Capítulo 48
Demorou... eu sei, até porque eu precisei refazê-lo mais de uma vez.
Penúltimo capítulo.
Rebeca
Primeiro tive que irritar Matteo e para que ele saísse de casa cedo, defendi minha sogra fingida e sonsa e depois a tirei do quarto. Precisava que ele fosse trabalhar e para isso, era preciso afastá-lo dela já que ele se abre com a insuportável.
Ele se abre com ela...
Tudo bem que eu pedi que ele não me contasse nada sobre seus negócios, mas a partir do momento que um canalha ameaça meu filho, tudo muda de história.
Que mãe não quer saber quando seu filho entra na mira de um assassino sem coração, sem piedade?
Depois foi sair de casa. Se Matteo estivesse, eu não conseguiria fugir já que ele tem um carro tão espetacular quanto o meu, mas seus empregados não e por melhores motoristas que eles sejam, não dá para comparar com uma Ferrari.
Na verdade, somente Matteo e o maluco do Lucca conseguiriam me seguir em uma perseguição verdadeira.
Derrubei a porteira da fazenda porque os infelizes não abriram mesmo quando disse que seria rápido, que precisava comprar algo pessoal para mim. E como eu sei que eles não gostam de interromper meu marido em uma situação de constrangimento quando a esposa dele precisou sair para comprar absorvente, eles não deveriam entrar em contato tão rapidamente..., até perceberem que o absorvente levou tempo demais.
Voei até a balsa.
Tudo esquematizado.
Me orientei por um mapa de papel até o lugar que eu pretendia ir, sem acreditar que acertei ao usar algo tão antigo. Eu não podia usar o GPS do celular.
— Pontualíssima — Caterina fala assim que eu desço do carro e me encontro com eles em uma pequena estrada no meio do nada.
Sabe aquele tipo de pessoa que consideramos um mal necessário? Caterina.
Como já era do meu conhecimento, Matteo, assim que voltou do Brasil, foi chamado para assumir o cargo que antes pertencera a seu pai e seu avô. Não que seja algo hereditário, mas quem está no poder não gosta de sair. E então ele passou a ser o Don.
Paciência.
Eu não queria saber de suas atribuições, o que fazia exatamente, onde ele atuava, mas eu descobri que a máfia não necessariamente trabalha com coisas ilegais, que ela é mais conhecia como um grupo de pessoas que se unem para se protegerem e protegerem seus interesses. Esses interesses é que acaba dando essa visão negativa porque alguns deles tem ligação com algo errado, condenável e seus métodos de persuasão não são nada bons.
Matteo era, pelo visto, muito competente.
Só que de uma hora pra outra, ele mudou. Não tinha hora pra voltar pra casa, isso quando voltava, seu humor estava azedo, sua irritação a níveis estratosféricos.
Algo muito sério havia acontecido, e como eu não queria me envolver, preferi me abster, até o dia que me deparei com homens em todo o perímetro da fazenda, meu filho fora proibido de brincar no jardim externo, eu não deveria sair sem estar acompanhada de quatro, cinco homens. Era algo surreal.
Perguntei a Matteo e ele disse que não era da minha conta.
Oi?
A coisa só piorava.
Além de toda essa irritação, ainda tinha que suportar minha sogra que para sair da cadeia, precisou fingir ser uma doente mental, e meu lindo cunhado achou melhor e mais saudável que ela viesse morar aqui conosco.
Minha raiva só aumentava.
Questionei-o mais uma vez, e nada. Aliás, sua resposta malcriada me irritou profundamente:
"Não foi você quem pediu que eu usasse de minha autoridade e te escondesse? Então leve isso como o cumprimento do seu desejo."
Foi então que eu pedi ajuda a Caterina para me colocar a par do que estava acontecendo e ela, depois de gargalhar desacreditada que eu havia me tornado uma dona de casa, me mandou tudo que era do seu conhecimento, inclusive a foto da ameaça a mim e ao meu filho.
