Capítulo 2
Acordei e estava deitada em uma cama com dossel e um tecido fino, branco e quase transparente pendurado a ele, balançava movido pela leve brisa que adentrava pela janela aberta no cômodo em que me encontrava.
Tentei levantar e senti que a minha cabeça doía, latejava e a dor me deixava tonta a qualquer pequeno movimento.
Esperei a minha visão se estabilizar e com dificuldade me sentei e observei todo o espaço a minha volta. Era amplo e exibia uma parede feita de grandes pedras empilhadas, no estilo medieval, parecida com as das imagens dos livros que meus pais tinham em casa.
O teto adornado por um forro de madeira escura e as portas e as janelas eram confeccionadas com o mesmo material que dava um ar imponente ao ambiente.
Além da cama, os móveis eram um espaçoso guarda-roupas de madeira e uma mesa com duas cadeiras. Estranhei ao ver uma grande banheira branca ao lado de uma lareira e me perguntei o motivo pelo qual a banheira não ficava em um banheiro. No chão, aos pés da cama, pousava-se um lindo tapete felpudo.
Não reconhecendo aquele espaço, ainda tonta forcei-me a levantar e imediatamente ao ficar de pé, senti minha cabeça pulsar com a dor e dessa vez acompanhada por uma tontura mais forte.
Tentei me segurar e com o equilíbrio um pouco comprometido, acabei derrubando um copo com água que estava na mesa ao lado da cama, fazendo um barulho alto ecoar por todo o grande cômodo.
Como um filme, lembrei-me de toda a cena que vivi com os lobos na entrada da caverna e do motivo de eu estar sentindo aquela dor. De imediato olhei em volta procurando por Bravo, mas ele não estava ali comigo, o que fez meu coração se apertar e meus olhos se encherem de lágrimas e preocupação.
Meu lobo amigo lutou bravamente, foi ferido e tudo para me defender.
— O que aconteceu com você, meu amigo? — perguntei em um sussurro, como se Bravo pudesse me ouvir e fiz uma prece para que estivesse bem em algum lugar.
Aprumei-me após a tontura passar e notei uma sacada no quarto, por onde a claridade entrava e repetindo o mesmo gesto que fiz quando acordei naquele dia, fui devagar até a porta e assim que a abri, senti a brisa tocar meu rosto. Fechei meus olhos para aproveitá-la e a diferença era que não estava mais frio.
Andei um passo para fora e ao sair na sacada, olhei para o céu que exibia tons de azul, roxo, laranja e rosa, como se o sol já estivesse se pondo e era uma verdadeira pintura, até parecia mágica.
Encostei-me ao parapeito, olhei ao redor e em minha confusão, entendi que encontrava-me em uma espécie de castelo com vários andares e o quarto em que acordei parecia ficar em um segundo ou terceiro andar dele.
Olhei para baixo e contemplei tudo ao redor, de modo que meus olhos se espantavam com o que viam. Era tudo muito colorido, com muitas flores e árvores, tudo parecia brilhar de um jeito diferente e radiava vida por todos os cantos.
No grande pátio logo abaixo da sacada, muitas pessoas andavam com sorrisos nos rostos e entre elas também grandes e lindos cavalos brancos e de todas as cores, com crinas bem penteadas e pelos sedosos que mesmo os vendo de longe conseguia notar que eram bem cuidados.
Do lado de fora dos muros altos, eu conseguia enxergar fileiras de telhados idênticos, provavelmente do povoado mais próximo.
Todas as pessoas no pátio eram magras, tinham a pele muito clara, cabelos loiros ou ruivos e eu, com a minha cor, se me misturasse a eles, certamente destoaria de todos.
— Vejam, nossa rainha! — alguém gritou e apontou para mim.
— Viva a rainha! — outra pessoa gritou.
— Viva! — todos responderam e começaram a fazer reverência em minha direção, bem debaixo da janela.
