Amor em libras
#PRATODOSVEREM 👁️| Banner na cor rosa-pink. Do lado esquerdo, lê-se "Amor em Libras", título do conto. Do lado direito, uma moça e um rapaz comunicam-se em Língua brasileira de Sinais. Ela não fala e ele não ouve; ele gesticula "te amo" em Libras e ela ri. Corações em volta deles. Conto escrito por Thays Marques.
Era a primeira semana de Sérgio na faculdade onde ele cursaria Tecnologia da Informação, e apesar de ele ser acelerado e estar sempre muito apressado, o rapaz não pôde deixar de notar mesmo assim, que ali havia uma bela garota, que curiosamente sempre se sentava sozinha na hora dos intervalos.
E intrigado com o olhar triste que aquela moça de cabelos negros e cacheados sempre lançava para a multidão, Sérgio resolveu perguntar para a sua nova turma de amigos, se eles sabiam algo sobre a misteriosa garota. Afinal, aquele comunicativo rapaz acreditava que ninguém era cem por cento sozinho no mundo; ao menos não por escolha própria.
Todavia, o que uma das pessoas que estavam sentadas a em sua mesa no refeitório disse, o deixou muito espantado e triste.
― Você não sabe, Sérgio? Ninguém consegue se comunicar com aquela mocinha ali, pois ela é surda!
O rapaz ficou parcialmente irritado com os amigos, ao vê-los dar de ombros, como se aquele assunto não lhes importasse nem um pouco. Afinal, todos ali podiam ouvir muito bem.
― As pessoas não conseguem, ou não querem se comunicar com ela? ― ele questionou com certa ferocidade em sua voz, afinal, existia à disposição a língua dos sinais. ― Eu mal cheguei aqui e já sei que a universidade oferece aulas de Libras de forma totalmente gratuita, como uma forma de incentivar a inclusão dos alunos com deficiência auditiva.
― Nós não estamos interessados em fazer aulas de Libras só para conseguir conversar com uma garota, Sérgio! – Isadora disse, cheia de petulância e preconceito em sua voz. ― E, aliás, eu acho mesmo é que deveriam ter instituições próprias só para pessoas assim como aquela garota!
Ao ver tamanha falta de empatia nas palavras da moça à sua frente, Sérgio se levantou da mesa, com o estômago todo embrulhado. Ele havia desde cedo aprendido com a família a ser uma pessoa que apoia e luta pela inclusão de todas as pessoas com deficiência, afinal, era muito errado descrever aquelas pessoas como se as suas limitações fossem tudo o que elas tivessem a oferecer, sendo que todos sempre têm muito mais a mostrar para o mundo. Afinal, cada ser humano é único, e conhecer os seus mínimos detalhes, sempre valeria a pena na visão de Sérgio.
― Pessoas assim? ― ele quase cuspiu as palavras na face de Isadora, tão cheio de repulsa que ele estava por aquela fala da garota. ― Apesar de suas limitações, aquela garota é como qualquer um de nós, e merece todo o respeito que qualquer ser humano sem deficiência recebe em sua vida!
Isadora voltou a dar de ombros, como se tivesse muito entediada com o assunto abordado pelo rapaz à sua frente.
― Se está tão interessado em defender aquela garota, por que não aprende Libras e vira o melhor amigo dela então? ― a moça questionou, cheia de arrogância em sua voz.
― Quer saber? Mesmo eu sendo ouvinte e não tendo nenhum surdo na minha família, eu já sei Libras desde que era um moleque ― ele falou, cheio de tristeza em seus olhos verdes. ― E quer saber ainda mais, Isadora? Assim como o meu avô fez comigo desde cedo, eu também irei incentivar outras pessoas a aprenderem Libras. Afinal, eu já percebi que perdendo o meu tempo com pessoas assim como vocês, é que não vai me ajudar em nada mesmo, na minha grande luta em busca de um mundo mais justo e inclusivo para todos!
― Pessoas assim como nós? ― quis saber Janaína, que logo se fingiu de desentendida.
― Pessoas assim como vocês, que são preconceituosas e com a mente tão pequena, que não são capazes de abraçar as diferenças das pessoas com o coração aberto ― ele disse, enquanto pensava em como poderia ajudar a diminuir o isolamento da garota de belos cabelos encaracolados. ― E eu digo ainda mais: não esperem algo adverso acontecer com vocês ou então com alguém que vocês amam, para aí sim, lutar por inclusão e acessibilidade, afinal, isso deveria ser feito pelo simples fato de que todos merecem viver em um mundo respeitoso e acessível!
Em seguida Sérgio saiu dali e caminhou apressado pelos corredores da universidade, pensando em como era triste que as pessoas fossem tão cruéis e egoístas em seus atos e palavras. E ele estava chateado ainda mais, ao ver que quase ninguém se importava com a maneira com que as pessoas com deficiência se sentiam, ao serem isoladas do mundo e das coisas, por falta de atitudes mais conscientes por parte das outras pessoas.
