3º LUGAR: Metas de Ano Novo
Metas de Ano Novo
Por Taísa Evangelista (inmyownpinkworld)
Amanda olhou para o papel e decidiu que tinha algo de errado com aquilo. Segurava uma lista com suas metas para o próximo ano enquanto esperava sozinha pela virada do ano. Não que estivesse fisicamente sozinha, mas se sentia só.
Olhou para o relógio. Ainda faltava uma hora e por um instante pareceu tempo demais para pudesse aguentar: não via hora de ir embora. Correu os olhos pela sala, vendo todos interagirem felizes e ignorando sua existência. Olhou para a mesa da ceia e sentiu vontade de comer um pedaço de pavê. Olhou de relance para a primeira meta, travou uma batalha consigo mesma e decidiu:
"Melhor começar logo com isso, falta só uma hora mesmo..."
Amanda sempre ouviu da família e das amigas que estava um pouco acima do peso. Sempre ouviu opiniões — que ela não tinha pedido — sobre como ter "o corpo do verão" e curtir as praias do Rio com um biquíni lindo — como se ela já não pudesse fazer isso. Ouvia sobre dietas radicais que poderiam prejudicar sua saúde de forma gravíssima, mas que a deixariam, por pouco tempo, no padrão de beleza vigente. Sempre ouviu que seu rosto era tão bonito e se ela fosse apenas um pouco mais magra...
—Já pensando em comida, Amanda?
Pensou em responder, mas lembrou da segunda meta. Preferiu manter a boca fechada ao invés de responder que não porque era gorda que comia compulsivamente. E que, aliás, o autor do comentário indesejado já havia eliminado dez pasteis.
Mas sempre ouviu da mãe que ela devia ficar quieta e ouvir, porque só queriam o seu bem. De nada importa se ela gosta ou não. Basta ouvir calada. Olhou para a segunda meta.
Conversa vai, conversa vem, ouviu uma conversa estranha e um pouco cruel de um determinado grupo da família sobre pessoas que eles nem ao menos conheciam.
Decidiu ouvir calada porque não queria passar a virada sendo chamada de louca ou qualquer coisa assim. Afinal, de que importa se ela gosta ou não do que está ouvindo?
Mas Amanda nunca foi muito boa em ouvir calada. Era explosiva. E se não explodia e guardava pra si, não aguentava muito tempo. A boca começava a tremer, a garganta começava a doer, os olhos começavam a ficar vermelhos e ela tentava esconder de toda forma. Até que alguém tocava na ferida e ela chorava. Mas o melhor era que ela nunca recuava. Seu choro não era sinal de covardia ou de medo ou de desespero. Chorava porque queria colocar pra fora o quão errado e injusto achava aquilo. Chorava por empatia, porque não era egoísta e sabia que aquelas pessoas não mereciam esse pré-julgamento.
E então aconteceu. Sua boca começou a tremer, seus olhos começaram a ficar vermelhos, a garganta começou a doer e ela tentou esconder de toda forma possível. Dessa vez, ela não queria ficar firme. Queria recuar ao menos uma vez para que não a chamassem de chorona. De fraca. Queria dar o primeiro passa pra cumprir bem a terceira meta.
E então, tocaram na ferida. E ela não recuou. Olhou para o relógio e faltavam 15 minutos para a meia-noite. Reconheceu que em suas metas levou em conta o que as outras pessoas esperavam de si e não a pessoa que ela queria se tornar. Catou uma caneta na bolsa. Reconheceu que se continuasse fazendo isso, machucaria a si mesma e deixaria de ser Amanda. Riscou a primeira meta: "Emagrecer". Escreveu do lado: "Ser o meu padrão de beleza".
Riscou logo a segunda, porque já entendeu que se continuasse assim, iria explodir. Riscou "Ouvir calada" e escreveu no lugar "Dizer quando algo me incomoda".
Olhou bem pra terceira meta e nem foi preciso pensar. Riscou-a e escreveu: "Continuar valente assim, mesmo que chore às vezes" no lugar de "Parar de ser chorona".
À meia-noite, estava tudo reescrito. Amanda pôde passar a virada de pensando em quem ela realmente queira ser e não em quem queriam que ela fosse.
Não, ela não respondeu verbalmente. Ela nem precisou. Sua decisão de amar a si mesma, naquele momento, falou mais alto.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro