Capítulo 3: Os Caça Lendas
Assim que o sinal toca, dou graças a Deus por finalmente acabar a aula. Me despedi de Rodrigo e Xaiane e peguei minha bicicleta, logo pedalando para casa.
Estava bastante calor, pois passava de meio-dia e o sol estava infernal. Tentei seguir por um caminho mais longo, pois pelo menos havia uma ciclovia que passava por bastantes árvores e amenizava o calor. Aperto o freio bruscamente ao parar em um poste, perto de um parquinho infantil onde algumas crianças brincavam.
— Enzo, 10 anos. Desaparecido desde a noite de segunda-feira. Visto pela última vez no parquinho infantil da rua oito. — Leio o placar em voz alta e dou uma olhada ao redor.
Algo me dizia que o desaparecimento da menina e deste garoto não era coincidência. Tudo na mesma semana, no mesmo lugar. Claro, Rodrigo e Xaiane poderiam estar certos, podia ser um simples caso de sequestro e não de Homem do Saco ou Slenderman. O Histórias Para Boi Dormir havia mexido um poucos com meu psicológico, e talvez eu só estivesse paranóica por causa do medo.
Volto a pedalar até em casa, encontrando minha mãe e Cecilia preparando o almoço. Tomo um banho refrescante e coloco um short jeans e uma blusa verde de alça, e logo vou ajudá-las na cozinha.
— Como foi o primeiro dia de aula? Gostou do Colégio Jesus Amado? — Minha mãe perguntou.
— Foi legal. Encontrei dois colegas que conheci ontem em uma locadora aqui perto. — Respondo, começando a cortar as batatas. — Lá é bem bonito, grande. Ah, fui acertada no rosto por uma bola de handebol, mas estou bem.
— Handebol? Que legal. — Cecília diz, enquanto mexia nas panelas no fogão. — Por que você não participa de alguma coisa também?
— Nada me interessa, para falar a verdade. — Admiro, pois sempre preferi não me pressionar muito para me encaixar em um grupo.
Não sou tão inteligente para ser do grupo dos nerds, sedentária demais para o grupo dos atletas, sem talento para o grupo de música e artes, sem carisma para o grupo de teatro. Talvez eu devesse ficar no grupo dos excluídos com o Rodrigo e a Xaiane.
Assim que terminamos o almoço, almocei e fui tirar um cochilo no meu quarto. Wandinha estava na minha cama, e quando deitei, ela se aconchegou ao meu lado e dormiu também.
• • •
Acordo sem saber que dia é, que horas são, quem eu sou. Sinto minha garganta extremamente seca e com meu rosto todo babado. Já estava de manhã de novo?
Pego o celular e vejo que são seis da noite e já havia anoitecido. Meu celular estava com a bateria fraca e extremamente quente, então o coloco na tomada e o deixo carregando, enquanto vou até a cozinha e bebo quase um litro de água de uma vez.
Vejo Shakira se aproximar, pulando em cima de mim, e só então lembro que preciso levá-la para passear. Vou até o banheiro e tomo um banho rápido para tirar a inhaca do corpo, e logo coloco uma calça jeans e uma blusa amarela franzida de manga tomara que caia. Prendo meu cabelo em um coque, tal qual as S/N do Wattpad, e monto rapidamente um pão com mortadela antes de sair com a Shakira na rua.
Ela anda na frente como de costume, e dessa vez fomos em um caminho diferente. Era basicamente o trajeto que eu fazia para ir até a escola, e consequentemente passamos pelo parquinho onde havia o cartaz de desaparecimento do garoto.
Me sento em um banco, enquanto vejo algumas crianças brincando na gangorra e no escorregador. Seus responsáveis estavam sentados em bancos como o que eu estava, porém, eles estavam focados apenas no celular. Vejo a Shakira começar a latir para a direção da entrada de um curto matagal que nos cercava, e então olho na direção. Vejo uma leve movimentação entre as árvores, e sinto meu coração começar a disparar só de imaginar serem os esquisitos de olhos vermelhos novamente.
— Para, Shakira! — Tento puxar sua coleira, enquanto ela tentava me arrastar para onde latia.