Ódio por saber de algo tão brutal e ser poupada. Eu tinha ódio desse tal de Fernandes e de Matteo. Tudo bem que eu era a culpada por essa desinformação.
Sondei Matteo, alegando que tinha ouvido ele falando pelo telefone e ele explodiu de forma superagressiva reclamando da minha curiosidade mórbida.
E aí tive que recorrer mais uma vez a Caterina, ou meu casamento ruiria em menos de um ano.
— Só quero te lembrar que eu sou contra. — Caterina me diz. — Você pode ser excelente, astuta, mas não é uma assassina.
Sim, eu tinha consciência disso, entretanto eu precisava cuidar do meu filho e de sua liberdade de ir e vir dentro da própria casa.
— Não quero problemas com nenhuma máfia, Rebeca. — Avisa-me. — Se seu esposo souber que eu te ajudei, ele vai pedir minha cabeça, assim como Fernandes, e eu estou em uma época de expansão de negócios sem entrar em guerra.
— Eu só quero que me coloque de frente a esse tal de Fernandes. E meu esposo está totalmente alheio a essa nossa conversa.
Ela nega discordando. Aliás, foi pela palavra dela que eu consegui ajuda com as informações, porque mais do que isso eu não terei.
— Como posso me aproximar de Fernandes? — Porque eu imagino que meu marido está tentando sem êxito dada a raiva que ele está soltando pelo nariz, e ela nesse momento de paz, deve ter muito conhecimento das andanças desse infeliz.
— Somente como uma prostituta — Miguel responde e eu me arrepio somente com essa possibilidade. — Ele se esconde em vários lugares que nós não temos conhecimento. Fica rodando o estado, parando em várias estradas com um mínimo de pessoas de sua inteira confiança.
— Perfeito. — Ri — E eu faço o quê? Paro na esquina de alguma estrada e espero até que ele passe e me pegue.
— Claro que não, Rebeca. — Caterina fala — Não somos amadores. Temos um informante. — Claro que teriam. — Infelizmente seu marido tentou essa técnica e desde então Fernandes está mais precavido.
— O que aconteceu com a garota? — Eu ainda não sabia disso.
— Assassinada por espancamento. — Meu coração acelera. — Rebeca, você tem certeza disso? Eu não pude envolver meus homens para não arriscar sua vida, a minha e a do meu grupo. A única pessoa que sabe de tudo é Miguel e tampouco ele vai poder se aproximar muito se é que há alguma chance disso dá certo. Mas eu dei minha palavra de que te ajudaria no que precisasse.
E se realmente ela quisesse me ajudar, daria essa informação ao meu marido e ele acabaria com tudo logo.
— Como eu conheço você muito bem, sei que há algum interesse em que isso dê certo, ou sua mão amiga não seria tão rápida e prestativa — eles se olham e trocam sorrisos. — Qual o seu interesse em que isso dê certo a ponto de você ser tão rápida em me ajudar? Aliás, você sequer ofereceu ajuda a Matteo.
— Você está sendo bem maldosa ao duvidar da minha fidelidade — Como ela era cínica! — E segundo eu não tenho qualquer dívida com seu marido, então, deixemos claro que eu só estou te ajudando porque é pra você.
— Sabe, Caterina, eu poderia acreditar em Papai Noel, coelhinhos que põe ovos de chocolates na Páscoa e até em fadinhas dos dentes que vêm buscar os dentinhos das crianças, mas na sua bondade e presteza tão eficientes... não.
Ela respira fundo.
— Vamos lá, Caterina. Conte-me o que você ganha com isso caso eu consiga eliminar esse monstro que sequer deveria estar solto — minha atuação foi perfeita.
Ela olha para mim erguendo uma de suas sobrancelhas muito bem delineadas.
— Ele não é um cara bom de negócios e o próximo na liderança é muito mais acessível — ao menos foi honesta.
E Matteo não está preocupado com um próximo na liderança. Eles são inimigos que querem se destruir.
Eu só não quero ninguém ameaçando meu filho.
— Ok. Então vamos rezar para que eu consiga eliminá-lo em prol de grupos mais unidos — e perigosos.
