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Prisão de Sangue e Âmbar - Bokuto

Este conto é voltado para o público adulto conforme orientação etária estipulada na sinopse, este perfil repudia qualquer tipo de ato com cunho abusivo, manipulador ou que corrobore um ato criminoso. É uma obra ficcional inserida num contexto de situações extremas, alguns temas tratados podem ser de natureza sensível.

Alertas para: Sangue, Abuso, Mortes, Bloodplay, Palavras de Baixo Calão.

Par: Bokuto Koutarou

Entre o descer do trem e o caminhar para a saída, apareceu um denso e frio nevoeiro que tentava me engolir até a alma, se rastejando sobre o piso velho da estação de trem como um inseto asqueroso.

No relógio enferrujado de ponteiros grossos e pesados marcava oito horas, talvez alguns minutos a mais, impossível de saber já que as marcações estavam gastas. Sobre a minha cabeça no céu noturno densas nuvens de chuva se revoltavam, trovões e raios cortando por elas violentamente.

Tive esperança de que pelo menos que a mente inútil do meu primo tivesse a decência de lembrar que o dia de hoje marcava a minha chegada.

Minha mudança e nova vida.

Bem a tempo, antes que a chuva despencasse sobre o telhado judiado da estação uma figura apareceu, esguia com os cabelos alinhados um grosso casaco e luvas para se proteger do frio. Apressado, subiu os degraus vindo de encontro comigo.

— Está tão frio! Como pode não estar tremendo? – perguntou meu parente observando a fina jaqueta que levava nos ombros.

— O ódio cultivado nessa meia hora de espera me manteve quente o suficiente – cerrei os olhos em sua direção, vendo a culpa passando por eles em seguida. Coçando a cabeça num sinal de culpa meu primo se apressou em pegar as minhas malas enquanto se desculpava com uma voz branda.

—Os garotos da escola insistiram para que eu ficasse apenas mais um pouco, e eu achei que viria apenas no próximo trem.

Ajeitei a mochila nos braços trêmulos de frio, o vento úmido agora parecia ainda mais intenso. Coloquei as mãos dentro dos bolsos enquanto observava meu primo colocar as malas cuidadosamente no porta malas do carro.

—O plano original era vir no próximo, mas sua mãe me avisou que deveria vir antes pela chuva.

—Isso é verdade – concordou e continuou a falar – Estamos com essa aparente tempestade se aproximando desde a semana passada, a cidade inteira está em alerta para o que pode vir a acontecer.

Ele parecia um tanto cauteloso sobre as palavras de escolha e talvez falando mais para si mesmo do que para mim.

—E o que pode vir a acontecer?

Lançou um olhar nervoso e um sorriso falso, antes de se aproximar e me envolver num abraço de boas-vindas – Nada com que deva se preocupar, muita chuva depois muita neve e uma cidade inteira bagunçada. – Se afastou para que pudesse me olhar nos olhos mantendo as mãos apoiadas nos meus ombros.

—Você cresceu, não usa mais aparelho. Não se parece em nada com a [Nome] que eu tenho nos meus pensamentos.

—Claro a lembrança que você tem é de dez anos atrás de um verão repleto de alergias – bati em sua mão seguindo para o lugar do passageiro apenas parando para ver que ele seguia para o lado do motorista – Em compensação você parece o mesmo garoto de sempre Akinori, exceto pelo aparelho de borrachas coloridas.

—Era moda tá legal? — apontou em minha direção por cima do teto do carro — Agora me lembro o quanto eu te odeio, pode voltar para sua casa.

Bom, isso era de fato uma coisa que nunca mais aconteceria porque eu já não tinha uma casa para voltar. As palavras que deixaram a boca dele pareceram ser registradas logo em seguida, culpa dançando por seus olhos até que a boca tentasse proferir uma desculpa.

—[Nome] não é...

—Eu sei.

O interrompi e entrei no carro mantendo o olhar fixo num penduricalho próximo ao espelho do motorista, que com certeza deveria pertencer a minha tia, irmã de meu pai. Provavelmente a única parente próxima e com disposição o suficiente para receber uma sobrinha recém órfã em sua casa.

Não conheci minha mãe, dizem as histórias que ela simplesmente fugiu depois de eu nascer e meu pai já nos seus anos avançados de vida ficou com a missão de me criar sozinho. Guiar, ensinar, encontrar tempo para ser pai e mãe enquanto dividia atenção com o trabalho de escrivão no jornal da minha cidade natal.

Um herói, foi essa a manchete na primeira publicação depois do incêndio, o prédio antigo fora completamente reduzido a ruínas após um curto circuito na fiação. Meu pai voltou para ajudar uma das moças mais jovens que trabalhava com ele e nesse ato de compaixão acabou se complicando, ficou por alguns dias internados com sérios problemas causados pela fumaça e no fim não aguentou. Partiu desse mundo enquanto segurava minha mão e o sol se punha pela janela.

Pousei a cabeça contra o encosto já que meu primo se colocou a dirigir o veículo familiar em direção a casa, bem agora seria nossa casa. A cidade da minha memória era pacata, não tinha muitos prédios — salvo os comerciais que ficavam no centro da cidade – e nem muitos habitantes. O clássico cenário de interior.

—Não parece que houve muitas mudanças por aqui.

—Bom, nessa parte não – a minha pequena fala foi interpretada como um sinal de desculpas dando brecha para que Akinori desatasse a falar – Mas uma família rica se mudou para cá a uns oito anos, empreiteiros, empresários, o que você quiser chamar. Trouxeram bastante prédios novos, shopping, lojas deram emprego para muita gente.

—Isso sim é surpreendente, achei que a única diversão que teria por aqui era de jogar pedras no riacho. Não era isso que fazíamos?

—No lago – corrigiu – Mas sim, não tínhamos muito o que fazer antes. Mas de qualquer forma, se quiser algo mais diferente, a próxima cidade está a uma hora de distância.

—Claro, afinal você cruza esse lugar inteiro de ponta a ponta em quinze.

—Não seja tão ruim, garota da cidade – Konoha parou o carro no cruzamento esperando um outro veículo passar – quarenta minutos, dê um pouco mais de credibilidade para meu lar.

Não pude esconder a risada que escapou da minha boca

– As nuvens se dissiparam um pouco – comentei observando pela janela. O céu permanecia aberto apenas numa parte deixando uma bonita lua crescente quase cheia à mostra. Seus raios prateados atravessando pela massa densa iluminando alguns locais da cidade com uma luz pálida.

—Diria que é um belo "boas vindas".

O caminho não se prolongou por muito tempo, a residência cor creme e telhado marrom logo entrou no meu campo de visão. Os dois andares de erguiam elegantemente ao fim do quarteirão, dava para ver uma chaminé e as luzes da sala acesas revelavam uma figura feminina e familiar espiando pelas cortinas.

Mal tive tempo de andar até a porta antes de receber o afago caloroso de minha tia, a mulher era mais baixa do que eu mas mesmo assim me tomou pelos ombros com tal força que não tive outra opção a não ser me curvar para responder seu afeto.

—Que bom que chegou bem, e antes da tempestade. Você está gelada [Nome], pelos céus venha! Ande logo, tome um banho quente e vá se esquentar junto a lareira.

—Normalmente eu não aceitaria tão fácil, mas hoje me parece uma boa.

—Pare com isso menina – me deu um tapa de leve no ombro, gritando para meu tio que estava escorado a porta – Ajude Akinori com as malas sim? Querida onde estão suas roupas quentes?

—Na mala amarela – comentei antes de espirrar e ter um calafrio me percorrendo o corpo. A minha nova moradia ficava nas imediações do rio então por natureza era mais fria, o fato de também estar próxima a floresta que cercava todo o condado também ajudava nisso.

Meu tio se aproximou em silêncio apesar de manter um sorriso no rosto, não parecia ter envelhecido um ano sequer, a única coisa diferente sendo os fios de cabelos tomados por um tom grisalho. Os óculos quadrados ainda tinham a mesma armação que eu me lembrava, sem barba, o rosto levemente quadrado e uma feição calma.

Beijou o topo da minha cabeça antes de ir até o veículo e tirar a dita mala amarela – Aqui está. Podemos ir.

—E o restante? – perguntou Akinori ao pai – Não quer que eu carregue tudo sozinho.

—Você esqueceu de pegar sua prima na estação de trem – respondeu o mais velho – Considere uma punição, se sua mãe não tivesse mandado uma mensagem é capaz que [Nome] ainda estivesse lá. No frio.

A indignação dele se desfez e sem continuar a conversa meu primo voltou a atenção para o carro murmurando algo inaudível, completamente destruído pelo argumento do pai.

