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3. Corte - Laís

Passarinhos cantavam em alguma árvore próxima, o som atravessava a janela de meu apartamento; deixei-me ser invadida pela melodia enquanto me concentrava no trabalho. Estava envolvida há quase uma semana com o artigo "Como auxiliar crianças a terem uma estadia mais agradável no período de internação", para a revista de saúde na qual eu fazia a coluna denominada "A parte humana dos hospitais: uma visão focada no paciente e em seus familiares".

Apesar do meu não conhecimento em jornalismo ou medicina, a coluna quinzenal me foi oferecida depois de terem vindo algumas vezes ao hospital entrevistar pacientes em busca de novos artigos e perceberem que eu era um nome constantemente citado entre os entrevistados. Minhas respostas elaboradas e longas acabaram por me dar essa possibilidade, desde então eu recolho depoimentos ou me baseio em percepções pessoais para escrever. Escrever esses artigos me faz bem por pensar que talvez outras pessoas que tenham suas vidas ligadas a um hospital de modo trágico, talvez tenham seus sofrimentos amenizados.

Com o dinheiro desses artigos juntamente com o que recebo através dos anúncios de publicidade colocados em meu blog de resenhas de livros, um passatempo adquirido no hospital, eu passei a poder pagar alguma conta de casa, desafogando um pouco minha mãe. O dinheiro era pouco, mas recebido com orgulho, fazendo eu me sentir menos um estorvo.

Minha mãe nunca me negava dinheiro. Mesmo quando as coisas estavam difíceis, ela dava um jeito de me presentear com livros e mimos. No passado isso não me incomodava de verdade, no entanto, desde que recebi um novo coração a vontade de seguir por minhas próprias pernas cresceu e agora eu buscava maneiras de ser financeiramente independente. Seria um longo caminho, mas eu estava empolgada em trilhá-lo.

Analisei pela internet alguns currículos de faculdades à distância, na esperança de encontrar algo que me permitisse realizar um trabalho autônomo sem precisar ficar dentro de uma empresa ou escritório, pois lugares fechados me davam calafrios. Assim cortei de minha vida qualquer possibilidade de frequentar ônibus, cinemas, restaurantes que não tivessem mesas ao ar livre, salas de aulas fechadas e repletas de universitários.

Talvez me chamassem de neurótica, no entanto, eu levava a sério as recomendações do imunologista de evitar ao máximo me expor a doenças contagiosas. Excluindo estes cuidados minha vida podia ser comparada à normalidade, as crises de falta de ar e dor no peito, por qualquer esforço idiota feito, não eram mais minhas companheiras.

O único lugar fechado onde eu me sentia bem era o hospital, algo tão familiar quanto um lar, onde girou por muitos anos a minha vida social. Meus parceiros de brincadeiras, namoricos de adolescentes e amigos foram todos conhecidos nas salas de recreação ou corredores do mesmo hospital.

Mesmo agora que só era obrigada a passar por lá uma vez por mês quando, na mesma manhã, visitava o cardiologista, o imunologista e a nutricionista, engajara-me em um trabalho voluntário, por não conseguir ficar longe. Todas as terças eu passava a tarde na sala de recreação contando histórias para os pequenos doentes da ala de doenças crônicas. Esses eram os melhores dias da semana, eu me sentia renovada a cada contação de história e conversas com enfermeiras, antigos pacientes, balconistas das lanchonetes. Não sei se isso era coisa de pessoa normal ou algo de gente louca, não me importava. Passar um tempo no hospital me fazia bem, e por isso eu continuava a ir.

Apesar das resalvas dos outros médicos, o Dr. Emílio, meu cardiologista, conseguiu-me um crachá de acesso à entrada de funcionários e assim eu ingressava no hospital sem ter contato direto com os andares onde houvesse pacientes que poderiam me transmitir algum vírus ou bactéria indesejada. Eu me mantinha no último andar, onde eram internados os acometidos de cardiopatias, deficiências de órgãos a espera de transplantes, cânceres e outras doenças crônicas; ou seja, era um andar exageradamente asséptico.

A lembrança das leituras de terça-feira me fez abandonar, por enquanto, a tentativa de escrever o artigo para a revista e sentar com as pernas cruzadas diante da estante de livros. Na prateleira, rente ao chão, haviam livros infantis lidos por minha mãe para eu dormir quando a vida ainda não nos apresentara suas desgraças, procurei algum para ler em minhas sessões com as crianças. Achei um com rimas, um dos meus preferidos. A vida parecia tão mais simples na infância, bastavam rimas engraçadinhas para gerar sorrisos sinceros. Folheei todas as páginas com uma sensação nostálgica.