— Antes de nos despedirmos, quero que veja algo! — Miguel pega um envelope que ela me entrega. — Veja!
As fotos eram de pessoas mortas, mas a pior foi a de uma família de pai, mãe, filha e filho todos mortos, decapitados, com todos os órgãos expostos.
— Ele não só matou essa família, como ele estuprou as crianças — Caterina diz — A menina tinha oito anos e o menino dois anos e três meses. Pela investigação da polícia, os pais assistiram ao abuso antes de serem assassinados.
E então eu me lembro daquela família. Sim! Nós fomos para o aniversário de dois anos do garotinho. Como Filipo ainda não está na escola e mora na fazenda, concordamos que sempre que houvesse a chance de ele interagir com outras crianças da mesma idade, nós o levaríamos. Os pais podem até ter sua culpa, feito coisas erradas, mas essas crianças não! Eles eram associados do Cosa Nostra, associados leais ao grupo do meu esposo.
Por isso Matteo está enlouquecido. Imagino o que ele não é capaz de fazer caso encontre esse doente, ainda mais depois de nos ameaçar.
— Por que está me mostrando isso?
— Para te lembrar de que será isso que irá acontecer ao seu filho caso você volte atrás. — Que incentivo!
— Qual o plano?
— Há um pub a doze quilômetros daqui. Às vezes, os homens de Fernandes aparecem para levar bebidas e mulheres para o acampamento deles. Não é sempre, mas ficamos sabendo que eles pretendem "pescar" algumas garotas para a diversão hoje em comemoração ao aniversário de um deles — Miguel é quem responde. — Deixaremos você lá.
— Fernandes vai?
— Muito difícil. Ele até pode aparecer, mas não é certeza
— E ele não vai me reconhecer? Ou algum dos seus homens? — Se ele tinha uma foto minha, ele me conhece.
Ela dá de ombros com desdém.
— Espero que suas roupas e maquiagem mudem sua aparência, até porque o rosto não é algo que se observa quando o objetivo é sexo — homens! — E eles não têm por que imaginar que a esposa de Matteo Mancini se encontra sozinha em um bar no território deles. — Nem eu consigo me imaginar fazendo algo assim.
Em que instante eu enlouqueci de vez?
— Agora eu preciso ir embora — Caterina avisa. — Miguel ficará até a hora de te levar ao bar, e depois vai deixá-la lá por conta própria. Como eu disse, não quero envolvimento.
— Você precisa levar meu carro até Roma e fingir que estou indo para o show da Cat — ela confirma fazendo um bico de que odiou essa tarefa.
— Deixarei seu carro na próxima cidade. Há uma mulher que eu contratei para levar o carro até Roma. Eu voltarei de avião — aquilo não foi o combinado — Eu preciso estar lá por garantia, ter um álibi que não seja Miguel.
Como se eu não soubesse que ela não gosta de dirigir.
— Não quero ter problemas em meu território se Matteo aparecer por lá.
Nego. Minha sogra, que de doente não tem nada, dará meu recado.
— Não, ele não vai. E Cat vai mentir por mim depois que receber a chave do meu carro.
— Ótimo — diz estendendo a mão para pegar a chave. — As coisas que você pediu pra trazer estão no porta-malas do carro. Boa sorte. — Ela aponta pra Miguel. — E você, volte pra casa assim que deixá-la no local! — ele assente como um cordeirinho.
Ela beija Miguel em uma rara expressão de carinho verdadeiro e parte deixando-nos sozinhos no meio do nada.
— Bom, agora é esperar. — ele diz e eu concordo. Eu vim cedo porque precisava fazer Matteo acreditar que estava indo pra Roma de carro. Se eu saísse à noite, eu não teria a menor ideia do que ele poderia fazer e ainda nos colocaria em risco, em risco a vida dos seguranças que não tem culpa de nada.
Matteo pode ser frio, focado como também tempestuoso e louco. E eu queria provar a Matteo que ele podia contar comigo, eu não queria envolver seus homens e muito menos estragar essa paz entre Casamonica e Cosa Nostra.