A casa tinha um cheiro quente – se é que isso era possível – as poltronas de veludo da sala de estar eram a primeira mobília à vista acompanhadas de uma pequena mesa próxima a escada que levava ao andar superior. A cozinha ficava ao lado direito depois da sala de jantar.

Minha tia me guiou pelos corredores ainda com o braço enganchado ao meu. Reclamando como Akinori tinha apenas uma coisa para se lembrar e ele se esqueceu.

—Costumava ser apenas um quarto de visitas, não sei se você se lembra – a mais velha colocou a mão para abrir a última porta do corredor do segundo andar – Mas reformamos assim que soubemos que viria.

A madeira rangeu um pouco no momento que abriu, mas o quarto que me foi doado era mais do que arrumado. Uma cama grande no meio encostada na parede oposta a entrada, do lado direito uma janela quadrada e do outro uma porta balcão que dava acesso a sacada compartilhada com Akinori. Meu primo era meu vizinho de quarto.

—Pensamos em reformar o escritório que tinha um espaço maior, mas achei que um banheiro só pra você seria mais interessante.

—Com certeza – comentei – Não se preocupe, é perfeito e aconchegante.

—Que bom que gostou – comentou colocando a mão no meu rosto – Se ajeite e desça para comer e se esquentar, depois de ficar tanto tempo no frio o que menos precisa é pegar um resfriado.

—Isso eu concordo – meu tio pousou a mala no chão – Akinori vai deixar o restante no corredor, pode ficar tranquila e relaxar.

Agradeci os dois adultos mal esperando para me colocar debaixo da água quente e tirar todo aquele cansaço de viagem, joguei a mochila num canto qualquer e revirei a mala até que achasse roupas confortáveis. Ainda no quarto tinha uma penteadeira e um pequeno closet embutido na parede.

O banheiro era simples, mas mesmo assim impecavelmente limpo, os azulejos tom de cinza estavam suados por conta do frio, boa coisa é que o quarto inteiro estava quente devido ao aquecedor que ficava próximo a porta sua onda de calor se entendendo até onde estava.

As roupas caíram ao chão e a água quente bateu contra a minha pele como um açoite. Queimava, ardia, e eu tinha esperança que com isso levasse embora todas as burocracias que tive que cuidar desde o enterro, a sensação de praticamente morar dentro de um hospital os olhares de pena e os sentimentos sem sentidos. Se fosse para começar uma vida nova que fosse limpa, por dentro e por fora.

Assim que me aconcheguei dentro de uma blusa larga de lã e calças igualmente grandes desci as escadas para encontrar o resto de meus parentes. Passando pelas malas cuidadosamente alinhadas à porta do meu novo quarto. O cheiro de comida caseira alcançando meu nariz fazendo o monstro dentro da barriga se revirar em deleite.

Pai e filho arrumavam os talheres enquanto os pratos fumegante de cores vibrantes eram postos sobre a mesa pela dona da casa – Bem na hora, podemos todos desfrutar de uma bela refeição.

Sentamos em pares, apesar da mesa ser para oito pessoas, meus tios se sentaram um ao lado do outro comigo e com meu primo a sua frente. Ninguém na ponta da mesa.

—Por favor se sirva do que quiser – disse o homem, lançando um olhar ao filho que não esperou uma segunda ordem.

—Estamos felizes que está aqui [Nome], apesar das circunstâncias.

Sorri de leve, mas um genuíno — Estou feliz de estar aqui e sou grata por terem me aceitado.

—Faríamos o que fosse necessário – os dedos finos da minha tia alcançaram os meus em cima da mesa apertando de leve provendo algum conforto. Ela se levantou em seguida me servindo de todas as delícias que tinha preparado, ela era uma exímia cozinheira. Disso com certeza me lembrava.

—Sei que hoje é sexta e provavelmente deveríamos deixar para amanhã – meu tio pousou os talheres por alguns minutos. – Mas te matriculamos na mesma escola de Akinori, as aulas começam na segunda.

Quase me deixei vacilar, tinha até me esquecido que ainda tinha quase um ano letivo para concluir a escola. Parecia séculos que eu não pisava em uma.

—Tudo bem – respondi – Preciso fazer alguma coisa? Quero dizer ir até a lá ou algo do tipo.

—Sim, na verdade seria bom você dar uma passada na secretaria e pegar algumas informações com o diretor.

—Akinori tem treino amanhã não tem? Pode apresentar a escola para [Nome]. Aposto que o diretor também estará por lá, quem sabe já faz alguns colegas?

—Não duvido, aquele velho não sai da escola. – meu primo resmungou – Mas não sei se é algo interessante... Quero dizer,  ela não deveria sair para algum lugar mais descolado?

—Está reclamando filho?

Akinori direcionou o olhar para um pedaço de frango – Não, foi só um comentário – o rapaz engoliu seco – Farei isso.

—Ótimo.

Depois de jantar e comer até mais do que o meu corpo permitia, subi para o quarto a fim de ajeitar as coisas. Recebendo logo depois a ilustre companhia de Akinori que se fez muito confortável na minha cama.

— Você simplesmente invade o quarto dos outros assim? – questionei.

Ele abraçou um dos travesseiros fofos – Não, eu entro no quarto das pessoas que eu conheço assim.

Revirei os olhos voltando a minha tarefa de guardar as roupas no armário, entre pendurar e dobrar um casaco ou blusa me lembrei de comentar com ele um detalhe.

—Sua mãe falou de treino, treino do que?

Um resmungo longo foi dado até que ele se sentasse sorrindo – Vôlei.

Olhei para a figura dele, não era o porte de alguém que gritava a prática do esporte. Quero dizer, geralmente os homens eram altos, fortes, cheios de músculos e Akinori... Era ele, o pensamento pareceu ser explícito pois ele lançou o travesseiro na minha direção.

—Idiota, eu sei o que você está pensando – respondeu ficando de pé no colchão erguendo a própria blusa do pijama – Eu tenho músculos está vendo?

Apontou para o próprio abdômen e os famosos gomos que se formavam nele, tímidos mas presentes, apenas ri em resposta – O que você espera que eu fale? Parabéns? Só não achei que é sua cara, não estou duvidando das suas capacidades físicas.

Coloquei o travesseiro embaixo do braço decidindo que guardaria o restante das vestimentas no dia seguinte, fechei as portas de madeira e andei até onde ele estava – Se você quebrar a minha cama nova, sua mãe não vai ficar nada feliz.

Imediatamente ele se sentou e o empurrei para o lado ganhando algum espaço, a melhor decisão foi de ter escovado os dentes assim que subi. Me aconcheguei embaixo das cobertas grossas e suspirei encarando o teto.

Akinori me cutucou de leve – Eu não sei o que está pensando, mas vai ficar tudo bem. Agora que está aqui, é sua casa também.

—Sei disso, mas de alguma forma minha mente ainda acha que é por apenas alguns dias e não por uma vida inteira. Mesmo na casa antiga ainda esperava ver meu pai bater na porta do meu quarto com uma xícara de café, ou recitar um trecho de notícia enquanto fazia o jantar.

As lembranças do nosso pequeno apartamento na cidade me invadiram, uma saudade que sabia que seria eterna – Só preciso de tempo para me acostumar.

Meu primo pareceu entender pois se deitou do meu lado – Você sempre tinha pesadelos quando dormia aqui na primeira noite. Então vou ficar com você.

Senti meu rosto esquentar e me virei de costas para ele – Eu era pequena, é natural.

Sua voz se rompeu numa gargalhada melodiosa, alcançando o interruptor para apagar a luz em seguida — Boa noite [Nome].

O outro lado remexeu indicando que ele também tinha se esparramado embaixo das cobertas, apenas balancei a cabeça e fechei os olhos na esperança de que realmente fosse verdade.

A tempestade que pareceu se afastar no momento que eu cheguei castigou a cidade durante a madrugada, acordei com as gotas de chuva se chocando contra a  janela e trovões tão violentos que até os vidros tremiam. Meu primo já não estava mais na cama, deveria ter ido para o próprio quarto durante algum ponto da noite. Tinha uma luz entrando pela janela por conta da cortina aberta e o vento dava a impressão que uma pequena fresta estava ali, já que um som agudo cantava pelo quarto silencioso.

Mesmo sem ter vontade, levantei. Tendo o choque do frio noturno contra o meu corpo quente, andei até a janela a empurrando para que o fio de espaço se fosse. Não tinha visto antes mas a vista era para o pequeno jardim da casa e além dele apenas a floresta, densa coberta pela escuridão, o topo das árvores farfalhavam com vigor. De alguma maneira estranha quanto mais eu encarava aquele manto de sombras, mas prestava atenção sentindo-me atraída.

O coração acelerado quando colocado à frente do vazio, batendo aos meus ouvidos sobressaindo o barulho traiçoeiro da tempestade. Sentia como se o nada estivesse me encarando de volta, espreitando raspando suas garras finas contra aquele mesmo vidro fino que nos separava.