Larguei o livro sobre o criado-mudo, e liguei o rádio portátil da estante da sala. Era melhor aproveitar meu bom humor e limpar logo a louça, antes de minha mãe chegar. A melodia se espalhava pelo apartamento enquanto eu remexia a cintura e esfregava com a esponja ensaboada copos, pratos e talheres engordurados.

Um copo escorregou de minha mão. Um reflexo atrasado e minha mão foi atingida por cacos quando o vidro se espatifou dentro da pia. A água começou a ganhar uma tonalidade púrpura, a ardência em minha pele me alertou instantaneamente do ferimento.

Droga! Analisei o estrago na palma ao mantê-la em baixo da água. Droga! Não está coagulando! Bufei aborrecida ao perceber a necessidade de sutura, os anos de convivência no hospital me deram alguma sabedoria sobre ferimentos.

Eu já passara por três cirurgias cardíacas, um corte profundo na mão não era nada. Tentei me acalmar, porém meu corpo parecia discordar comigo ao me enviar o alerta de dor. E como ardia! Por que me mandar todo esse sinal dolorido diante de um corte menor que minha mão? Resmunguei ao meu cérebro "fiasquento".

Peguei uma das toalhas limpas e enrolei na mão ferida para conter o sangue. Ligeira, alcancei o saguão do meu prédio. Até a edificação branca e quadrada de seis andares que ocupava o quarteirão inteiro com uma cruz vermelha na entrada era exatamente cinquenta e sete passos, minha mãe os contara de modo meio obsessivo quando compramos nosso apartamento. Hoje, mais do que nunca, fiz o percurso em tempo recorde.

Hesitei à frente da entrada da emergência do hospital. Como eu podia ter esquecido o crachá de acesso? Arriscar-me em entrar num lugar no qual vários tipos de vírus transbordavam era mais preocupante do que perder um pouco de sangue ao voltar para buscar o crachá?

Como uma barata tonta fiquei de um lado ao outro segurando uma das mãos na frente da porta da emergência. Meu coração palpitou em ansiedade, odiava não saber o que fazer. Analisei a mão, havia focos com borrões vermelhos cada vez maiores manchando a toalha.

Um enfermeiro se aproximou ao me ver:

- Venha comigo, vou cuidar da sua mão.

- Por favor, chame a enfermeira Claudete do último andar? - Tentei manter a calma em minha voz, mas eu a ouvia meio esganiçada. O homem me mirou desinteressado, sem disposição de acatar meu pedido, enquanto pousava a mão sobre meu ombro para me conduzir para dentro da emergência. - Isso é um erro! - gritei descontrolada ao me afastar dele. - Não posso entrar na emergência, imunidade zero! Por favor, chame a enfermeira Claudete.

Eu estava a um ponto de começar a chorar, o que era estranho até mesmo a mim. Passei por tanto sem soar tão frágil. Mas não era a dor ou o corte que me amedrontavam e sim o risco de ser empurrada para a emergência e isso adoecer meu novo coração saudável.

Demorou apenas um segundo para o homem ponderar e correr para dentro. Olhando a toalha ganhar mais tons de púrpura, eu comecei a hiperventilar. Será que ele acharia Claudete? O que eu fazia? Voltava para pegar o crachá?

Antes que a toalha ficasse vermelha, Claudete irrompeu a minha frente assustada:

- Criança! O que aconteceu?

- Cortei a mão lavando a louça - choraminguei. Eu conhecia Claudete desde minha primeira internação, era como uma tia simpática de meia idade. A presença dela me acalmou. Suspirei, eu sabia a partir de agora que tudo ficaria bem.

- Não se preocupe. Venha comigo. - ela olhou com as sobrancelhas cerradas para uma das enfermeiras ali pela frente e disse com sua firmeza característica de chefe de setor. - Peça para um dos médicos da emergência ir com o material de sutura até a sala de atendimento 12, no último andar.

Claudete pousou o braço sobre meus ombros e me levou pela lateral do prédio em direção ao elevador dos funcionários, eu a segui com calma, até a dor parecia ter desistido de seu alerta. O percurso de elevador foi rápido, o balcão circular das enfermeiras à frente estava vazio, andei com ela pelo corredor envidraçado até alcançarmos as seis portinhas de salas de atendimentos, de frente para as outras seis.

Entramos na primeira a esquerda, sala 12. Não precisei de indicação conhecia o andar de cor. Tranquila, sentei-me na cadeira de estofado branco com a braçadeira onde apoiei meu braço incontáveis vezes para fazer exame de sangue. Claudete desenrolou de modo gentil a toalha, mantinha a expressão de preocupação. Inclinou-se para o balcão com gavetas onde eram guardados os materiais de laboratório e pegou gaze para limpar o ferimento.

- Que corte feio! Infelizmente precisa de sutura. - ela sacudiu a cabeça penalizada.