Se desse errado... Não dará errado.
E foi nessa convicção que eu esperei as horas passarem lentamente...
Havia uma cesta de comida com tudo da melhor qualidade. Ele tentou até puxar conversa, contudo eu preferi me concentrar, fechar os olhos e tentar relaxar.
— Você ainda me odeia? — pergunta-me como se aquilo fosse relevante.
Dou de ombros.
— Eu preferiria que você não estivesse aqui — ignoro. — Eu gosto de você, Rebeca. De verdade — diz, o que eu estranho. — Depois de Caterina, você foi a única mulher que conseguiu me atrair. Se não fosse por ela, eu lutaria por você, fugiria com você como planejado.
Sorri.
— Ah, Miguel! Nunca parou pra pensar que se realmente eu fugisse com você, eu te deixaria na primeira oportunidade? Nunca tive realmente interesse em você — e olho pra ele convicta de que eu falava a mais pura verdade.
Porque eu nunca o amei.
— Adoro sua sinceridade. Só que isso não apaga o que nós vivemos. — Nós vivemos? Nos usávamos mutualmente.
— Me poupe, Miguel. — corto a conversa e ele baixa o banco do lado do motorista e finge dormir.
O que eu menos preciso agora é um homem tentando reatar o caso, ou lembrar do meu passado de merda.
Era já começo de noite quando Cat recebeu meu carro.
Como já havia imaginado, Matteo já a tinha chamado e ela avisou que eu não queria papo com ele, e que o melhor era ele me deixar dormir lá, que no dia seguinte, assim que eu acordasse, ela ligaria para ele.
Claro que ela só não me chamou de santa, que eu estava colocando-a em risco de morte caso eu estivesse fazendo algo errado, temendo por minha vida, por sua própria vida.
"Ai minha santa dos gays bonzinhos. Dê juízo a essa minha amiga louca" foi o que ela disse antes de se despedir.
Óbvio que ela não sabia o que eu estava aprontando. E louca como ela era, chegou a me perguntar se eu estava com um amante.
Amo demais aquele cavalo para traí-lo.
Peguei a mala com as coisas que eu pedi: aplique para o cabelo, maquiagens, lente de contato e uma roupa que insinuava, beirando o vulgar para eu não parecer uma prostituta barata.
— Vai ficar mesmo olhando eu trocar de roupa? — Mesmo que já fosse noite, era possível me ver.
— Eu já toquei em seu corpo, já provei dele, lembra? — que argumento era aquele?!
Matteo sequer gosta de ouvir o nome Miguel, mesmo que não seja referente a esse Miguel diante de mim.
— Isso foi antes de eu me casar e virar uma Mancini — e saio do carro, batendo a porta com violência, vestindo-me longe das vistas dele mesmo que estivesse escuro.
Quando estava pronta, voltei para o carro.
— Vamos!
Ele inspira fundo, liga o carro e parte para o local combinado. Sonhava que o tal do Fernandes aparecesse naquele buraco que Miguel parou.
— Rebeca — ele desliga o carro e olha para mim. — Eu fui contra esse seu plano maluco só que eu não posso ir de contra a Caterina.
Assinto consciente que ele era pau mandado muito fiel, ainda mais por ser amante da dona da porra toda.
— Mas daqui você consegue ver alguns homens.
Eu não consigo enxergar quando ele aponta alguns em posições estratégicas.
— Fernandes deve estar aí dada a quantidade de homens que estão na porta — por um segundo eu quis ir embora. — Não imaginávamos que ele viesse para uma confraternização.
— Tudo bem.
— Tudo bem nada, Rebeca. — Ele segura a minha mão. — Você estará sozinha cercada de homens que não medem consequências quando querem alguma coisa.
— Miguel, me deixa na porta e depois arranque.
— Não vai desistir? — Ele me encara desacreditado — Por que não chama seu marido e acaba logo com isso?
Porque Fernandes se esconde, então suas permanências são rápidas em algum lugar, e não daria tempo de vir gente da Sicília.
