11. E Daí Se Eu Sou Louca?
1962.
Alice. Meu nome era Alice. Foi a primeira coisa que pensei quando acordei na minha cama toda dolorida, como se tivesse apanhado de diversos homens. Que merda tinha acontecido? Não fazia ideia nenhuma do que havia me feito chegar aqui. Olhei para o lado e me assustei ao ver uma garota me encarando. Ela parecia estar irritada, pois estava me olhando como se fosse me atacar a qualquer momento.
– Desculpe-me a grosseria, mas por que está olhando assim para mim?
– Você se acha demais não é Alice?
– Eu não sei do que está falando.
– Ridícula.
Ela se virou para o canto da cama, me deixando confusa. Decidi então me levantar e andar até a porta. Quando me aproximei da mesma, porém, alguém apareceu e tentou abrir pelo lado de fora. Voltei rapidamente para a minha cama e me escondi debaixo das cobertas achando que adiantaria alguma coisa, mas logo percebi o que tinha feito e tirei a cabeça debaixo do cobertor. Ao ver o rosto do homem que entrou, imediatamente dei um grito ao ver seu sorriso maléfico que me lembrava o de um gato listrado.
– O que deu em você Alice? – perguntou ele.
Continuei calada e olhei atentamente esperando o primeiro movimento suspeito. Ele então se aproximou e eu fui para trás em minha cama, mas encontrei rapidamente a parede. Ele pegou um comprimido e me ofereceu. Eu neguei com a cabeça, mas ele insistiu. Novamente neguei, e ele então perdeu a paciência.
– Alice, pegue a porcaria do remédio.
– Não. Eu não quero tomar.
– Você não tem vontade própria, aceite isso.
Em seguida, ele pegou o comprimido e pressionou contra a minha boca enquanto apertava as bochechas tentando abrir um espaço. Por ele ser mais forte do que parecia, acabei me rendendo e tomei o remédio. Ele parecia sorrir ao me ver tão vulnerável e eu me assustei ainda mais.
– Gato risonho. – comentei olhando para seu rosto diabólico enquanto ele pegava a bandeja com os copinhos.
– Durma Alice, vai ser melhor para você.
Assim que o gato saiu do quarto, olhei para a garota do outro lado.
– Não sei qual o seu nome.
– Vai se foder Alice. – disse ela se virando novamente.
Percebi então que a porta tinha sido deixada aberta. Levantei-me indo em direção a ela e dei de cara com um enorme corredor. Encantada com aquilo, mas ao mesmo tempo aterrorizada, comecei a lembrar de ter corrido nesse lugar várias vezes. Sabendo para onde deveria ir, caminhei para a direita, chegando em uma sala enorme. Ao ver diversas pessoas se divertindo enquanto dançavam alguma música do jukebox, me senti em casa. Cheguei perto de um homem que usava uma longa e fina mangueira que descartava sua urina no chão do ambiente e comecei a dançar com ele.
Ninguém parecia estar ligando para as regras, ali eles eram felizes. Estranhamente passei a me sentir igual a todos ali, feliz e despreocupada. Após dançar com o garanhão da bexiga descontrolada, me dirigi ao jukebox, onde olhei cada uma das faixas. Prestes a escolher uma delas, acabei levando um pequeno choque. Não sei de onde veio ele exatamente, mas a lembrança que me veio depois foi o que me deixou apavorada. O cabelo em formato de coração rindo de meu desespero enquanto arrumava seu vestido vermelho. Um homem com capa preta; ele estava me eletrocutando, só tinha certeza disso.
Sentei em um dos sofás rapidamente, e uma garota que estava sentada na outra ponta se aproximou.
– Alice? – perguntou ela parecendo me conhecer.
– Sim?
– O que houve com você?
– Como assim?
– Está estranha, o que houve?
– Eu não me lembro direito, mas acredito que eu tenha sido eletrocutada. – respondi mesmo não sabendo o nome dela.
– Usaram a terapia de choque em você?
– Não sei dizer ao certo, mas eu vi uma mulher com um cabelo no formato de coração.