- Eu sei. - respondi totalmente tranquila, afinal agora ela estava ali e mais nada me assustava, em poucos minutos eu voltaria para casa sã e salva. Sorri. - Um procedimento para lá de simples.

Claudete piscou para mim e estalou a língua como se me parabenizasse pela coragem, e isso me fez soltar um risinho pelas boas recordações de nossa relação, das vezes em que os procedimentos médicos se tornaram menos traumatizantes por tê-la segurando minha mão e fazendo suas caretas que tinham diversos significados, uma linguagem secreta compreensível entre nós.

Um homem magro, mas com costas largas e cabelos castanhos curtos desarrumados, como quem se esqueceu de olhar no espelho antes de sair de casa, usando jaleco branco, irrompeu pela sala num gesto mais para aborrecido do que preocupado com a paciente. Claudete agradeceu a presença do médico com um aceno.

- Laís, o Dr. Theo cuidará de seu ferimento. Infelizmente preciso ir conferir um paciente, mas venha me ver depois.

Agradeci-a com um sorriso sincero. Se ela dissera que tudo ficaria bem, então eu confiava nela.

O médico calado se sentou na cadeira à minha frente, colocando as luvas nas mãos, observou com atenção o ferimento para então preparar a anestesia trazida na maleta de couro deixada entre seus pés, como se eu não estivesse presente. Já passara por incontáveis médicos que ignoravam os pacientes e isso não mais me incomodava. Eu poderia também ignorá-lo, no entanto, algo no rosto anguloso e nos olhos verdes extremamente claros dele me fez querer quebrar a barreira de imparcialidade.

- Trabalha aqui há muito tempo?

- Sentirá uma ardência com a anestesia. - ele respondeu, ignorando minha tentativa de aproximação.

Sério? Vai me ignorar ainda? Quis xingar, mas apenas apertei os olhos durante a anestesia. O primeiro segundo me atingiu com dor, para aos poucos tanto a ardência do ferimento quanto a sensibilidade em minha mão ir desaparecendo. Evitando olhar para minha mão ferida me concentrei no tal Dr. Theo, seu rosto era o retrato da tristeza. Aquela imagem me penalizou.

Ele arriscou uma olhadela para mim ao pegar a pinça e a agulha curva com o fio preto esterilizado. Seus olhos pousaram involuntários sobre a ponta da cicatriz no centro do meu peito, para depois se desviarem rápidos. Eu estava acostumada a esse tipo de olhar, não era o olhar de um homem que aproveita um breve momento para analisar meus dotes físicos, e sim curiosidade ao perceber algo que não deveria estar ali.

Acompanhei seu olhar torcendo que ele dissesse algo para romper o silêncio daquela sala, contudo o homem voltou a se ater apenas à palma da mão cortada. Se eu não disse algo, nenhum som seria pronunciado naquela sala.

- Então, é médico da emergência há muito tempo? - Limpei a garganta tentando ser natural ao reiniciar a conversa.

Ele me lançou um olhar incrédulo. Não pude evitar, havia a necessidade dentro de mim em falar. Não conseguia olhar para aquele homem com aspecto desamparado a minha frente e ignorá-lo como ele fazia comigo. E, também, falar me distraía do que estava se passando com minha mão, como se pudesse imaginar ser a de outra pessoa.

Puxei o ar outra vez em preparação para fazer outra pergunta, contudo ele esboçou algo que eu podia imaginar como um sorriso irônico ao perceber minha intenção.

- Se não responder vai continuar a me fazer a mesma pergunta? - ele disse sem desviar os olhos da mão ferida. Sorri culpada e ele bufou derrotado. - Estou na emergência há uns seis anos, desde minha residência de medicina.

- Tanto tempo assim?! Estranho, nunca te vi. - o comentário escapuliu sem pensar, quando minha curiosidade natural tomou seu lugar de liderança. O médico lançou um olhar desconfiado, e inclinou os lábios em um quase sorriso.

- Então você é frequentadora do lugar? - ele encarou-me por um segundo. - Não da emergência, com certeza.

- Meu lar costumava ser o último andar. - disse, com certo orgulho.

- Seu lar? Pelo jeito passa mais tempo aqui do que eu na emergência.

- Agora não mais. Estou de alta permanente. - Os olhos dele pousaram novamente sobre minha cicatriz e se desviaram em vergonha ao perceberem que eu sabia para onde olhavam. Achei graça de seu acanhamento e ri alegre, falar sobre minha grande conquista era gratificante. - Tenho um novo coração.

- Transplante! Eu devia desconfiar. - ele disse quase para si mesmo, ao voltar o olhar para a sutura em fase final. - Um bom motivo para se afastar da emergência. Quando foi transplantada?

- Oito meses.

