Capítulo 19
— Me esperem! — Gritei.
Havíamos chegado à praia. Mia com os cabelos pingando, tremendo de frio e com um olhar desamparado. Serena estava plena, mesmo depois de se transformar em humana. Enquanto eu me debatia na areia, sentindo dor e tentando sair da água da maneira menos desajeitada possível, a loira já estava em pé. Graciosa, ela me lançou um olhar desentendido e franziu as sobrancelhas.
— Quando é que isso para de doer? — Perguntei arquejando.
— Você se acostuma. — Respondeu.
Se vocês acham que depois disso ela me ajudou, estão muito enganados, virou-se para o mar e começou a gritar injúrias em um idioma que eu não entendia. Entreolhei-me com Mia e ela ainda carregava um olhar pesado, mas agora confuso também. Minhas pernas voltaram ao seu devido lugar e eu respirei aliviada. O vestido que haviam me arranjado estava inteiro, mas colado no meu corpo e causando arrepios. Serena tomou um objeto redondo e dourado na mão e o observou.
— Sem nave, sem bateria, sem bússola. — Ela trincou os dentes e jogou a bola na areia com força, ainda murmurando coisas sem sentido.
Eu me aproximei de Mia abraçando os ombros e tremendo de frio. Permanecemos juntas tentando entender no que tínhamos nos metido. Serena andava de um lado ao outro murmurando coisas com uma expressão enlouquecida que dava a entender que tentaria arrancar os cabelos a qualquer momento.
Eu não havia parado para analisa-la direito da outra vez, mas agora eu tinha alguns segundos de sobra. Ela não usava mais as roupas de serviçal e os cabelos longos estavam soltos. Era difícil descrever seu traje, já que eu nunca havia visto nada parecido. A parte de cima tinha mangas curtas e um decote V, o formato lembrava um corpete, mas só marcava metade da cintura. Dali em diante, a parte inferior que envolvia sua pele, era uma calça do mesmo tom que a sua calda. Nada fazia muito sentido, pois eu não me lembrava de tê-la visto se vestindo.
— Sem comunicação, sem recursos, sem reforços! — Continuou dizendo e levando dois dedos na testa. — Droga, droga, droga! Sem longas previsões!
Serena estava tão vermelha que parecia que ia explodir de tanta aflição, mas ela respirou fundo e virou-se para nós, nos analisando, ou melhor, analisando nossos futuros, como eu bem sabia que ela podia fazer. Não consegui ler o que ela havia visto, Serena também tinha uma mente trancada, mas soube pela expressão que seu rosto fez que ela estava assustada.
— Calipso está aqui?! — Ela exclamou. — Calipso está aqui... — Disse com um suspiro.
— Ela é sempre assim? — Mia perguntou para mim aos sussurros.
— O que? Maluca? — Serena pegou a bola dourada e começou a caminhar ao léu. — Pelas minhas experiências, sim. Ei! Aonde você vai?!
Nós nos apressamos em segui-la. Para a nossa sorte, a praia que nos localizávamos era deserta, ornamentada só pelo mar e pela mata que se estendia a nossa frente. Estou começando a achar que Serena tem a péssima mania de andar sem rumo.
— Aonde você está indo? — Gritei. — Será que você pode me responder pelo menos uma vez sem que eu tenha que berrar?!
— Vou fazer uma fogueira. — Disse por fim. — Antes que vocês morram de frio.
Sem que esperássemos, alguns galhos começaram a flutuar ao redor do seu corpo e pousaram na sua frente, antes dela se sentar em uma pedra. Serena remexeu a mão e um quadrado dourado surgiu na sua palma. Com um estralar entre o dedão e o dispositivo, uma chama singela apareceu e ela jogou o novo objeto na pilha de madeira.
Eu e Mia encaramos de boca aberta os gravetos queimarem e espalharem fumaça.
— Vocês vão ficar aí tremendo ou vão se aquecer? — Serena perguntou.
Eu fui a primeira a me encaminhar para ficar do lado dela, Mia passou alguns segundos nos fitando temerosa, mas se aproximou, ansiosa pelo calor. Estranhei seu silêncio, se Zachary estivesse ali, estaríamos nos atropelando para fazer perguntas. Contudo, Mia era só lábios franzidos e olhares fixos no fogo. Talvez estivesse pensando na quase morte.
Eu mordisquei a boca e torci as mãos procurando formas de colocar para fora todo o interrogatório que a minha mente tinha criado.
— Uma órfã suicida e uma órfã atlante. Estamos indo muito bem, a missão está sendo um sucesso, parabéns Serena! — Disse enfiando as mãos no rosto.