Assustada e sem entender se toda aquela comoção era para mim, andei de costas de volta para dentro do quarto, passo após passo, sem me virar e até pensei em correr, mas a tontura não me deixaria ir muito longe.
O que estava acontecendo?
Antes que pudesse me virar, dei de encontro com alguém muito alto, parado logo atrás de mim e me virei em um pulo.
Um homem, forte, alto e com a pele clara como os outros que eu tinha visto, me observava com atenção. Carregava olhos tão azuis que pareciam brilhar em seu rosto. Tinha o cabelo loiro, quase cinza, que lembrava muito os do meu pai e estava amarrado em um pequeno rabo de cavalo.
Nem os atores que eu assistia na pequena TV da cabana, eram tão bonitos como aquele homem na minha frente. Ele era lindo.
Olhava-me como se me conhecesse e esperasse a mesma reação de mim, só que quando percebeu que eu não diria nada e muda o olhava assustada, enfim falou, parecendo receoso:
— Desculpe a intromissão, mas ouvi um barulho. Fiquei preocupado e entrei sem bater para ver como a senhora estava. — Abaixou o olhar e tinha as mãos para trás. Sua voz era grossa e soava como um carinho de tão boa de ouvir.
Juntei as sobrancelhas e o analisei mais um pouco, admirada com sua beleza e sem saber o motivo de me tratar com tamanha educação e respeito como se eu fosse alguma divindade. Seu tratamento e modo de falar, até me lembrou um pouco os meus pais e senti uma paz me atingir.
Voltou a me encarar e analisei seu rosto bem desenhado, com o maxilar alinhado e uma leve barba por fazer que o deixava com um ar másculo.
Imediatamente tive a impressão de já tê-lo visto, seus olhos azuis me pareciam familiar, entretanto, não tive contato com mais ninguém que não fossem meus pais e o médico que me atendeu uma vez.
Usava uma camisa cinza de mangas longas, confeccionada com um pano fino que se ajustava aos seus músculos, calças pretas e botas também pretas, como se fosse montar, completava sua vestimenta.
Notei que levava uma adaga no coldre, que possuía um cabo em metal e o desenho de uma flor de lótus, como a que meu pai carregava.
Balancei a cabeça na intenção de parar de vagar com os pensamentos nas minhas lembranças e perguntei tudo de uma vez, tirando meu olhar dele:
— Quem é você? Onde eu estou? Como volto para a minha casa? E cadê meu lobo? — Nitidamente demonstrei meu desespero, quando desviei do seu corpo e como se tivesse saído de um transe, comecei a andar de um lado para o outro. —
Levei a mão a cabeça sentindo dor.
— Eu estou aqui — me respondeu baixo, com uma voz forte e grossa, mas parecia tão nervoso quanto eu.
Juntei minhas sobrancelhas e o encarei sem dizer nada.
— Sou eu... o Bravo. — Engoliu em seco como se estivesse com medo da minha reação. — Vida, você... está em seu reino, que se chama Flós. — Percebi que disse meu nome e me perguntei como ele sabia que me chamava Vida.
Olhei para o seu pescoço que levava um curativo e depois para o seu rosto que tinha uma cicatriz clara na vertical. Sentindo-me muito desnorteada comparei com a cicatriz que o meu Bravo levava desde o dia que chegou machucado na minha casa, no dia seguinte a morte dos meus pais.
O encarei muito confusa, mas balancei a cabeça em negativo e voltei a andar pelo quarto, sendo fitada por aquele homem grande e bonito, tão grande que sua presença parecia encher todo espaço do quarto. Já seu olhar exalava receio como se não soubesse o que fazer para me acalmar.
Notando a minha confusão, começou a me explicar:
— Sei que é surpreendente e vai ser difícil de encarar essa nova realidade, no entanto, vou tentar te contar e amenizar a sua confusão.
Balancei a cabeça em negativo.
