3º LUGAR
E o terceiro lugar pertence a Flik_777, com um conto profundo sobre um Natal que se passa debaixo do ardente sol brasileiro contrastando com a neve que pinta o Natal nos filmes estrangeiros.
Mais uma vez, estão livres para stalkear o autor.
Ah, que época encantadora! Os telhados recobertos deneve, crianças moldando bonecos e rindo juntas, criando umambiente fraterno e repleto de paz. Era essa cena que Miguelassistia pela televisão de sua casa, enquanto suava sob o ventoquente de um ventilador na potência máxima. Ele suspirava,imaginando como seria brincar na neve, em vez de enfrentar ocalor escaldante do Nordeste.
O Natal dos filmes e da televisão sempre parecia mágico, umespetáculo deslumbrante que Miguel, um garoto do interior daBahia, sabia que jamais poderia vivenciar. Para uma família pobrecomo a dele, a realidade natalina resumia-se a ficar diante datelevisão, assistindo ao Natal dos outros.
Era véspera de Natal, e Miguel, entediado, fitava a televisãocom os olhos cansados, cercado pela família reunida na sala. Elesassistiam a um filme chamado "Meu Próprio Natal". Enquanto Louis,o protagonista do filme, olhava pela janela e via a neve cairsuavemente, Miguel desviava o olhar para fora e encontravaapenas o Sol ardente no horizonte, acompanhado de uma brisaquente que acariciava seu rosto, já avermelhado pelo calorsufocante. As cenas do filme — neve cobrindo as ruas, árvores deNatal brilhantemente decoradas, presentes e abraços calorosos —pareciam pertencer a um universo distante, um conto de fadas emque ele jamais seria o protagonista.
Com a cabeça para fora da janela, Miguel contemplava obrilho intenso do Sol no horizonte, imaginando se algum dia teria achance de ver a neve cair diante de seus olhos. Ele esfregou aspálpebras, hesitante, temendo que sua mente estivesse lhepregando uma peça. Mas aquele pequeno cristal de neve que caiuem suas mãos parecia tão real... Era como se, por um instantemágico, o Natal dos filmes estivesse tomando forma diante dele,dissipando o calor sufocante do Nordeste.
"Miguel, está babando?", a voz de sua mãe o trouxe de voltaà realidade. Ele piscou algumas vezes, confuso, antes de perceberque não passava de um delírio provocado pelo calor.
Miguel voltou a prestar atenção no filme, exatamente nomomento em que Louis brincava na neve com os amigos. A alegriacontagiante das crianças, rindo e se jogando na neve, despertousua imaginação. Por um instante, ele se viu dentro daquela cena:ao lado de Louis, Miguel corria, gargalhava e compartilhava dadiversão com um sorriso que quase parecia real.
No entanto, sua fantasia foi rapidamente interrompida pelasvozes de sua família, que discutiam sobre detalhes irrelevantes dofilme. A realidade, com suas trivialidades, o arrancava daquelemomento mágico, deixando apenas o calor do Nordeste comolembrança.
Mais adiante no filme, Louis aparecia sozinho, decorando umautêntico pinheiro de Natal. Ele pendurava cuidadosamente todosos tipos de enfeites: pequenos Papais Noéis, renas, presentinhos,vinhas e bolas brilhantes de diversas cores — cada detalhetransformava a árvore em uma obra-prima natalina. Por fim, comum toque de capricho, ele enrolava o pisca-pisca pelos galhos,enchendo-os de luz, e coroava sua criação com uma grande estrelareluzente no topo. A cena exalava o espírito mágico do Natal.
Quando Louis ligou as luzes, a árvore brilhou em toda a suaglória, refletindo os maiores anseios de Miguel. Ele desviou o olharpara os cantos da sala de sua casa. Não havia luzes piscando,tampouco uma árvore enfeitada com bolas coloridas. O ambienteparecia tão simples, quase vazio. Ali, o Natal parecia algoinatingível, uma celebração que existia apenas em telas, distantede sua realidade. A ausência de uma árvore era mais do que a faltade um ornamento — era como um vazio no próprio coração deMiguel.
A cada nova cena do filme, a frustração de Miguelaumentava. Ele não conseguia deixar de comparar seu Natal com ode Louis, e isso só aprofundava a tristeza que transparecia emseus olhos. A magia e as cores da tela pareciam tão distantesquanto a neve que ele jamais tocaria.
Sua mãe o trouxe de volta à realidade ao lhe entregar umcopo de água. "Está muito calor, filho. Beba água," disse ela comum sorriso reconfortante. Miguel deu um gole, sentindo o líquidoaliviar o calor momentaneamente. No filme, Louis começava apreparar um chocolate quente, e a ideia despertou algo em Miguel.
"Mãe, posso fazer chocolate quente?", perguntou, esperançoso.
"Se você encontrar em algum lugar," respondeu ela com umapitada de ironia. A resposta arrancou risadas de todos, menos deMiguel.
Os olhos de Miguel afundavam ainda mais no poço dadesilusão. "Nem chocolate quente eu posso ter?", pensava, com oolhar franzido e o semblante visivelmente abatido.