Engoli seco olhando mais atentamente, até que um trovão iluminou o céu e por um único segundo me deu a visão do que me cercava. Não havia nada.

Virei-me apenas para dar um pulo de susto, bem atrás de mim minha tia estava parada com uma coberta nos braços. Ela também se assustou comigo se desculpando em seguida.

—Achei que tinha me ouvido entrar — comentou quase num sussurro — Acabou a energia, imagino que vá precisar de uma camada extra.

—Certo — me recompus engolindo seco lançando um último olhar para o lado de fora antes de fechar as cortinas de vez. — É essa a tempestade que me disse? Parece uma chuva forte mas não sei se é tão preocupante.

A mais velha pareceu mirar o pano que agora nos separava da visão de fora — Essa é apenas uma chuva. A tempestade se estende por dias, é violenta e arrebata tudo que tem na frente.

—Não houve um ano onde pessoas não desapareceram, é como se tudo se tornasse diferente. Sabe que não nasci aqui, seu tio sim. Mas mesmo assim todos os anos essa mesma época eu me sinto estranha como se estivesse prestes a desaparecer.

Não sei se eu realmente deveria ouvir aquilo ou se foi um pensamento profundo que escapou dos âmago da mais velha, mas de qualquer forma ela me estendeu a coberta extra desejando uma boa noite em seguida. Voltei a me deitar ainda prestando atenção no som da chuva com as palavras da minha tia cravadas na minha mente.

O restante da madrugada não foi tão agradável quanto a primeira metade dela, meu sono foi agitado mal consegui me fazer confortável e a sensação de ter algo mirando a mesma janela do lado direito me acompanhou até que o sol nascesse. A chuva ficou fraca e se dissipou antes mesmo disso acontecer. Tomei tempo para me arrumar, talvez até mais do que o de costume, enrolando e ganhando tempo para descer.

Ainda era inegavelmente cedo, mas pelo menos o barulho de outras pessoas acordadas na casa já era presente. Encontrei Akinori no corredor andando como um zumbi, passos lentos cambaleantes escorando na parede como apoio, passei por ele e os olhos estavam praticamente fechados.

—Não dormiu bem? – perguntei, recebendo em resposta apenas um aceno de mão e um bocejo.

Acho que meu primo não era uma pessoa de manhãs, assim como na noite anterior minha tia havia preparado um belo café, havia bolos, pães, chá. De tudo para que pudesse escolher e me fartar.

Mas não tomamos muito tempo, afinal meu primo tinha treino, do recém descoberto time de vôlei, e eu teria que o acompanhar. Seguindo as minhas suspeitas o carro era realmente da minha tia Mas depois de o bater a apenas algumas semanas atrás ela tinha ficado com um pouco de receio de dirigir de novo, então a fim de não deixar o motor parado Akinori estava desfrutando do veículo.

O céu estava cinzento, ruas e casas lustrosas ainda por conta da chuva já não tiveram tempo de secar. A manhã era congelante condensando minha respiração em espirais brancos quando soprei minhas mãos na tentativa de as esquentar, agora parecendo uma pessoa de verdade meu primo me lançou um par de luvas.

—Podemos passar em algum lugar e comprar uma pra você depois – ele bateu de leve no para-brisa tirando uma fina camada de gelo dele em seguida.

—É uma boa ideia.

Na noite anterior não consegui ver por conta da penumbra mas agora com o dia claro, realmente parecia uma cidade mais desenvolvida. Pequena, claro. Mas melhor do que antes.

Foram apenas quinze minutos até o prédio de tijolos vermelhos aparecer no meu campo de visão. Era uma escola grande e se não me enganava havia algumas outras na cidade, mais duas ou três talvez, no estacionamento tinham alguns carros e ao lado dele ficava um campo de futebol com arquibancadas.

Os prédios atrás dele eram os ginásios, Akinori me acompanhou até a dita secretaria depois de subir dois pequenos lances de escadas.

—Srta. [Nome]! – um homem magricelo, calvo, de nariz pontudo e olhos fundos me cumprimentou com uma alegria não condizente com sua aparência. Estendendo a mão rapidamente em seguida. – Sou o Diretor Herbert, é um prazer a ter na nossa escola.

Olhei para meu primo confusa mas logo agradeci – Obrigada diretor, meu tio comentou sobre uns documentos.

—Certamente – bateu no pequeno balcão de madeira antes de apontar na minha direção – Homem muito íntegro seu tio.

O diretor se afastou sumindo dentre algumas prateleiras empoeiradas ainda resmungando, talvez coisas apenas para que ele ouvisse, não nós.

—Aqui está – bateu uma pasta amarelada teatralmente na minha frente – Seus horários e demais informações. Não consegui te deixar na classe do seu primo, suas notas merecem uma classe mais avançada, talvez devesse considerar alguns clubes.

—Vou pensar sobre isso – tomei a pasta rapidamente da mão dele me virando para Akinori em seguida – Vamos para seu treino?

Cada segundo na presença do diretor me incomodou, ainda sentia ele mirando o olhar nas minhas costas, assim que viramos para descer vi que o homen estava parado ao lado da porta apenas nos observando, parado estático como uma aparição. Qual é o problema dessa cidade que parece ter olhos em todos os lugares?

O ginásio pelo menos tinha um clima mais agradável, já tinha alguns garotos por ali que se apresentaram gentilmente quando cheguei.

—Você disse que ia buscar sua prima mas não disse que era gostosa.

Akinori bateu na parte de trás da cabeça do líbero pelo comentário, o mesmo disse para que eu o chamasse de Komi. Os outros amigos do meu primo eram Washio e Saru, tinham mais alguns rapazes por perto também, mas eles apenas me direcionaram um aceno de cabeça. O ginásio tinha arquibancadas e algumas pessoas por ali, para assistir ou apenas matar o tempo.

Conversamos por alguns momentos até que o treinador começou a os reunir.

—O capitão não está aqui

—Nem Akaashi.

Meu primo colocou a mão na cabeça – Fala sério, aquele cara sempre se atrasa... [Nome] você pode ficar nas arquibancadas só tome cuidado com os cortes. Às vezes eles voam.

—Tudo bem — Peguei a bolsa de meu primo e me sentei mais ou menos no meio mas mesmo assim um pouco próxima a entrada.

Quando o time estava reunido pronto para começar a porta abriu e com ela passaram dois garotos, um deles tinha os cabelos escuros como a noite e feições  elegantes. O outro era mais alto andava de um jeito imponente e tinha surpreendentes cabelos cinzas. Retomando a minha comparação da noite anterior, ele sim seria o arquétipo perfeito do jogador de vôlei.

Enquanto encarava a figura, que era excepcionalmente deslumbrante, meu corpo resolveu me trair forçando a espirrar de repente.  Vestígios do frio que passei na noite passada.

Os dois ainda estavam por perto então as cabeças viraram automaticamente e dois pares de olhos intensos encaravam como se estivessem prontos para perfurar a minha alma.

Não prestei atenção no segundo, o que me segurou foram os olhos dourados do primeiro que brilhavam tanto que eu diria que até tinham luminescência própria, um ouro puro e cintilante. O rapaz manteve o olhar fixo, me encarando de volta e por alguns segundos senti a minha própria presença ficar pequena tamanha força que eles exerciam.

Nessa luta me forcei a desviar, abençoado fosse meu primo por chamar a atenção dos dois, disseram algo entre eles e se afastaram. Só então me vi no direito de respirar, podia ser um aluno mas a autoridade que emitia dele era absoluta.

Abracei a mochila de Akinori ainda mais forte contra o peito, não que fosse ajudar em alguma coisa, e enfim o treino deles teve início. A maioria das pessoas que estava ali parecia estar matando o tempo pois iam e vinham com constância, apenas duas figuras se mantiveram e prestaram atenção no treino. Uma em especial comentava avidamente as jogadas enquanto a outra mantinha um livro no colo e apenas concordava casualmente.

—Aki você é ruim! – exclamou se jogando sentada ao lado da outra recebendo um dedo do meio em resposta ao meu primo. Aparentemente eles recebiam as instruções para a última parte do treino.

—Ótimo, agora você está chamando atenção – a morena ao lado dela disse. As duas olhando para mim em seguida, sem um segundo pensamento a castanha veio na minha direção.

—Nunca vi você aqui, mas está com a bolsa do Aki. Aquele perdedor finalmente arrumou uma namorada?

Engasguei com a fala dela rindo em seguida e balançando a mão em negação – Não, somos primos. Só vim acompanhar.

