10 - Vínculo
E lá estávamos...
Os hamburgueres já haviam chegado com as fritas e o milk-shake. A lanchonete não era a mesma do sonho, mas não deixava de ser curioso o fato de eu ter acertado onde encontraria com Pete mais uma vez.
Quando ele foi me buscar, falamos da minha faculdade e de como eu odeio estudar direito durante boa parte do trajeto até a lanchonete. Depois, Pete falou um pouco mais sobre seus irmãos mais novos, sua mãe e a família que ele tem em Nova Iorque e fora do país.
Entramos na lanchonete, fizemos os pedidos, recebemos nossos lanches, começamos a comer e, desde então, um silêncio constrangedor pairou sobre nós.
Eu estava com medo de alguma coisa além da compreensão. Não era igual aqueles medos que eu tinha quando sabia que alguma coisa de ruim ia acontecer. Era diferente. Eu sentia um frio na barriga, arrepios frequentes nos ombros e até dificuldade motora para comer o hamburger.
Era surreal.
"Você gostou de mim, né?" ecoou a frase que Pete tinha dito em meu sonho em minha cabeça.
— O que?! — exclamei por impulso.
— O que foi? — questionou Pete enquanto comia. — Disse alguma coisa?
— Não — murmurei quase engasgando.
— Eu amo hamburger com bacon, sério! — falou Pete antes de voltar a devorar o lanche.
Eu não fazia ideia de como era estranho sentir atração por uma pessoa. Nos sentimos encurralados, nervosos, ansiosos e uma série de outras coisas ao mesmo tempo. É como descer de bicicleta em uma ladeira em alta velocidade, mas intensificando a adrenalina quatro vezes mais.
— Você ficou bem por esses dias? — questionei torcendo para ele não estranhar a pergunta.
— Fiquei sim, e você?
— Sim, mas... — Respirei fundo. — Não aconteceu nada estranho? Nem um assalto ou quase atropelamento?
— Se houvesse, com certeza você estaria lá para me salvar — falou Pete antes de me presentear com aquele sorriso.
Tentei retribuir o sorriso, mas todo aquele negócio de sorrir e ser simpático era novidade para mim. Eu não tinha o costume de sorrir para meus amigos ou para minha família.
Eu não costumava rir nem de piadas, por mais engraçadas que fossem.
— Não esqueça sua promessa, Pete.
— Te atender sempre que você me ligar?
— Sim.
Pete sorriu novamente, mas desta vez de uma forma mais tímida e especial. Eu não fazia ideia se Pete era apenas simpático ou se sentia alguma coisa por mim também.
Tudo aquilo era novidade para mim.
— Quando você ligou esta tarde, eu estava terminando de dar banho no meu irmão caçula. Esqueci o celular em cima da cama, por isso não atendi a primeira chamada.
— Pete, não me entenda mal, mas é importante que você fique atento às minhas ligações — alertei.
— Por quê? — questionou ele finalmente estranhando minha imposição. — Não que eu não queira atender, pois eu quero te atender e conversar com você, mas...
— Só faz o que eu estou te pedindo, por favor — afirmei mais uma vez de forma autoritária.
Pete contraiu os lábios e tentou segurar a risada, mas não se conteve. Ele até tentou disfarçar, beber uns goles do milk-shake e colocar a mão na boca, mas deu para perceber a grande vontade que ele tinha de rir.
— O que foi?
— Nada, Klay.
— No que você está pensando, Pete?
Meu maior medo era de assustá-lo ou confundi-lo. Eu não queria que Pete pensasse coisas erradas a meu respeito, porém...
— Você é bem mandão, sério e misterioso — disse ele voltando a me olhar diretamente. — Além disso, você tem um olhar que intimida, seduz...
— Seduz? — questionei sentindo vontade de enfiar a cabeça dentro dos sacos de lanche.
— É, seduz! — confirmou Pete. — Você deve ter muitas garotas atrás de você, né?