— Eu vou acabar com isso hoje. — E ainda evito uma guerra de proporções homéricas.
Ele inspira profundamente e nega,
— Eu não vou embora, Rebeca. Se puder entrar em contato comigo, eu vou te buscar onde estiver. Eu sei que sabe meu telefone de cor.
— Não terá problemas com Caterina? Se alguém te vir, você acabará envolvendo seu grupo.
— Deixa que com ela eu me entendo — dei de ombro demonstrando desdém mesmo que aquilo tivesse me surpreendido. — Antes que eu esqueça, eu trouxe isso — e me entrega um celular dos antigos. — Você precisa ter um celular.
— E acha que os homens de Fernandes não vão se desfazer dessa porcaria? — Aquilo era pior do que o que eu tinha quando morava na vila sozinha
— Com certeza, mas quem hoje em dia não tem um celular? Se for sem um, levantará suspeitas. — Ele tinha razão, tanto que eu o peguei. — A senha é sua data de casamento. Há uma série de contatos e fotos aleatórias alteradas por IA.
Abro o celular e vejo algumas fotos minhas totalmente alteradas de quando eu fiz o book com Sâmia, além de fundos falsos. E como a qualidade do celular era ruim, ficava menos evidente.
— Dê um jeito de me chamar. Não posso te seguir porque eles não são amadores e isso te colocaria em risco, mas eu vou tentar ficar pelas redondezas.
— Obrigada. Agora me deixa mais próximo mas não estacione.
E antes mesmo de ele parar o carro, eu já desço.
— VAI SE FODER, FILHO DA PUTA — grito ao descer do carro, batendo com força a porta chamando a atenção de alguns que ali estavam.
Miguel sai cantando pneus e eu ainda mostro o dedo médio para ele.
Tadinho. Mas como justificar uma mulher sozinha entrando num bar um pouco afastado?
Caminho a passos duros até a porta do estabelecimento quando sou abordada.
— Aqui é uma festa particular — um brutamontes me para mostrando a arma.
— Aqui tem o nome "Bar", então não fode — e só me deixou passar porque alguém próximo permitiu.
Eu até queria chamar a atenção ao entrar, mas longe da forma como eu chamei. Havia homens demais naquele lugar e mulheres de menos. Aliás, pude observar que parecia um pequeno exército.
Aquilo tinha que dar certo.
Caminhei até o balcão do bar ignorando os diversos olhares, mas vendo se o estrupício estava ali presente. Se acaso não, eu teria que usar um daqueles para chegar a ele.
E ele estava ali, um pouco mais afastado, longe das janelas, na penumbra.
Não me insinuei, não me expus. Somente me sentei em uma cadeira depois de tirar o sobretudo que me aquecia, pedi uma gin tônica.
Um homem se aproximou e eu fiz de conta que não era comigo quando ele puxou conversa.
Meu objetivo era Fernandes. Era ele quem eu queria chamar a atenção, e dada as duas mulheres que estavam no colo dele, fáceis demais, eu precisava ser um pouco difícil para atiçar seu lado caçador, sem parecer muito difícil para que desista da dor de cabeça.
Usaria das mesmas armas que eu usei quando atrai Matteo mesmo que não tivesse sido planejado.
Não! Eu joguei na cara dele aquele esfregão podre.
— A gostosa foi convidada por quem? — o homem fala ao meu ouvido quase se esfregando em mim.
Eu não era de beber, mesmo assim dei o primeiro gole.
— E aí? Posso saber seu nome? — o cara perguntou novamente acariciando meu braço. — Qual o preço de uma mamada? — Aquilo foi demais, e olha que eu já trabalhei em puteiro.
Nojo.
— Pode me fazer outro? — peço ao barman antes de jogar o líquido no rosto daquele nojento.
Pense num ódio.
O cara ainda pensou em me bater, e até teria conseguido se eu não me desviasse e metesse a minha mão por entre as suas pernas e apertasse as bolas dele.