– A Rainha de Copas?! – perguntou surpresa.
– É ela mesma! Foi ela quem mandou ele colocar na potência 250.
– Quem foi que ela mandou colocar na potência 250?
– Um homem de capa preta, não vi o rosto dele. – respondi expressando confusão.
Ela me olhou mais chocada do que antes.
– Você descobriu! – disse ela. – Você descobriu quem é o homem de capa preta!
Ela se aproximou mais e me abraçou.
– Mas eu não sei quem ele é.
– Esse fato não é importante, temos que ir atrás dele agora.
– Se vai te deixar melhor então vamos.
***
Corremos bastante aquela manhã, isso era certo, mas não encontramos o homem de preto que aquela garota tanto procurava. Não sei se ela estava louca ou simplesmente não o encontrou, mas eu achei que ela estava bem assustada com o fato de o homem de preto estar dentro do sanatório. Andei mais alguns metros com ela só para ter certeza, mas logo perdi a paciência.
– Olha, eu cansei. Não sei o que você quer indo procurar um homem que não existe.
– Você não entende. – disse ela. – Ir atrás desse homem pode salvar a gente, talvez até tire todos nós daqui.
Assim que ela disse isso, um pequeno flash de memória passou em minha cabeça, me fazendo parar em uma parede por alguns segundos. Obviamente a garota percebeu isso.
– O que foi Alice?
– Acho que me lembrei de uma coisa, mas não consigo assimilar.
– Me diz o que é.
– É uma mulher que eu gosto muito.
– Você é lésbica?
– Não! Não esse tipo de gostar. – respondi não acreditando que ela supôs isso. – É tipo como se ela fosse da família. Eu acho que ela está em perigo.
– Pode ser a sua irmã Beatrice.
– Eu tenho uma irmã?
– Sim. Não finja que não se lembra.
– Não estou fingindo, eu realmente não me lembro.
A garota parou e começou a se aproximar de mim. Eu não entendi o motivo.
– O que foi? – perguntei enquanto ela me examinava de cima abaixo.
– Você se lembra de mim?
Eu respondi negativamente com a cabeça. Ela temia isso.
– Meu nome é Quinn Standall. Eu sou sua amiga.
– Parece uma lebre. – comecei a rir.
– O quê? – perguntou ela confusa.
– Você fica correndo para falar e quando vai fazer alguma coisa, tem que parar com isso.
– Alice isso não é uma brincadeira.
– Eu sei, mas acho que é melhor te associar a uma lebre.
De repente, ouvimos um barulho atrás de nós duas. Corremos para trás e no escondemos no corredor ao lado, de forma que podíamos ver o que se passava ali. A origem do barulho se mostrou quando uma porta se abriu e um homem de capa preta apareceu. Quinn parecia surpresa por ter descoberto aquilo, mas eu entrei em choque com algumas lembranças minhas: sentei-me no chão enquanto sentia novamente as correntes elétricas passando pelo meu corpo. Em uma tentativa de fazer com que a dor sumisse, comecei a gritar desesperadamente. Quinn então percebeu e tentou me tocar para fazer com que eu parasse.
– Cala a boca Alice! – sussurrou alto.
Mas era tarde. O homem de preto apareceu atrás de Quinn e, imediatamente, enfiou uma faca na cabeça dela. Meu desespero foi instantâneo. A dor em meu corpo era enorme, mas me levantei e corri o mais rápido possível. Olhei para trás e o vi tirando a faca da cabeça de Quinn antes de correr na minha direção.
Droga. Pensei. Uma lembrança horrível tinha sido trazida por uma simples imagem, e agora minha amiga estava morta. Ao ver uma porta próxima de mim, tentei abrir a mesma e entrar no quarto, mas acabou que fui devagar demais. O homem de preto havia me pegado. Não havia mais nada que eu pudesse fazer.
***
No caminho enquanto íamos até a porta maléfica da qual o homem de preto saiu, comecei a gritar na tentativa de alguém me ouvir e me salvar antes que ele entrasse naquela sala.