O rapaz de cabelos castanhos então decidiu que para mudar ao menos um pouco a realidade dos surdos ali da sua faculdade, ele conversaria com o professor de Libras da universidade, sobre uma ideia que havia tido naquele segundo.
Sérgio então caminhou até a sala onde o Professor Jonas ficava e tocou na porta, esperando pacientemente ser atendido. Quando o homem caminhou até Sérgio, ele o fez com uma aparência muito cansada.
― Boa tarde, Sérgio ― Jonas o cumprimentou com simpatia. ― No que posso ajudá-lo hoje?
― Boa tarde, Professor Jonas ― respondeu o garoto. ― Será que poderíamos nos falar por um instante?
― Claro!
Logo Sérgio estava dentro da sala do Professor e sentados de frente um para o outro, o rapaz se preparou para dissertar sobre a ideia que havia tido.
― Professor Jonas, eu sei que essa instituição é totalmente a favor da inclusão e acessibilidade para pessoas com deficiência ― Sérgio disse ―, mas essa visão não vem sendo seguidas pelos alunos, pois a maioria deles não se importam com a causa. Hoje mesmo eu vi uma garota surda completamente isolada dos outros, pois ninguém acha que vale a pena aprender Libras, só para conhecê-la... Então, depois de me indignar totalmente com esse fato, eu tive uma ideia bastante radical, mas que talvez possa mostrar aos alunos ouvintes, como uma pessoa com deficiência auditiva aguda se sente, ao se ver rodeada de pessoas que não sabem e nem aprender Libras...
― E qual é a sua ideia, Sérgio? ― quis saber o Professor Jonas. ― Eu já tentei atrair os alunos para as aulas de Libras de tudo quanto é jeito, mas eles quase sempre escolhem as outras matérias que existem na grade das optativas.
― A minha intenção é mostrar aos ouvintes, como é estar do outro lado da questão ― o rapaz começou a explicar. ― E desse modo eu então pensei em darmos uma palestra toda feita em Libras, onde logo após haveria um bate-papo sobre o assunto. O tema abordado seria "O Amor é para todos". E após todos os ouvintes reclamarem que não conseguiram entender nada e que desse modo, sentiram-se isolados, nós explicaríamos que é dessa mesma maneira que as pessoas com deficiência auditiva se sentem, ao não não encontrarem pessoas que sabem Libras nos vários locais onde frequentam e também ao assistirem vários vídeos por dia, onde não os seus desenvolvedores, não se preocupam em colocar legenda... Eu acho que isso pode mudar ao menos um pouco, a visão das pessoas sobre esse assunto.
O Professor Jonas pareceu pensar no assunto por um instante, mas por fim, abriu um grande sorriso para o garoto à sua frente.
― É uma ideia bastante ousada, mas eu gostei dela ― respondeu o educador. ― Mas para que isso dê certo, nós precisaremos que uma boa quantidade de surdos compareçam ao nosso evento...
― Isso o senhor pode deixar comigo!
Em seguida o rapaz se retirou da sala do professor e de maneira muito animada, caminhou até onde estava sentada a garota solitária.
Sérgio se sentou de frente para ela e então pôde notar ainda mais, o quanto a moça era linda. O seu coração pareceu saltar no peito, tentando lhe avisar de algo, mas o rapaz ignorou aquele sinal, decidido a antes de tudo, colocar o seu plano em prática.
― Olá! ― Sérgio disse, usando a língua dos sinais. ― Você poderia me ajudar em uma coisa?
A garota fez um gesto com as suas mãos, indicando que sim, ela estava disposta a ajudá-lo.
Sérgio então contou para a moça ― que ele logo descobriu se chamar Analice ― sobre a ideia que acabava de ter. A garota pareceu animada com a palestra e então prometeu chamar todos os seus amigos surdos, para que eles também pudessem participar daquela ação.
Quando o rapaz já se levantava para ir para a sua próxima aula, Analice o chamou de volta, a fim de perguntar mais uma coisa.
― Você também é surdo? ― ela o questionou em Libras.
― Não. Eu sou ouvinte ― respondeu Sérgio, que também usava a língua dos sinais. ― Mas mesmo assim, eu me importo muito em lutar por um mundo mais justo e inclusivo para todos.
Analice sorriu para ele, pois se existiam até mesmo pessoas com deficiência auditiva que não se importavam com as coisas da comunidade surda, quiçá pessoas que podiam ouvir. Então aos olhos da garota, Sérgio era apenas uma exceção.
Logo os dois se separaram e foram cada qual para a sua aula, mas mesmo assim, prometeram sempre se encontrar nos intervalos, para que pudessem conversar.
E desse modo eles fizeram por um mês e meio, até chegar o grande dia da palestra.
