Capítulo 13
Pude ver a surpresa nos olhos de Rafi ao me ver cair sobre seu corpo, nos transformando em um quebra-cabeças de braços e pernas. Seu calor foi transferido para mim, e com certeza o contrário aconteceu.
— Senti tanta a sua falta! – disse, ainda abraçando-a.
Rafi me afastou cuidadosamente, pareceu me analisar e então seu olhar tornou-se sério.
— O que fez, Rosalho?! Por que não me ouviu? Por que não ficou na minha casa? Ah... – ela negou com a cabeça.
— É como diz o ditado no meu mundo: A curiosidade matou o gato. – ela me olhou sem entender – Ah, esquece. Mas eu queria conhecer este mundo antes de finalmente ir embora.
– E agora...
— Agora está na situação em que se encontra. – completou Flora – O que há nessa bolsa? – indicou a mão livre de Rafi, que eu não havia notado.
— O que é?
Ela puxou à frente e revelou um manto bege.
— Essas cobertas ajudam a mascarar nossos cheiros. – respondeu – Tomem, joguem nos ombros.
Rafi lançou um para Flora, me entregou outro e por fim vestiu o último.
— Se bem que... Você não é deste mundo, então para os outros, não possui cheiro. Será mais fácil esconder apenas duas pessoa. – completou depois.
— Não mais, Bromo os ligou. – Flora falou o mais rapíto que pôde.
Rafi pareceu perder a cor, e então se voltou para mim:
— Rosalho, foi capaz de se apaixonar tão rápido? – Perguntou inquisitiva.
Eu sabia que em algum momento teria de contar à Rafi o que aconteceu ontem naquele quarto, só não pensei que fosse tão... cedo. Ainda não me sentia pronta para tocar neste assunto, não quando ainda sentia sua presença sobre mim, vigiando cada movimento, tomando conta do meu corpo.
Como pude ser tão tola, não, não fui burra, mas alguém deveria ter me contado que não é sábio aceitar uma porção de um homem. Contudo, como eu poderia imaginar que isso era algum tipo de ritual de acasalamento. Falando assim até pareço um animal que está pronto para cruzar no primeiro cio.
Senti vertigem com tais pensamentos. Me inclinei para frente, com os braços enroscados à barriga.
— Rosalho, tudo bem?
— Sinto muito, fui uma tola. – disse de uma vez – Ontem à noite, Rafi. Foi assim que ele criou este tal laço.
Rafi ficou muda. Quando retornei à posição de antes, a peguei olhando para mim com pena.
— Sabe, de primeira eu pensei que este tal "laço", esta "ligação", fosse algo puro e genuíno, mas na verdade, não passa de algo imundo e sombrio, que nos prende à pessoas que desconhecemos. É um gesto egoísta, patético e manipulador. – Disse me recordando do primeiro pensamento sobre os companheiros.
— Eu vou te ajudar a ir embora, Rosalho, não se preocupe. – havia verdade em suas palavras, pude sentir – Vamos, pelo o que Flora me contou, você quer encontrar uma bruxa. Conheço uma, venham.
Dei graças a Deus por ela não querer comentar nada sobre o assunto, pelo menos nessa parte Rafi me conhece completamente.
Caminhamos por mais ou menos duas horas, mata à dentro, até que finalmente nos deparamos com uma pequena cabana, de aparência tão rústica quanto à de Rafi.
A mulher foi na frente, deu dois toques suaves contra a madeira.
Aguardei ansiosamente para que a porta fosse aberta e me revelasse uma bruxa de verdade, mas a mulher que surgiu, não possuía nada de incomum, a não ser a beleza.
Todas as pessoas daqui são bonitas e têm físico perfeito?
Ela possuía pele clara, como se nunca tivesse sido tocada pelo Sol; belos olhos redondos e cor de mel; longos cabelos loiros e um corpo que parecia ter sido criado em uma mesa de cirurgia.
Ela transparecia outro diferencial além da beleza: suas vestes. A mulher que não aparentava mais que vinte e cinco anos, vestia um vestido justo, de tons escuros – algo entre o marrom e o preto –, longo e que demarcava perfeitamente suas curvas, acentuando sua feminilidade.
— Rafi! – exclamou – Quanto tempo! – ela se projetou para frente, mas Rafi cortou qualquer interação, recuando – Urgh, está de mau-humor.
— Não viemos aqui para falar de mim ou de meu humor. – era incrível como Rafi podia mudar de comportamento tão rápido – Precisamos de um favor.
A mulher finalmente pareceu perceber a mim e a Flora, pois seus olhos nos avaliaram de forma incisiva; o que me fez ter calafrios pelo corpo.
A mulher parece ter a mesma habilidade que Rafi, pois no mesmo instante se virou e com a voz fria e regulada, dizendo:
— Entrem, vamos conversar aqui dentro.
Sua forma sumiu, e logo Rafi a seguiu. Encarei Flora, que logo tomou rumo em direção à entrada, a segui.
Não havia muita diferença na estrutura da casa da mulher para a de Rafi, bem, apenas que era menor.
Rafi logo sentou-se em um sofá, a segui e fiquei ao seu lado, enquanto Flora foi para o outro.
