XIV. A MENTIRA
Peter já havia trabalhado mais de uma vez com o Programa de Proteção a Testemunha, muito antes de participar do Departamento de Homicídios. No entanto, apesar da experiência, decidiu que deixar com que o Detetive Lawrence ficasse com essa responsabilidade era a melhor decisão.
Nenhum dos dois comentaram sobre a discussão de mais cedo. Meia hora depois do que aconteceu, Peter avisou ao seu parceiro que ainda tinha muito trabalho para fazer e ele apenas o seguiu. Sentados de frente ao computador, os detetives analisavam as imagens da câmera da prefeitura de Raytown.
A rota observada não era muito usada, sendo ela a mais longe para Kansas City. Só em imaginar o motivo da escolha do caminho era estranho, levando em consideração que eles desejavam chegar o mais cedo possível na reunião. Lawrence solicitou, por telefone, a presença das secretárias dos CEOs para depor, acreditando que elas teriam mais facilidade de resolver aquele pequeno mistério.
O relógio da câmera da prefeitura marcava seis e meia da manhã quando uma moto sem placa parou no meio da estrada. Duas pessoas trajando preto e máscaras de pano embaixo de seus capacetes, desceram posicionando o veículo entre as árvores. Meia hora mais tarde, o carro dos Stuarts apareceu na filmagem. Um dos suspeitos parou no meio da estrada e atirou contra o pneu do carro. As imagens apresentavam uma ação rápida: os dois criminosos apontando armas contra o carro, a ordem de sair do banco de motorista para que o sequestrador guiasse-os até a casa em Raytown, a cem metros dali. Tudo aquilo na maior tranquilidade.
— Não há nenhuma ligação de algum dos Stuarts para a polícia? — indagou Peter.
— Já procurei. O primeiro a ligar para a polícia relatando o desaparecimento foi Elliot Russel. Nada dos Stuarts em si — Lawrence respondeu pensativo.
Na imagem, pode-se ver que um dos criminosos carregando em uma bolsa de plástico o que parecia os celulares. Ele os colocou debaixo do pneu da moto e os esmagou.
Entretanto, para o detetive Richard Lawrence, a resposta era essa: Isabelle Stuart queria assumir a empresa e para isso planejou a morte de sua família. Para tanto, contratou uma dupla de criminosos para fazê-lo.
O que intrigava a Peter era o fato de que uma família com grandes posses se posicionava de forma tão negligente quanto sua segurança. O automóvel usado por eles não tinha nem mesmo um rastreador ou seguro, sendo ele um dos carros mais antigos no nome de Chad Stuart.
— Há algo que não consigo entender — comentou Richard depois de um tempo. — Eles abordaram o carro cada um com uma arma, mas não a usaram para matá-los. Todas as mortes se deram com o corte de suas cabeças e não havia sinal de tiros no local.
— Seja lá quem o fez, odiava os Stuarts o suficiente para querer sujar suas mãos — concluiu Peter. — Um inimigo antigo e rancoroso.
— Sua amiguinha, Isabelle, tinha um relacionamento ruim com a família?
Bane segurou-se para não perder a paciência e respondeu a contragosto.
— Não a conheci o suficiente para saber.
Richard cerrou os olhos para focar na imagem em sua frente. Demorou alguns segundos até que abrisse de vez os olhos.
— É um casal. Um homem e uma mulher — constatou. — Ela tem 1.70, o homem tem 1.80.
Eles observaram os dois retirarem um a um do carro e amarrando seus braços e pernas. Havia uma agitação na imagem e o homem ameaçou a atirar na cabeça de Isabelle. Em rápidos segundos todos ficaram parados, tensos, e obedeceram as ordens dos assassinos. Os dois entraram no carro apertado e deixaram a moto para trás, empurrando-a entre os arbustos. Peter adiantou o vídeo, mas em nenhum momento os criminosos voltaram para buscar o veículo.
— Irei levar outro policial junto comigo para verificar a moto — avisou Lawrence levantando-se.
Peter estava compenetrado na imagem, uma mentira revelando-se diante de seus olhos.