Sérgio então subiu no palco que havia no auditório da faculdade, com as pernas um pouco trêmulas. Ele não tinha o costume de falar em público, mas sabia que por aquela causa que ele defenderia naquele dia, valeria totalmente a pena para o rapaz, enfrentar o seu grande nervosismo.
O rapaz recebeu o apoio do Professor Jonas e também de Analice, que mesmo sentada na plateia, a todo momento trocava olhares com Sérgio, passando-lhe segurança.
E depois de quase todas as cadeiras do auditório estarem preenchidas, o rapaz começou todo o seu discurso, que foi feito totalmente em Libras. E mesmo tendo que se concentrar em seus gestos, mesmo assim o rapaz pôde notar o olhar perdido e indignado, de quase todos os ouvintes que estavam ali presentes.
E depois de terminar a sua apresentação e receber uma salva de palmas de todas as pessoas que conheciam a língua dos sinais, Sérgio foi logo questionado por um rapaz, que havia se sentado na primeira fileira.
― Como eu vou fazer um relatório sobre essa palestra, sendo que eu não entendi nada do que foi dito aqui?
Sérgio se preparou para o momento que tanto havia aguardado em seu coração.
― Prestem bem atenção ao que eu vou falar agora ― Sérgio disse e naquele momento, Jonas traduzia tudo para as Libras, para que todos os surdos também pudessem entender o que era dito pelo rapaz. ― Na verdade, nós trouxemos todos vocês até aqui somente para que pudessem entender e sentir na pele, todas as dificuldades que os deficientes auditivos passam todos os dias em suas vidas, ao tentarem se comunicar com o mundo de forma digna. E como eu garanto que nenhum de vocês ouvintes gostaram de se sentir perdidos e isolados no dia de hoje, eu também lhes afirmo que os surdos não gostam de se sentir assim também. Porém, a grande diferença é que eles enfrentam isso todos os dias e nós, estamos experimentando o outro lado da moeda, somente no dia de hoje.
"E agora eu lhes digo que o meu discurso de antes foi simples e pode ser abreviado. Eu disse apenas em minha palestra, que o amor é para todos, mas que nós com os nossos egoísmos, insistimos em limitar e nos doar somente a algumas pessoas. Mas eu também disse que nós mesmos podemos mudar os conceitos limitantes e muito preconceituosos, que foram plantados em nós no passado. E para finalizar, eu os chamo a refletir sobre essa questão e se acharem que ela faz sentido e se acreditarem que o amor deve ser mesmo propagado, adotem a aula de Libras do Professor Jonas como algo primordial na graduação de vocês. Eu garanto que isso vai ajudar sim, todos a se comunicarem muito melhor com os deficientes auditivos, mas que muito mais, os engrandecerá como pessoas, pois todos e, inclusive, os surdos, têm muito a nos ensinar todos os dias."
Em seguida Sérgio explicou também sobre a importância das legendas e depois daquelas pessoas se virem bastante informadas, todos ficaram de pé e aplaudiram o discurso do rapaz. E tão logo cessaram as palmas, o Professor pegou o microfone das mãos de Sérgio e o garoto, tomou o posto de intérprete de Libras para si.
― Quem estiver disposto a se abrir para novas conexões e aprender uma nova língua de forma totalmente gratuita, me procure logo mais ali naquela mesinha!
Não tardou muito e logo a fila de pessoas interessadas em aprender a língua dos sinais já começava a se formar e de uma maneira inimaginável, crescia a cada minuto.
Sérgio então caminhou tranquilamente até Analice, que o esperava com um grande sorriso no rosto.
E depois de cumprimentar a garota com um beijo e um abraço, o rapaz olhou dentro dos olhos escuros da moça e de forma gestual lhe disse, decidido a transformar aquele dia em um momento ainda mais incrível do que já estava sendo:
― Analice, eu acredito que assim como o amor é para todos, ele é para nós dois também, que mesmo com as nossas diferenças, não deixamos que nada fosse maior do que o afeto de um pelo o outro ― Sérgio disse e então rapidamente tirou de dentro do bolso, um singelo anel com uma pedrinha azul no centro ―, e então, desse modo, eu gostaria de saber se a garota com os cabelos encaracolados mais lindos do mundo, desejaria namorar comigo?
E assim como Analice havia aprendido desde cedo que um gesto vale mais do que mil palavras, ela respondeu àquele pedido, dando logo um beijo na boca do rapaz à sua frente.
E sem saber que eram observados por algumas pessoas, Sérgio e Analice logo se viram sendo aplaudidos por todos os presentes, que puderam ver naquele minuto com ainda mais clareza , como o amor era capaz de contornar todas as barreiras impostas pela vida.
#PRATODOSVEREM 👁️| Banner de cor branca. Um menino e uma menina gesticulam em Língua brasileira de Sinais. Eles não falam.
FIM.
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