Uma silhueta estranha sai da espreita da floresta e se aproxima do parquinho. Ele usava um capuz velho, rasgado e sujo, e carregava um enorme saco de pano nas suas costas. Parecia mais um simples mendigo, mas eu pude sentir a irritação de Shakira ao latir na direção do homem.
Havia apenas duas possibilidades no momento: O universo estava fazendo uma pegadinha comigo para me fazer acreditar em lenda urbana, ou aquele realmente era o Homem do Saco. Eu assisti todas as lendas urbanas do Gugu no YouTube, então sabia bem cada uma.
— Ei! — Dou um grito, chamando a atenção de duas mães e um pai na pracinha. — Cuidem dos filhos de vocês! Não estão sabendo que duas crianças desapareceram aqui em menos de uma semana?
— Ai meu Deus, cadê a Valentina? — Uma das mulheres olha ao redor, e só então me dou conta de que estava faltando uma criança e que aquele homem não estava mais ali.
— O homem do saco que levou ela! — Um menino diz desesperado, enquanto a outra menina começa a chorar, indo para o colo do pai.
— E você não viu nada?! — A mãe pergunta indignada para mim.
— Eu pari sua filha por acaso? — Pergunto, fazendo-a me olhar perplexa.
— Mas ela estava aqui agora há pouco! — A outra mulher intervém, se aproximando de nós. — Precisamos ir para a polícia agora! Ela pode ainda estar perto.
— A não ser que ele tenha desaparecido. — Sussurro comigo mesma, vendo Shakira parar de latir.
O homem caminha alguns metros até chegar a uma cabine policial que havia não tão longe dali. Enquanto ele buscava por ajuda, eu e a outra mulher ajudamos a mãe a procurar a menina ao redor, mas não havia sinal de nada. Logo, o homem se aproxima com dois policiais.
— Moço, ela estava aqui em um instante e no outro desapareceu! Olhamos tudo mas ela não está perto! — A mulher diz desesperada, e a outra mulher a acode antes dela desmaiar. — Minha filha!
— O homem do saco levou ela! A gente viu enquanto estávamos brincando! — O menino insiste mais uma vez, e o policial se aproxima dele.
— Você viu um homem aqui? Viu ele levar sua amiga?
— Vimos! Não foi, Vitória? — O garoto pergunta, olhando para a menina ao seu lado, que concorda com a cabeça.
— Realmente tinha um homem, parecia um morador de rua. Eu não cheguei a vê-lo levar a garota, mas logo depois os dois desapareceram. — Falo ao policial, que rapidamente volta sua atenção para mim.
— Tem a descrição desse homem?
— Ele devia ter um metro e setenta, não consegui ver seu rosto porque ele usava um capuz todo capenga. Ele também estava com uma bolsa de pano grande pendurada nas costas. — Explico, e os dois policiais se olham.
— Já é a segunda vez que descrevem este homem. A mãe da Sarah descreveu bem semelhante na tarde em que a garota desapareceu, mas também relata não tê-la visto ser levada por ele. — Um dos policiais diz, e o segundo o olha confuso.
— Se for o mesmo homem, isso quer dizer que ele esteve em duas cenas de crime recentes, o que o torna o principal suspeito. — O outro completa. — Precisamos que a senhora nos acompanhe até a delegacia para fazer o boletim de desaparecimento da sua filha.
Então, os policiais acompanham a mulher desolada até a cabine de policial, onde havia uma viatura. Eles adentram a viatura e logo somem de vista.
— Cuidem dos filhos de vocês. Já tem crianças desaparecidas demais. — Digo para o homem a mulher, pouco antes de dar às costas e voltar para casa com a Shakira.
Quando entro em casa, coloco ração para ela e para Wandinha. Saio para a varanda, pego minha bicicleta e rapidamente pedalo para a locadora Geek Store, onde provavelmente Rodrigo e Xaiane estavam. No momento, eles eram as únicas pessoas que eu achava poder chamar de amigos, então seria com eles que eu falaria.
Prendo a bicicleta no bicicletário que havia na calçada da loja e logo abro a porta bruscamente, assustando os dois. Xaiane estava organizando os gibis de uma das prateleiras, enquanto Rodrigo varria o chão.
