💙 LUIZ PEDRO FERNANDO HENRIQUE 💙
Às vezes, sinto que a vida é apenas um aprendizado e que todas as coisas ruins são uma forma de mostrar o quanto os mínimos detalhes são importantes. Não me considero um garoto chato, insuportável, que mereça passar por situações difíceis, mas acredito que sou como qualquer outra pessoa e tenho o direito de ter minhas escolhas, pensamentos, mudar de opinião quando achar necessário... É extremamente complicado tentar ser correto, buscar fazer o melhor sempre e apontar os defeitos das pessoas, sem ao menos enxergar os próprios erros.
Ver meu amigo passando por um momento bem delicado trouxe uma reflexão sobre meus atos.
Acho que não sou tão legal com meus pais como eles merecem. Eles deveriam ser compreendidos cada vez mais por mim. A Kauany até que consegue entender o lado deles, só que eu sempre me pego no ápice do estresse com tantas exigências, cobranças e regras.
Preciso rever minhas atitudes, meus pensamentos, mas... o ideal, no momento, é ajudar meu amigo. Os pais dele podem... Bom, nem quero pensar nisso, mas é melhor ter fé e acreditar que um milagre vai acontecer a qualquer momento.
— E aí, como você está? — questionou Kauany a mim.
— Estou refletindo! — soltei.
Eu estava sentado sobre uma pedra, perto do acampamento. Todos estavam guardando as mochilas e barracas no ônibus. Faltavam poucos instantes para voltarmos. Não deu tempo de avisar aos nossos pais sobre a volta para casa repentina. O acidente com os pais de Tomate deu um impacto enorme na galera, e geral sentiu a dor que ele estava enfrentando.
— Parece que eu previ — disse Kauany.
— Será? — questionei, confuso.
O problema é que todos acham que a Kauany já sabia do ocorrido, por causa do seu comentário mais cedo, em volta da mesa. O problema maior é que eu já sabia... e não pude preparar meu amigo melhor para receber a notícia.
— Acho que precisamos manter a calma, focar no que pode ser feito para ajudar o Tomate nesse momento difícil e ter fé, muita fé — disse minha irmã.
Fé, muita fé.
— VAMOS, PESSOAL! — gritou Pedrão.
Entramos no ônibus, nos sentamos na parte da frente e ficamos em silêncio.
Todos estavam em silêncio, e eu fiz questão de manter distância de Tomate para deixá-lo sozinho, por enquanto. Acredito que conversar não é o ideal (e eu nem sei sobre o que conversar). É estranho ficar longe dele, mesmo perto.
Ele entrou no ônibus por último, com os olhos cheios de lágrimas, parou por um instante, nos observou calmamente, fechou os olhos, abaixou a cabeça e caminhou até a parte de trás.
A cena foi triste e muito preocupante.
Até o momento, não sabíamos sobre o estado dos pais de Tomate. As informações foram objetivas, sem muitos detalhes.
💙💙💙💙
O ônibus deixou cada um em sua residência. Tomate iria direto para o hospital, acompanhado de Pedrão.
Kauany e eu chegamos em casa de surpresa.
— O que vocês aprontaram? — questionou minha mãe, furiosa. — Responde, Luiz Pedro Fernando Henrique! Kauany? Vocês voltaram muito cedo, por quê?
Olhei para minha irmã, dei meio sorriso e caminhei até os braços de meus pais.
Kauany fez o mesmo.
— O que deu neles? — indagou meu pai, sendo esmagado pelos nossos braços.
— Seja lá o que tenha acontecido, este abraço não vai livrar vocês do castigo! Ouviram? — lançou minha mãe, com todo aquele jeito furioso de ser, e que jamais pensei sentir falta.
Permanecemos com os braços envolvidos nos dois. Unidos, com muita força. Para mim, foi um momento difícil lidar com o acidente, sem ao menos saber no que resultou.
Kauany soltou nossos pais, deixou uma lágrima cair no rosto esquerdo, limpando logo com a mão, e sorriu.
— Teve um acidente, mãe — soltou minha irmã.
— Como assim? O que vocês aprontaram? — indagou minha mãe, apavorada, achando que o ocorrido fosse culpa nossa, e sem saber absolutamente nada do que houve.
— Não, não foi culpa nossa — falei, libertando meus pais do abraço longo e apertado. — Lembra do meu amigo Tomate?