— Será que uma mulher não pode ter um minuto pra pensar na porra da vida de merda dela antes que outro merda apareça? — O homem ainda tentou se desvencilhar, agarrar meu pescoço quando Fernandes se aproximou.
— Deixe a garota em paz, Franco. — Fernandes pede sentando-se ao meu lado. — Desculpa pelo incômodo de um dos meus homens. Ele está um tanto bêbado. — Pego a gin tônica que o barman fez tomando outro gole. — Fernandes é meu nome, e faço questão de pagar seu drink como um pedido de desculpa.
— Obrigada — ele estende a mão em cumprimento bem diferente do outro, mas com o mesmo objetivo. — Meu nome é Rosa — e aperto sua mão não tão forte para não parecer muito cheia de mim nem fraca para parecer uma frágil garota.
— Pelo nome e sotaque, a senhorita não é daqui — assinto, tentando parecer desarmada.
— Sou portuguesa de nascença. Minha mãe era portuguesa e meu pai era italiano. — Por medo de ser reconhecida, falo olhando para frente enquanto degusto da bebida bem devagar, mesmo que o ambiente esteja escuro. — Vivi minha infância em Braga até completar doze anos quando minha mãe faleceu e meu pai resolveu voltar para Florença, sua cidade natal.
— E o que faz aqui em Calábria? — Buscando uma oportunidade de acabar com você. — Por que eu tenho a sensação de que eu já te vi? — e toca no meu cabelo que pelo aplique de rabo de cavalo, bate quase na bunda, além de muito liso.
Um exagero necessário.
— Cansei de viver com meu pai e avó. Então, saí de casa assim que completei dezoito anos buscando minha independência. — Uma rebelde sem causa e fácil é tudo que eles querem. — E com relação a ter me visto, deve ser só impressão. Meu rosto é do tipo comum.
Ele puxa meu queixo obrigando-me a encará-lo. A maquiagem ao redor dos olhos era forte, isso sem falar que eu usava lentes escuras pra esconder meus olhos verdes. Minha sobrancelha estava pintada para parecer mais escura. Os cílios eram tão grandes que parecia um espanador pesando minhas pálpebras.
Quem usa uma merda dessas?
Meu batom era vermelho vivo e minha base era um tom mais claro. Isso sem falar em uma pinta grande ao lado da boca.
— Seu rosto é tudo menos comum — diz, acariciando minha bochecha e por mais asco que eu sinta, eu deixo. — Dezoito aninhos? Você é uma menina, ainda.
Fernandes não era feio, mesmo com aquela enorme cicatriz em sua bochecha que o deixava com uma cara de perverso. Era mais franzino que Matteo, provavelmente da mesma idade ou até mais novo.
— O namorado te largou aqui na porta? — pergunta já sabendo o que deve ter havido do lado de fora.
— O idiota mão de vaca me deixou na porta. — Olho ao redor. — É verdade que aqui é uma festa particular?
Ele confirma.
— E eu sou uma penetra? — fiz uma cara de menina travessa, mordendo o lábio inferior.
— Não. Você é minha convidada — eu o encaro e ele sorri. — E o que faz da vida, Rosa?
— Eu faço de tudo um pouco pra sobreviver — seu sorriso mostrava a nojeira que pensava. — Antes de vir pra cá, eu trabalhava de garçonete em um bar lá em Potenza, mas já fui cuidadora de criança, empregada doméstica, manicure, cabeleireira...
Alguém chama a atenção dele, ele olha o relógio e assente, deixando-me confusa.
Ele já ia sair?
— Eu preciso ir embora — ele se levanta e eu chego a estremecer temendo que ele somente se despeça.
Como assim?
— Quer ir conosco? — Senti um alívio ao ser convidada e ao mesmo tempo fui tomada por uma avalanche de adrenalina em minhas veias.
— Para onde? Vai ter bebida? — Ele confirma e eu devolvo o copo. — Esse drink está muito ruim.
Ele estende sua mão e eu acabo pegando-a.
— A bolsa — tomei um fora.
— Para quê quer minha bolsa? — Claro que eu não seria tão fácil assim.
