Capítulo IX
O toque do celular me despertou de um sonho que eu não consigo me lembrar.
- O que você quer, Sammy? - joguei o lençol para o lado e levantei.
- Que você me conte todos. Os. Detalhes! - ele disse pausadamente, com a voz mais escandalosa do mundo.
- Detalhes de quê? - "Do quê é que ele tá falando?" me perguntei coçando os olhos.
- De ontem! Anda, conta logo. Como foi?
- Não teve nada. Não aconteceu nada, tá?
- Tem certeza? E aquela hora antes do jantar começar?
- Eu trouxe ele pro meu quarto e ficamos conversando um pouco sobre...
- Sexo? Filhos? Fetiches?
Dei risada e sentei em frente à escrivaninha, ligando o computador.
- Não, não e talvez... Brincadeira. Não falamos sobre nada íntimo demais. Ele só me chamou pra um encontro no fim de semana.
- E é aí que vocês transam.
- Sammy, vai se ferrar. Preciso desligar. Já terminou o trabalho de inglês?
- Ainda não.
- Eu fiz a maior parte e você ainda não entregou? Meu Deus, Sammy.
- Querida, se você está achando ruim, vem aqui e faz por mim.
- Hahaha, não vou cair nesse seu joguinho psicológico. Seu trabalho. Você termina.
- Então adeus, vadia.
- Também te adoro - mas ele já havia desligado.
Como de praxe, esperei o computador ligar enquanto tirava o pijama.
Havia uma mensagem.
"Oi Lia. Você não me disse mais nada depois da mensagem que eu te mandei e eu realmente fiquei curioso em saber o que você queria me dizer. Posso te encontrar hoje no seu trabalho?"
Engoli em seco e pensei em milhares de respostas para dar: Lia morreu. Perdi a memória. Hã? Quem é você, cara? Sai fora!
Mas todas me pareceram juvenis e... Bem, imbecis.
Só que eu não queria encontrar ele. Eu não queria ter que inventar mil mentiras para tentar me safar da história e também não queria dizer a maldita e vergonhosa verdade.
"Não sei se terei tempo."
Curta e grossa. Mas, totalmente o oposto do que eu esperava, ele respondeu logo em seguida.
"Vou estar passando em frente ao Café onde você trabalha por volta das dez da manhã. Te vejo lá."
QUÊ? Ele não sabia ler? Eu estava deixando bem claro que não queria nem falar e nem vê-lo, mas ainda assim o cara insistiu.
Não respondi nada. Chequei - mais de uma vez - se Léo (o Leonardo do metrô, ok? Afinal, o outro havia acabado de falar) tinha falado comigo e me vi decepcionada - mais de uma vez - ao ver que ele não mandara nenhuma mensagem.
Me aprontei para o trabalho e saí do quarto. Não era nenhuma surpresa que meu pai ainda não tinha levantado. Ele dormira com a garrafa de whisky ao lado do corpo e estava numa posição um tanto desconfortável, mas eu não me arriscaria em entrar lá e move-lo.
Comi um cereal rápido e parti para minha rotina.
Andei por alguns minutos até sair da minha rua e cheguei à estação de metrô, onde desci as escadas que começavam a ficar movimentadas e me direcionei à pilastra amarela e branca onde eu costumava me escorar e esperar pelo trem.
Ele chegou menos de cinco minutos depois e eu - ignorando a horda de apressados que simplesmente brotaram do chão à minha frente - embarquei e me segurei na barra de metal.
O caminho até Midtown não era o que podemos chamar de super demorado, mas também não era estupidamente rápido.
As pessoas à minha volta pareciam tão distraídas e submersas em seus mundos particulares, que eu, de repente, me senti insignificante no meio de todos eles. Uma mulher à minha direita fazia palavras cruzadas enquanto batia os pés num ritmo bastante lento no chão; um homem sentado ao lado da porta parecia fascinado com o que quer que estivesse lendo em seu jornal amassado. Ele usava um paletó muito surrado e tinha a barba por fazer; alguém atrás de mim cantava baixinho uma música que ecoava dos seus fones super altos. Todas elas estavam vivendo suas vidas e - pelo menos aparentemente - sabiam para onde iam e do que gostavam. Diferente de mim. Eu era uma mulher - com uma mente de garota no final da adolescência - de vinte anos e não sabia o que queria para a minha vida. Não tinha um emprego no qual eu pudesse me orgulhar e nem um lar que pudesse chamar de meu. Eu não tinha hobbies e nem era apaixonada por nada que me fizesse querer viver. Aquilo me deixou profundamente triste.