A boca carnuda dela se retorceu deixando à mostra uma fileira de dentes, os olhos brilhante e castanhos também tinham um tom de dourado iluminado entrelaçado aos tons de mel. Não tão intensos quanto o do garoto de antes, mas mesmo assim similares.

—Então você é a prima misteriosa? Soubemos de você, mas ele não disse absolutamente nada.  – ela estendeu a mão - Tess Smith

—[Nome] Heroux – apertei sua mão.

Algum pensamento pareceu cruzar sua cabeça por ela ficou quieta por um segundo antes de se sentar ao meu lado – Heroux... Nunca ouvi esse sobrenome.

—É da minha mãe – respondi, ela fugiu depois de me registrar um único pedido feito ao meu pai antes de sumir de nossas vidas. Embora naquele momento ele não soubesse desse fato. – Smith não parece o tipo comum por aqui também.

—Essa cidade é uma mistura estranha de Ásia e Europa. Mas é o que a torna especial – ela se apoiou no degrau atrás de nós esticando as pernas para frente — Você entende de vôlei?

—Não mais do que mostram na mídia – um suspiro um tanto quanto derrotado deixou sua boca quando dei o meu posicionamento – Desculpe.

Balançou a mão dispensando a minha fala – Não tem problema, já que está aí sozinha porque não se junta a nós?

Ao mesmo tempo que me deixava nervosa ficar com desconhecidos de repente o pensamento de parecer mal educada também se fez presente. A garota parecia conhecer meu primo e talvez no momento isso foi mais do que suficiente para que aceitasse seu convite.

Ainda na mesma posição de antes a acompanhante dela apenas ergueu os olhos do livro para dar um meio sorriso na minha direção, os cabelos ostentavam cachos largos e perfeitos que caiam como uma cascata. O rosto não era nem fino nem largo mas mesmo assim era de uma beleza excepcional, os olhos verdes de um tom vibrante e incomum com certeza eram um diferencial.

— Lianna Glamdring — se apresentou antes de retomar a leitura.

Apesar de estar ali não mantivemos uma conversa extensa por muito tempo já que Tess falava constantemente sobre o treino enquanto nós duas apenas ouvíamos seus apontamentos. Era interessante de alguma forma e em algum ponto me fez questionar sobre o porquê dela mesma não estar jogando. E quando perguntei a resposta foi imediata.

—Já joguei a muito tempo, hoje apenas aprecio. De qualquer forma, o restante das meninas da escola estão ocupadas demais em tentar foder com os jogadores.

—Tess – o tom da morena foi de aviso, pela primeira vez ela desviou o olhar do livro por completo, o fechando e guardando na bolsa em seguida. 

—Não estou mentindo e sabe disso.

—Imagino que isso não se aplica a vocês então?

O tom de horror se instalou no rosto da castanha – Não, de jeito nenhum. Somos irmãos, bom quase uma matilha por assim dizer. E ela já tem o jogador dela para foder de qualquer jeito.

Lianna, jogou a alça da bolsa pelo ombro claramente desaprovando o jeito de falar de Tess, embora ela tenha ignorado completamente a fala da castanha seu rosto estava levemente corado.

—Ela namora o levantador – me disse baixinho após a amiga já estar a alguns passos de distância.

Realmente não sabia muito sobre o esporte, mas era familiar o suficiente para conseguir identificar as posições. Os dois que chegaram atrasados eram respectivamente atacante e levantador, o primeiro sendo também capitão e ace pelo que aparentava já estava sempre com a vantagem nas jogadas.

Mesmo de longe, com a roupa de treino pude ver as coxas grossas e os ombros largos. No treino em si sua personalidade era alegre bem menos intensa daquela que tinha visto quando entrou. Desci as escadas acompanhadas da garota, apenas para ter um Akinori correndo na minha direção louco para tomar a bolsa das minhas mãos.

—De todas as pessoas justo ela? – me perguntou recebendo um soco no ombro, cortesia de Tess.

—A melhor de todas apenas.

Balancei a cabeça, meu primo disse para me esperar do lado de fora, havia alguns bancos e o time parecia se reunir por ali depois dos treinos. Isso também parecia rotina, pois as duas garotas fizeram o mesmo.

—Geralmente somos três mas Sarah provavelmente se esqueceu de colocar o despertador para tocar.

—E isso acontece com frequência?

—São raras as vezes que ela aparece, para ser sincera — Lianna, completou com um tom de riso.

Pelo horário vi que tinham se passado algumas horas e que estávamos quase no almoço. Algumas vozes se aproximaram revelando o mesmo grupo de antes, agora com a adição dos dois garotos, os olhando de frente pude reparar um pouco melhor. 

O levantador – namorado de Lianna – mantinha uma expressão serena no rosto e assim como ela tinha intensos olhos cor de esmeralda.

Era belo, mas uma beleza calma. Em compensação, o outro andava na nossa direção com um sorriso cativante rindo de algo que algum amigo disse, brilhante, intenso como um próprio astro celeste caminhando por terra. Nossos olhares se chocaram e de imediato um calafrio percorreu a minha espinha se não estivesse escorada contra a parede teria caído ali mesmo.

—Vocês chegaram atrasados e não sabem — Akinori jogou os braços em cima dos meus ombros — Minha prima. A que eu fui gentilmente buscar ontem.

—Depois de deixar meia hora no frio, com inúmeras malas – rebati – Possui mais débitos do que créditos.

Meu parente tombou a cabeça para o lado aceitando o ressentimento na minha fala os apresentando em seguida – Akaashi e Kou. Respectivamente.

O primeiro acenou com a cabeça me estendendo a mão num cumprimento solene depois de se colocar ao lado da namorada. – É um prazer. Pelo menos não era uma mentira, achamos que era uma desculpa dele para sair mais cedo.

—Aparentemente sua credibilidade não é muito boa Aki.

Ele suspirou largando meus ombros e se deixou desmontar no banco ao lado de Tess, uma segunda mão se apresentou na minha frente – Fico imensamente feliz que não seja uma mentira, Koutarou ou como ele disse Kou.

Sua mão era grande e quente, calejada provavelmente pelos anos de treino. Mas eram hipnotizantes ao toque.

—[Nome] – respondi juntando de toda a minha boa vontade para formular uma frase coerente.

—Heroux – Tess comentou olhando as próprias unhas – Sobrenome interessante não?

Koutarou ainda segurava a minha mão com firmeza e a apertou de leve quando a amiga comentou sobre o meu nome soltando em seguida. – Realmente.

A frase ficou vaga no ar, ao mesmo tempo que um vento forte soprou, me forçando a colocar os braços na frente dos olhos. Úmido com uma frieza cortante, cheirando terra e madeira úmida.

—Parece que a tempestade se aproxima – comentou Lianne abraçada pela cintura com o levantador de olhos verdes – Não é melhor adiar o evento da fogueira?

—Qual é – Komi, o líbero reclamou – Arrumamos isso por muito tempo, fazem duas semanas que estamos levando as coisas para a casa do lago e convidando as pessoas.

—Acho que nem daria para desmarcar, é hoje afinal de contas. A propósito está convidada [Nome].

—O que exatamente é isso? – perguntei passando os olhos pelo grupo, sorrisos maliciosos se estenderam pelos rostos dos meninos. Akinori jogou os braços para cima os cruzando atrás da cabeça.

—Não temos muito o que fazer, mas antes da temporada de jogos damos uma pequena reunião na mansão da colina. Fogueiras, bebidas quentes, esse tipo de coisa.

—Às vésperas de uma tempestade tão tenebrosa como seus pais contam?

—Não é tão ruim, está com medo?

Senti a atenção em mim, me sentindo desconfortável e tratando de responder rapidamente um sólido não. Meu primo riu e se levantou, beijou a minha bochecha esquerda antes de avisar para o grupo que precisávamos ir embora, nos despedimos e caminhamos em direção ao estacionamento onde o carro da minha tia nos esperava.

Comentei sobre o treino e ele me disse um pouco mais sobre o grupo. Akaashi apesar de ser completamente diferente era algo como um irmão adotivo de Koutarou, ele fazia parte da família de empresários que se mudaram anos atrás. Tess também sendo uma parente distante ou algo do tipo.

O restante havia nascido na cidade com a exceção de Lianne que tinha se mudado a pouco mais de dois anos. Era um grupo unido pelo que eu percebi, estavam juntos desde sempre.

A conversa continuou pelo caminho inteiro até o almoço, só parou quando me senti sonolenta e resolvi que seria uma boa ideia cochilar na parte da tarde. Já que a madrugada foi um tanto conturbada, abri a janela por alguns momentos deixando o ar se renovar, talvez devesse terminar pelo menos uma das malas que comecei a arrumar na noite passada.

Seria uma a menos para desfazer no dia seguinte.