Fiquei boquiaberto, mas não sei definir se foi por surpresa ou decepção.
Talvez os dois.
— Não tenho — resmunguei balançando a cabeça.
— Vai esconder o jogo? — insistiu ele. — Você é todo bonitão, tem esse cabelo liso castanho-claro, olhar penetrante, voz grossa e autoritária.
— Acho você bem mais bonito que eu, Pete — falei sem rodeios. — Você que deve ter muitas garotas por aí.
Pete balançou a cabeça negativamente e franziu o cenho. A expressão dele permanecia indecifrável, pois sempre era divertida, simpática, generosa...
Era possível ver felicidade e vida abundante nos olhos dele.
— Você me acha bonito? — perguntou Pete voltando a me olhar diretamente.
— Acho — falei seriamente.
Pete sorriu e ameaçou falar, mas...
— Desejam mais alguma coisa? — perguntou uma das garçonetes.
— A conta, por favor — disse Pete.
— Tão cedo? — questionou a garçonete piscando um dos olhos para ele e depois para mim.
Permaneci de cara fechada e ergui a sobrancelha esquerda por conta da ousadia dela.
— Sim, por favor — confirmou Pete.
A garçonete saiu em direção ao caixa enquanto Pete terminava de comer suas fritas e beber seu milk-shake. Eu já tinha terminado o hamburger, mas minhas fritas estavam intactas e meu milk-shake ainda estava na metade.
— Já vamos embora? — perguntei decepcionado.
— Você queria ficar mais? Me desculpe, Klay!
— Não, tudo bem! Sem problema...
— Eu tenho horário para voltar, pois minha mãe fará plantão esta noite no hospital e...
— Você tem responsabilidades, eu sei.
Era a primeira vez que vi Pete parecer triste.
— Eu também não quero ir embora — confessou ele enquanto mastigava. — Você é uma excelente companhia e eu ficaria aqui conversando com você por horas e horas.
Não consegui responder.
Forcei um sorriso e balancei a cabeça positivamente.
— Estou pensando em ir à praia de carro no próximo final de semana. Minha mãe vai ter folga do hospital e do restaurante e me deu três dias livres.
— Legal — falei tentando parecer animado.
— Você me acompanharia?
Novamente aquela sensação gelada na barriga.
— Eu não sei, pois tenho a faculdade e...
— Leva os livros e estuda no caminho.
— Também tem meus pais e...
— Você já é maior de idade, não é?
— E eu não quero te incomodar, Pete.
— Eu estou convidando, Klay!
Por que ele era tão irresistível?
Por que eu suspirava e ficava todo tímido quando ele me olhava daquele jeito?
— Eu vou pensar, okay?
— Okay!
— Não prometo nada.
— Tudo bem, Sr. Mandão! — exclamou Pete antes de abrir o sorriso mais lindo e fofo que eu já o vira fazer.
E ele tinha conseguido me fazer rir.
Rir de verdade desta vez.
— Mandão? — questionei.
— Eu quero te dar um apelido que combine com sua personalidade misteriosa, autoritária e com o seu olhar sedutor — disse Pete ainda sorrindo.
— Sem apelidos, Pete — resmunguei.
— É uma ordem? — perguntou ele ainda em tom de brincadeira.
Apesar de querer responder, me limitei a olhá-lo tentando intensificar o jeito que ele dizia ser sedutor. Eu ainda estava sorrindo, pois aquele jeito descontraído e simpático do Pete tinha destravado um pouco de minhas inseguranças e pensamentos negativos.
Estar com ele naquele momento foi um alívio para todas as minhas preocupações.
— Aqui está a conta, rapazes — disse a garçonete.
— Eu pago — me prontifiquei.
— Pode deixar, Klay — disse Pete pegando a carteira. — Eu convidei e...
— É uma ordem — afirmei ainda na brincadeira.