Olhei de um lado ao outro, tentando encontrar algo que dissesse que a moradora praticava bruxaria. Nada. Sequer um caldeirão, caveiras ou algo semelhante. Mas sua pequena cabana possui um frescor anormal para a época do ano: folhas frescas.
— Então, o que precisam? – perguntou, parada à nossa frente.
Quando ela chegou ali?
A mulher arqueou a sobrancelha e olhou na minha direção; senti novamente o calafrio de antes, dessa vez, mais forte.
— Precisamos que corte uma ligação.
Ela voltou sua atenção à Rafi, ergueu o rosto em direção ao teto e deixou que uma risada escapasse de seus lábios.
— É uma ótima piada, Rafi. – disse, ao se recompor – Mas você sabe que há muito não faço mais este tipo de serviço. Não destruo mais a vida dos outros.
Não, ela não poderia se negar a me ajudar. Sem ela... estarei condenada a este mundo!
— Senhora! – a chamei em súbito – Por favor, não estará destruindo nenhuma vida, pelo contrário, salvará a minha!
Ela retornou seus belos olhos em minha direção, e ainda me encarando, perguntou:
— E quem seria esta... jovem? – perguntou com tom superior – Você não me parece daqui.
— A companheira de nosso Soberano. – Respondeu Rafi.
A mulher então permitiu toda a atenção para mim. Ela começou a caminhar, dando voltas no sofá e me analisando ainda mais.
— Companheira, é? Hum... Então por que você iria querer quebrar esta ligação? – Cravou os seus olhos em mim como se fossem estacas.
— Por favor... Eu não quero nada com aquela criatura primitiva! Por favor, me ajude a ir embora, a senhora é a única que pode fazer algo! – em momento algum meus olhos desviaram dos seus, seja por querer mostrar minha força ou algo maior.
— Saiba que, quebrar uma ligação não é fácil, garota. Há consequências, como tudo nessa vida. – a mulher farejou o ar à sua frente – E me parece que a de vocês já foi estabelecida. – estremeci – Isso torna as coisas diferentes. Se eu quebrar a ligação, você terá que desaparecer deste mundo, pois se por acaso seus olhares se cruzarem a quilômetros de distância, ela automaticamente voltará e com força total. Saiba que, você vai sentir como parte da alma fosse tomada, desejará morrer por tal dor. Talvez você fique louca, talvez ele fique insana... Então, o que me diz?
Me levantei à sua frente, encarei firmemente seus olhos e então respondi:
— Quando terei de ir embora? – Perguntei decidida.
Ela sorriu, aparentemente satisfeita com a minha resposta.
Não é possível que todos aqui também seja sádicos loucos.
— Sabe, Rafi, que é praticamente impossível um humano ir embora deste mundo. – Entoou como se fosse uma provocação a Rafi.
— Nos ajude a encontrar um modo, e se tornará mais que possível. – Tentei direcionar sua atenção a mim.
Seu peito estufou com a curta risada.
— Gosto do modo como pensa, mas as coisas não são tão fáceis assim. Não posso simplesmente estalar os dedos, falar palavras estranhas e... puff. – Gesticulou exageradamente.
— Nós duas sabemos que pode. – Rafi permanecia da mesma maneira.
— Sim, sabemos... – concordou.
Qual é a dessa mulher? Ela vai me ajudar ou não?
A mulher estalou os dedos e fechou os olhos.
— Durante a caminhada é normal ter desvio, perder coisas. Para ir embora, é preciso encontrar o que foi perdido e só então o caminho será revelado. – Pronunciou calmamente como se fosse uma charada.
Ela os abriu novamente, olhou para mim e então para Rafi.
— E então? – Flora indagou.
— Mas... O que isso quer dizer? – perguntei – Isso não faz o menor sentido...
— De onde essa garota veio mesmo? – Perguntou com desdém.
– É uma charada, Rosa. – esclareceu Flora – Precisamos pensar com calma para resolvê-la.
Não acredito, em vez das coisas serem mais fácil, agora vem essa mulher para complicar tudo.
— Agora faz sentido por que ninguém nunca foi embora. – ponderou Rafi – Apenas você sabe dessa charada, e ela é quase impossível de se resolver.
— São os "quase" presentes em nossas vidas, que nos permitem as brechas para escapar. E você, Rosalho, escapará pela menor de todas. – aproximou seu rosto do meu, me permitindo sentir sua respiração. Seus olhos desceram pelo meu rosto e foram além – Isso vai ser interessante.
— O que eu preciso fazer? – perguntei temerosa.
Ela se afastou e deu de ombros.
— Rosa, apenas você se conhece de verdade. Apenas você possui a resposta certa. – Pronunciou mais um de seus joguinhos.
— E o que isso quer dizer?
— Precisa olhar para si mesma e perceber o que perdeu. – Flora respondeu pela bruxa, fazendo com que minha mente ficasse ainda mais confusa.
A mulher apontou para Flora.
— Sua amiga está certa.
E quanto ao lago? O diário... – Tentei buscar alternativas. E sem perceber falei em voz alta.