— Eu quero ir para casa e quero o meu lobo... meu melhor e único amigo, o único ser que eu amo.
Vi seu semblante sério se amenizar, um leve sorriso tomou seus lábios, depois olhou para o chão como se tentasse se recompor e com um olhar fixo recomeçou a falar:
— Vida, aos arredores de Flós existem muitos reinos. Tem o reino Fidelium que são nossos aliados, mas com a localização distante de nós, assim como que é ainda mais longe e não temos contato. Tem também o reino de Cinere, que são nossos vizinhos, e nossa história de tormento começa com eles. — O vi engolir em seco. — Há muitos anos, um mago do reino de Cinere, transformou o nosso reino em cinzas por causa do casamento do nosso rei e da rainha Evoen, do reino de Animalis, outro dos nossos vizinhos. — Naquele momento eu o encarava com as mãos na cintura, claramente mostrando interesse no que me dizia. — O rei de Cinere, Malum, era apaixonado pela rainha Evoen e não aceitou ser rejeitado, quando ela escolheu se casar com o nosso rei. Com isso, ele ordenou que o seu mago lançasse uma maldição que mataria aos poucos o reino de Flós.
— Maldição?
— Sim.
— Isso existe mesmo? Sempre li nos livros que meus pais guardavam na estante e achei que era lenda.
Encarou-me de forma que eu não soube decifrar no momento.
— Sim, existe e a que foi lançada sobre nós foi a pior delas, que só começaria a ser quebrada quando uma criança com a pele como a noite e os olhos como o sol, nascesse no nosso reino, o que era impossível, já que todos os habitantes do reino de Flós são brancos e nunca na história da nossa genealogia uma criança com essas características havia nascido aqui. — Apesar de ser difícil de acreditar, eu estava me interessando por tudo o que ele contava. — Com o passar dos anos, os alimentos foram ficando cada vez mais escassos e cada árvore foi morrendo e se transformando em cinzas como era em Cinere, o reino das cinzas. Mesmo o nosso rei e rainha sendo solidários com seu povo e dividindo cada pão com seus súditos, passávamos cada vez mais fome e cada vez menos bebês nasciam aqui, com isso, tornando impossível a quebra da maldição.
— E quando isso aconteceu? Porque agora, ainda que tão magros, vejo que vivem bem. — Apontei para o lado de fora da janela, indicando o que eu tinha visto minutos antes.
— Começou um pouco antes de sua mãe biológica ficar grávida e você nascer. Foi uma surpresa e uma alegria. Sua pele como a noite foi admirada por seus pais e a cor dela era vista como uma benção e uma salvação para todos. — Involuntariamente eu sorri. — Depois, investigando, foi descoberto que sua mãe nasceu aqui, mas seus avós vieram de um reino distante e as pessoas de sua genealogia tinham a pele como a noite.
Juntei a sobrancelha tentando assimilar tudo e ele continuou:
— A primeira vez que você os olhou, com seus olhos cor de mel, os dois choraram de alegria e logo a notícia se espalhou por Flós. A garota de pele escura como a noite e os olhos claros como o sol havia nascido para salvar o nosso povo. Festas começaram a serem organizadas, as flores e frutos reviveram, as árvores voltaram a ser verdes e o povo tinha alimento. No entanto, misteriosamente no mesmo dia em que a notícia se espalhou, a casa dos seus pais pegou fogo e ambos morreram no incêndio dias após seu nascimento. Meu pai conseguiu salvar apenas você das chamas que consumiram a sua casa e, desse dia, você leva a cicatriz na mão.
Minha cicatriz de coração...
Olhei para a minha marca e me sentia muito confusa, mas tudo fazia sentido e eu o ouvia falar cada palavra com atenção, ao mesmo tempo sentia o meu coração bater acelerado como se tudo fosse um sonho ou como se uma lembrança esquecida, estivesse sendo reavivada em meus pensamentos.