Pete sorriu, guardou a carteira e levantou os braços em forma de rendição. Peguei a comanda, tirei o valor que estava marcado nela do bolso dianteiro da calça e entreguei para a garçonete.
Pete permaneceu me olhando daquele jeito bobo e engraçado.
Apesar de meu encontro com Pete não ter durado tanto quanto eu gostaria, fiquei feliz em saber que ele estava bem, que gostava da minha companhia e queria que voltássemos a nos ver. Eu não tinha certeza sobre a orientação sexual dele, mas mesmo que Pete fosse hétero, eu não abriria mão de uma amizade.
Eu tinha minhas dúvidas em relação aos olhares, o jeito carinhoso e simpático que Pete me tratava e até os elogios que ele fez enquanto comíamos na lanchonete. Não dava para ter certeza das intenções e sentimentos dele, pois eu já tinha conhecido caras heterossexuais que se comportavam de forma parecida, mas que não deixavam de ser heterossexuais. Sem falar que eu mal conhecia o Pete, então...
Era prematuro chegar à uma conclusão.
— Fico feliz em ver que você está melhor, Klay — disse Pete assim que voltamos ao carro. — Naquele dia, eu fiquei muito preocupado, pois você estava muito pálido e fraco.
— Desculpe se te assustei, Pete.
— Não me assustou — falou Pete colocando o cinto de segurança enquanto me olhava daquele mesmo jeitinho especial. — Só fiquei preocupado, pois não foi a primeira vez que eu te vi passando mal.
E eu tinha me esquecido completamente das outras vezes. Pete tinha razão, pois sempre que impedi que algo de ruim acontecesse com ele, eu me senti mal, com dores de cabeça e no corpo, zumbidos agudos no ouvido e fraqueza. Era como se ao tentar impedir o que estava para acontecer, meu corpo e minha mente sofressem.
Quando impedi que ele fosse baleado, senti apenas uma pequena confusão mental. Quando impedi que ele fosse atropelado, senti dores no corpo e na cabeça. Quando apareci naquele posto de gasolina por achar que aquela bomba de gás ia explodir, minha cabeça e meu corpo sofreram tanto que não aguentei e desmaiei antes de conseguir falar com o Pete.
— Eu estou bem agora, Pete.
— Você não está me escondendo nada, né? — questionou ele ainda preocupado. — Eu sei que nos conhecemos a pouco tempo e que você não tem que abrir sua vida pessoal para mim se não quiser, mas não quero que nada de ruim te aconteça.
— Eu estive doente há algumas semanas, mas já estou bem — menti. — Foi apenas uma gripe bem forte que me derrubou, tirou o apetite e me deixou fraco. Sabe como é, né?
— Eu entendo, pois uma de minhas irmãs tem alergia a quase tudo e vive tomando remédios, fazendo inalação — disse ele voltando a sorrir. — Eu sempre cuido para que ela não pegue friagem, não tenha contato com pó ou coisas que ataquem a alergia dela.
E novamente aquela sensação que deixava meu peito aquecido, meu estômago estranho e minha respiração falha. Quanto mais eu conhecia Pete e a vida que ele levava, mais respeito, admiração e carinho por ele eu sentia.
— Você é incrível, Pete — murmurei.
— Não como você, Klay — respondeu ele quase no mesmo tom de voz.
Era difícil resistir ao olhar carinhoso do Pete. Ele me olhava de forma tão direta e sorria de forma tão irresistível que era impossível desviar meu olhar e controlar os sentimentos que insistiam em crescer dentro de mim.
— É melhor irmos embora, não acha? — falei quando comecei a me sentir envergonhado com aquela troca de olhares.
— Tem razão — respondeu Pete chacoalhando a cabeça e girando a chave do carro para liga-lo.
Eu sentia uma certa conexão e carinho crescendo entre Pete e eu...
A menos que minha intuição estivesse errada.
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