Coisas básicas de fácil arrumação em dez minutos me livraria dela, me enfiei no fundo do armário empilhando algumas camisetas simples. Uma pequena luz acima da minha cabeça iluminando o estreito local, quando me abaixei para guardar algumas calças numa prateleira baixa, escutei a porta ranger.

—Estou no closet – falei para quem quer que tivesse entrado.

Arrumei as roupas esperando a pessoa se pronunciar, mas não tive resposta. Me levantei vendo que não tinha ninguém no quarto e a porta estava fechada aparentemente da mesma maneira que eu deixei. A cortina balançava em frenesi indicando que talvez fosse o momento de fechar a janela, foi quando eu vi na borda de madeira branca uma marca de mão.

Não tinha reparado se já estava ali antes ou não, de qualquer forma eram alguns metros entre a minha janela e o chão do quintal. Provavelmente era uma impressão que ficou gravada ali durante a reforma.

Fechei as cortinas cessando a iluminação e me enfiei debaixo das cobertas para uma tarde de descanso. Os olhos pesaram, minha respiração se tornou lenta e pouco a pouco senti me afundar nos braços do sono.



As vinhas me rasgavam a carne, enquanto fazia um caminho dentro da densa floresta para que pudesse escapar. Corvos cantando mau presságio e lobos uivando famintos a distância, rompendo a sufocante noite coberta de sombras.

Escutava ruídos, rugidos, tão horrendos que até mesmo o mais sábio e corajoso dos homens temeria. As pernas latejantes se impulsionavam para a frente movidas apenas pela força de vontade, a camisola branca não servia de proteção contra o frio e tão pouco me cobria o corpo que era violentado pelas folhas e galhos afiados.

Encurralada pelo ambiente, a própria floresta parecia caçoar de mim, maliciosa como um deus cruel apostando com uma vida humana. Raízes se enroscaram nos meus pés fazendo com que fosse de encontro ao chão coberto de musgo envelhecido, folhas e restos de mata podre. O brilho prateado da lua alcançava a minha pele fria e coberta de arranhões.

Os uivos se aproximaram e presa até os joelhos, não vi outra opção senão deixar que os lobos devorassem minha carne até os ossos. Patas pesadas bateram contra o chão e antes que pudesse perceber meus olhos estavam fechados, o ar a minha volta dançando pela nova presença. Talvez se eu fingisse que estava morta fosse embora e me poupasse de partir deste mundo ainda esta noite.

Um grunhido bem abaixo do meu ouvido e um ar quente saindo da boca da criatura bateu contra a lateral do meu rosto, as patas me circularam ficando bem acima do meu corpo. Roçando uma pelagem úmida contra o fino tecido da camisola, as patas da frente uma de cada lado da minha cabeça, espiei por um segundo a pelagem cinza reluzente do lobo que carregaria minha morte entre os dentes.

Mais uma vez se aproximou do meu pescoço, que a mordida fosse forte o suficiente para me matar de uma única vez e não me deixar agonizando sangrando até o fim, o rosnado me fez fechar os olhos ainda mais fortemente apenas esperando para que o meu fio da vida se desfizesse. Mas contra a minha pele algo frio foi depositado, como uma gota de chuva fresca, tendo proferido contra ela um murmúrio rouco.

—Minha.



Levantei num pulo, levando as mãos à cabeça. Batidas insistentes na porta me fizeram andar até ela ainda com as pernas bambas.

—Finalmente! – disse meu primo – Se quiser ir comigo na fogueira vou sair em trinta minutos, o que deu em você para dormir a tarde inteira?

—Não sei. Deve ser cansaço – minha voz soou rouca como se eu tivesse gritado por horas e mais horas. Tossi algumas vezes – Me dê alguns minutos.

Voltei a fechar a porta me escorando nela em seguida, levei a mão ao pescoço a sensação do sonho ainda se agarrando ao meu corpo. Peguei algumas roupas quentes e rumei para o banheiro esfregando a minha pele com vigor, quando saí dele já vestida estava um pouco melhor.

Saímos da residência sobre uma série de avisos da minha tia, e meu primo se defendendo avidamente sobre o fato de já saber tudo que ela estava falando. Não partimos em direção a cidade como na parte da manhã, mas sim pegamos uma estrada velha que seguia ainda mais adentro da montanha. Já era bem de noite julgando pelo ambiente escuro, realmente dormi por um bom tempo.

Foi um pouco menos de vinte minutos até que Akinori estacionasse o carro numa campina iluminada por tambores de lenha, bem mais à frente uma enorme fogueira se erguia e ao redor dela diversos jovens pareciam conversar e beber. Salvo os que estavam aproveitando um outro tipo de calor para se aquecerem.

O grupo dos amigos do meu primo estavam um pouco mais distantes do fogo num lugar estratégico próximo às bebidas e contra o vento. Assim não pegariam fumaça e também estavam servidos de assentos feitos de madeira.

—Sarah – meu primo exclamou – Pelo menos da fogueira você se lembrou.

—Porque eu fui buscar ela em casa – Tess disse antes de virar um copo com uma bebida cor de vinho na boca, deixando sua boca pintada de vermelho carmesim.

— Não briguem comigo – respondeu a figura que eu não conhecia, mas que já havia sido mencionada algumas vezes. A garota parecia simpática tinha o rosto e nariz corados pelo frio, na cabeça o gorro de lã abraçava os cabelos em ondas – Você deve ser a [Nome], é bom te ver.

— Digo o mesmo – respondi com um sorriso me simpatizando com ela que parecia ser o alvo e zombaria do grupo. Todos eles estavam bem agasalhados, o que me fez pensar de não deveria ter mantido o cachecol no pescoço ao invés de o descartar no último segundo.

Não vi Kou ou Lianne a princípio, mas logo os dois se aproximaram com bebidas na mão.

—Parece que agora estamos com a turma completa – Komi comentou – É bom passar o tempo assim.

O capitão do time me lançou um sorriso antes de erguer o copo na minha direção – Não sei o que é exatamente mas é bom — Agradeci e mantive a bebida na mão, Kou se ajeitou do meu lado alguns dos outros garotos preferindo ficar de pé, não dava para se esperar muito de uma reunião como essa.

Afinal eram um bando de jovens loucos para desfrutar de alguma libertinagem.

—Veja só se não são as florezinhas do vôlei – um bando de aproximou, eram garotos altos, todos bem troncudos e mau encarados – Vimos as moças se reunindo de manhã, com uma coisinha muito mais interessante.

Senti o olhar deles cair sobre mim, e me encolhi imediatamente mantendo o olhar no copo entre as minhas mãos.

— Saia daqui Trevor – Tess disse – Não tem uma única pessoa aqui que aguente ficar mais de dois minutos perto dessa sua boca podre.

—E a vadia fala – respondeu a encarando com ódio voltando antes de voltar o olhar para mim — Só viemos checar a carne nova, e me parece deliciosa.

— Tess já disse, vá embora Trevor – Kou virou o restante da bebida na boca – Ela não é do tipo que se mistura com a sua raça vira lata.

O garoto avançou na direção do capitão, apenas para ser prontamente confrontado. Um era tão alto contra o outro e ali na minha frente pareciam duas montanhas prontas para se chocar, Akaashi se adiantou colocando a mão no ombro do irmão adotivo.

—Não vale a pena, apenas vai desencadear problemas desnecessários.

—Precisa sempre da sua fadinha por perto para puxar sua coleira – ele disse empurrando Kou para trás – Podemos resolver isso aqui, e agora.

—Em grupo com o seu bandinho te dando suporte, quero ver se tem a mesma coragem quando está sozinho. – o dono dos olhos cor de ouro empurrou Trevor de volta.

Olhei para o grupo que não parecia se importar com a cena, seria uma coisa rotineira? De trás dos adversários uma garota saiu como se estivesse abrindo alas.

—Por favor não briguem por mim, posso ser dos dois. Até ao mesmo tempo se quiserem.

—E lá vem a puta. – Tess comentou alto o suficiente para que todos ouvissem – Como se alguém fosse querer restos mastigados.

—Seu ex namorado quis – a garota retrucou com um sorriso venenoso.

—Por uma noite, parabéns. Não deve ter sido tão bom assim.

A tensão estava quase palpável mas por sorte, alguém bêbado o suficiente começou a bradar palavras enquanto dava voltas ao redor da fogueira. Pedia por histórias de terror e voluntários.

O grupo odioso por fim se afastou, mesmo que um pouco contra a vontade.

—Eu já estava preparada para jogar o meu sapato em alguém – Sarah disse devolvendo por fim o clima mais agradável arrancando risadas do grupo, que voltou a conversar em vozes baixas enquanto um conto era recitado ao redor da fogueira.

