Cúmplices de um resgate natalino
Neve caindo.
Presentes sendo embrulhados.
Árvores sendo montadas.
Cheiro de chocolate quente.
Eu sempre amei o natal. Tudo nele faz meu coração se encher de amor e encanto, mas não pelos motivos que talvez você esteja pensando.
Minha família gosta do natal mais do que qualquer outra no mundo.
E isso se dá porque meu avô é nada mais e nada menos que o próprio Papai Noel.
Agora você deve estar pensando "você pode ganhar qualquer presente que desejar". Pois bem, infelizmente, nós não temos tempo para troca de presentes. Assim que a neve começa a cair e o espírito natalino a surgir, nossas noites e dias se tornam dedicadas para a confecção dos presentes e garantir que todos estejam nas casas corretas antes do nascer do sol do dia 25 de dezembro.
E antes que você me pergunte, não, não temos renas voadoras. Aliás, existem coisas sobre ser o Papai Noel que você não sabe.
1- Papai Noel não é branco (esse negócio de achar que tudo é sobre os brancos já está batido).
2- Não moramos no Polo Norte, somos do Canadá mesmo.
3- Meu avô não entrega os presentes em um trenó, apesar de possuir magia, ele usa uma nave (sabe a nave do Pantera Negra? Que fica invisível? Pois bem).
4- O Papai Noel não é imortal, apesar de ser mais forte que os humanos normais, chega uma hora que a vida se esvai dele.
E é isso que está acontecendo com meu avô.
Meu pai é o próximo na linha de sucessão ao reino natalino, contudo, comparando o tempo de vida dos outros Papais Noéis, meu avô teria 20 anos de vida pela frente.
Ô Deus, que grosseria a minha, eu estou contando sobre minha vida e nem me dei conta de me apresentar. Olá, querido leitor, eu me chamo Ane, tenho 11 anos e muita história natalina para contar.
Mas vamos focar em meu avôzinho (que não se chama Papai Noel e sim John)
Faltam 20 dias para o natal e ele não quer sair da cama. Eu vou todos os dias ao seu quarto e tento levar um pouco do espírito natalino. Já montei uma árvore de natal própria para ele, costurei uma meia com seu nome para pendurar em sua lareira, fiz biscoitos (que ficaram horríveis, ainda bem que ele não comeu), já fui o acordar fazendo cócegas em sua barriga e gritando "ho-ho-ho".
Sem resultado.
Meu avô não contou o que aconteceu para reagir assim, só soubemos porque minha avó contou de forma superficial o que realmente rolou (os dois são irritantemente cúmplices nas coisas). O único jeito de descobrir é entrando no escritório dele.
Como vocês devem imaginar, o escritório do Papai Noel não tem entrada livre para todos, apenas meus avôs entram, contudo, quando se fica muito tempo dentro de uma casa tão grande e antiga por conta do inverno, você descobre passagens secretas. No corredor ao lado da sala dele, tem uma saída de ar gigante o bastante para uma menina de 11 anos, ou seja, eu.
Como eu sei disso? Ah caro, leitor, isso é história para outra hora.
Abro a grade e me espreito para dentro. Felizmente, com minha agilidade (e talento) para engatinhar em dutos de ar, eu chego no meu destino rapidamente. Abro a grade e saio para o aconchegante escritório do Papai Noel, onde cartinhas do mundo todo chegam anualmente. Entretanto, noto o primeiro problema logo de cara: a mesa de meu avô nunca fica bagunçada. Bem, uma pessoa que distribui presentes para o planeta todo tem que ser no mínimo organizado.
Observo o amontoado de cartas e franzo a testa. Caminho até a mesa e pego uma delas para ler:
Papai Noel,
Mamãe me disse que posso te pedir qualquer coisa. Posso pedir que traga meu pai de volta em vez de uma bicicleta?
Pedro (8 anos)
Coloco a mão na boca, tocada com este pedido. Pego outra cartinha e me deparo com o mesmo pedido: algum familiar de volta. Acabo lendo todas as que estão espalhadas e percebo então, o motivo de meu avô estar devastado.
Senhor John dedicou sua vida a entregar presentes todos os anos, contudo, neste ano, ele não pode realizar os pedidos. Estamos passando por uma pandemia e mais de um milhão de pessoas faleceram em todo o mundo. Não haveria nada que estas crianças quisessem mais do que seus parentes de volta.
Sinto um aperto no coração pelo sentimento de impotência que meu avô deve estar sentindo nesse momento. Levanto a cabeça e uma ideia insana surge em minha mente. Eu sempre fui conhecida como uma criança com uma mente muito fértil. Veja, sou neta do Papai Noel, quem poderia me julgar por ser criativa demais?
Saio do escritório pela porta determinada, esquecendo-me totalmente de que eu estava sendo uma espiã infiltrada e deveria sair por onde entrei, e dou de cara com minha mãe.
— Ane, o que está fazendo? — ela franze seus olhos cor de mel para mim.
— Hã... Eu vim... — começo a pensar loucamente em uma desculpa. — Pegar uma tesoura!
Ela me olha por um instante e cruza os braços.
— E cadê a tesoura?
Merda, penso.
Contudo, antes que eu diga algo, alguém a chama:
— Ana!
— Tem alguém te chamando, mamãe. — digo, docemente.
