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72 dias. Sexta-feira 13 - parte VI.


Estaciono o carro na rua da Mandy, amiga da Kim, e seguimos com as duas para a maravilhosa jornada de "doces ou travessuras".

Todo o bairro está decorado com morcegos e teias de aranhas nos galhos das árvores, abóboras e personagens sinistros nas entradas das casas e repleto de gente de todas as idades fantasiadas das mais diversas coisas. Um cara, por exemplo, acabou de passar por mim fantasiado com um lençol cobrindo o corpo e dois buracos na frente dos olhos para que ele pudesse enxergar. Esse é o cúmulo da falta de criatividade.

- Doces ou travessuras?! - grita Mandy e Kim à porta de uma senhora de idade vestida de super heroína.

- Tomem seus caramelos, meninas lindas - diz a moça gentilmente.

- Tá afim de assistir um filme? - pergunto à Tess, puxando-a para um canto.

- E as meninas?

- Elas sabem se cuidar. Tenho certeza que deve estar passando algum sexta-feira 13 no cinema. Topa?

Ela da de ombros e eu entendo isso como um sim.

- Ei, Kim, eu e a Tess vamos dar uma volta enquanto vocês pedem os doces, beleza? Nos encontramos na casa da Mandy por volta das dez.

- Tá, podem ir namorar.

Tess da uma risada engraçada e alterna o olhar entre mim, a Kim e a Mandy. Quando percebe que nenhum de nós três ri, ela fica séria e se vira.

- Ela é maluca, né? - pergunta Mandy ao ouvido da Kim.

- Ele é mais, acredite.

Ignoro o comentário das duas e acelero os passos para acompanhar a Tess.

- Tem um cinema bem perto daqui, podemos ir a pé. Tudo bem pra você? - quero saber, já que eu nunca sei quando ela vai ficar cansada ou desmaiar de repente.

- Tudo sim... Você fica falando pra Kim que estamos namorando?

- Não - respondo na mesma hora. - Ela viu a gente se beijando na roda gigante.

- Ah, isso explica muita coisa.

Balanço a cabeça e dou risada.

Discretamente, me aproximo um pouco mais dela e as costas das nossas mãos se tocam. Ela toma a iniciativa e entrelaça nossos dedos.

Faz mais ou menos cinco minutos que estamos andando em silêncio, observando a movimentação alegre à nossa volta, quando ela me pergunta do nada:

- Qual sua segunda banda favorita?

Paro um tempo para pensar e respondo:

- The Cure, conhece?

- Nunca ouvi falar. Eles são legais?

- É claro que são. Você acha mesmo que eu iria gostar de algo que não fosse minimamente incrível?

- Bom saber que eu sou minimamente incrível - ela comenta.

- Minimamente incrível é um apelido carinhoso se comparado ao que você realmente é - digo, talvez não me dando conta do papel de idiota apaixonado que estou pagando.

- Eu sinceramente sinto vontade de te chutar e te beijar quando você diz essas coisas.

- Olha...

- Calado.

Damos risada e tornamos a mergulhar num silêncio que já não é mais desconfortável.

Chegamos ao cinema e eu estava totalmente certo. A parte seis do sexta-feira treze está em cartaz e entramos na fila para comprar nossos ingressos. Menos de um minutos depois já estamos comprando a pipoca e os refrigerantes.

Eu quase posso ouvir grilos no cinema de tão vazio que ele está, já que, obviamente, a maioria das pessoas estão aproveitando o Halloween com festas, doces ou travessuras e pregar peças em alguém suficientemente trouxa para cair nelas.

Eu e a Tess nos sentamos numa das primeiras fileiras da sala quase completamente vazia e o filme começa.

A Tess assiste em silêncio, os olhos fixos na tela e a mão se movimentando em direção ao balde de pipoca e ao refrigerante cheio de gelo. Procuro prestar atenção no filme, mas confesso que passo grande parte do tempo a observando disfarçadamente. Eu preciso aproveitar cada momento com ela e observar cada detalhe do seu rosto.

Sinto um rápido desconforto dentro de mim ao pensar que não teremos muitos momentos como esse, mas ele logo vai embora quando a Tess percebe que eu a encaro e vira o rosto para mim.

- Não vai ver o filme? - pergunta num cochicho.

- Claro - desvio os olhos para a tela. Ela faz o mesmo.

O filme acaba e as luzes acendem. As poucas pessoas começam a sair, mas nós dois permanecemos sentados.

- Está afim de fazer o que agora? - ela pergunta. Eu dou de ombros, ainda sem olha-la. - quer ir comer umas batatas fritas? Parece que essa pipoca realmente me deixou com mais fome - solto uma risada fraca e ela toca meu ombro. - o que foi?

- Nada não. - Eu não queria preocupa-la com o fato de que eu estou preocupado com sua morte que, a cada dia, se torna mais próxima. Levanto e estendo a mão para ela, que levanta-se sem minha ajuda e recolhe nosso lixo.

- Bom mesmo que não seja nada.

Saímos do cinema e começamos a caminhar em direção à casa da Mandy, pois a lanchonete que a Tess quer ir é a duas ruas de distância de lá.

Conforme vamos nos aproximando do nosso ponto de partida, percebo uma aglomeração de pessoas olhando para alguma coisa no chão.

Eu e a Tess nos andamos com mais velocidade eu logo avisto a Mandy.

- Ei, Mandy! O que está acontecendo? Cadê a Kim? - toco o ombro dela, que vira para mim, os olhos lacrimejantes, e aponta em direção ao centro de toda aquela multidão.

Prendo a respiração e sinto tudo girar.

Empurro as pessoas para abrir caminho e passo por entre elas. Chego ao centro da aglomeração. Minha cabeça dói na mesma hora. A Kim está caída no chão com uma faca enfiada no braço esquerdo.

Corro para ela e me jogo ao seu lado. Ela respira.

- Alguém chama uma ambulância! - grito, esquecendo completamente do fato que eu tenho um carro. - SAIAM DA MINHA FRENTE! - berro, carregando a minha irmã para longe de tudo aquilo. Corro com ela em meus braços em direção ao meu carro estacionado. A quantidade de sangue que sai dela é muito pouca e eu tento me tranquilizar que não foi nada de muito grave.

Repouso o corpo mole dela no banco de trás e sento em frente ao volante. Antes de ligar o carro respiro muito fundo e ouço um barulho de porta se abrindo. É a Tess. Ela apoia a cabeça da Kim em suas pernas e estende a mão para tocar meu ombro.

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