O outro homem que tentou me assediar puxa minha bolsa de vez e abre-a.
Não tinha nada ali dentro além de um documento falso, um pequeno estojo de maquiagem e o celular com algumas notas de euro.
— Qual o seu problema, cara? — ele mostra o celular para Fernandes que o observa e joga dentro do drink. — Que porra é essa? Sabe lá o quanto eu ralei pra conseguir comprar um desse?
— Te dou outro, gatinha — e me devolve a bolsa depois que o outro vasculhou tudo. — Só estou me precavendo.
— E acaso você é o quê? O rei da Inglaterra? — Eu realmente havia aprendido a interpretar.
— Sou alguém conhecido com alguns poucos inimigos — e só então segura minha mão, entrelaçando nossos dedos forçadamente já que eu não estava mais mostrando disposta a sair com ele. — Eu prometo que te dou um celular melhor — ainda faço uma careta de raiva. — E algumas centenas de euro pra que você esqueça o idiota mão de vaca — meu sorriso foi convincente.
Fernandes não me levou com ele em seu carro. Eu entrei em outro com mais algumas meninas que estavam ali e seguimos pela rodovia até entrar em uma estrada de terra.
Meu coração estava acelerado. Eu somente observava de relance para ter uma ideia de como sair dali, porque eu iria sair. Quem acabou com Adriano, Michelle e Don Carlo, não temeria um panaca de um Fernandes.
Era um pequeno acampamento. Poucos homens e alguns trailers ao redor. Saímos do carro e as meninas já foram fazendo festa com o som ligado, se aproximando da fogueira.
Eu preferi ser mais discreta.
— Temos cerveja — Fernandes me oferece a bebida e eu pego de sua mão, bebendo quase tudo de uma vez.
Horrível. Nem quando eu morava no Brasil eu gostava daquela merda. Aliás, eu só aprendi a beber bebida alcoólica porque Caterina me obrigou a ser educada e ainda me falou que as melhores festas sempre servem algo requintado e seria de bom tom tomar nem que fosse uma taça somente para elogiar o anfitrião.
— Vamos dançar — puxei Fernandes pela mão, aumentei o som da caixa ao máximo e comecei a dançar, seduzindo, brincando, rebolando.
Gargalhei quando ele me abraçou se esfregando em mim, beijando meu pescoço.
— Você é linda, sabia? — e ainda me elogia o defunto.
— E eu quero meu celular que você quebrou — ele ri, vendo a puta interesseira que eu estava interpretando.
— Será que você merece? — e ainda me questiona.
— Ah, mereço sim, e posso te provar — sussurro em seu ouvido quando ele me leva pela mão até um trailer mais afastado.
— Eu realmente tenho a sensação de que já te conheço — diz assim que fecha a porta.
O trailer era um pouco maior e muito mais equipado do que o motor home que eu viajei por toda a Europa com Filipo.
Ainda estava olhando tudo ao redor quando percebo Fernandes já despido, caminhando em minha direção.
Aquilo me causou todo o tipo de repugnância.
Lembrei de Don Carlo, de meu tio, dos homens nos prostíbulos que eu trabalhei.
"E finja com mais veracidade. Seus lábios não expressam o que seus olhos gritam. Se achar difícil, use a mente. Recorra aos recônditos mais profundos dessa sua cabecinha e traga à tona os sentimentos que no momento precisam aflorar mesmo que tudo esteja de ponta-cabeça." Agora estava sendo difícil. Eu estava ali porque eu queria. Na verdade, eu fui atrás.
Me arrependi amargamente.
Senti falta da segurança de Matteo, de seus braços me rodeando, abraçando, até de suas grossuras por medo de que algo me acontecesse.
De repente, a Rebeca voltava a ser a adolescente que fugiu de casa por causa do tio, com medo, desesperada.
Eu queria ter ouvido Miguel.
Eu queria estar em casa com meu filho, brincando em seu quarto com seus carrinhos.
— O que foi? — Fernandes beija meu pescoço e eu recuo, sentindo nojo. — Vai desistir, putinha?