Ninguém. Essa foi a minha resposta. Ninguém parecia se importar o suficiente para sair de seu quarto e saber o que estava acontecendo comigo. Mas quem dera se saísse alguém, meus gritos se pareciam com os dos pacientes em seus dias normais; ninguém se importa com esse tipo de desespero.
Quando chegamos perto da porta, ele me colocou no chão e, em questão de segundos, me empurrou para dentro da sala contra minha vontade, fechando a porta para que eu não saísse. Apesar de ter caído longe, me levantei e comecei a chutar e bater na porta para que a mesma se abrisse de alguma forma, mas minhas tentativas só resultaram em fracasso. Decidida a sair dali, encostei-me na parede e procurei alguma coisa (mesmo estando escuro), tomando em susto ao pegar em algo metálico acima da minha cabeça. Voltei para perto da porta e encontrei um interruptor. Ao apertar o mesmo, o ambiente se iluminou com algumas luzes espalhadas pela sala. Ela era enorme e assustadora. Nas paredes, diversos objetos cortantes de múltiplos tamanhos estavam organizados de forma muito macabra.
Após admirar os objetos, olhei para frente e vi uma garota amarrada a uma cadeira. Supus imediatamente que fosse minha irmã. Corri até ela e tirei o pano de sua boca.
– Alice, que bom que você me achou. – disse ela enquanto esperava eu desamarrar a corda de sua mão.
Olhando mais detalhadamente para seu rosto, eu percebi a devera semelhança entre nossas faces.
– Se parece comigo. – comentei enquanto ela tirava o resto da corda de seu pé.
– Claro que eu pareço, sou sua irmã.
Continuei na minha para tentar obstruir o fato de que eu não me recordava do nome dela, mas ela percebeu algo, pois começou a reparar em mim.
– O que houve com você? Está quieta.
– Eu não queria revelar para ninguém, mas acho melhor te contar antes que aconteça o mesmo que aconteceu com a Quinn.
– Espera, o que aconteceu com a Quinn? – perguntou segurando na minha mão.
– O homem de capa preta a matou.
– O Theodore.
– Quem?
– O cirurgião.
Balancei meus ombros indicando que não fazia ideia do que eu estava falando.
– Marido da Constance? Nada? – ela agora teve certeza de que tinha algo errado comigo. – O que houve com você?
– Eu não me lembro direito, mas acredito que tenham me dado choque.
– Usaram a terapia de choque em você!? – ela parecia surpresa, então continuou segurando a minha mão.
– Temos que sair daqui.
Eu e ela levantamos e fomos em direção à porta. Tentamos uma vez, tentamos duas, mas a porta se recusava a abrir. Voltamos então para onde ela estava sentada e olhamos ao redor.
– Como vamos escapar, não tem saída. – disse ela.
– Talvez a gente possa tentar atacar ele.
– Não daria certo Alice, ele é muito rápido e forte, não conseguiríamos.
– Somos duas e poderemos matar ele se formos mais espertas. Temos as ferramentas necessárias.
Olhei fundo nos olhos dela e tentei convencê-la a entrar nisso comigo. Ela era durona, mas meu olhar poderia vencer aquilo facilmente, eu sentia isso. Quando ela finalmente respirou fundo e desviou o olhar, percebi que tinha ganhado.
– Tudo bem, mas se o matarmos, temos que fugir daqui logo em seguida, certo?
– De acordo.
Ela pegou um dos facões que estava ao lado da porta e tentou mirar em alguma coisa para treinar enquanto eu disse para ela que precisava encontrar uma furadeira.
– Por que uma furadeira? – perguntou.
– Não sei, ela pode ser bem útil.
Apesar de sentir que ela abominou o que eu disse, continuei a procurar a furadeira. Quando a encontrei, liguei-a rapidamente e fiquei ao lado da porta junto com minha irmã. Esperamos um bom tempo antes de ter certeza de que teria alguém atrás da porta para que nós duas atacássemo-lo. Após alguns minutos, desistimos de esperar e largamos nossas armas no chão. Ela, para não continuar mexendo no facão, decidiu puxar um assunto.