— Eu acho que a lenda do homem do saco é real. — Afirmo de uma vez, fazendo eles se olharem confusos.
— O que aconteceu? — Rodrigo pergunta confuso, largando a vassoura no canto e retirando o avental pendurado no seu pescoço.
— Já é o terceiro caso de desaparecimento de crianças essa semana! Eu estava na pracinha com a Shakira, minha cachorra, e eu vi as crianças brincando. E então um velho de rua esquisito com um uma saco enorme igual de papai noel se aproximou do parquinho, e aí eu cheguei perto dos adultos que estavam sentados para alertar eles mas aí quando olhamos uma menina tinha desaparecido! E as outras crianças confirmaram que foi o homem do saco que levou ela. — Digo, quase sem dar uma pausa, e no final respiro fundo para recuperar o fôlego.
— Acho que é a primeira vez que acontece algo assim em Três Luas. — Xaiane diz, sem esboçar nenhuma reação.
— A gente tem que fazer alguma coisa! — Afirmo, quase entrando em desespero.
— Por que acha que deveríamos fazer algo? — Rodrigo questiona. — Acho que esse é um assunto mais delicado para o podcast.
— Que se dane o podcast de vocês! Estamos falando de um caso real, não essas invenções e histórias para boi dormir que vocês contam. Talvez estejamos lidando com um caso real de lenda urbana, e se formos os únicos que perceberam isso até agora, nós devemos investigar! — Digo com convicção, quase como um discurso político, e pela primeira vez vejo um sorriso no rosto da Xaiane.
— Eu gostei dela. — Ela diz para Rodrigo, que a encara incrédulo.
— Olha, tudo bem. — Rodrigo suspira, se dando por vencido. — Vamos investigar. Acho que tenho algumas coisas no depósito que podem nos ajudar...
— Ele sempre foi fascinado por histórias de terror. — Xaiane explica brevemente.
Rodrigo vai até os fundos da loja, e logo volta com uma caixa de papelão fechada com uma fita durex. Ela pega um estilete e corta a fita, abrindo a carta e colocando alguns dispositivos e objetos em cima do balcão. Havia comunicadores de rádio, uma lanterna de luz infravermelha, um termômetro ambiental, um gauss master, que servia para detectar ondas eletromagnéticas, uma câmera de visão noturna e uma câmera normal.
— Uma coisa que aprendi com as pesquisas paranormais é que para lenda urbana existir, ela não está presente em corpo sólido, caso contrário não seria denominada lenda. — Rodrigo orienta, indo até uma das prateleiras de livros e puxando um manual de caça-fantasmas. — Então, mesmo que esse homem do saco seja real, se for mesmo uma lenda, será identificado como um ser paranormal. Se for um ser humano, deixamos esse caso para a polícia. Todas de acordo?
— Por mim beleza. — Xaiane concorda imediatamente.
— Eu tenho certeza que ele não é real. Eu... eu senti. — Digo baixo, vendo Rodrigo me encarar confuso. — De qualquer forma, ele desapareceu rápido demais para ser um ser humano.
— Como capturamos o homem do saco? — Xaiane pergunta, cruzando os braços e olhando Rodrigo.
— Também conhecido como papa-figo, o objetivo do homem do saco é carregar crianças desobedientes e devorar seus fígados. O papa-figo é geralmente representado como um homem rico, que sofre de alguma doença e que, acreditando que será curado, rapta crianças para beber seu sangue e devorar seu fígado. — Rodrigo explica, ligando um dos computadores e digitando algo rapidamente. — Aqui não diz bem como capturar o homem do saco, então precisamos encontrar um ponto fraco dele.
— Vamos encontrá-lo, esperar resgatar as crianças com seus fígados inteiros, e então a gente quebra ele no pau! — Digo determinada.
— Então é isso? Viramos caçadores paranormais? — Xaiane pergunta. — Os Caça Lendas! O que acham?
— Eu gostei. Dará um bom núcleo para o podcast. Quem sabe não abriremos um blog também com as gravações que conseguirmos. — Rodrigo diz, começando a gostar da ideia.
E então, Rodrigo e Xaiane apanharam suas coisas e fecharam a loja. Iríamos atrás do homem do saco o mais rápido possível, e de hoje ele não escapa!
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