Enquanto assistia Louis esculpir biscoitos natalinos comprecisão e alegria, Miguel sentia a garganta apertar. A cena, tãodistante de sua realidade, o fazia olhar ao redor de sua casaquente, onde o calor do forno não cozinhava delícias, mas fritavaseus sonhos. Ele se perguntava se algum dia experimentaria algotão especial.
O ideal de um Natal perfeito parecia escapar de suas mãos,desmanchando-se como o calor que ainda impregnava o ar oucomo a última fatia de bolo que sua mãe jamais poderia preparar.
O que lhe restava eram apenas biscoitos de mercado queMiguel dividia com seus irmãos que carregavam um saborinesperadamente amargo, como se fossem recheados defrustração. A camada de creme, dura e mal distribuída, pareciamais um remédio do que um doce natalino. Enquanto seus olhospermaneciam fixos nos biscoitos impecáveis de Louis, o gosto doabandono tomava conta de sua boca. Sua realidade parecia umpresente quebrado, esquecido no canto, que ninguém sepreocupou em dar.
Na tela, Louis desembrulhava presentes com entusiasmo,entregues por seus pais e familiares. Ele brincava com seus novosbrinquedos sob a árvore decorada, próximo à lareira que aquecia asala contra o frio lá fora. O contraste não poderia ser mais cruel:Miguel não tinha brinquedos e nem sequer um presente para abrir.A ausência de qualquer símbolo natalino ao seu redor fazia o brilhodo filme parecer ainda mais inalcançável.
Enquanto Miguel afundava cada a vez mais na desilusão,observava a alegria de Louis, lentamente, se dissipando. O garotoque brincava com tanto entusiasmo agora exibia um semblanteabatido, e, pouco a pouco, sua empolgação desapareceu porcompleto. Ele deixou os brinquedos de lado, abandonando-os ali,sem a mesma animação de antes.
Miguel, curioso, ajustou-se na cadeira, recostando-se parafrente, os olhos fixos na tela. Ele queria entender o que haviaacontecido, por que aquele garoto, que parecia ter o Natal perfeito,começava a se entristecer. Algo parecia faltando, e Miguel sepegou refletindo se, talvez, a felicidade não estivesse apenas nascoisas que ele não tinha.
Louis vagava pela casa, com um semblante abatido epassos lentos, procurando algo em silêncio. Ele vasculhava osquartos, a cozinha, todos os cômodos, mas não encontrava o quebuscava. Miguel o observava com uma curiosidade crescente e seperguntava, em silêncio: "O que ele está procurando? O quepoderia ser mais importante do que tudo o que ele já tem?"Enquanto pensava nisso, a angústia que sentia se transformou emuma pergunta silenciosa: "Será que eu também estou perdido?"
Depois de algum tempo, Louis desistiu de procurar. Ele sesentou novamente sob a árvore de Natal, com os olhos caídos e osemblante ainda abatido, como se, no fundo, soubesse que aresposta não estava em mais presentes, nem em mais coisas.
Miguel tentava se concentrar no filme, mas o som dasbrincadeiras de sua família preenchia a sala, afastando-o da tela.Eles estavam tão imersos na diversão uns com os outros quepareciam ter esquecido o filme que passava diante de seus olhos.
Enquanto isso, no filme, Louis começava a chorar. Algumaslágrimas escorriam silenciosamente de seus olhos, e ele tentavasecá-las com as mãos, mas elas insistiam em cair, como umachuva teimosa que não cessava até atingir seu fim. O sofrimento deLouis, tão silencioso quanto a tristeza de Miguel, parecia ressoarnas profundezas de seu coração.
Irritado com todos ao seu redor que não deixavam que ele seconcentrasse no filme, Miguel explodiu:
"Por que vocês não fazem silêncio?! Não vêm que eu queroassistir? Por que não vão gritar lá fora?!".
Todos na sala ficaram surpresos com a reação inesperadade Miguel. Seus irmãos, irritados com ele, decidiram sair,arrastando os pais junto. Agora, sozinho diante da televisão, Miguelpôde mergulhar completamente no filme, sem distrações ou ruídos.
Mais uma vez, sua imaginação tomou o controle. Ele se viuao lado de Louis, sentado sob a árvore de Natal, cercado pelosnovos brinquedos do garoto. Eles brincavam juntos, compartilhandorisadas e gestos de camaradagem. Por aquele breve momento,Miguel sentiu como se ele e Louis fossem mais do quepersonagens de mundos distintos — eram irmãos, conectados pelasimples alegria de estarem juntos.
"Você tem irmãos?", questionou Louis a Miguel.
"Tenho. Um irmão e uma irmã", respondeu.
Ali, sob a árvore de Natal, eles continuaram brincando poralgum tempo. Miguel, entretanto, começou a perceber algoestranho. Apesar das risadas e da companhia, o semblante deLouis permanecia abatido. Seus olhos carregavam uma melancoliaque nem os brinquedos nem a brincadeira conseguiam dissipar.