Numa noite de penumbra enquanto fazia ronda ao redor da igreja no pé da montanha deparei-me com um som, arrastado e rouco. Quem havia de estar no templo de portas fechadas tão tarde da noite, me escondendo atrás do adro encarei o corredor escuro observando

Por ventura levava comigo uma lamparina, e devagar calando os ruídos dos meus sapatos caminhei em direção ao fundo da igreja, as portas de madeira maciça exatamente como eu as havia deixado, trancadas até o topo. Sorrateiramente pus o ouvido contra a porta o barulho de algo molhado, pingando ou talvez sendo rasgado me alcançando.

Tinha alguém no templo sagrado e sabe-se lá o que estava aprontando, seria um ladrão? Se aproveitando da noite para surrupiar os poucos trocados que os fiéis depositavam na caixinha ou talvez algum desesperado que se escondeu durante a tarde e agora havia se arrependido.

Estando desarmado correria grande risco me apresentando com nada além da defesa das próprias mãos. Na entrada o vigia do dia guardava escondido sobre as pilastras um facão de cabo velho, antigo porém muito capaz de matar um homem, ele dizia. Teria de servir, seria isso e rezar para os mesmos santos desenhados em mosaicos coloridos nos vitrais que, quem quer que fosse não estivesse com uma arma.

Apoiei a fonte de luz no chão, me preparando para abrir as portas e descobrir por fim o que há de se esconder no salão fechado da igreja. Os portais de madeira foram destrancados e empurrados, no chão bem à frente ao púlpito do padre uma criatura de pelos negros e brilhantes se debruçava sobre o corpo já sem vida de uma jovem menina.

Mensageiro das sombras, o filho da escuridão rosnou em minha direção mostrando os dentes pintados de vermelho e restos de tripas ainda grudados ao redor da boca. Lancei a lamparina em sua direção, o óleo se espalhando queimando parte do pelo quando se chocou contra seu enorme corpo.

O fogaréu engoliu os bancos de madeira assim como as cortinas, estava cercado. Ou esperava para morrer queimado ou vinha na minha direção que empunhava com orgulho e nobreza o velho facão. Sem esperar mais um segundo, o grande lobo se lançou contra o vitral deixando apenas a luz da noite e da lua cheia alimentando as chamas que consumiam a igreja, queimando com ela os vestígios do seu crime hediondo.

— Nessa mesma floresta que nos cerca essa grande criatura ainda vive faminta, na espreita na busca de uma jovem bela e virgem para cravar seus dentes e lhe devorar as entranhas – o garoto terminou de contar, bebendo de uma garrafa em seguida – Por isso garotas estou disposto a tirar sua virgindade, assim o lobo mau não vem atrás de vocês.

Balancei a cabeça incrédula pelo final, o mesmo com outras pessoas, afinal lhe lançaram algumas latas e uma série de xingamentos.

—Até que não estava tão ruim – Lianne comentou – Isso é, até três minutos atrás.

—Vou pegar algo para comer – Tess anunciou – Toda essa baboseira me deu fome.

O frio alcançou o meu pescoço, estava estranhamente sensível naquele local hoje. Então me levantei pedi a chave ao meu primo explicando que pegaria o cachecol, não eram mais do que talvez uns duzentos metros de distância mas ficava um pouco fora da visão deles.

Meus sapatos bateram contra o chão de terra, enquanto me afastava do barulho em direção ao veículo. Já tinha muitos outros carros por ali e os mais afastados estavam embaçados pelo lado de dentro, pelo menos algumas pessoas estavam se divertindo.

Abri a porta e me inclinei para pegar a peça de vestimenta que tanto fazia falta, mas assim que virei assustei—me com a figura atrás de mim.

—Koutarou! – coloquei a mão na boca falando mais baixo em seguida – Pelos céus quer me matar do coração?

—Desculpe – ele sorriu – Vi Trevor deixando a fogueira logo depois de você, achei que ele pudesse tentar algo.

O rapaz estava a meio metro de mim se não menos, apenas sua figura no meu campo de visão fazia um sentimento de nervosismo se alojar em meu estômago – Hum, obrigada. Parece que vocês dois tem uma rixa antiga.

—Algo do tipo sim – ele tombou a cabeça para o lado dando um passo para a frente e instintivamente tentei recuar, mas me vi presa entre o garoto na minha frente e o carro. Os olhos cor de âmbar mirando os meus com intensidade Koutarou colocou um braço apoiado em cada lateral da minha cabeça, coração batendo tão forte que mal deixava eu raciocinar.

Erguendo a mão esquerda ele colocou alguns fios de cabelos atrás da minha orelha se aproximando mais ainda. Seu olhar percorreu minha feição parecendo se fixar num ponto específico e franzindo um pouco antes de se inclinar disse — Está sujo.

Kou virou meu rosto lentamente antes de roçar o nariz contra a minha bochecha, foi quando senti algo molhado percorrer a minha lateral. Ele...

—Você me lamb—

Antes que pudesse completar me vi tomada pela boca dele que avançava sobre a minha com certa violência. Uma mão mantendo meu rosto no lugar quanto sua língua quente acariciava a minha de maneira sedutora, a outra apertava a minha cintura me mantendo pressionada contra o carro.

Arfei no momento que ele deixou a minha boca apenas para puxar meu lábio inferior com os dentes e se pressionar mais ainda contra mim. Ele soltou minha boca apenas para distribuir beijos pela linha do meu queixo chegando ao meu pescoço, por mais que tomasse todo o meu controle. Coloquei as mãos em seus ombros o empurrando.

Ele ergueu uma sobrancelha parecendo confuso e quase desisti de falar algo quando o olhar intenso me alcançou. Se achava que eles não podiam ficar ainda mais encantadores acabara de me provar errada.

—Desculpe... – balancei a cabeça – Eu não saio beijando caras no dia que eu os conheço. Ainda mais os amigos do meu primo.

Kou riu melodiosamente – Não tem problema, posso esperar amanhã. Que começa em... Duas horas.

Ele olhou rapidamente o relógio e voltou a sorrir na minha direção.

Pelos céus ele seria a minha morte, e eu não estava fazendo nada para mudar isso. Ou talvez não quisesse.

Arrumei o cachecol no pescoço olhando no reflexo do vidro, na volta ele deliberadamente pegou na minha mão, não perguntando. Apenas agindo como se aquilo fosse normal e estivesse acostumado. O fantasma dos apertos ainda pareciam estar sobre a minha pele.

Voltamos para fogueira onde assim como antes ele se manteve sentado ao meu lado, trocando os dedos entrelaçados por um abraço na minha cintura.

Com exceção de Aki talvez, nenhum deles estranhou a repentina aproximação, não houve um momento nas horas seguintes em que ele não estivesse me tocando; fosse nos ombros, na cintura ou uma mão relaxadamente pousada no meio da minha coxa.

As horas noturnas se passaram, as duas horas para ser mais precisa, e conforme o relógio se aproximava da meia noite eu me sentia nervosa. Podia ser uma fala infundada mas a veemência no tom de voz dele fez juntar-se à minha imaginação os mais variados cenários, e não havia um deles que não acabávamos nus um sobre o outro.

Lianne comentou que iria ao banheiro, então as meninas se apressaram em falar que acompanhariam. Eu por vez também concordei, não tinha prestado muita atenção na velha mansão tomada por cipós e folhas, mas parecia algo como um depósito. Uma única bateria alimentava com energia os dois banheiros no final do corredor, o de frente para a porta do banheiro das garotas, parecia fechado. As batidas ritmadas da madeira e os gemidos imorais eram provavelmente o motivo pelo qual os garotos preferiam se embrenhar na mata.

—Para estar parecendo um porco indo pro abate, só pode ser Megan – comentou Tess — Parece que Trevor demorou demais essa noite.

Kou tinha comentado que o viu sair atrás de mim, mas não me lembro de ter visto o garoto de volta à fogueira. Me apoiei sobre a pia respirando fundo só queria alguns momentos para tentar reorganizar meus pensamentos.

—Ele parece gostar de você de verdade – Sarah se colocou ao meu lado – Se é isso que está pensando.

Ela era um pouco mais baixa que as amigas, e sua personalidade amigável fazia com que todos a adorassem, apesar das zombarias carinhosas.

—Tão pouco para apenas um dia – respondi – Desculpe, sei que é seu amigo.

Sarah riu em resposta e cruzou os braços – Os caras intensos são assim, ficam muito animados ou muito pra baixo com coisas pequenas. A amam com ardor num piscar de segundos.

As palavras ficaram na minha mente, era possível algo como isso realmente acontecer? Não ser apenas um enredo de uma fantasia juvenil e clichê, o estereotipado amor à primeira vista realmente existia? Foi com esses questionamentos que deixamos a mansão, ou melhor elas deixaram já que num momento me vi sendo puxada para uma das salas laterais.

