A Babá Humana?
Emily Sandiego, 18 anos, solteira, estudante de designer, recém saída de mais um namoro frustrado, ainda morando com os pais, resolveu aceitar o convite de alguns colegas da empresa onde trabalha a menos de dois meses, para uma festa no sábado à noite.
Já passava da meia noite, com inúmeros drinks, quando sentiu súbita indisposição além de pesado sono, resolvendo então se retirar. Educadamente se despediu dos novos amigos, entrou no seu carro e foi voltando para casa.
Avenidas, ruas desertas e uma fina chuva, fizeram pesar ainda mais a sensação de sono, mas o pior ainda estava por vir, virando a direita acabou deixando a cidade sem querer para trás indo parar numa floresta, e do nada uma neblina espessa encobriu o território todo. Emily começou a pensar em parar o carro e dar uma cochilada, para evitar dormir ao volante - a questão era "onde?".
Ao entrar numa longa estrada de terra reta, ela viu um extenso muro de pedras cobertos por flores à sua direita, com um portão quase ao meio. Do lado oposto e bem em frente ao portão, uma estranha ruina, com diversos vagalumes sobrevoando o local.
Lindo realmente, mas um tanto estranho. Por causa da bebida acabou acreditando ter parado em um dos diversos pontos turísticos do vale Venosa.
Logo a esquerda havia uma mansão espetacular.
O que uma mansão estaria fazendo num lugar tão isolado assim? Divagou pensativa, mas logo se lembrou que a cidade estava sendo invadida pelos novos ricos que queriam propriedades para se gabar com os amigos.
" -É aqui." - Disse ela para si mesma.
Parou quase no portão da mansão misteriosa, desligou o carro, trancou sua porta e abriu uma fresta de seu vidro, reclinando o banco para um cochilo.
Mal fechou os olhos e veio-lhe uma vontade aguda de fazer urinar.
" - E agora? Não vou entrar numa ruína à essa hora, para fazer minhas necessidades! Ah, mas o portão da mansão ali está entre-aberto. Acho que ninguém vai ver, eu ir no cantinho do muro do lado de dentro e no escuro, para resolver esse meu problema! - Tomara que não tenha cachorro!!!"
E assim, Emily entrou pelo portão de ferro trabalhado com duas abas (uma entre-aberta), indo logo para trás do muro, se agachando e "resolvendo o seu problema".
Mas o portão bate bruscamente, "se fechando". Ela se levanta e tenta abrir o portão, mas... Por incrível que pareça, está agora trancado! Nisso, ela ouve atrás de si a voz distante de uma menina.
" - Oiiii."
Ela olha pra trás e vê a grande mansão , à uns 40 metros mais ao fundo. Na varanda de entrada, uma fraca luz de dentro iluminava a silhueta de uma menina, que logo passa para dentro. Emily grita na esperança da criança ouvi-la.
" - Ei, espere! Entrei aqui por engano e o portão trancou! Olá?.. Menina..?"
À medida que Emily se aproxima da porta de entrada da mansão, aquela luz tênue vai se ofuscando, até apagar. Ela acreditou que a casa estava às escuras, pelo avançar das horas. Na porta ela gritou novamente que está aberta.
" - Olá, garotinha? Tem alguém aí? Entrei sem querer e estou trancada!"
Sem resposta, ela dá dois passos pra dentro e a porta atrás dela bate, fechando. Tenta abrir e... trancada! Emily liga seu celular e nota que não existe sinal para que ele funcione.
"Sem sinal! Mas que merda! Pensa enquanto volta a olhar em volta".
Completamente no escuro, pois às árvores na entrada do grande pátio, impediam a claridade da lua cheia, ela liga a lanterna do aparelho e procura um interruptor na parede. Encontra, tenta ligar a luz, mas... nada! Então passa a luz da lanterna ao seu redor e surpresa ela vê.
Sala ampla, com móveis cobertos por lençóis empoeirados e embolorados, dando ao ambiente uma cena fantasmagórica de uma mansão abandonada. O que é muito estranho.
Diante dela, um corredor com uma porta aberta, à direita e logo no início. Ela vai até lá, entra e contempla o que seria a cozinha: paredes e pia encardidas por gordura, poeira e bolor, um grande fogão, sem chance de ser utilizado e, pelo chão e no balcão, um caos de utensílios sujos e enferrujados, além de uma grande e antiga geladeira aberta, exibindo um conteúdo indecifrável.
Nesse instante, Emily ouve umas batidas abafadas, semelhante à um martelo sobre madeira, vindas de cima - eram batidas compassadas, marcando os segundos!
Ela sai da cozinha e vê à direita, no corredor ao fundo e do lado esquerdo, outra fraca claridade. Emily se anima e vai até lá, repetindo.
" - Olá, garotinha? Tem alguém aí? Entrei sem querer e estou trancada!"
É uma escada que sobe, de madeira e em dois lances, e a claridade é de uma tênue lâmpada do andar de cima. Sem resposta, ela vai subindo e se depara com um corredor que cruza a escada. A lâmpada se apaga e as batidas, marcando um segundo, ficam mais altas!
Iluminando o lado esquerdo do corredor, o primeiro susto: ao fundo, cinco vultos negros em pé e parados. Um grito de Emily e, atrás dela, no lado oposto do corredor e bem ao fundo, uma porta bate.
Ela vira a lanterna e não vê ninguém. Ao voltar a luz, para onde estariam os vultos... sumiram!