– Eu sei que você provavelmente não vai se lembrar direito, mas eu sinto muito por não te tirar daqui quando entrei.
– Deve ter tido seus motivos.
– Não, eu só não acreditei quando me disse aquelas histórias malucas sobre monstros no guarda-roupa. – Ela parecia querer muito que eu a desculpasse. – Eu fui tão cética que não acreditei que existia um assassino aqui.
Continuei em silêncio esperando que ela continuasse; eu não sabia o que dizer.
– Os assassinatos foram reais, e o assassino também. Me desculpa por não acreditar em você.
Ela chegou perto de mim e me abraçou. Nunca me senti tão amada desde que abracei minha mãe pela última vez. Foi então que o momento em família foi interrompido por um barulho vindo de trás da porta. Nós duas nos levantamos rapidamente e pegamos nossas ferramentas, assumindo a antiga posição em que nos encontrávamos. A porta então se abriu lentamente. Quando vimos o homem de capa preta, fomos para cima dele e o derrubamos. Sem pensar duas vezes, liguei a furadeira e perfurei a capa, que começou a jorrar sangue por toda parte. Minha risada ao ver que estava matando alguém era maligna, e comecei a sentir que nunca estive tão viva quanto naquele momento.
***
Assim que percebi que ele estava sem movimento, tirei a capa de cima e me surpreendi ao ver que acabara de perfurar o corpo de Quinn. Minha irmã já não estava atacando mais e seu arrependimento bateu.
De repente, fui surpreendida por Theodore, que me pegou pela cintura tentando fazer eu largar a furadeira. Segurei-a mais forte e tentei acertar ele, mesmo que ele estivesse segurando as minhas mãos. Comecei a entrar em desespero, porque não sabia se a minha irmã iria me ajudar. Precisaria lembrar do nome dela.
Tentei forçar algumas memórias que me restaram. Me vi na cama do meu quarto, com medo do monstro do guarda-roupa. Theo tentou pegar a furadeira. Outra memória. Dessa vez conversando com Ethan sobre um chapéu. Uma nova tentativa de pegar a ferramenta. A memória sobre Henry e Rick brigando voltou e a associei a morte dos dois. Theo agora me jogou no chão e a furadeira estava longe de mim. Quando meu corpo tocou o chão frio, me lembrei de Constance, de Emma e até mesmo da minha mãe. Theo veio para cima de mim. Desesperada, me arrastei até a furadeira e então a memória sobre o nome dela veio.
– Beatrice! – gritei assustada. – Me ajuda!
Ela então pegou o facão e tentou mirar em Theo. Obviamente na primeira tentativa ela errou.
– Theo. – disse tentando fazer ele parar. – Não precisa fazer isso.
Ele fingiu que não me escutou e pegou a furadeira aproveitando minha distração. Beatrice tentou acertar uma segunda vez, mas errou de novo.
– Beatrice acerta ele!
Beatrice mirou e, quando foi acertar ele, Theo virou e parou o braço dela. Ele olhou no fundos dos olhos de minha irmã e perfurou o antebraço da mesma com a furadeira, fazendo-a gritar de dor enquanto largava o facão no chão
Ao ver que ele estava distraído, empurrei-o para trás e me levantei rapidamente. Encarei-o com ódio por ter atacado Beatrice. Peguei o facão que ela largou e mirei na cabeça de Theodore. Com somente um golpe, empalei a parte metálica no crânio, cravando de forma que não pudesse ser tirada. Ele tremeu alguns segundos e depois caiu junto a uma quantidade enorme de sangue que se espalhou. O homem de capa preta tinha morrido.
– Você está bem? – perguntei para Beatrice enquanto amarrava uma faixa ao redor de seu braço.
– Estou. Você me salvou dele, obrigado.
– Deixe as formalidades para lá.
Ela me olhou feliz e surpresa pelo modo como matei o Theo e não fiquei triste por isso. Então fui lembrada de nosso plano inicial.
– Temos que ir embora agora lembra? – perguntou ela.
– Lembro sim. – respondi indo para a porta. – Vamos.