Eles assentiram com a cabeça, e Kauany prosseguiu:
— Os pais dele sofreram um acidente de carro, e a única informação que temos é esta. Não sabemos o estado dos dois.
Minha mãe andou de um lado para o outro na sala, preocupada, mas tentando mostrar revolta, e disse:
— Viu, Luiz Pedro Fernando Henrique? Viu, Kauany? Foi preciso acontecer uma desgraça para vocês dois se tocarem do quanto nós dois somos importantes. Bom, a Kauany sempre foi um amor de menina, tão doce... É meio bagunceira, às vezes, mas a gente consegue dar jeito, mas você, Luiz Pedro Fernando Henrique, você...
Ela parou na minha frente, com as mãos na cintura e naquela pose de autoridade.
— Calma, meu amor. As crianças estão assustadas — alertou meu pai. — Eles presenciaram o sofrimento do amigo e estão em choque.
— Eu sei. E nós vamos para o hospital, agora!
Olhei para Kauany, e ficamos surpresos com a decisão.
💙💙💙💙
Chegamos no hospital o mais rápido possível.
Como conseguimos o endereço? Com o Pedrão. Felizmente, entramos em contato, ele atendeu a ligação e passou tudo certinho.
— Será que eles estão bem? — questionou minha irmã.
— Não sei — respondi, confuso, com receio, preocupado, e em meio a uma tempestade de diferentes sensações.
— Eu não sei em qual quarto eles estão! Aliás, nem sei o estado deles, e é por este motivo que estamos aqui: para ter notícias — disse minha mãe para a recepcionista. — Você entendeu?
— Calma, senhora — acalmou a recepcionista (bom, tentou, pelo menos). — Nós precisamos saber se vocês têm algum parentesco com os pacientes. Recebo ordens.
Dona Débora ficou mais furiosa, e cada vez mais irritada (como de costume).
— Ah! Se recebe ordens, por que não está atendendo a minha ordem? Hein? Me obedece, garota, que eu não tenho o dia inteiro!
— A senhora está me desrespeitando.
— Desrespeito é eu chegar aqui e ser barrada. Me respeita, por favor. Tenho idade para ser sua mãe... — Minha mãe parou, refletiu por um instante e retificou: — Bom, tenho idade para ser sua irmã, mais nova, de preferência... Não que você seja aparentemente... velha, sabe? Mas espero que esteja tudo certo.
— Não está nada certo, e eu não vou dizer nada sobre os pacientes. A senhora é louca!
— Isso, me desrespeita... Pode continuar...
Meu pai chegou no momento exato, impediu aquela discussão, e por pura coincidência, Pedrão apareceu do nada, todo confuso com a bagunça na recepção.
— O que está acontecendo aqui? — questionou Pedrão.
— Pois é, do estacionamento, pode-se ouvir toda gritaria — complementou meu pai.
Minha mãe explicou o ocorrido... Bom, o lado dela, né?
Pedrão nos guiou até a outra parte do hospital, avisou à recepcionista sobre nossa presença e tudo ficou meio que esclarecido, vamos dizer assim.
— Acho que ela enlouqueceu — comentei.
— Não sei como ela consegue continuar desse jeito em uma situação como essa — disparou Kauany.
— Os pais do garoto estão melhores agora. Foi tudo um susto — esclareceu Pedrão.
Nossa, que notícia incrível!
Jamais imaginei que fosse enfrentar tantos conflitos com meu próprio interior. Acredito que todos se colocaram no lugar do Tomate, e isso foi muito importante, porque o cara estava precisando de ajuda. Ninguém ajudou ele exatamente, mas todos tiveram a mesma sensação da consequência do acidente e respeitaram o momento.
— Ah, que bom que está bem! — disse minha mãe, aliviada. — Nesses filmes, sempre dá tudo certo no final.
— Mas isso não é um filme, mãe — retruquei. — É vida real. Inclusive, é a nossa vida.
— E quem disse? — Dei de ombros. — Vai que alguém queira fazer uma adaptação da nossa vida. Já adianto que eu quero ser interpretada por uma atriz bem linda, bonita e jovem, de preferência. E eu quero ser muito rica no filme.
— Mãe, se for uma adaptação da nossa vida, não tem como você ser rica — rebateu Kauany.
— Lembra daquele livro que a menina tem um final feliz, e que na adaptação que foi feita, mudaram tudo, até o nome dela? Então... Também vou poder mudar o roteiro, né? Direitos iguais para todos — esclareceu minha mãe.