A última vez que eu a tinha visto, a loira era só orgulho e bravura, era estranho vê-la desesperada daquela forma.
— Talvez, porque da última vez eu tivesse tudo sob controle. — Respondeu, me fazendo semicerrar os olhos.
— Está lendo os meus pensamentos?!
— Assim como você tem tentado ler os meus desde que pisamos em terra.
— Se você me explicasse tudo que está acontecendo, talvez eu não precisasse ficar tentando.
— Explicar o que? Que vocês são sereias assim como Kassandra e Calipso? — Mia soltou ácida. — E que a loira magrela está morrendo de medo das outras duas?
— Você já sabia? — Questionei. — É claro que sabia! Foi você quem disse para eu não mostrar que era forte!
— Eu sei coisas demais. — Continuou, apática. E eu quase não sei de nada. Pensei e preferi não comentar para não passar vergonha.
— Por onde você esteve todo esse tempo?
— Procurando por você, não é óbvio?
— Eu pensei que você pudesse prever o futuro e soubesse para onde estava enviando a mim e a Zack!
— Não é bem assim que funciona! Eu não sou uma vidente tão incrível a ponto de ver meses à frente! Só posso prever um dia ou no máximo dois com muito esforço.
— Quer dizer que você nos enviou ao mar aberto, sem ter noção alguma de para onde estávamos indo?!
— Quando você coloca nesses termos parece até problemático...
— Ah sério?! — Levantei-me impaciente, pronta para começar a estapeá-la. — Eu não acredito que confiei em você! Uma completa estranha! Meu Deus, onde é que eu estava com a cabeça?!
— Eu salvei a vida de vocês! — Serena gritou em resposta.
— Salvou?! Você piorou a situação inteira! Nós fomos sequestrados por piratas, quase morremos um trilhão de vezes, isso se eu for otimista! Agora Zachary está nas mãos daquela capitã louca e eu não faço a mínima ideia de onde ou como ele está! — Meus olhos marejaram e eu não conseguia conter minha raiva.
— Não é como se eu tivesse planejado tudo! Aquela era a única maneira de mantê-los vivos! COMO EU PODERIA IMAGINAR QUE VOCÊ CAIRIA NAS MÃOS DA HERDEIRA RENEGADA DE ATLÂNTIDA?!
— O que? — Eu e Mia exclamamos em conjunto.
— Pois é! Qual a possibilidade de isso acontecer em uma vida inteira?! A rainha Eudora a tem procurado por anos e você simplesmente vem parar no covil dela! — Suas sobrancelhas estavam franzidas e ela apertou os lábios chateada. — Uma missão simples, ela disse, só esqueceu de dizer que você é um ímã pra problemas! — Resmungou.
— Atlântida. — Mia saboreou a palavra na boca.
— Eu pensei que era só uma lenda. — Murmurei.
— Sereias supostamente também são. Eu pareço uma lenda pra você? Sua cauda parecia um mito?! — Serena questionou.
— Mas o que é Atlântida? — Mia soltou, atraindo a atenção de uma Serena incrédula.
— Não me diga que... — Ela começou e revirou os olhos depois de notar que Mia de fato não fazia a mínima ideia do que estávamos falando. — Ah pelo amor dos deuses!
E então tudo ficou escuro. A fogueira havia sumido e não estávamos mais na praia. Meu instinto foi o de reprimir o grito que se formou na minha garganta e procurar por alguém para confirmar que eu não estava sozinha. Eu me debati por alguns segundo até perceber que meu corpo não estava apoiado em nada, e sim flutuando pela escuridão.
Antes que eu começasse a ter um surto, uma fina poeira dourada começou a dançar ao meu redor, iluminando a mim e as outras duas que estavam me acompanhando naquela experiência estranha. Mia observava o bruxulear brilhante com fascinação e Serena analisava nossas reações.
— Onde estamos agora? Você nos telecoisou? — Serena cerrou os olhos num misto de deboche e decepção.
— A palavra certa é teletransporte, Ellie, e não, ainda estamos na praia na frente da fogueira.
— Então... que lugar é esse? — Questionei.
— Estamos onde tudo começou, o princípio do mundo.
— Como isso é possível? — Mia perguntou rodopiando e sorrindo para as partículas em movimento.
— É tudo uma visão, estamos dentro da minha mente. Visto que vocês não sabem quase nada do mundo e que são lerdas o suficiente para não entender 80% das coisas que falo, decidi mostra-las.
— Ei! — Protestei. — Nós não somos burras se é isso que está tentando dizer.
