácio. Agora não tinha nem o lobo nem o rei.
Seu quarto dava a vista para o nascer do sol, onde ele podia ver o dourado banhar o reino que tanto ama. O reino que ele serviu sob três reis.
Nenhum deles, nem mesmo o segundo, desejaria ver o reino como ele está agora.
Edmund se dirigiu a antessala onde lhe serviram o café da manhã, café preto, salada de frutas, torradas com manteiga e sanduíche de queijo quente. Hoje seria um dia tedioso como todos os outros, ninguém se importava com um velho aposentado nem com o que ele fazia.
Diferente da maioria ali, Edmund não conquistou nada por ser de nascimento elevado, e sim graças a seu trabalho duro e esforço. Quando se aposentou, o segundo rei que serviu, Menoecio Veeren, decidiu expulsá-lo do palácio. Isso aconteceu minutos antes do exército escariano ser avistado na entrada da capital.
O último rei era mais generoso. Miriam Minori nunca ligou para ele, então os outros lordes dispensaram Edmund sem ela se importar, mas quando o rei assumiu o trono, ele procurou por Edmund para assumir um cargo no Conselho do Rei.
"O senhor viveu sob os dois reis que vieram antes de mim, seus conselhos podem ser os mais valiosos aqui."
Mas depois que o rapaz morreu, Edmund voltou ao seu tédio, pelo menos não tinham como expulsar ele do Wildknight agora.
Edmund pegou sua bengala, e caminhou lentamente até a saída do quarto, estava atrasado para sua observação dos Mosaicos das Feras. Nenhum funcionário andava pelo palácio ainda, ninguém estava acordado a essa hora a não ser Edmund Cassel. O corredor estava coberto pelas cores dos mosaicos que refletiam a luz do sol, as janelas tinham cerca de dez metros de altura e atraiam a atenção de qualquer um.
O primeiro era o famoso Leão de Bronze, a primeira Besta da Coroa reconhecida na história de Denver. Ele está sobre duas patas e com a boca aberta em um escudo cor de bronze e um fundo verde escuro. Edmund não lembrava mais do nome do leão, sua memória começava a falhar por causa da idade, mas lembrava muito bem do nome do rei: Edmund Veeren, o Grande.
O segundo era uma grande serpente de ouro que pertenceu a Edmund II, o fundo era o mesmo que o do leão, o nome dela era Skonos. O terceiro era uma águia roxa que chegava aos dois metros de cumprimento, esse era o favorito de Edmund, e ele já contou essa história ao último rei.
"O rei daquela época não podia mais andar por causa de um acidente na infância, mas aquela águia o levava para voar por toda Denver. Eles atravessavam o céu juntos e o rei só saía de cima dele na hora de dormir."
"Eram boas histórias, a dele também será."
No fim do corredor, Edmund viu pessoas montando o que seria o último mosaico, o do Lobo Branco, mas seu escudo é dourado com o fundo azul escuro, as cores de Escarion. Escarianos se encarregavam da montagem. Uma provocação clara como o dia.
Edmund fez sua caminhada matinal pelo palácio tranquilamente, os outros lordes e conselheiros estavam em reuniões. Discutindo se deveriam atacar Escarion ou manter a lealdade já que o poder dos Veeren não foi passado para ninguém ali, Edmund não tinha interesse em participar de nada disso. Ele concordava que Escarion ajudou Denver a crescer ainda mais, mas não concordava com o método que os outros discutiam isso.
Uma declaração de guerra contra o império causaria um caos no mundo inteiro, não se trata mais de uma implicância entre Denver e Escarion.
Edmund estava observando a estátua dourada de Skonos no jardim quando alguém se aproximou dele cuidadosamente.
- Senhor Cassel? Sua presença foi requisitada.- Um rapaz com o rosto quadrado, olhos azuis e cabelo loiro diz educadamente. Suas bochechas estavam vermelhas por causa do sol, mas tinha um belo sorriso.
Edmund se levanta com esforço, o rapaz o ajuda.
- Obrigado, vejo que veio de Escarion.
Ele aponta para o uniforme azul marinho do jovem, sua patente era de soldado raso.
- Sim, senhor. Nasci em Gedeon.- O jovem responde oferecendo o braço para ele, Edmund aceita.
- Por que não tem a pele azul? - O senhor pergunta.
- Minhas mães vieram de Therese, senhor.- O rapaz explica educadamente.- Não tenho sangue de escariano.
- Oh, sim. Suas mães vieram pela lei Danielle Alfred?
- Sim, senhor. Desculpe, mas o senhor tem que ir a sala do trono agora mesmo.
