Natal, vinhos e rótulos.
Solitariamente em seu Natal abriu a geladeira, apanhou a garrafa de um bom vinho e, enquanto secava as gotículas de água, ao enrolar a garrafa em um pano para que não escorregasse de sua mão enquanto fazia força para sacar a rolha, eis que o rótulo de seu saboroso vinho soltou-se por inteiro, deixando nua a garrafa. Neste momento a sua vida inteira passou diante de si e questionou-se: o que garantia que aquele vinho vinha mesmo de um bom vinhedo? O que garantia que ele era realmente saboroso?
A resposta foi uma só, o paladar, o olfato e claro o momento em que ele era apreciado, mas isso eram coisas que ele só poderia saber depois de provar. Sendo assim, o que o levou a comprar tal vinho?
A indicação de outras pessoas, o que as revistas especializadas falavam, o que os vinhateiros forneciam como parâmetro e o rótulo; é claro.
Pegou uma taça limpa e cristalina, despejou o líquido rubro, fez pequenas circunferências com a taça, cheirou e sorveu um mínimo gole do produto. Deixou que permanecesse em sua boca por um tempo e depois o engoliu. Estava aprovado, era um bom vinho, mas, e se não fosse? Teria apreendido aquele gosto e passado adiante que não era agradável, pelo menos em sua opinião, ou calaria e deixaria que outros descobrissem novos sabores por conta própria e talvez, assim, poderia também ele descobrir através de outro ponto de vista o sabor daquele mesmo vinho?
Pensando nisso ficou a sorver gole após gole e a pensar no Natal. Seria o Natal igual para todas as pessoas? Isso era claro que não, mesmo que todos dissessem que Natal é um momento de reflexão, de reunir a família, de paz, amor, e do nascimento de Jesus. Quantos estariam verdadeiramente refletindo o Natal? Ele sorriu porque sabia que a maioria não pensava nisso e que o Natal agora tinha outro rótulo, o rótulo comercial, o que importava era o presente, a festa, a comida, que acabariam se convertendo em exageros; que gerariam frustrações; estresse; desentendimentos; mortes.
Sim, também havia a alegria; a reconciliação; o encontro de pessoas que estavam distantes de Deus e acabavam por renovar sua fé através desta data. Era impossível responder o que era maioria ao certo.
Ainda olhando a garrafa nua, pensou que as pessoas se apegavam demais aos rótulos e este era o motivo do sofrimento. Se paga caro por um produto pelo o que o rótulo diz, mas nem sempre a qualidade do produto era compatível com a marca. Quantas marcas desconhecidas ou mais simplórias eram melhores que os grandes nomes e mesmo assim não obtinham reconhecimento?
Não pensava mais nas marcas dos produtos, na verdade, acabara de perceber o quanto o ser humano rotula as pessoas ao seu redor: rotulam através da raça, cor da pele, religião, características pessoais, opção sexual e tantas outras coisas, mas, sobretudo, a aparência. O rótulo mais cruel que a sociedade criou; o rótulo da aparência. O que alguém quer dizer com boa aparência numa entrevista de emprego? Quem determina o que é uma boa aparência?
O ser humano estava perdido, pois, ao escolher pelos rótulos estava destinado a sofrer e fazer sofrer a todos. Olha o rótulo, mas se esquece da essência e, muitas vezes, paga caro por não se ater ao que é essencial. Aquilo que a aparência não mostra.
Seu vinho estava no fim, sua solitária noite também e agora tinha certeza de uma coisa; aquele natal que passou consigo mesmo foi o que mais lhe fez aprender algo.
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