Beatrice se levantou e foi atrás de mim segurando o pano que impedia seu braço de sangrar completamente. Olhei para o meu vestido enquanto andávamos pelo corredor e o mesmo estava coberto de manchas enormes de sangue. Ao ver aquilo, senti uma estranha sensação de prazer e alegria. Claro que tive que disfarçar o olhar perto da minha irmã, mas aquilo era lindo. Aquela cor era linda. Tudo que eu mais queria naquele momento era tentar de novo. Foi aí que, em meio a alguns pensamentos sobre sangue que Beatrice me cutucou. Eu não estava mesmo prestando atenção em nada.
– Alice, como vamos sair daqui?
– Pela porta da frente, não tem erro.
– A Constance estará nos esperando, sabe como funciona.
– Matamos ela também.
– Que horror! – Beatrice estava pasma. – Matar o Theodore já não foi o suficiente?
– Eu só estou cansada de toda vez eu tentar sair e dar errado. – disse na tentativa de justificar meus pensamentos. – Tudo que eu mais quero é sair daqui.
Beatrice ficou em silêncio para não me contrariar. No fundo eu também achei que seria uma péssima ideia se ela fizesse.
Chegamos ao salão. Olhamos os pacientes que estavam lá. Como não tinham muitos, era fácil nos ver, estando escondidas ou não. Fomos andando até chegar na cozinha. Nem eu sabia o motivo de ir até lá, mas achei que meu cérebro pensaria em alguma coisa. Quando entramos, fui até um armário pequeno que ficava ao lado da dispensa e peguei uma roupa de arrumadeira. Comecei a tirar meu vestido, e Beatrice olhou para a porta como se procurasse alguém.
– Só preciso trocar de roupa para o caso de Constance me reconhecer. – afirmei enquanto colocava a calça, percebendo que o tecido era muito frágil. – Aliás, esse tecido é horrível.
Terminei de colocar a roupa e fechei o armário logo em seguida. Peguei meu vestido sujo de sangue e joguei na lata de lixo mais próxima. Beatrice guiou o caminho de volta ao corredor para fora de Creedmoor, e logo percebi que talvez eu pudesse ir embora para sempre dessa vez. Nos aproximamos então da escada que levava à sala de Constance e, quando a atravessamos, senti um alívio no peito.
– Calma Alice. – disse uma voz conhecida, me fazendo parar por alguns instantes.
Eu sabia de quem se tratava, mas eu também tinha certeza de que ele estava morto.
– Ethan? – perguntei olhando para trás.
Minha mente podia me enganar, mas meus olhos não, era ele, ali de pé, olhando para mim da escada que eu estava com tanto medo de atravessar.
– O que está fazendo Alice? – perguntou Beatrice. – O que houve?
Olhei para Beatrice e dei um sorriso antes de largar sua mão e me aproximar de Ethan. Ele sorriu para mim e ficou sério logo em seguida.
– Desculpa pelo que fiz com você. – disse. – Foi por culpa minha que você morreu.
– Eu iria morrer de qualquer jeito, assim como todos que entram em Creedmoor.
– Mas Ethan, eu...
– Para com isso! – ele me interrompeu. – Você matou pessoas para chegar até aqui, e agora está recuando para me pedir desculpa, estando tão próxima da saída?
– Está indignado comigo?
– Estou surpreso com você. – disse sentando-se no primeiro degrau. – Usaram a terapia de choque em você e ainda conseguiu sair viva? Sem memórias, claro, mas viva.
– Queria que estivesse vivo?
– Aparentemente essa sua cabeça pode fazer milagres.
Ethan começou a desaparecer de repente.
– Calma! E se a Constance nos achar?
– Se ela te achar, faça o que sempre faz. Seja louca.
Ele então sumiu em meio a fumaça que se dissipava junto com suas pernas. Uma lágrima caiu do meu rosto e eu sabia o que teria que fazer para sair daqui. Eu teria que agir como uma louca.
– Alice! – gritou Beatrice ao me ver indo na direção oposta à qual estávamos indo. – Volta! Estamos tão perto.