- Alguma infecção?

- Não.

- Reação?

- Só dos remédios, mas os enjoos são cada vez mais raros. - Eu estava pronta para responder o interrogatório por ser uma paciente educada, mas o seu interesse me causou divertimento, soltei uma gargalhada. - Médicos não contêm a curiosidade de ter um relatório de toda a situação, não é?

- Desculpe. Não sou seu médico. Foi indelicado de minha parte. - ele se fechou novamente. - Fiz pontos miúdos, não terá uma cicatriz muito perceptível.

- Obrigada. - Fitei-o com remorso, enquanto ele cobria os pontos com o curativo. - Não quis ser estúpida, foi só uma brincadeira.

- Sem problema. - a voz dele soou seca e ele se concentrou na tarefa de jogar os materiais usados na lixeira. - Os pontos devem ser limpos com... - eu sabia o procedimento de cor depois de ter passado por três cirurgias, os cuidados com pontos eram o de menos. Apesar disso, não quis ser grosseira novamente e deixei que ele continuasse. Mas o médico era mais atento do que aparentava. - Já sabe de tudo isso, não é?

- Sim.

- Bem, os pontos devem ser retirados em sete dias. É só pedir para uma enfermeira me chamar.

O homem abriu a porta para eu passar e se despediu. Não pudemos evitar sorrir torto um para o outro, sentindo-nos tolos ao percebermos que usaríamos o mesmo elevador: eu para voltar ao meu apartamento e ele para retornar à emergência.

- Realmente é uma cliente vip, usa até o elevador dos funcionários. - ele parecia tentar ser simpático, mas era visível como esse tipo de brincadeira lhe era desconfortável.

- E digo mais, - sorri irônica, tentando deixá-lo mais a vontade. - Tenho um crachá para acesso exclusivo, mas esqueci em casa.

- Pelo visto conquistou algumas regalias. Mais alguma? - ele manteve o tom, soando mais em sintonia com minha fala do que antes.

- Ganho alguns sanduíches de graça da garçonete da lanchonete do último andar para familiares de pacientes carentes. - sussurrei em tom de brincadeira como se alguém pudesse ouvir, apesar de estarmos sozinhos. Eu começava a me divertir com aquela situação toda.

- Provavelmente eu não conseguiria nenhum lanche grátis.

- Se fizer cara de doente, aposto que consegue. - Depois que falei, temi ser grosseira ao tentar tratá-lo com essa intimidade como se ele fosse um amigo, ao invés de um médico que eu mal conhecia.

- Seguirei seu conselho na próxima vez.

O elevador chegou ao seu destino, ele acenou sério ao sair e me lembrou de retornar em sete dias. A porta voltou a fechar, carregando-me para um andar abaixo. Apesar da primeira impressão não tão positiva, eu concordara que Theo era um bom médico e, talvez, até um bom homem. Ele tinha certo charme, assim se ele fosse menos magro e mais sorridente eu o classificaria como um homem bonito.

Só quando voltei para o meu apartamento percebi que não agradeci Claudete por sua ajuda. Com preguiça de regressar, mandei uma mensagem para ela e aproveitei para tirar uma foto da mão contendo um enorme curativo branco, era uma história interessante para contar a Cauã. Ele iria me chamar de desajeitada e riria comigo. Porque mesmo que houvesse sido algo catastrófico ele faria o possível para afastar minhas preocupações.

Por outro lado, minha mãe teria uma crise de angústia quando soubesse, imaginando alguma desgraça iminente. Para não a preocupar em vão, limpei qualquer indício de meu ferimento pela casa, assim poderia salientar ter sido um pequeno corte que não precisou mais do que dois pontinhos, apesar de eu ter contado uns sete. Sua preocupação me angustiava, e eu fazia o possível para amenizar esse tipo de sentimento.

Os acontecimentos da sala 12 me trouxeram à memória alguns aspectos de minhas estadias anteriores e encontrei o foco faltante para finalizar o artigo da revista. Nem tudo havia sido uma desgraça. Sentei na cadeira da escrivaninha à frente do notebook, estralei os dedos e acrescentei: É indispensável o paciente sentir-se acolhido pela equipe médica...

Eu sabia isso por experiência própria, Claudete era especialista em transformar os maus momentos em algo um pouco melhor e foi graças a ela que o hospital deixou de ser para mim um lugar de horror para ser parte de meu lar. A imagem de Dr. Theo entrando na sala 12, como se aquilo fosse uma tortura veio em minha mente, e eu sorri por recordar como ele parecia mais disposto após nos despedirmos. Talvez não apenas os pacientes precisassem ser acolhidos, médicos também tinham suas necessidades de atenção.

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O que será desse encontro de Theo e Laís? Deixem seus palpites. :D


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