Bati as pernas que estavam no alto e tentei acertar com os cotovelos quem quer que tivesse me pego. Me jogaram contra uma mesa de madeira que rangeu quando meu peso bateu sobre ela, era um dos garotos que andava com Trevor, reconheci pela jaqueta meu atacante.

—Estar andando por aí com esse cheiro é pedir para ser fodida. – ele se manteve entre as minhas pernas enquanto mantinha uma mão na minha boca firmemente me impedindo de gritar.

Os olhos dele se iluminaram na minha direção, não como os verdes brilhantes de Akaashi e Lianne nem o mel cintilante e ouro puro de Tess e Kou. Mas num cinza pálido, uma água turva e suja.

—Aquele cara tentou te proteger, sabe? Mascarando o cheiro dele em você, mas a pequena putinha andou pensando algumas sacanagens não?

A boca dele se aproximou da minha e a única coisa que consegui fazer foi arranhar seu rosto. Ele cambaleou para trás grunhindo e eu me virei para descer da mesa e correr até a porta, mas ele mesmo machucado foi mais rápido me segurando contra a parede pelo pescoço.

—Se estiver inconsciente tudo vai ser mais fácil.

Meus pés não tocavam o chão, minha garganta estava sendo pressionada pelo antebraço dele não conseguindo receber ar. Bati minhas pernas e tentei o empurrar para longe, mas sem sucesso. E pouco a pouco minha consciência foi esvaindo, a porta velha voou para longe assim como o garoto que me sufocava, tentei fixar a minha mão no chão para fazer com que o quarto parasse de girar e ao mesmo tempo, os gritos do lado de fora da casa chegaram aos meus ouvidos de forma distorcida.

Relâmpagos impetuosos atravessando a janela quebrada me deixando ver apenas trechos do que parecia uma briga. Mais vultos entraram e depois do que pareceu uma discussão interminável me vi sendo levantada por um par de braços, cenários embaçados e chuva intensa foram as únicas coisas que minha mente registraram, não consegui identificar para onde estava indo ou quem estava comigo.

Nesse estado de quase transe sentia trechos de lembranças sendo resgatados de uma época à muito já esquecida.

Era um fim de tarde de verão, meu pai penteava meus cabelos com uma escova de cerdas moles enquanto me contava histórias.

—O sobrenome da sua mãe é francês sabia? — disse puxando os fios de leve, não devia ter mais de cinco anos, brincando com um boneco de pano que estava apoiado nas minhas pernas — Mas vem originalmente do Alemão, Hariwulf. Hari para exército e wulf para lobo.

—São inúmeras as histórias que cercam sua origem mas todas elas acabam em lendas de guerreiros noturnos, rainhas Hariwulf que tinham em suas mãos exércitos inteiros prontos para dominar e subjugar territórios inimigos, em prol de proteger suas famílias.

O mais velho puxou meus cabelos para trás os prendendo com um lacinho de cor azul vivo.

—Eu sou um lobo então? Rawr — as mãos se curvaram como se fosse garras enquanto virava para ver meu pai de frente.

—Você pode ser o que quiser. Lobinha.

Quando acordei estava num quarto grande, gigantesco para falar a verdade, branco sem muitas mobílias mas quente, tão aquecido que eu me vi livre da maioria das camadas de roupa que tinha antes. Tossi algumas vezes, não fazia ideia de onde estava mas sabia que não sairia por algum tempo, do lado de fora a tempestade castigava a cidade, as árvores se curvaram perante o vento e as gotas de chuva largas aparentavam ser capazes de ferir a carne.

Era isso e também a corrente que me prendia o tornozelo, devia ter alguns metros mas estava firmemente ligada ao pé da cama tilintando a cada movimento que fazia. Lágrimas vieram aos meus olhos junto com uma sensação de nó, não conseguia engolir e nem respirar pelo nariz precisando abrir a boca para conseguir colocar um pouco de ar para dentro dos meus pulmões.

No espelho no canto do quarto vi refletido as marcas vermelhas do enforcamento prévio, e outras manchas que pareciam tão violentas quanto. Me levantei andando até o objeto e tocando de leve o meu reflexo o que tinha acontecido?

A porta se abriu e com ela uma figura conhecida se apresentou. Kou estava completamente encharcado e não era de água, as manchas — mais precisamente respingos — se estendiam até o rosto, as vestes deixando um rastro de vermelho e um cheiro metálico por todo lugar. Era uma escultura viva insanamente brutal de um deus assassino, quis recuar mas não tive tempo de me mexer pois ele tomou meu rosto entre as mãos enluvadas de sangue passando os dedos pelas marcas no meu pescoço.

—O que fizeram com você meu amor? — tinha uma tristeza pura em sua feição, podia até chamar de ressentimento — Uma pena que não sobrou muito daquele vira-lata, o faria sofrer de novo e de novo por ousar encostar em você.

O tom era possessivo e soava diferente aos meus ouvidos, agressivo. A última parte quase foi acompanhada de um rosnado.

—Não, não, não. Não chore, minha pequena não está feliz? Ele está morto, eu matei ele por você. Deveria ter deixado um braço?

Um braço? Porque eu iria desejar...

O reflexo no espelho me deixou ver as mãos que tinham dedos mais alongados com garras e um tom de pele prateada que se estendia até os antebraços se dissipando como raízes, os caninos estavam mais afiados e pontudos do que o normal saltando pela boca de tom rosado dele. Kou viu o meu olhar fixado em nossa imagem refletida, sorrindo abertamente como se gostasse da minha expressão de terror manchada pelo vermelho de seus dedos.

—Não somos um casal lindo? – assim como no momento do estacionamento ele beijou e lambeu a lateral do meu rosto.

Pisquei algumas vezes tentando o empurrar – Eu quero sair daqui – minhas pernas se mexeram a corrente balançando com ela. Koutarou me empurrou contra a parede me arrancando um gemido de dor pela batida.

—Não pode – ele passou as unhas pela minha lateral – Não vou deixar, a tempestade é perigosa. Todas as matilhas caçam nessa época.

—Parece hipócrita falar de perigo quando acabou de matar uma pessoa. E está me mantendo como uma prisioneira.

As sobrancelhas dele se juntaram, como um cachorro que foi repreendido pelo dono – Você está chateada comigo — ele apertou os braços ao meu redor esfregando o rosto com vestígios de um assassinato conta o meu — Mas eles te machucaram, encostaram em você mesmo depois de te marcar.

—Não posso deixar que eles me desafiem ou a minha matilha. – ele ergueu a cabeça – Ah ele não era uma pessoa, pelo menos não um humano comum, então está tudo bem certo?

Se ele estava se desculpando num segundo no outro pareceu muito animado pela desculpa do cadáver não ser alguém humano.

—Você é doente – tentei o empurrar para longe mas era clara a nossa diferença, e a corrente ainda era um grande problema. Ele me jogou sobre os ombros me soltando sobre a cama, não se importando em sujar os lençóis cor da primeira nevasca de inverno, Koutarou prendeu entre as pernas segurando os braços acima da minha cabeça.

—Você não sabe sobre você mesma não é? – me encarou como uma expressão triste enquanto tentava me debater, sem sucesso – A linhagem Héroux é bem conhecida entre nós, apesar de ter o gene lupino não se transformam por completo mas geram os mais fortes alfas, e as fêmeas nascem para ser rainhas.

—Seu cheiro... É a coisa mais deliciosa que eu já senti, sabia que os vira-latas mais fracos tentariam colocar as patas em você assim que pudessem. Mas nem mesmo o meu cheiro pode te esconder não a curto prazo.

—Essas coisas não existem – rebati – São fantasias criadas para assustar crianças.

Ele abaixou mantendo nossos rostos próximos – Nem você acredita no que está falando — Sua cabeça abaixou para que pudesse distribuir alguns beijos pela lateral do meu pescoço — Você me viu, não viu? Nos seus sonhos.

Minha.

—O lobo era você... — juntei as minhas pernas tentando ignorar a sensação que nascia no meio delas e que era alimentada por cada pedaço de pele de Koutarou que tocava o meu — E o que vai fazer? Me devorar como a história e desfilar com as minhas entranhas entre os dentes?

—Não lógico que não — seus olhos se voltaram para os meus, e nossas testas se tocaram — Amor eu nunca faria isso com você. Nós fomos destinados a ficar juntos, por isso preciso te manter aqui não entende? Segura.

— Se outros clãs te pegarem, vão te estuprar e forçar seus filhotes em você até que não passe de uma carcaça parideira.

—Nunca te machucaria – ele beijou o canto da minha boca – Já disse que você é minha.

A palavra sussurrada fez um calafrio subir a minha espinha, não eram pelos que roçavam contra mim, mas sim músculos quentes de um garoto estupidamente bonito que apenas tinha a peculiaridade de se transformar num lobo ou algo do tipo.