Bravo continuou a falar:
— Com medo de que a salvadora do povo morresse com mais um atentado misterioso, o rei e a rainha ordenaram que um casal de guerreiros muito corajosos de Flós, saíssem do reino pelo portal que levava para o mundo paralelo onde você foi criada. Era algo que ninguém aqui conhecia direito, sabíamos da existência do mundo e a passagem sempre esteve ao nosso dispor, mas nunca foi usada por ser algo ainda desconhecido. Contudo, alguns guerreiros foram até lá e sondaram tudo antes da sua chegada, em seguida o casal de guerreiros aceitou o desafio, deixaram suas vidas e família para trás e partiram com você, para o desconhecido que era o único jeito de mantê-la segura. — Ele me encarou e pude ver seriedade em seus olhos, como se me contar a próxima parte fosse importante. — Por todos esses anos, ambos te mantiveram segura e viveram na espera de que você completasse seus vinte anos e assim os dois pudessem voltar para o reino com você. Enquanto após a sua partida há vinte anos, aqui vivíamos nas cinzas e à espera.
— Mas por que apenas com vinte anos?
— Achamos que a maldição tem ramificações, uma delas, que o nosso antigo mago descobriu, era a idade de duas décadas. Se você vivesse por vinte anos acabaria de vez com o feitiço do mago de Cinere.
— Então meus pais adotivos eram guerreiros? — perguntei baixo, mais para mim mesma, só que Bravo respondeu:
— Sim, e fizeram um excelente trabalho, te defenderam contra tudo de ruim que ameaçava a sua vida, mesmo em um mundo que não conheciam, porém aprenderam, se reinventaram e quando estavam perto de cumprir seus trabalhos com êxito, sentiram os lobos se aproximando de onde morávamos e para afastá-los de você, saíram de casa ao encontro deles, infelizmente eram muitos e ambos não resistiram a luta.
Bravo parecia sofrer ao me contar essa parte da história e ao ouvir sobre meus pais eu também sofri.
— Meus pais... digo os adotivos... quando eles morreram... — Eu estava confusa e acreditando na história mesmo parecendo loucura, mas tudo fazia tanto sentido.
— Eles morreram em um ataque dos Cineres. O povo Cinere leva a forma de lobo no outro mundo, só que lobos maus, com a aparência carregada da feiura que levam em seus corações. Eles também têm uma passagem em seu reino.
— Todos aqui viram lobos no outro reino também?
— Não, nós levamos a forma que o nosso coração desejar ou da nossa personalidade, mas também podemos escolher a forma humana. Eu fui enviado pelo guardião do trono, para ajudá-los no final da empreitada e já estava à espreita, tomando conta de vocês de longe. Porém, quando percebi os guerreiros sendo atacados foi tarde, tentei os ajudar, mas... foi tarde. — Notei sua tristeza evidente ao falar da morte dos meus pais... adotivos. — Matei os Cineres antes que conseguissem chegar até você e então, como estava sozinha, fiquei te protegendo por lá, mesmo quando insistentemente me mandava embora.
Sorri com a lembrança do quanto eu tinha brigado com o Bravo e o chamava de cachorro feio, desmerecendo sua beleza de lobo.
— Você? O meu... o Bravo?
— Sim, sou eu. Sou guerreiro do seu reino, o reino de Flós. Fui consagrado seu guerreiro protetor pelo guardião do trono e... considerado por vossa majestade um amigão... como me chamava. Sinto-me honrado. — Fez uma reverência e parecia tímido.
— Você consegue virar lobo aqui? Agora?
Conteve um sorriso.
— Sim, quando eu quiser, mas não vou fazer isso.
— Prefiro que não faça mesmo. Acho que teria um pouco de medo.
Sorri e tudo fazia sentido, por mais doido que parecesse, aquilo tudo sim parecia ter sentido, a minha vida enfim fazia sentido.
Vossa majestade...