Ignorando-a completamente, me dirigi ao meu quarto, fechando a porta atrás de mim e sentando na cama logo em seguida. Fechei meus olhos e depois de alguns segundos abri-os novamente, direcionando eles para o guarda-roupa, enquanto respirava fundo.
– Tad. – chamei ele, enquanto meu nervosismo aumentava. – Saia.
A porta do guarda-roupa se abriu lentamente, e a mão negra dele encostou no chão, seguida da outra, que puxou o corpo deformado para fora. Assim que ele ficou de pé, respirei fundo e tentei não o temer. Aos poucos, Tad se aproximou de mim e a escuridão da noite se fez presente em cada fresta de luz que restava em meu quarto. Quando finalmente estava em pé do meu lado da cama, me virei e encarei o buraco em seus olhos. Evitando ao máximo falar qualquer palavra que ele não entendesse, toquei seu peito da mesma forma que fizera comigo. Não sabia se ele tinha entendido, mas o vi sair correndo do meu quarto no exato momento em que fechei meus olhos. Levantei então rapidamente da minha cama e tentei alcança-lo pelos corredores. Virei o primeiro e vi sua sombra negra correr rápido para a esquerda. Novamente o seguindo, encontrei-o agora subindo a escada para a sala de Constance.
Sabendo o que ele faria, sorri maleficamente e subi para testemunhar com meus próprios olhos a morte de Constance Holden.
Infelizmente, ao entrar na sala dela, uma outra cena foi presenciada pelos meus olhos: minha mãe, sangrando muito pelo pescoço, enquanto o vestido era manchado pelo vermelho que eu agora tanto admirava. Corri para perto dela e segurei sua cabeça em minhas pernas enquanto tapava o sangramento com a mão. Ela estava conformada. Essa era a impressão que seu olhar causava em mim. A conformidade com a morte parecia ser algo que ela já não temia.
– Mãe, por favor não vá. – disse enquanto via minha blusa de manga longa manchar também. – Já sobreviveu uma vez, pode sobreviver de novo.
– Alice. – Jade continuou calma. – Você é louca filha, nunca tive dúvidas disso. Mas eu quero que você se sinta à vontade para viver o resto da sua vida enquanto pode. Por isso, eu contarei algo que nunca quis que soubesse.
– Mãe....
Uma lágrima caiu em seu rosto. Eu não aguentei.
– Você me atacou Alice. – disse ela, me deixando surpresa, mas ao mesmo tempo confusa.
– Não posso ter feito isso mamãe.
– Queria que saísse daqui o mais cedo possível, então disse que você não tinha me atacado. Achei que liberariam você logo em seguida, mas descobri que não é assim que funciona esse sanatório.
Eu chorava de tristeza, de raiva, e de qualquer outro sentimento que pudesse relacionar com isso, mas eu ainda estava incrédula por ter feito isso.
– Não existe nenhum monstro do guarda-roupa Alice. Queria que você tivesse percebido isso antes.
Ela então respirou fundo e tossiu sangue antes de relaxar. Ao perceber que seus olhos não tinham mais movimento, eu comecei a chorar muito. Não conseguia acreditar que minha própria mãe arriscou viver comigo mesmo sabendo que eu a atacaria novamente. Fiquei muito furiosa comigo mesmo, mas não soube organizar meus sentimentos. Quando vi, estava deixando lágrimas cair enquanto ria igual a psicopata que eu era.
1963.
Alice acordou após a cesariana onde tiveram que tirar seu bebê de modo arriscado. Ela viu a sala iluminada a qual colocaram-na e começou a entrar em desespero quando procurou sua barriga e não encontrou nada. De repente, sua irmã chegou e foi até ela acalmá-la.
– O que houve com o meu filho?!
– Calma. – disse Beatrice. – Você não está bem.
– Cadê ele?!
– Alice descansa.
– Fala aonde ele está agora! – gritou Alice.
– Ele morreu.
Beatrice então se levantou e saiu do quarto, deixando ela gritar desesperada após saber que mais uma pessoa próxima tinha morrido.
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