— Shh! — Ela interrompeu, colocando o indicador na minha boca. — Fique 2 segundos quietinha, certo? Você me pediu para explicar e eu vou, mas pra isso tem que parar de agir como uma criança birrenta a cada 10 palavras que profere. — Ela respirou fundo e deixou os olhos vagarem pelo vazio. — Esqueçam tudo que vocês acham que conhecem. Família, amigos, crenças. Esse é o momento em que vocês vão compreender que nada faz muito sentido.
Os grãos de poeira ao nosso redor começaram a se encontrar e grudar uns nos outros, formando bolas e mais bolas douradas. O processo se iniciou lento e passou a ser mais rápido, de maneira que as bolas passaram a se juntar e se tornar cada vez maiores e mais quentes.
Nós nos afastamos e por mais que eu soubesse que aquilo não fosse real, o brilho que se formou quando as últimas duas circunferências se encontraram, quase me deixou cega.
— Abram os olhos! Não percam esse instante! — Serena gritou.
A esfera era muitos metros maior do que nós e talvez metros fosse uma unidade de medida insuficiente para dizer o quão grande aquela coisa era. Ela alcançou seu tamanho máximo quando um último grão se conectou à sua massa e então explodiu. O que veio a seguir ia além da minha imaginação.
Estrelas, cometas, astros, planetas e tantas outras coisas inimagináveis começaram a surgir e rodopiar ao nosso redor. Queimando e explodindo sem parar, enchendo nossos olhos de cores e tirando os nossos fôlegos.
— O que é isso, Serena? — Perguntei sorrindo.
— Isso foi a criação do mundo, há bilhões e bilhões de anos atrás.
— E você estava lá pra ver?! — Mia questionou.
— Não. — Ela gargalhou.
— Pensei que estivéssemos vendo uma de suas memórias. — Comentei.
— Primeira lição pequena sereia: nossa mente é livre, podemos criar o que quisermos. A imagem que quisermos. Infelizmente os humanos ainda não aprenderam a compartilhá-las com exímio uns com os outros, os atlantes sim. O que estou mostrando a vocês é só uma simulação dos estudos em Atlântida, não foi nem mesmo criada por mim. — Eu assenti, admirada com tudo que ela dizia. — Vamos avançar um pouco no tempo.
A explosões começaram a acontecer mais rápido e nós nos movimentamos em uma velocidade inumana. Ao nosso redor tudo era um borrão até pararmos no meio do caminho e ela apontar para uma nuvem cheia de luzes.
— Aquela é a nossa galáxia.
— Via Láctea? — Perguntei em busca de confirmação, eu me lembrava de alguma menção àquilo nas aulas do sr. Lackwood.
— Sim.
— Como é enorme! — Mia exclamou.
— Pois é! — Serena confirmou rindo. — E ela nem é uma das maiores. Vamos avançar um pouco mais.
Ela estralou os dedos e tudo se tornou um borrão novamente, até nos depararmos com vários pontinhos rodopiando ao redor de uma esfera amarela.
— Esse é o nosso sistema solar. Rodando e rodando sem parar, não sei como não fica tonto. É muito jovem se compararmos com todo o resto.
— E pequeno também. — Mia comentou. Analisei seu rosto, procurando indícios de surpresa, mas ela parecia estar entendendo tudo melhor que eu. Não faço a mínima ideia de como ela sabia tanto, aqueles assuntos não eram o tipo de coisa que garotas da nossa idade aprendiam.
— Você acha? Espere só até ver o nosso planeta!
Procurei a terceira esfera mais próxima do sol e torci o nariz.
— Não seria aquela bolinha azul, seria? — Questionei, fazendo Serena rir.
— Alguém não faltou as aulas de astronomia.
— Era uma das mais interessantes... — Sussurrei antes de nos movimentarmos de novo.
Paramos mais uma vez, mas agora estávamos mais próximos da esfera azulada e ela parecia enorme de perto, com suas nuances de terras, nuvens e água. Eu precisava admitir que era uma visão belíssima.
Por mais que eu estivesse vislumbrada com todas as coisas que Serena nos mostrava, eu não conseguia conectar aquelas imagens com aquilo que eu deveria saber. O que toda aquela questão de criação de universo tinha a ver com Atlântida?
— Tem tudo a ver. — Serena respondeu.
— Será que você pode parar de ficar lendo a minha mente? — Reclamei.
— Perdão, é um hábito difícil de largar. Debaixo d'água é muito mais fácil ler os pensamentos uns dos outros do que ficar falando o tempo todo.
— É, mas estamos em terra firme. Aqui, ficar vigiando o que o outro pensa é mal-educado. — Comentei chateada.