Baixei a cabeça, envergonhada. Como se as pessoas ali pudessem ler meus pensamentos e saber que eu estava desesperada em encontrar a parte que faltava de mim.
Caminhei até o Caféxpresso a passos largos. Não queria nem mais um minuto permanecer do lado de fora. Naquela cidade onde até os mínimos detalhes faziam com que eu me sentisse minúscula.
- Bom dia - murmurei para Angus, antes de me apressar até o vestiário e trocar de roupa. - a máquina está funcionando bem? - perguntei à ele quando voltei ao seu lado.
- Está. Abriremos em dois minutos.
- Por que não podemos simplesmente abrir agora? Quem liga se está faltando dois minutos?!
- Regras são regras, Lia.
Revirei os olhos e vesti o avental apoiado no balcão.
- Pode abrir. Angelina se atrasou hoje, mas acho que você pode dar conta das coisas, certo?
- Eu vou receber a mais?
- Nem pensar.
- Então verei o que eu posso fazer.
Virei a placa para aberto e entrei pra varrer o Café.
Ouvi a sineta tocar e corri pra trás do balcão.
- Um café expresso e suas rosquinhas, por favor - um homem baixo, de cabelos castanhos e olhos vermelhos fez o pedido. Ele parecia nervoso.
- Pra levar?
- Não, eu também quero usar um computador.
- Certo. Angus, vem aqui - ele apareceu da cozinha. - libera um computador pra ele - informei enquanto servia o café e o entregava as rosquinhas
- Obrigado.
- Obrigada você.
Mais algumas pessoas entraram e saíram depois que atendi aquele cara, e ele permanecia no mesmo lugar. Não pediu mais um café e nem tocou nas rosquinhas.
Não comentei nada com o Angus pois ele podia me chamar de paranoica mas, quando ele disse que precisava sair por uns minutos e eu teria de ficar ali sozinha, me arrependi amargamente de não ter feito.
O cara levantou dez segundos após a saída do Angus. EXATAMENTE DEZ SEGUNDOS, eu contei. Veio na minha direção e suspendeu a blusa para que eu pudesse ver sua arma.
Gelei da cabeça aos pés e não consegui pensar ou fazer ou falar nada.
- Não grite e nem faça nenhum movimento brusco, passa tudo o que você tem aí. Eu sei que vocês guardam dinheiro numa dessas gavetas então nem venha com a desculpa de que acabou de abrir. Anda - mas eu ainda continuava do mesmo jeito. Congelada. Ele rodeou o balcão e veio pisando forte em minha direção. - você não ouviu o que eu disse, vadia? - puxou meu cabelo para trás e na hora eu não senti nada que não fosse um medo terrível. O que ele faria em seguida? Afinal, estávamos apenas eu e ele ali. - anda, me mostra onde é que tá o dinheiro.
Tremendo mais que uma cidade em terremoto, apontei para a segunda gaveta do lado direito e, antes que ele me soltasse, a porta se abriu e Leonardo entrou. Ele usava o mesmo macacão azul daquele dia, mas não carregava sua maleta.
Na mesma hora, o ladrão sacou a arma e a apontou para Leonardo, que arregalou os olhos e levantou as mãos.
- Deita no chão e não faz nenhuma droga de barulho, entendeu? Anda. DEITA LOGO - alteou a voz e apontou a arma para mim. Fechei os olhos não querendo ver aquela cena e uma lágrima escorreu pelo meu rosto. - se não eu acabo com ela.
Leonardo deitou no chão sem dizer uma palavra. Sei disso porque ouvi seus movimentos ao se abaixar e também porque o ladrão me soltou e me empurrou para a gaveta.
- Abre e coloca o dinheiro naquela sacola. Vai logo! - me arrisquei a olhar pra ele por um segundo e reparei que seus olhos eram fundos e sua respiração estava ofegante e descompassada. - NÃO OLHA PRA MIM!
Segurando a respiração, fiz o que ele me pediu com bastante agilidade, apesar de ter a visão turva por causa das lágrimas acumuladas em meus olhos e das mãos trêmulas. Entreguei-lhe a sacola e ele pegou, tornando a apontar a arma para mim.
- Eu já fiz o que você pediu - sussurrei em súplica.
- Cala a boca. Se você contar sobre mim, eu acabo com você, entendeu? Eu mato você - apesar da ameaça, sua voz estava agitada. Ele com toda certeza era um usuário de drogas. - e isso é só pra você ter noção do que vai acontecer caso conte pra alguém - e me deu um soco no rosto.
Por um segundo eu senti uma dor martelar minha cabeça. Depois vi tudo girar e logo em seguida escurecer.
Se vocês gostaram, lembrem de votar e comentar o que acharam. Beijos de Luz =)
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