— Ah, dona Débora, só a senhora, mesmo, para nos fazer rir em um momento como este — disse Pedrão, aos risos.
Revirei os olhos (ri também) e procurei disfarçar toda tranquilidade exposta pelo momento de descontração.
De repente, Tomate apareceu, com um sorriso no rosto e com suspiros de esperança e tranquilidade.
— E aí, cara? — cumprimentei ele.
Apertamos as mãos, ele abraçou Kauany e disse:
— Já estou melhor. Foi apenas um susto.
— Poxa, Repolho, ficamos bem preocupados com tudo que aconteceu, mas acabou tudo bem, felizmente — disse meu pai, errando o nome do cara.
— É TOMATE, PAI — Kauany e eu falamos ao mesmo tempo, e começamos a rir.
— Ah, perdão — desculpou-se ele.
— Sem problemas — garantiu meu amigo.
O momento foi muito tranquilo e pude perceber no olhar do Tomate o quanto ele estava aliviado por saber que os pais estavam bem.
Felizmente, eles iriam para casa em menos de uma semana. O acidente não foi tão grave como pensávamos. Tudo um susto, ou apenas uma lição, não sei.
Muitas coisas acontecem sem motivo algum. Vem do nada, acontece de modo inesperado e pronto. O negócio é aceitar e saber lidar com a situação. O mais complicado, mesmo, é quando não há saída... Bom, na verdade, é isso que a vida quer que a gente pense: que não há saída. Mas sempre há uma solução cabível para o momento. Só é preciso saber enfrentar, sem deixar a essência de lado.
💙💙💙💙
Saímos do hospital muito tarde, pois passamos parte do dia com Tomate, e decidimos jantar em um restaurante próximo à nossa casa.
Pedrão se prontificou em cuidar do meu amigo, e nos sentimos mais seguros quanto a isso.
O dia foi cheio e teve um final tranquilo.
As notícias foram boas quanto à recuperação dos pais do Tomate, e isso nos deixou mais aliviados.
O restaurante que estávamos era um ambiente calmo, sem muita gente, com uma música suave no fundo, os berros alucinados de minha mãe e meu pai, com ótimas comidas (e claro, pedi muita comida, porque eu estava faminto).
— Nossa, mas você come, hein, meu filho — disse meu pai.
— Deixa o garoto, Ricardo — disse minha mãe. — Quando ele tiver a sua idade, aí, ele vai ver a consequência de ter comido tanto na adolescência.
Começamos a rir.
— Vai com calma, né? — pedi.
— É, nós temos muita coisa pela frente ainda — disse Kauany.
— Bom, por falar nisso, eu gostaria de dizer uma coisa — soltei.
— O que é? — indagou meu pai.
— Antes de mais nada, quero pedir desculpas a vocês, caso eu tenha sido um péssimo filho.
— Péssimo filho você não é, mas mal-educado, às vezes, sim — interrompeu minha mãe. — Mas a gente dá um jeito.
— Débora! — exclamou meu pai.
— O que foi?
Começamos a rir da situação.
Meus pais são muito divertidos, e nunca consegui perceber isso com tanta apreciação.
— Enfim... — continuei. — Desculpa por tudo que fiz de errado, e por ser mal-educado.
— Você não precisa se preocupar, filhão — garantiu meu pai. — Nós te amamos, e é isso que importa.
Olhei para Kauany e senti uma alegria imensa por estar ao seu lado. Voltei o olhar para meus pais e percebi o quanto eles eram importantes para mim.
Às vezes (nem sempre, claro), é preciso acontecer algo de ruim para que a mente seja levada a outros horizontes. Eu preciso aprender muito ainda sobre a vida e sobre o convívio entre família. Mas o amor, que é a base de tudo, acabei encontrando.
A minha parte já foi feita. Agora, será preciso enfrentar novos obstáculos, lidar com um futuro desconhecido e fazer o que há de melhor: viver o hoje, com muita intensidade.
Não me sinto melhor, ou maduro, no momento, me sinto realizado e disposto a encarar o amanhã de forma mais compreensível, buscando aproveitar cada instante ao máximo.
A noite em família estava sendo incrível.
Descobri o verdadeiro sentido de estar rodeado por meus pais e minha irmã.
Na verdade, todo o ocorrido com os pais de Tomate, além de toda preocupação, resultou em uma grande lição.
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