Mia nos encarou sem nos entender e aguardando por uma explicação que não viria. O raciocínio de Serena funcionava rápido demais, deixando lacunas que eram difíceis de acompanhar.
— Oricalco.
— O que? — Mia e eu perguntamos ao mesmo tempo.
— Oricalco é a resposta de tudo. É o que conecta o universo a Atlântida. É o que a torna tão poderosa.
Tenho certeza que nossas expressões eram caretas de garotas desentendidas, porque pela segunda vez na noite, Serena revirou os olhos impaciente. Não é minha culpa se ela é doida! Pensei.
— Dê-me o bracelete, Elizabeth. — Ela pediu.
Eu pensei em questionar, mas lembrei-me que o acessório era dela no fim das contas. Abri o fecho e a entreguei o fio dourado, sentindo falta logo em seguida do calor ao redor do pulso. Serena fechou a palma da mão no bracelete e o pulverizou.
— Ei! — Reclamei em protesto.
— Observem. — Ela ordenou nos mostrando sua mão suja dos restos da pulseira. — O que isso parece para vocês?
Eu franzi as sobrancelhas chateada, mas me deixei seguir as instruções da sereia. Analisei o pó reluzente que o bracelete que eu guardara havia se tornado e me vi reconhecendo a poeira dourada que Serena nos mostrava.
— Não pode ser. — Sussurrei.
— É a mesma poeira que... — Mia não conseguiu terminar.
— Que criou o mundo. — Serena explicou por ela. — Oricalco foi a primeira partícula a existir, não se sabe o que veio antes ou o que as colocou lá, mas sabemos que foram essas partículas douradas que geraram a faísca para a criação do nosso universo.
O cenário mudou novamente, nos mostrando vários habitats do nosso planeta. Selvas, mares, rios e desertos. Animais de todos os tipos, pessoas de todos os tipos. Tudo passava com rapidez, mas não sem nos impactar.
— Tudo o que conhecemos, tudo o que vimos e somos, é fruto do Oricalco. Essa poeira, como vocês chamam, é a origem de tudo. Em algum momento, quando ainda nem existia tempo, ela se acumulou, explodiu e se espalhou nos dando vida. Todo nós carregamos uma pequena porcentagem de Oricalco, assim como o resto do universo. Somos feitos de poeira cósmica.
As imagens pararam e agora estávamos no meio de uma rua movimentada. Meu estômago ainda rodopiava, quando percebi que não estávamos em qualquer cidade. Os trajes eram diferentes, as pessoas usavam túnicas leves e sandálias de couro. Os cabelos das mulheres eram trançados com flores e adornados com tiaras douradas, carroças passavam a mil ao nosso redor e os prédios eram construções de mármore em modelos clássicos.
— Essa é Atlântida? — Mia perguntou e ganhou um aceno de cabeça em confirmação.
Serena nos fez flutuar e nós sobrevoamos a cidade rumo às florestas que serpenteavam a montanha central do país. Em meio as árvores, nós descemos e acompanhamos um grupo de homens adentrando uma caverna. Pelas roupas, era notável que eram algum tipo de exploradores.
— Nossos ancestrais, Elizabeth, pertenciam a uma nação jovem e próspera, posso dizer que éramos relativamente normais, como qualquer outro país. Por acidente, nós encontramos no centro da ilha uma quantidade inesgotável de Oricalco.
Dentro da gruta, os homens acenderam tochas e iluminaram as pedras. Tanto eles como nós, nos vislumbramos com as pedras douradas. A caverna se mostrava profunda, com quilômetros e quilômetros de extensão.
A visão mudou novamente. Serena nos levou para um ponto alto da cidade e deslizou a mão pelo ar. Notei que ela havia acelerado o tempo, pois tudo começou a mudar rapidamente. As carroças foram substituídas por transportes voadores, as casas e os prédios não tinham mais um modelo antigo e passaram a ter designs que eu nunca havia visto antes, com vidros e Oricalco em todas as paredes.
As pessoas passeavam pelas ruas adornadas com acessórios e roupas douradas, as ruas não eram mais de terra e sim de Oricalco. Quando o tempo voltou a correr normalmente por ordem de Serena, assisti boquiaberta o império avançado que Atlântida havia se tornado. Eu faço parte disso também. Pensei.
— Não sabíamos o poder do minério que havíamos encontrado até começarmos a usá-lo constantemente. O Oricalco era volátil, podia se tornar em qualquer coisa. Roupas, armas, acessórios... o que quiséssemos. Mal notamos que com o passar do tempo estávamos mais inteligentes, mais fortes, mais poderosos.
