Capítulo XI
'Voávamos num céu noturno inundado por estrelas cintilantes. Ele estava ao meu lado de braços abertos e olhava para baixo, enquanto eu observava tudo à minha volta. Sobrevoávamos Las Vegas e aquela cidade era - para ser humilde - do Caramba. Os cassinos, a réplica da Torre Eiffel, as fontes e todas aquelas maravilhosas luzes me deixaram encantada.
Ele finalmente levantou a cabeça e sorriu para mim.
- Está gostando?
- Se eu tô gostando? Isso aqui é melhor que voar de vassoura!
- Não é pra tanto...
Dei um giro no ar e gritei de tanta felicidade. Meu coração pulsava com força e eu jurava que podia ouvi-lo bater contra meu peito.
Olhei na direção de onde ele devia estar e vi que Leonardo caía. Seus grandes olhos negros me fitavam enquanto ele mergulhava de encontro à luz.
Virei o corpo para baixo e estiquei o braço, na esperança de arraga-lo. Os milhares de prédios se tornavam maiores e mais brilhantes a cada segundo, o que significava que a qualquer momento ele chegaria ao chão.
- Sinto muito - ele murmurou. - por tudo.
Inclinei ainda mais o corpo para baixo, mas já era tarde demais. Não conseguiria salva-lo.'
- Leonardo! - gritei, sentando na cama de uma vez só. Aquilo nunca acontecia. Eu nunca gritava por ele.
- Hã? - ao ouvir sua voz bem do meu lado, dei um pulo da cama e corri até a porta. - Relaxa, se eu quisesse fazer qualquer coisa, faria enquanto você dormia, não acha? - ele permanecia sentado na cadeira ao lado da cama e tinha os braços cruzados.
Fazia sentido.
- Há quanto tempo você está aqui?
Ele tirou o celular do bolso e disse:
- Duas horas.
- E o que você fez durante todo esse tempo? Me observou dormir enquanto fotografava meu corpo nu? - sugeri, voltando para a cama.
- Isso aqui não é Life is Strange e eu não sou o professor Jefferson - arqueei as sobrancelhas não entendendo a referência. Quando ele percebeu que eu estava "boiando", deu de ombros e disse: - encontrei esses livros - apontou para uma pilha de livros no chão. Eles pertenceram à minha mãe e eu nunca tive vontade de lê-los. - e folheei alguns. São muito bons.
- Ótimo. Pode ficar com eles, se quiser.
- Você não quer? Por que não quer?
- Olha... Eu realmente não entendo o que você ainda faz aqui. Sério.
- Eu quero saber o que tinha naquela mensagem que você me mandou.
- Por quê é tão importante que você saiba?
- Porque eu preciso entender por que a Lilá a apagou.
- Lilá?
- É, minha namorada - abri a boca. Não sabia o que dizer ou o que pensar. A namorada dele havia lido aquela mensagem maluca que eu tinha mandado, o que podia significar que ela estava me caçando naquele exato momento com uma furadeira em mãos. - ela tem o péssimo hábito de mexer nas minhas coisas e também adora entrar nas minhas redes sociais.
- Ela me parece ser meio psicótica.
- Tecnicamente sim.
Arqueei as sobrancelhas.
Era muito pior quando a pessoa assumia que se relacionava com alguém que a qualquer segundo podia matar toda a sua família num incêndio aparentemente acidental e que levaria anos para ser solucionado.
- Sinto muito pela sua vida.
- Você não quer mesmo me dizer o que tinha naquela mensagem, né?
- Pela primeira vez eu tenho que concordar com você. Acertou em cheio.
- E por que não?
- Porque se você souber disso, seremos todos perseguidos pela CIA... Você viu se meu pai acordou? - perguntei mudando de assunto. Não esperei resposta. Levantei e atravessei meu quarto em direção à porta. Passei pela frente do espelho e algo me fez parar.
- É... Por que você chamou meu nome quando acordou? - ele perguntou e eu o ignorei.
Toquei meu rosto roxo e - por alguma razão bastante babaca - pressionei. Doeu bastante e eu gemi. Ele levantou.
- Hein? - insistiu, não dando a mínima para minha dor.
- Do que é que você está falando, cara?
- Por que você chamou meu nome? - repetiu a pergunta que eu havia tentado ignorar.
- Pelo mesmo motivo que você está me seguindo - respondi, me esquivando do assunto.
Acho que pela primeira vez desde que começamos a conversar naquele dia, ele sorriu. Três rugas de expressão surgiram nas pontas de seus lábios, tornando-o um tanto atraente.
- Será?
Revirei os olhos não querendo mais olhar para ele e saí.
Meu pai ainda dormia na mesma posição esquisita de antes e eu preferi que ele descansasse por mais um tempinho. Mas, quando minha barriga roncou, eu me vi tentada a acorda-lo.
Entrei na cozinha e abri a geladeira a procura de qualquer coisa comestível que não precisasse de um preparo elaborado.
Peguei as sobras de ontem e ao me virar dei de cara com Leonardo, que estava parado há poucos centímetros de mim. ELE DEFINITIVAMENTE ME ASSUSTAVA.