— Eu sou a rainha? Não, espera! Por que eu sou rainha se meus pais não eram os reis? Onde estão o rei Kaynaon e a rainha Evoen?
— O rei e a rainha morreram e não tiveram filhos por causa da maldição e com isso, atestaram que quando a salvadora do reino regressasse, ela seria a rainha.
— Eu sou a rainha... salvadora do reino... — falei baixo, mais para mim do que para ele.
— Sim, majestade. — Me lançou um sorriso discreto. — Seu povo está em festa por seu retorno e ficariam felizes se os cumprimentassem. — Ele apontou para a sacada onde eu tinha ido antes e agora ouvia música alta vinda de lá, como se comemorassem.
Comecei a andar devagar em direção a sacada e novamente quando saí, houve uma comoção. Aplausos soaram e uma multidão estava a minha espera.
Olhei os rostos felizes, saudáveis e observei que todo o reino onde meus olhos pousavam era florido, colorido e frutífero, não parecia ter vivido tantos anos de fome.
— O povo não parece ter vivido em cinzas.
— Assim que você... digo a senhora... majestade.
— Você. Me chame de você.
Assentiu.
— Assim que você pisou em Flós, quando fomos resgatados na entrada da passagem, como um encanto quebrado tudo coloriu, floriu e ressurgiu das cinzas. O povo está voltando ao normal aos poucos.
Ergui a mão e acenei meio que de maneira involuntária e a multidão reagiu instantaneamente.
— Seu povo te ama, rainha. Seja bem-vinda de volta ao lar.
Pensei que mesmo que eu estivesse de volta e a maldição tivesse sido quebrada, os inimigos de Cinere ainda estavam à espreita, julgando pela forma que quase me mataram para que eu não retornasse.
— E quanto ao inimigo?
— O povo de Cinere segue nos tratando como inimigos e a vingança de amor do rei ficou em segundo plano, agora nos querem fracos para tomar nosso reino, mas resistimos fortemente quando tentaram e por anos os ataques ficaram adormecidos, mas com a chegada da sua idade de retorno, como pôde ver eles voltaram a dar sinais de que estão à espreita, como aconteceu na morte dos... seus pais e como tentaram nos impedir de voltar. Aqui você está segura, voltou e aqui eles não podem mais fazer nada contra sua vida.
— Por que não?
— A maldição foi quebrada, a criança de pele escura como a noite e os olhos como o sol nasceu em Flós, completou seus vinte anos e retornou. O povo se sente revigorado e nada nos destruirá novamente. Estamos mais fortes com a volta da rainha da salvação.
— Obrigada, por ter me protegido, Bravo.
Sorriu ao perceber que eu havia aceitado a verdade, mas logo seu rosto ficou sério novamente.
— Eu me chamo Iran, majestade.
— Será sempre Bravo.
Bravo... a constante presença da feição séria em seu rosto mostrava isso.
— Você se sente bem?
— Sim — respondeu contido.
— Você sabe quem me deu meu nome?
— Vida... Soube que sua mãe biológica te deu esse nome assim que a viu.
Encarei-o e sorri, querendo saber tudo sobre mim e ao olhar para aquele homem educado, encantador e lindo apesar da seriedade, tive a certeza que seriamos ótimos amigos, como éramos quando ele era apenas um lobo tão doce quanto um cachorro grande.
Sendo muito ousada, passei a mão na sua cabeça, como se ainda fosse um lobo de estimação e sem jeito, parecendo em dúvida se retribuía ou se mantinha-se sério, acabou dando um sorriso discreto de volta, no entanto, seus olhos demonstravam querer passar mais que apenas a alegria pela minha volta e pareciam carregar uma névoa ou até mesmo uma tristeza.
Imediatamente lembrei-me do tempo de fome que devia ter passado e entendi que muito daquele olhar carregado, era pelo peso da memória de tudo que viveu durante os tempos que esperou meu retorno.
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