- Claro. Qual o seu nome?- Edmund pergunta.
- Sou o soldado James Lunther, senhor.
- É um prazer, James.- Edmund cumprimenta dando uma olhada para o céu, em um tom cinza escuro assustador.
...
Apenas no corredor que levava a sala do trono, Edmund viu a situação caótica que estava acontecendo lá. Tinha um escariano sentado no trono, e não era o que os denverianos respeitavam e sim um dos que eles temiam.
Urano Febe estava sentado no trono de maneira relaxada, com o cotovelo apoiado no braço do trono e o queixo repousando sobre o punho fechado. Ele usava um traje azul marinho e a capa preta oficial de general, suas medalhas cintilavam em seu peito.
- Não entendo, não fizemos nada contra o império.- Uma mulher diz observando o braço direito da imperatriz Miriam no trono do rei.
- Eu não disse isso, disse que estou aqui porque recebi a informação de que uma Zander passou por aqui.- O general Urano diz antes de um de seus homens chamar sua atenção e mostrar algo em seu tablet.- Oh, perdoe minha falta de informação, dois Zander. Vocês tinham dois Zander andando pela sua capital.
- Impossível.- Alguém suspira.
- É possível, os nomes estão aqui. Os rostos também.- O general pega o tablet e confere.- Sophie e Tyr Zander. A garota eu até entendo, mas como vocês não viram Tyr Zander andando pela capital de vocês como quem faz turismo? Sabem como ele é perigoso?
- Temos noção do perigo que os Zander representam para a população. - Um homem diz em tom esnobe e arrogante.
- Então por que brincaram de pega-pega com Sophie Zander usando metal não protegido?- Urano pergunta no mesmo tom e arqueando uma sobrancelha.
- Ela não estava sozinha, general.- Outra pessoa sibila. A comissária de polícia, Helen Dominguez, diz.- Também vi Hank Fowller com ela. O que ele estava fazendo com Sophie Zander?
- Assim como todo o continente, meu filho está se esforçando para capturar os Zander. - O general responde dando de ombros. - E, aparentemente, está fazendo um trabalho melhor que vocês porque ele alcançou a Zander.
- E está cooperando com ela?- Helen pergunta. - Ele simplesmente desapareceu com a garota.
- O que qualquer criança de dez anos sabe é que um Zander com metal a disposição é extremamente perigoso, e vocês praticamente lhe deram um arsenal completo. - Urano diz abrindo a mão. - Meu filho salvou a vida de vocês. Em nome dele, de nada.
- O que a Imperatriz está fazendo a respeito dessa traição?- Outra mulher pergunta.- Como ela está lidando com essa ameaça dos Zander?
- Sabiamente, senhorita.- Urano responde.- Ou você está vendo algum Zander sentado aqui?
- O que o senhor faz aqui, general Urano?- Edmund pergunta se aproximando com a ajuda de James. - A que devemos essa visita tão inesperada?
Diferente dos outros, Urano e Edmund tinham uma relação respeitável. O general era arrogante com a maioria das pessoas, mas não com Edmund enquanto ele era o aliado mais pacífico em Denver que Urano encontrou.
- Como eu acabei de mencionar, vocês têm dois Zander correndo a solta por Marillion. - O general responde em tom burocrático. - A Imperatriz Miriam, que deixou claro que eles devem ser presos imediatamente, me mandou aqui para comandar diretamente qualquer operação de vocês em relação a isso.
- Isso não explica...- Alguém começa, mas sua voz murcha a cada palavra.
- Não explica o quê?- General Urano pergunta, fazendo papel de inocente.
"Você está sentado no trono do rei, rapaz. Esse é o problema."
O General Supremo Urano Febe representa a Imperatriz Miriam Minori quando ela não está, é sua voz quando ela não pode falar e é sua espada quando ela não pode lutar. Não é Urano Febe que está sentado no trono do rei de Denver, é Miriam Minori. O império Íris não vai permitir que essa ideia de rebeldia continue.
- General Urano, com todo o respeito, não precisamos de ajuda.- Helen Dominguez diz educadamente.
- Primeiro, não é uma ajuda. - Ele rebate.- Sou o General Supremo do Império Íris e estou no meu dever de defender a honra da família Minori. Segundo, vocês não se mostraram capazes de deter uma adolescente com problemas e traumas psicológicos.- O general apoia as duas mãos nos braços do trono e se levanta. - Vocês não são aptos para essa tarefa, mas eu espero que isso não se repita. Já que vocês adoram mostrar como se lembram bem das coisas, lembrem- se do que os Zander fizeram com vocês.