—Sinto você – o suspiro saiu quente – Queria que eu me enterrasse em você contra o chão sujo da floresta. Você me quer pulsando dentro de você, te enchendo por completo.

—Eu vou te foder tão forte que meu cheiro não vai desgrudar de você por um ano inteiro.

O calor explodiu no meu interior, como se uma besta adormecida se levantasse da tumba que estava sepultada. E então o sangue ou as coisas que eu tinha passado já não me importavam mais ou não me afetaram, o cheiro doce do garoto em cima de mim me ludibriou de tal forma que tudo que passou na minha mente foi a imagem dele socando tão fundo dentro de mim que faria com que eu esquecesse até o meu nome.

Ele estava certo, queria que me tomasse contra o chão, forte e sob a luz da lua, eu gritaria tão alto que eles iriam ecoar pela floresta até o amanhecer.

Parecia ser o certo a fazer então lambi a lateral de seu lindo rosto, limpando as gotas de sangue respingadas. Deveria ser mais do que um sinal de aceitação porque ele se voltou para a minha boca soltando meus braços e escorregando as mãos por debaixo da minha camiseta pressionando a pele ardente sobre ela.

Os caninos expostos tinham algo de sedutor quando raspavam contra a minha língua ou lábios, e quando me vi buscando mais deles minha própria boca se encheu de um gosto doce e saboroso. Ele afastou nossos rostos apenas para que eu pudesse ver a boca manchada de vermelha e as pequenas gotas de sangue que saíam dela e o sorriso perversamente sexy que moldava sua feição.

—Com fome? — ele puxou a própria camiseta pela cabeça a jogando para longe antes de se voltar para mim — Desculpa amor, mas eu vou te comer primeiro.

Os restantes das roupas foram rasgadas antes de serem descartadas, doeu e queimou; marcando a minha pele com novos vergões de sangue pisado ele traçou as marcas com os dedos como se estivesse admirando o próprio trabalho. Kou não se segurou na hora de atacar meu colo tomando os meus seios com mão cheia e apertando enquanto mordia e lambia o caminho até minhas dobras.

Irritado pela calça ele a tomou pelo dente rasgando até a base, minha perna permanecia acorrentada, os músculos que tinha observado sob o uniforme durante a manhã eram explorados pelas minhas mãos se tencionando sobre os meus toques e arranhões. Koutarou apoiou as minhas pernas em seus ombros e fui forçada a arquear as costas quando sua língua quente entrou no meu centro puxando seus cabelos enquanto ia cada vez mais fundo.

A corrente balançava brigando contra o som dos gemidos altos e grunhidos animalescos, um próprio rosnado rasgando a minha garganta sem que eu pudesse me conter de excitação.

—Está pronta para mim cachorra? – Kou levantou o rosto apenas para ver a bagunça que ele havia me deixado. – Vire.

—Você é tão gostosa – as unhas dele percorreram as minhas costas, ele mesmo se curvando sobre mim enquanto ficava de quatro. Uma dor dilacerante me tomou da base do pescoço até o fim da coluna, senti algo molhado escorrendo pela minha lateral e pingando sobre o lençol branco.

—Cada garra tem uma assinatura – disse roçando com o membro ereto na minha entrada – Você já era minha no momento em que colocou os pés nessa cidade, minha lobinha Héroux.

Uma lembrança acompanhada de um trovão, a fala de meu pai sobre o sobrenome voltou a minha mente.

No reflexo do espelho nem me reconheci. Os olhos de íris azul cintilantes e os dentes afiados. As minhas mãos que seguravam tão firmemente os lençóis tinham unhas que rasgavam por eles como se fossem de papel tomadas por uma pele mais clara que terminava com os mesmos padrões de raízes do garoto.

A primeira investida não foi gentil e me arrancou todos os pensamentos que tinha rondando a mente. Seu pênis pulsando no meu interior enquanto eu mesma me ajustava ao seu tamanho, me inclinei encostando a cabeça na cama alcançando um ponto mais fundo enquanto o sangue acumulado na minha coluna escorreu até cair em gotas na cama.

Grunhi e respirei fundo enquanto empinava em sua direção.

—Mexa.

Era uma ordem, cada fibra do meu corpo tomou aquela frase como uma verdade absoluta. O comando, a força e a autoridade. Koutarou era um alfa.

Mexi dolorosamente devagar, poderia estar brincando com o perigo mas eu só queria ele enterrado em mim, com as mãos nas laterais do meu quadril ele me puxava, metendo cada vez mais profundo mas mantendo as coisas lentas. Mas não por muito tempo, as estocadas se tornaram mais rápidas e fortes.

—Você está me dando fodidamente bem – rosnou puxando minha cabeça para trás mordendo com força meu ombro – Talvez eu não queria sair de você nunca mais.

—Meu clã não se reproduz durante a temporada de caça, durante uma semana inteira enquanto a tempestade cai e a lua cheia está no topo. Até o fim dessa semana você vai estar rouca de tanto gritar, com o meu cheiro impregnado na pele e não querendo outra coisa que não seja meu pau dentro de você.

—Então você tem sete dias pra me fazer esquecer meu nome.

Ele gemeu e me apertou, percorrendo com a mão livre a minha coluna até conseguir agarrar com força um punhado do meu cabelo. Mais, queria mais dele, muito mais.

Ter os tremores do ápice me tomando o corpo uma vez não foi o suficiente, queria ver seu rosto cheio de prazer gemendo meu nome enquanto cavalgava. A corrente já não servia de nada e foi facilmente quebrada quando invertemos de posição.

Espalmei as mãos no seu abdômen definido arranhando de leve.

—Você gosta quando eu te tomo por inteiro? — pressionei seu tórax — Vai ser um bom garoto enquanto eu rebolo pra você?

—Puta merda [Nome].

—Não foi o que eu perguntei — abaixei o rosto sentindo ele pulsando dentro de mim lambi a lateral do seu rosto até chegar no ouvido — Você vai ser o meu bom garoto Kou?

—Porra, vou ser o que você quiser.

As duas mãos dele seguraram meu quadril me puxando. Gemi jogando a cabeça para trás, minhas recém descobertas garras cravadas na pele dele na altura do peito, não tão grandes quanto a marca que ele me deixou nas costas mas o suficiente para o marcar como meu.

Segurei seu pescoço diminuindo o ritmo do movimento aproveitando cada centímetro que escorregava pra dentro de mim. Senti seu abdômen tremer e seu pênis pulsando contra as minhas paredes ele estava corado e arfando soltou uma das minhas coxas apenas para guiar a mão que o segurava até a boca. Koutarou lambeu a palma da minha mão antes de guiar dois dos meus dedos para dentro da boca chupando e mordendo de leve.

Apertei de leve sua língua arrancando um gemido que me fez gelar a espinha. Kou segurou meu dedos entre os dentes com um sorriso e se sentou fazendo meus seios ficarem pressionados contra o tronco nu e suado dele.

Puxei meus dedos e coloquei eles na boca sentindo o gosto do macho na língua.

Os braços deles seguram a minha cintura saindo de dentro de mim em seguida. Com um suspiro longo ele sorriu e apoiou a cabeça entre os meus seios me mantendo sentada em sua barriga.

—Nós provavelmente deveríamos tomar um banho, não posso deixar você nua cheia de sêmen e sangue — ele deixou um beijo estalado no meu colo antes de me encarar nos olhos — Embora eu ache sexy.

—E então o que? Nós destruímos outro quarto? — beijei seu rosto — Ainda tenho voz, e lembro meu nome.

—Temos seis dias ainda — Kou segurou meu rosto encostando o nariz no meu — Ainda tenho que caçar. Quando voltar para você vou cumprir minha promessa.

—Você realmente é um bom menino.

—Só pra você.




N/A: Projeto de Dia das Bruxas oficialmente iniciado!

São 5 contos (espero que seja porque eu terminei o quarto hoje), envolvendo personagens de Haikyuu em temas misteriosos, sobrenaturais e cheios de travessuras. Eram 7 originalmente mas cada um acabou saindo com +10K de palavras, então não deu tempo.

As histórias também tiveram seus enredos desenvolvidos rapidamente porque né, convenhamos que cada uma é uma fanfic inteira se eu fosse detalhar.

Os contos serão lançados durante essa semana, até o próximo domingo. Pode ser dia sim dia não dias seguidos, então adicione aos favoritos para acompanhar.

Se você  completou o jogo que eu montei e chegou até "Penumbra" teve acesso exclusivo a ordem de postagem. Caso contrário o Sr. Tenebrose Nubrapem manterá sua palavra e me ajudará com esse suspense.

Espero que gostem, vejo vocês em breve!

Xx

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