Ele não parecia realmente se divertir, como se algo maisprofundo o estivesse incomodando. Miguel observava atentamente,sentindo que, mesmo em sua imaginação, algo não estavacompleto naquele momento compartilhado.
"Por que você está triste? Seu Natal é perfeito", disse Miguel.
"É que meus pais estão no trabalho".
A imersão de Miguel no filme foi abruptamente interrompidaquando a energia caiu, desligando a televisão. Ele piscou algumasvezes, voltando à realidade. A queda de energia era algo comumna região onde morava, mas isso não diminuía sua irritação sempreque acontecia.
Com um suspiro frustrado, Miguel olhou ao redor da sala,agora envolta em penumbra, enquanto o calor parecia seintensificar na ausência do ventilador. A magia do momento que elehavia construído em sua mente se desfez, deixando apenas osilêncio e a escuridão que se fazia presente após o pôr do Solcomo companhia.
Enquanto esperava a energia voltar, Miguel permaneceusentado, agora apenas ouvindo o som das gargalhadas de suafamília vindo dos fundos da casa. Eles pareciam se divertir comalgo que ele não conseguia identificar, o que fazia o isolamentoparecer ainda maior.
Após alguns minutos, as luzes voltaram, e com elas, atelevisão ligou novamente. Miguel percebeu que havia perdidoparte do filme, mas isso não o desanimou. Ainda queria saber comoa história de Louis terminaria. Ele ajustou-se na cadeira,determinado a assistir ao final, esperando encontrar algumaresposta ou sentido naquele Natal que parecia tão distante do seu.
Quando a televisão voltou a funcionar, Miguel notou que algohavia mudado. Na tela, Louis aparecia com um sorriso radiante, deorelha a orelha, enquanto saboreava biscoitos e chocolate quente.A cena era tão diferente do semblante abatido de antes que Miguelnão pôde evitar pensar: "O que mudou? Por que ele agora está felizfazendo as mesmas coisas?"
Intrigado, continuou assistindo até que uma nova cenatrouxe clareza. Louis estava na cozinha com seus pais e irmãos,brincando e rindo juntos. Eles se divertiam como se não houvessepreocupações, aproveitando a companhia um do outro. Foi nessemomento que algo acendeu na mente de Miguel: a verdadeiraalegria de Louis não vinha dos presentes, dos brinquedos ou daneve, mas do calor humano que o cercava.
Como se estivesse falando com ele, Louis olhou para a telae disse:
"A melhor coisa do Natal é aproveitá-lo em família"
Finalmente, Miguel compreendeu a verdade. Louis estavatriste porque estava longe de sua família. Apesar de todas asatividades natalinas e do cenário de um "Natal perfeito", ainda haviaum vazio dentro dele que nada conseguia preencher.
Miguel percebeu que o brilho das luzes, os presentes ou atémesmo a neve não eram suficientes para trazer felicidade genuína.O que realmente importava era a presença das pessoas queamamos, o calor dos laços que compartilhamos. Naquele instante,ele começou a enxergar sua própria realidade com outros olhos,entendendo que, mesmo sem os luxos dos filmes, ele ainda tinhaalgo precioso: sua família.
Miguel olhou para sua família reunida nos fundos, rindo e sedivertindo, e finalmente percebeu que seu Natal sempre estivera ali,bem diante dele. No entanto, o peso de suas ações mais cedorecaía sobre ele. Ele sabia que precisava juntar os cacos e pedirdesculpas, mas a vergonha o impedia de olhar qualquer um nosolhos.
Com a cabeça baixa e o coração apertado, Miguel reuniucoragem e foi até eles. Assim que apareceu, o riso cessou. Osilêncio tomou conta do ambiente, e ele pôde sentir o olhar de cadaum sobre si. Todos ainda pareciam chateados com a atitude queele havia demonstrado mais cedo, e, em um gesto dedesaprovação, resolveram ignorá-lo.
O peso da rejeição o fez hesitar, mas Miguel sabia queprecisava enfrentar aquilo. Ele respirou fundo, determinado amostrar o quanto estava arrependido.
"Gente, o que estão fazendo?", questionou Miguel, tentando fazerparte do assunto.
Miguel aproximou-se de cabeça baixa, carregando avergonha e a tristeza de seus atos, mas algo inesperadoaconteceu. Em vez de rejeição, encontrou os braços abertos de suafamília. Eles o acolheram com risos e brincadeiras, como se nadativesse acontecido. Naquele momento, Miguel sentiu o verdadeirosignificado do Natal florescer em seu coração.
Ele finalmente compreendeu que o Natal não era algo que secomprava ou dependia de enfeites, presentes, biscoitos ouchocolate quente. Não era sobre a neve, os cachecóis ou o cenárioperfeito dos filmes. O verdadeiro Natal estava nas pessoas ao seuredor, nos momentos compartilhados e no amor que os unia.
Miguel entendeu, e você? Aproveite cada instante ao lado dequem ama, porque é isso que faz o Natal ser especial. Feliz Natal!
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