Emily vai até a suposta porta ao fundo que fechou-se e abre: um amplo quarto, tomado por teias de aranha e poeira. As batidas, marcando um segundo continuam, irritantemente sem parar. De repente, ela ouve um gemido de alguma criatura desconhecida, vindo do chão.
Ilumina com a lanterna do celular e vê: um lobo gigantesco, arrastando um homem com o rosto desfigurado. O lobo o havia arrastando pelo chão, seus braços, sujos, ensanguentados e tendo o corpo até a cintura, sem pernas e sem quadril... O lobo o havia devorado - um grito!
Dá um passo prá trás e sente alguém murmurando atrás dela. vira a lanterna e vê outro homem, agora em pé, maltrapilho e sujo, com os olhos tapados por pele desgastada implorando ajuda - outro grito!
Volta para a escada e vê, agora nitidamente, os cinco vultos tornarem-se cinco criaturas deformadas, sujas e esfarrapadas, caminhando lentamente em sua direção.
Em pânico, Emily desce as escadas, encontrando no andar de baixo, dezenas de pessoas semelhantes às outras, aglomerando-se para serem devoradas por vários lobos.
Com total desespero, ela corre para a porta, que agora abre, sai correndo para o portão, que também abre, e entra no seu carro - as batidas param!!!
Mas ao sentar, seus olhos escurecem e ela perde os sentidos... Depois, ela abre lentamente os olhos, por causa da claridade do sol do meio-dia.
" - Que foi aquilo???" -Falando sozinha - "Será que sonhei? Que sensação estranha de ter vivido tudo aquilo!"
Ao arrancar com o carro e passando pelo portão, ela vê uma menina lá dentro, acenando para ela!
" - Eu, hein?! Está decidido: se eu beber de novo, não dirijo e também... não entro mais escondido na casa dos outros!"
Em seguida surgem um casal do lado da criança.
- Lindinha, quantas vezes já lhe avisamos pra não assustar as babás. Sabe como é difícil encontrar boas funcionárias nos dias de hoje. - Diz a mulher olhando o carro partir em disparada.
- E a jovem bruxa nem pegou o pagamento. Informou o marido acariciando seus lobos de estimação.
- Ela não era uma bruxa! Informou a garota sorrindo. -Era uma humana!
- Impossível! Será... Afirmaram os pais assustados. - Humanos não podem atravessar o portal para o nosso mundo.
- Melhor informar esse fato aos anciões, querido Casmir. Disse a mulher assustada. - Humanos são perigosos e carregam diversos vírus estranhos, nossa pobre filhinha poderia ter se machucado.
- Realmente todo cuidado é pouco com essas estranhas criaturas. Comentou o homem.
- Eu a achei divertida, apesar dos gritos. Além disso, ela caiu em todas as minhas ilusões. As bruxas que cuidam de mim são sempre entediantes. Revelou a garotinha entusiasmada.
- Isso é muito interessante. Já que nossa garotinha gostou daquela criatura, por que não a trazemos pra ser o bichinho de estimação de nossa princesinha? Indagou a mulher.
- Sabe que temos leis e regras, querida Carmilla.
- Ninguém precisa ficar sabendo meu amor. Além disso, humanos são considerados pragas mesmo, mais um menos um tanto faz.
- Viva! Gritou lindinha feliz. Isso significa que eu e Kairós, junto da matinha teremos um novo brinquedo?
- Com certeza querida. Mas antes, limpe a bagunça que fizeste. Aqueles vampiros estão manchado o nosso carpete. Avisou a mulher suspirando e saindo junto do marido para o jardim da mansão.
Emily nunca imaginou que uma simples decisão impulsiva transformaria sua noite numa espiral inexplicável de terror.
Encurralada em um mundo que não era o seu, cada sombra e cada som reverberava como um lembrete de que ela havia cruzado uma fronteira invisível.
Talvez tenha sido o próprio cansaço que a guiou até aquele momento surreal, mas como poderiam coincidências e sonambulismos explicar criaturas tão inumanas?
O terror que ela experimentara tinha se misturado a um delírio incompreensível: vultos, lobos, uma menina enigmática... Tudo parecia como um pesadelo irracional, mas os detalhes, os cheiros, as texturas, essas sensações eram vívidas demais para simplesmente serem relegadas à ilusão de uma mente inebriada.
Para aquela família peculiar, no entanto, Emily não era apenas uma vítima de circunstâncias mágicas.
Ela havia atravessado uma barreira que não deveria ter atravessado, infringindo leis que próprios humanos desconheciam.
Aos olhos daquele casal sobrenatural, ela era mais do que uma invasora - uma raridade.
Humanos, afinal, não deveriam conseguir ultrapassar o portal que dividia os dois mundos, mas ela conseguira, o que a tornava um enigma perigoso.
Para eles, seu erro não era apenas digno de punição, era uma oportunidade.
A indiferença com que conversavam sobre seu destino contrastava ferozmente com o terror que ela havia sentido.
Para Emily, era uma fuga desesperada.
Para aquela família, ela era apenas um brinquedo, uma nova distração para sua filha entediada.
Atrás de cada fala cordial, havia uma ameaça silenciosa de controle e dominação.
O destino de Emily, que aos seus olhos parecia encerrar quando ela fugiu do portão, mal havia começado.
Agora, presa na mira de seres superiores e talvez predatórios, sua liberdade seria uma questão de tempo e conveniência.
Afinal, quem a salvaria de um mundo que os humanos sequer sabiam existir?
1712 Palavras
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