Este conto não tem nome
Quando ela sentiu o amor pela primeira vez, aos quinze anos de idade, sabia que ainda não estava pronta para aquilo. Não era algo que estava ao seu alcance diariamente, e muito menos algo que buscava àquela altura. Recém havia saído do ensino fundamental e ainda estava se recuperando de seus traumas da adolescência, o que significa que qualquer aproximação soava como deboche ou uma tentativa de lhe ridicularizar como sempre faziam os colegas desde que ela se entendia por gente.
Ela já estava crescendo, sabia que mais dia menos dia alguém acabaria despertando coisas, sentimentos dentro de seu coração. E com certeza ela desejou bem lá no fundo não estar pronta para aquilo, ela sabia dos riscos, mas decidiu apostar alto mesmo assim. Ele não era bonito, pelo menos não para as outras; e não era engraçado também, a não ser para ela que ria de qualquer sarcasmo que lhe escapasse pelos lábios. Lábios esses que ensinaram a garota a beijar e a dizer aquelas três palavras mágicas que ela jurou que só diria quando já fosse muito velha e madura para pronunciar tais palavras. O garoto tinha o tom de voz mais alto que ela já ouvira. Suas amizades de caráter duvidoso também o colocavam em xeque diante dela, mas havia algo nele… Talvez fosse a sua ironia, ou a mania de estar sempre ocupado vendo filmes durante a tarde, ou o fato de que nunca, desde que se conheceram no primeiro dia de aula, ter aberto qualquer um de seus cadernos e mesmo assim tirar boas notas, sempre.
O que acontece é que ela aprendeu a pronunciar aquelas palavras e acabou deixando-as escapar rápido demais, em uma daquelas ligações que costumavam durar mais de duas horas e meia durante as tardes após a aula. Tardes essas em que sua única preocupação era ajudar nos serviços domésticos e ir logo se trancar no quarto para estar livre quando “Best of You” do Foo Fighters anunciasse que ele estava enfim entrando em contato. E até mesmo em algumas noites, em que o celular vibrava debaixo do travesseiro, obrigando-a a sussurrar enquanto desejava a ele uma boa noite e torcia para acordar ainda viva, para que pudessem se ver na manhã seguinte.
Ela soube que sentia o mesmo quando ficou sem palavras ao ouvi-lo dizer primeiro, porque ele era um sem vergonha; ele não tinha vergonha de dizer o que sentia, e isso sempre a pegava desprevenida. A garota nunca soube muito bem o que dizer, desde aquele último dia, daquele último beijo. Desde que teve a certeza de que era tarde demais para dizer algo... Nem aquelas três palavras o fizeram voltar atrás, porque a covardia dela o afastou tão rápido quanto o fez se aproximar. Ele não queria mais. A indecisão dela até hoje atrapalha tudo.
Ainda guarda em um canto escuro da memória a manhã em que escapou de casa enquanto todos dormiam para encontrá-lo no lugar de sempre. Passaram a manhã aos beijos, fazendo planos e mais planos do que fariam de suas vidas após a escola, e o pior de tudo, a inocência lhes fazia acreditar que sim, tudo daria certo e correria como o planejado. O que os dois não esperavam é que logo mais à frente havia o destino e a consequência de suas escolhas mal feitas.
Somente ela sabe quantas vezes chorou após o fim daquele verão. “Eu adoraria voltar no tempo”, foi o que pensou durante todos os meses que seguiram a partida dele. Sua mente lhe pregava tantas peças que ela acabou sozinha e sem ninguém para ouvir seu pedido de desculpas. Na verdade, até houveram outros depois dele, mas ninguém chegava aos pés, não do amor que tinham um pelo outro. Nunca. Queria ir até ele, queria ligar e dizer que nenhum outro a faria sentir o que ele fez, porque certas coisas jamais se repetem, certos toques jamais poderão ser imitados por ninguém.
Cada maldita vez que deitou a cabeça no travesseiro desde então, a saudade de sabe-se-lá-o-quê lhe castiga como se ela fosse alguém pedindo carona em uma rodovia sob o sol escaldante de Dezembro. Ela ainda não sabe lidar com as escolhas que fez. Passa e repassa todos os últimos momentos em sua cabeça como o roteiro de uma novela mexicana. “Deveria ter feito isso.”, “Deveria ter dito aquilo.”, “Deveria ter passado bem longe dessa encrenca”, isso tudo são coisas que castigam e mastigam a sua mente dia após dia.
Ainda guarda e sabe de cor todas as piadas internas que tinham um com o outro, os planos que fizeram e todas as juras de amor feitas em finais de tardes, aquelas mesmas tardes em que ela arranjava uma desculpa qualquer para sair de casa e ir ao encontro dele nas férias, porque tantos dias longe castigavam demais o seu coraçãozinho de menina apaixonada. E ele ia ao seu encontro, porque sabia que cada minuto ao seu lado era precioso demais e de certa forma ele também guardava a certeza de que aquela história não duraria muito mais.
Ele a via como alguém forte, alguém que conseguiria viver com a sua ausência, porque ela jamais havia deixado transparecer que era mais frágil do que podia imaginar. E no dia em que deu a ela uma última chance para atender ao telefone e apenas dizer a ele que gostaria que ele não fosse embora, a covardia da garota lhe traiu e ele foi arrastado para longe por sua família, que por saberem que aquilo se tratava de um romance entre adolescentes, sequer lhe deram ouvidos quando pediu para ficar.
A garota ainda recorda o momento em que o reencontrou após as férias em uma festa de formatura. A saudade foi esmagada pelo sentimento de alívio logo que o seu coração teve a certeza de que sim, ele estava lá, e de que não, ele não iria embora tão cedo. Uma pena que essa sensação de pertencer a alguém durou tão pouco, porque graças à garota tudo acabou. Nunca mais sentiu as mãos dele em sua cintura enquanto dançavam uma música qualquer em meio a tantos jovens bêbados e trêbados que mal sabiam qual caminho seguir após aquela noite. A sensação de pertencer a alguém como ele durou apenas três meses e dezoito dias.
Os arrependimentos que ainda permeiam sua mente nunca serão bons o suficiente a ponto de apagarem cada minúsculo segundo que passou ao lado dele. Ela precisaria de muito mais para odiá-lo, mas tudo o que sabe sentir é uma alegria absurda ao lembrar de seu primeiro amor. Ele lhe ensinou coisas preciosas sobre o amor, e sobre como as pessoas podem marcar umas às outras mesmo em tão pouco tempo. Não importa o quanto as pessoas tentem lhe dizer que só amamos uma pessoa em toda a vida, ela sempre teve convicção de que o ser humano é capaz de amar mais de uma vez, de diferentes formas, sim, mas sempre é capaz de aprimorar-se nesse quesito cada vez mais. Ninguém ama ninguém de igual forma, e ela sabe disso porque cada vez que passa pelo lugar que um dia pertenceu aos dois dá um largo sorriso de satisfação, e nutre lá no fundo a certeza de que amores de verão são mesmo muito passageiros, mas que nunca irão se comparar a nenhum outro.
Por: Gabriela Ferreira
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