- Acho melhor você ir embora - sugeri, dando um passo para trás - Não é que eu não queria sua presença aqui, mas... Nós meio que não somos amigos e eu estou começando a te achar um pouco estranho, entende?
- Sabe, eu ainda lembro de quando você me pedia para te enviar dezenas de músicas do Bruno Mars.
POR QUE ELE SEMPRE MUDAVA DE ASSUNTO DA FORMA MAIS BIZARRA POSSÍVEL??!!
- Não gosto mais dele - coloquei o prato dentro do microondas.
- Nem eu.
- Ótimo, agora você já pode parar de dizer e perguntar coisas sem sentido.
- Sinto muito se te deixei desconfortável.
Eu ri como quem diz: Pfff, você não me deixou desconfortável. Tsc.
- O quê?! É isso o que você acha? Que me deixa assim? Não, não, não, relaxa, relaxa - e, gente, vocês precisam saber: essa é a declaração oficial de uma pessoa numa situação desconfortável.
- Que bom então - ele me encarou. Decidi manter o olhar. Aquilo era tão desconfortável que a minha vontade era de rir, mas eu não podia. Se desse risada ele veria que eu não passava de uma idiota. Levantei uma das sobrancelhas e cruzei os braços. Ele permanecia imóvel. O microondas apitou e eu involuntariamente me assustei.
- Acho que você perdeu.
- Perdi? Isso era uma competição?
- Não - respondeu ele, balançando a cabeça. - Acho que já entendi que você não vai me contar e que você não me quer aqui.
Não disse nada.
- Se importa se eu levar um daqueles livros?
- Pode levar quantos quiser.
Leonardo assentiu e saiu da cozinha em direção do corredor. Voltou menos de um minuto depois com apenas um livro em mãos.
- Depois eu te devolvo.
- Não precisa.
- Eu faço questão - e, com isso, ele foi embora.
"Por que você foi tão grosseira, hein?"
Foi o que uma vozinha dentro da minha cabeça perguntou assim que ouvi a porta fechar.
Eu não era assim, mas algo nele me fazia querer manter distância. Eu não sabia o que era. Na verdade, eu sabia, mas queria ignorar aquelas lembranças.
Terminei de almoçar e fui até o quarto do meu pai.
- Pai, você pretende acordar hoje?
Ele se mexeu muito brevemente e deu um gemido.
- Pai, você precisa trabalhar, sabia? Tem um livro que precisar ser escrito e personagens que precisam ser mortos.
- Eu sei - ele murmurou mas nem saiu do lugar.
- Então se você sabe, levanta logo, vem. Você não tem ideia do que aconteceu comigo hoje - disse, na tentativa de fazê-lo olhar para mim. Falhei miseravelmente. - pai, sabia que hoje o Café foi assaltado, eu fui ameaçada de morte e levei um soco no rosto?
Ele abriu os olhos e percebi que sorria. Com certeza não acreditava em mim. Mas, quando sua visão entrou em foco e ele viu meu rosto inchado e roxo, seu sorriso murchou na mesma hora e ele pulou da cama.
- Machucaram você? - perguntou, estendendo o braço e me puxando para mais perto.
- Bem, é isso o que acontece quando se leva um murro, não acha?
- E como você está agora?
- Confesso que estou com um pouco de medo de voltar a trabalhar lá, mas eu até que estou aguentando muito bem essa coisa toda de recém assaltada.
- Isso é terrível, minha filha. Não tinha ninguém lá para te ajudar?
- Hum... Primeiro eu estava sozinha quando tudo começou, mas depois Leonardo chegou... Não, não foi aquele que veio aqui em casa... E o ladrão apontou a arma para ele, que foi obrigado a deitar no chão. Meu gerente chegou logo depois.
- E o que ele disse?
- Nada demais. Me deu um dinheiro pro táxi e Leonardo fez questão de me trazer.
- Ele ainda está aqui?
- Não. Eu praticamente o expulsei.
- Posso saber o por quê?
- Não. Mas sabe o que você pode? Tomar um banho e tirar esse fedor de whisky fermentado.
- Filha, não quero que você volte para esse trabalho.
- Pai, relaxa. Um raio não cai duas vezes no mesmo lugar, lembra?
- Mas e se cair?
- Não vai cair - respondi com uma certeza que eu não tinha. O abracei e saí do quarto antes que ele começasse a criar argumentos para me fazer mudar de ideia.
Entrei em meu quarto e a primeira coisa que eu fui obrigada a ver foram os livros da minha mãe no carpete. Nunca havia tido nenhum interesse por eles e não seria agora que eu mudaria de ideia. Me agachei e meu rosto latejou. Apanhei a pilha e um livro escorregou e caiu. Coloquei os livros na cama e senti a mesma dor ao abaixar para pega-lo. Ia jogando ele em cima dos outros quando vi o nome do primeiro livro na pilha sobre a cama: A Menina Que Roubava Livros.
Gente, A Menina que Roubava Livros é meu livro favorito e o grande motivo da minha escolha para a capa: o guarda-chuva vermelho. Espero que estejam gostando bastante. Votem e comentem o que acharam... Beijos de Luz =)
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