— Richard, você está certo.
O detetive levantou a sobrancelha, curioso.
— Do que está falando?
Bane apontou para a tela.
— Não houve tiros contra ninguém diretamente. Isabelle falou que atiraram em sua direção como sendo uma lembrança inesquecível. Isso não aconteceu.
Richard piscou lembrando das palavras da mulher. Estava tão focado na relação íntima que Peter tinha com sua principal suspeita que não se ateve aos pormenores.
— Bom trabalho, detetive Bane — disse ele satisfeito segundos antes de ir embora.
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Andrew Bane amava comida mexicana. Claro que, depois da sua visita ao país latino, sempre encontrava uma desculpa para mostrar o quanto a comida preparada no seu país de origem era superior à feita pelos americanos. Ainda assim, ele nunca negava jantar em restaurantes mexicanos.
Era uma noite quente. Peter deixou o casaco no carro quando entrou no estabelecimento para encontrar seu irmão. Estava atipicamente vazio, então, Andrew pegou o que achava ser a melhor mesa.
— Chegou faz muito tempo? — indagou o detetive ao se aproximar.
— Apenas alguns minutos — respondeu enquanto saboreava os nachos que estavam sobre a mesa — Já pedi pra trazerem seu prato, sei que está com fome.
Peter assentiu sentindo-se relativamente tímido na presença do irmão mais velho. Andrew exalava um tipo de superioridade que era de sua personalidade, sem soar plástico e superficial. Ele falava e comandava; sabia e comentava; dizia e era ouvido. O mais novo dos Bane odiou-o por toda a adolescência. Odiava o fato de que ele estava sempre certo.
Em algum momento durante os seus anos na academia, os dois voltaram a se ver como irmãos. Andrew era um homem bom, generoso. Detestava a ideia de que afastou-se de seu irmãozinho, a quem amou assim que soube que Olívia Bane estava grávida do segundo filho. Desde então os encontros aconteciam esporadicamente e Peter sempre voltava para casa com a sensação agridoce que deveria ter escutado-o quando mais novo. Talvez, se o fizesse, teria uma vida tão sublime quanto a dele.
— E aí? Como está o trabalho na delegacia? — perguntou Andrew.
— O de sempre — falou com descaso. — Nada tão interessante quanto o seu trabalho.
— Olha, está aí uma coisa que eu discordo completamente. Você não deveria exigir tanto de si mesmo.
Peter deu um sorriso sem graça enquanto bebia seu chá gelado. Não conseguia se concentrar desde que constatou que Isabelle mentia. Ela não dera qualquer indício que o fizera intencionalmente — era possível ver em seu olhar a sinceridade de suas palavras. Algo estava errado. O detetive sabia disso.
Quando a comida chegou, Andrew falava de política. As eleições presidenciais de 2016 aproximavam-se e muito se falava disso. O filho mais velho dos Bane era muito antenado, enquanto o mais novo, apesar de considerar-se republicano como os pais, pouco importava-se com o assunto. Ainda assim, Andrew, que se identificava com os liberais, não tinha esperanças para mudanças.
— Me vê mais três tacos, por gentileza. — pediu Peter ao garçom assim que terminara de comer.
— Tinha me esquecido que você come como uma mula.
O detetive deu sorriu.
— Esses músculos não se sustentam sozinhos.
— Que músculos? Você fala dessas suas pernas de galinha?
— Ei! — exclamou Peter.
Andrew observou-o por alguns segundos. Seu sorriso vacilou, as memórias de que um dia ele o machucara tanto com suas palavras. Porém, já fazia muito tempo isso. A sua frente havia um novo homem e aquele era confiável.
— Peter, preciso te contar uma coisa — disse Andrew. — Estou noivo e vou me casar no final do ano. Quero que você seja meu padrinho.
N/a:
Sim, eu voltei.
Passei muito tempo sem conseguir engatar no capítulo, mas finalmente veio a força que eu precisava. Espero que estejam gostando.
As coisas irão ficar cada vez mais complicadas pra Isabelle. O que vc acha que vai acontecer? Comente! Seu feedback é super importante 💕
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