Serena então nos levou para dentro de um palácio. Estávamos em uma sala de estudos, repleta de frascos, vapores e equipamentos dourados que eu não sabia distinguir para que serviam. Um homem andava de um lado ao outro, verificando as telas coloridas e os líquidos amarelos aquecidos. Uma máquina de metal ocupava mais da metade do recinto e frequentemente, uma pessoa verificava alguns ajustes nela.
— Aquele é Atlas. — Ela apontou para o rapaz impaciente de cabelos castanhos. — Era o rei vigente da época. Dentre todos, era o mais inteligente e curioso quanto aos componentes do Oricalco. Suas descobertas sobre o metal fizeram com que entendêssemos com o que estávamos lidando e suas pesquisas ainda servem de base para as nossas teses. Atlas era um gênio e transcendeu qualquer reinado, levando Atlântida a ser uma potência econômica e bélica. Ele passou a descobrir os efeitos do Oricalco nos nossos corpos e ele sabia que as outras nações iriam tentar nos roubar. O jovem rei começou a procurar maneiras de nos proteger e descobriu que toda a ilha de Atlântida era feita de Oricalco. Ele criou então uma máquina interligada ao centro do continente, para extrair o máximo possível do metal e gerar uma nova fonte de energia, capaz de desenvolver armas e escudos protetores ao redor de Atlântida. Foi durante um dos testes que uma tragédia aconteceu.
O que quer estivesse sendo feito dentro da máquina, começou a dar errado e fumegar. Um dos círculos da parafernália, tremeluziu e abriu um portal puxando alguns dos assistentes de Atlas que desapareceram logo depois. O rei virou-se, tentando concertar o que quer que estivesse destruindo o experimento, mas uma luz dourada começou a jorrar de dentro do portal e uma explosão retumbou as estruturas do palácio.
Involuntariamente, Mia tampou o rosto, mesmo sabendo que aquelas imagens não eram reais. Eu fiquei vidrada, não consegui desviar os olhos por um minuto. A luz transcendeu e subiu com uma coluna até o céu, se expandindo, logo em seguida como uma esfera que tomou conta de toda a cidade.
A visão do alto do palácio nos privilegiou para assistir o momento em que terremotos tomaram Atlântida. As ondas do mar cresceram, devastando os vilarejos e as cidades periféricas. Mesmo a força do oceano sendo volumosa, as águas bateram na esfera que havia se materializado e não invadiram a parte da capital que estava protegida.
Em poucos minutos, o continente que havia nos deixado encantadas, afundou dentro da esfera de Oricalco.
A visão terminou e nós voltamos a encarar a fogueira na praia deserta de Tortuga. Minha respiração estava entrecortada, porque eu finalmente havia reconhecido as imagens dos meus pesadelos. Todo aquele tempo, era com Atlântida afundando que eu tinha sonhado.
— Atlântida afundou. Morreu para o mundo e renasceu para si mesma. Aqueles que foram engolidos pelo mar não sobreviveram, mas todos os que permaneceram dentro da esfera, tiveram contato direto com a água e o Oricalco. Algo aconteceu, uma experiência que nem o próprio Atlas havia previsto. Os corpos dos Atlantes passaram por um processo profundo de transformação, evoluíram milhões de anos em minutos. O Oricalco permitiu que eles tivessem uma segunda chance e os adaptou para a vida marinha. As barreiras permanecem protegendo Atlântida das águas congelantes do oceano e uma esfera dourada agora brilha no alto do reino, esquentando e produzindo energia, como um sol particular. Ninguém mais tentou roubar nossos conhecimentos e assim têm se seguido nos últimos milhares de anos. — O tom de voz de Serena passou a ser mais profundo. — Ou pelo menos assim tinha sido. Ílios está perdendo força. A esfera de Oricalco que manteve a Atlântida ativa por anos está enfraquecendo. Nós estudamos e fizemos experimentos de todos os tipos, mas nada têm funcionado. — Ela parou e ficou me encarando.
Toda a história de Atlântida ainda estava se assentando na minha cabeça, quando eu comecei a fazer as conexões do que ela havia dito. Ninguém protegia outra pessoa por nada, não é mesmo? Meu estômago começou a embrulhar e eu engoli em seco nervosa.
— Eu não sei como você se perdeu do nosso povo ou como a rainha Eudora sabia da sua existência, mas a quantidade de Oricalco no seu sangue, mesmo sem nunca ter tido contato com Atlântida, é inegável.
— Por que você quer me mandar de volta para Atlântida? — Perguntei como uma idiota. — Por que depois de todo esse tempo?
— Atlântida está morrendo e você pode ser a nossa única salvação.
3592 palavras
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