— Diário? – Voltou sua atenção para mim com os seus olhos brilhando em curiosidade, como se fosse uma criança que acabara de descobrir um novo brinquedo.
– Sim. – respondeu Rafi. Ela mexeu na mesma bolsa de antes, sacando-o – Este.
A mulher o tomou de suas mãos, abriu e folheou algumas páginas.
— Não posso ler, foi selado com magia. A quem pertence este diário? Alguém conseguiu ler?
— Sim, eu consegui. – Respondi. Ela indicou que eu prosseguisse. – Ele fala sobre o Lago Leifin.
— Isso não é um lago, mas um símbolo do nosso povo. – revelou – E então, a quem pertence?
A mulher olhou para Rafi, e esta devolveu o olhar tão intenso quanto o primeiro. Havia certa tensão no ar, tão palpável, que eu sabia que Flora estava tão desconfortável quanto eu.
— É citado um nome, "Selena". – respondi.
— É minha filha. – revelou Rafi.
Meus olhos se arregalaram em sua direção, não acreditando que ela manteu segredo todo esse tempo.
— Sua filha? Por que não me disse antes? – Mesmo estando surpresa conservei um tom moderado a minha voz.
— Porque ainda é difícil lidar com sua morte, me desculpe, Rosalho. – Transpareceu um pouco de dor e remorso em seus olhos, remorso?
— Morte? Disse que ela tinha ido embora!
— Eu... menti. – Desviou os seus olhos de mim.
— Rafi, tudo bem você não conseguir lidar com a sua morte e até mesmo dizer que ela vive em outro lugar... Mas esconder de mim que ela escreveu este...
Me entristece, imaginávamos que fosse-mos amigas, ou até mesmo... uma família. Conquanto, deveria imaginar, já que sou uma fraca iludida.
— Chega! – ordenou a mulher.
Não senti vontade – ou capacidade – em desobedecer sua ordem.
Ela olhou de mim para Rafi.
— Rosalho, você não deveria acusar Rafi dessas coisas... – abri a boca para me defender, porém ela me interrompeu antes mesmo de a primeira sílaba sair – Eu sei que ainda não fez isso! Mas está pensando. Então, vamos pegar leve.
— A minha filha... Eu sinto tanta falta dela... – seus olhos brilharam por conta das lágrimas, mas elas não desceram.
A bruxa olhou novamente para Rafi. Ela suspirou e retomou a fala:
— Nunca cheguei a descobrir o motivo, mas tudo começou quando Selena foi presa. Ela era uma pessoa tão inteligente, que no dia que receberia sua sentença, fugiu. Lembro-me que na época eu morava na parte montanhosa e estava vagando pela floresta, catando galhos. Ouvi sons vindo mais à frente, e quando cheguei à sua origem, a encontrei em um estado de semi-consciência, falava coisas sem nexo e estava magra, suja. Eu a peguei e levei para a minha casa, cuidei até que estivesse como antes e um dia, a perguntei o motivo de estar naquele estado. Ela me contou meias verdades – olhou para Rafi – como a mãe. Não a pressionei e ela decidiu ficar comigo. Em pouco tempo notei que tinha aptidão para a magia e quando questionei sobre, me contou que era metade bruxa, por causa do pai. Ótima família, Rafi. – disse.
"A adotei como aprendiz e logo se tornou boa com a magia. Ela passou a morar comigo de vez, e em certos dias, saía para visitar a mãe e voltava entre quarenta e oito horas. Um dia, à noite, ela disse que havia esquecido de colher galhos para lenha, e então, resolveu sair para buscar. Notei que estava demorando e então, lancei um feitiço que me guiasse até Selena. Quando a encontrei, segurava com força alguns poucos galhos nos braços, estava de costas para um precipício, na ponta do penhasco, e na sua frente, um grande lobo branco. Quanto mais ele se aproximava, mais ela se afastava e seguia até a ponta. Me lembro que... – uma pausa – Ela parou e olhou na minha direção, o lobo não percebeu, caso o contrário teria me matado. Ela largou os galhos, abriu os braços e se lançou de costas para a morte. O lobo correu no mesmo tempo em que ela pulava, chegou na ponta e uivou na direção da Lua. Ele correu floresta adentro. Corri para o penhasco e desci com outro feitiço. Ela estava com os braços unidos sobre o peito, uma expressão serena no rosto e a pele incrivelmente pálida. Estava morta.
Olhei na direção de Rafi, agora, me sentindo levemente culpada por ter ficado irritada.
— Rafi... – Pronunciei como um sussurro.
— Sabe, ela poderia ter simplesmente desaparecido dali com um feitiço, poderia ter feito... qualquer coisa! – disse, com o olhar distante. – Não acabou. – retomou a bruxa – Quando me aproximei do seu corpo, uma forte luz saiu dele, era quente e... tentadora. Logo depois o clarão se foi, assim como Selena.
— Ela... desapareceu? Depois de morrer? – disse, não acreditando – Isso...
É loucura!
Espero que tenham gostado, até a próxima e não esqueçam de dizer vossa opinião. Tchau, tchau.
Se gostarem recomendem a estória para seus amigos.
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