— A gente conversa mais tarde, mocinha.
Minha mãe sai pelo corredor caminhando rapidamente. Ela cuida para que todo o sistema operacional da Fábrica de Presentes funcionando perfeitamente (sim, somos bem tecnológicos). Com isso, após me safar de uma bronca daquelas, sigo atrás de cúmplices para resgatarmos o natal.
— Bem vindos a reunião da trupe Cúmplices de um Resgate Natalino! — exclamo olhando para meus aliados.
Tudo bem, eles não sabem ainda o que estão fazendo aqui, mas com certeza vão topar.
— O natal está em perigo? Meu pai sabe disso? — diz Tom, filho do chefe dos duendes.
— Óbvio que temos um problema, Tom. Meu pai anda levando o café para Papai Noel no quarto dele todos os dias! — comenta Jaque, a filha do mordomo.
— Sim, caros amigos, o natal precisa de nós.
E então conto tudo para eles, sobre os dutos de ar (me acharam extremamente corajosa), as cartas e meu plano para salvar o mundo de não ter presentes no dia 25 de dezembro.
— Certo. — Tom franze a testa. — Sua ideia é garantirmos um natal feliz, mas como exatamente vamos fazer isso?
Jaque me olha seriamente.
— Exatamente. Somos só três adolescentes de 11 anos, Ane.
Abro um sorriso.
— Não sejam pessoas de pouca fé, amigos, vamos salvar o natal com esperança.
Meu avô sempre disse que cada presente que vem da Fábrica do Papai Noel possuem uma magia própria. Com isso, nos dias que se passaram, eu e meus cúmplices garantimos de pegar todos os brinquedos que foram fabricados a mais e que foram armazenados no quartinho dos fundos para transformarmos em pura magia natalina em uma máquina própria para isso. Com essa magia extra, meu avô poderá espalhar esperança para o mundo todo!
No dia 24 de dezembro, próximo da meia noite, eu, Tom e Jaque colocamos a roupa dos ajudantes natalinos e rumamos até o quarto de John.
Bato na porta, mas não temos resposta. Apesar do quarto dele nunca estar trancada realmente, meu avô detesta que entrem sem bater, contudo, dada minha grande coragem e a missão de salvar o natal, eu abro a porta mesmo sem permissão.
Vejo o ancião mais requisitado no dia de hoje deitado, usando uma regata branca e uma calçola vermelha tomando sorvete enquanto assiste um filme aleatório de natal na Netflix.
— Vovô! — chamo e ele se assusta.
— Ane! Já disse para não entrar sem permissão.
— Desculpe, vô, mas é uma emergência!
Ele se levanta em um pulo.
— O que aconteceu?
— O senhor precisa se arrumar, está na hora de entregar os presentes.
Senhor John me olha confuso.
— Ane, querida, não há como entregar presentes este natal, os desejos das crianças não estão ao meu alcance. — diz, limpando uma lágrima solidária que escorre por seu rosto.
— Vô, confie em nós. Vista-se e nos encontre na plataforma de decolagem.
— Mas...
— Vovô, o natal não pode esperar! — exclamo sua típica frase, o que o faz sorrir.
— O que não faço por minha neta amada.
Quinze minutos depois, estamos todos entrando na nave com o próprio Papai Noel sem saber o que estamos prestes a fazer.
— Vocês chamaram Jake? — pergunta meu avô sobre o piloto.
— Sim! — responde Tom.
— Mas e o Chico?
— Chamando o piloto, o copiloto vem junto, senhor Noel. — diz Jaques.
— Sua mãe e seu pai sabem disso, Ane? — ele pergunta.
Dou um sorriso amarelo.
— Sabe, eu pensei em avisar depois que der tudo certo. Certo! Vamos logo.
A nave do Papai Noel é altamente tecnológica (talvez você possa comparar com do Pantera Negra ou a Millennium Falcon do Han Solo em Star Wars), temos o piloto e copiloto, poltronas nas janelas para os duendes e membros da família que sempre querem ir na entrega vulgo eu mesma e no meio uma grande porta no chão que abre para que meu avô distribua os presentes. Normalmente, seu saco mágico de presentes fica do lado desta porta, mas dessa vez, temos um grande caldeirão de magia.
Meu avô me olha confuso.
— Cadê os presentes?
— Neste natal, querido vovô, vamos entregar esperança!
Ele me olha surpreso em um primeiro momento, depois seus olhos se enchem de gratidão para depois de emoção.
— Ane... - olha para o caldeirão. — É magia o suficiente?
— Sim! A partir de hoje, o mundo irá receber uma dose extra de esperança.
Meu avô me abraça forte.
— Eu tenho muito orgulho de você, minha netinha. Muito obrigada por não ter desistido do natal como eu fiz.
Um cisco cai no meu olho e sinto uma lágrima escorrer.
— Não precisa agradecer, vôzinho. — sorrio.
Eu e meus amigos nos sentamos na poltrona, colocamos o cinto de segurança, enquanto a nave alçava voo e meu avô abria a porta para começar seu trabalho.
Assim que chegamos na cidade mais próxima de nós no Canadá, ele começa a espalhar a magia.
— HO-HO-HO, FELIZ NATAL! — Papai Noel grita para os quatro cantos do mundo.
Por: Gabriela Manzato
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