- Nós sabemos o que eles fizeram.- Lorde Jaime dispara, seus cachos ruivos e sua barba tão bem feita eram impecáveis.- Sua Imperatriz é que aparenta não se importar.
O som estrondoso de um trovão faz Jaime saltar e gritar de susto, junto com vários lordes e conselheiros que estavam na sala. Urano Febe continua com a mesma expressão calma de sempre.
- Vocês são de um reino que perdeu um rei, a Imperatriz é uma mãe que perdeu o único filho.- Ele diz com a voz calma.- Não duvidem do que ela é capaz de fazer pela memória dos que ama, vocês sabem. Vocês se lembram bem.
...
- Devíamos matá -lo agora.- Lorde Jaime diz batendo na mesa, mas sua voz era apenas um sussurro furioso. - Ele está a nossa mercê. Que oportunidade seria melhor que essa?
- Não podemos matar ele, seu idiota.- Uma mulher do Conselho, magra e esguia, cabelos trançados, pele parda e olhos azuis penetrantes diz ao lado dele.- Miriam Minori manda seu maior aliado aqui e mandamos de volta apenas o corpo?- Ela levanta e abre as mãos.- A próxima coisa que ela fará vai ser varrer a capital inteira com todos nós junto.
- A senhorita Tereza está correta.- Edmund diz, com as duas mãos sobre a bengala. Normalmente ele evita as reuniões com esses jovens alterados, mas teve que abrir uma excepção hoje. - Matar Urano Febe vai fazer com que a Imperatriz Miriam entenda que nossas intenções são hostis e vai mandar um exército que não podemos vencer.
O jovem Jaime engole seco e se senta lentamente. Ele prestou atenção nas aulas de história quando criança.
- Então, o que faremos?- Senhorita Tereza pergunta.- Deixamos ele fazer o que quiser aqui?
- Ele quer deter os Zander, e nós devemos ajudá-lo.- Outra mulher, Edmund não lembra o nome dela, diz levantando da cadeira. Ela tem os olhos violeta, seu cabelo já era grisalho e seu corpo ocupava sua cadeira, sua pele era negra com pequenas pintas em volta dos olhos. - Eu já conheci Magnólia Zander, aquela mulher é um monstro. Dificultar nossa relação com a Imperatriz Miriam é abrir espaço para aquela cobra nos atacar.
- Eu me recuso a entregar o trono para qualquer uma das duas.- Diz Natan em sua cadeira de rodas, é um lorde de quase cem anos e sem um único fio de cabelo. Seu rosto lembrava o de um urubu e sua pele era cinza como a de um cadáver.
- Para quem prefere entregar, senhor? Os Veeren?- Senhorita Tereza pergunta, arqueando uma sobrancelha.
- Eu já disse milhões de vezes, menina!- Natan bate o punho na mesa.- Temos que investir na viagem até o coração da Floresta de Cecília e pedir à ela que passe o poder do trono para outra pessoa. Assim, estaremos livres daquelas duas lunáticas. Poderemos colocar Denver de volta a posição de onde nunca deveria ter saído.
Natan sempre teve um pensamento antiquado, sempre vinha com as mesmas reclamações de que Escarion tinha que cair. A única vez em que disse algo diferente foi quando sugeriu a Menoécio Veeren, o penúltimo rei, que entregasse Miriam Minori para o rei inimigo na Guerra do Alvorecer. O rei seguiu o conselho de vender a própria esposa, mas não esperava que Miriam voltasse algum dia.
- Lorde Natan, não diga que Denver estava bem antes de Miriam Minori. - Edmund diz com a voz calma.- Pois não estava.
- Sei bem disso, Edmund.- O lorde diz se engasgando. Depois de bater no peito duas vezes, ele volta a falar.- Se tem algo pelo qual agradeço aquela mulher, foi por ela ter mandado aquele maldito do Menoécio embora. Mas eu estou certo quando digo que ela é uma mulher perigosa. Um demônio que tirou proveito de uma criança para governar.
- Por isso, não devemos provocá-la.- Edmund repete pela quinta vez naquela tarde. - Deixem o General Urano em paz, vocês sabem que ele não pode ser desafiado também.
Todos que falaram se calam e quem apenas assistia a reunião abaixou a cabeça, envergonhado. Edmund se levanta lentamente.
- Agora, senhores. A reunião deve se dar por encerrada. Não queremos que nossos convidados saibam a respeito dela.- Ele diz, esperando todos saírem. Enquanto tentava se lembrar dos nomes de quem estava na sala, outra sensação veio. Edmund fecha os olhos, inspira o ar pesadamente e solta o ar lentamente.
- Venha, majestade. Seu reino precisa de você.
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