Ele aperta meu pescoço, me prendendo contra o pequeno armário e coloca a mão por entre minhas pernas.
"Você pode ser excelente, astuta, mas não é uma assassina." Caterina me conhecia mais do que eu a mim. Ela tinha razão.
Tentei me soltar, empurrá-lo. Eu estava com medo... dominada por lembranças horríveis.
"Ele não só matou essa família, como ele estuprou as crianças. A menina tinha oito anos e o menino dois anos e três meses. Pela investigação da polícia, os pais assistiram ao abuso antes de serem assassinados. [...] Para te lembrar de que será isso que irá acontecer ao seu filho caso você volte atrás."
E então eu vi meu filho morto naquela foto.
Eu me lembrei da ameaça de morte enviada ao meu marido.
Eu me lembrei da raiva de Matteo por não conseguir achar esse desgraçado, e agora era eu quem estava com ele, sozinha, frente a frente, e ainda com ele nu.
Eu sorri, deixando que ele me tocasse. Em vez de empurrá-lo, como era meu desejo, eu acariciei seu dorso, passando as unhas enormes e postiças.
Ele cedeu e se afastou para observar eu me despir.
Tirei a camiseta fina e curta, ficando somente de sutiã que tinha um diferencial. O fecho era atrás, mas na frente havia um pequeno que ao abrir, soltava um fio de cobre resistente, mas que passava fácil por qualquer vistoria por ser de bojo com estrutura metálica.
No jogo de sedução, mandei que ele se sentasse na cama de frente a um pequeno espelho e atrás dele, tirei meu sutiã, e quando mordisquei sua orelha, eu enlacei meu sutiã sobre seu pescoço e puxei.
O fio apareceu e o enlaçou. A estrutura metálica do bojo segurava firmemente o fio e o tecido grosso ajudava a não machucar as mãos.
— Deveria ter ouvido seus instintos — falei enquanto ele se debatia. — Meu nome é Rebeca Monteiro Mancini, esposa de seu arquirrival Matteo Mancini.
Ele abriu os olhos já vermelhos pelo sangue preso, crispou os lábios de raiva e se jogou com força para trás, derrubando-me com ele.
Não doeu, sequer me machucou, mas como eu fui pega de surpresa, o fio folgou e ele conseguiu pôr os dedos e puxá-lo.
— Cadela — o tapa foi forte no rosto, mas não foi suficiente para eu perder a chance de voar em cima dele enquanto ele ainda buscava ar.
Eu já treinei pesado. Adriano e Miguel não mediam forças para me treinar, mas aquilo era totalmente diferente.
Fui jogada com força contra o armário, caindo em cima de um banquinho de madeira que se despedaçou.
Isso sim me fez parar de respirar de dor.
— Vou mandar seus pedaços para seu marido, mesmo que eu ache que ele sequer faça questão de tê-la como esposa, puta — o chute na lateral do corpo quase me fez desfalecer.
"E depois que eu matá-la, vou pegar o filho dele e empalá-lo e mandar para ele num espeto."
Aquilo me deu uma força descomunal.
Até a dor que eu sentia, sumiu.
O chute em seu joelho quando ele se aproximou, o fez cair gemendo de dor. Peguei a perna do banquinho e enfiei com força em sua coxa. Entrou, mas nada profundo.
— Nunca mais ouse ameaçar meu filho, desgraçado — quando fui enfiar novamente, ele segurou minha mão e apertou meu pulso com muita força, obrigando-me a soltar a estaca.
Eu não tinha mais forças e ele continuava firme mesmo fodido.
Consegui dar um chute em suas bolas, dando-me um breve alívio.
— Piranha! — gemeu de dor.
Arrastei-me para longe, mas meu cabelo comprido demais atrapalhou e foi nele que Fernandes segurou e me puxou.
Erámos dois lutando no chão pela vida, tendo o desejo de vingança como combustível.
— Vou te matar, desgraçada. Vou fazer um estrago tão forte em você que ficará irreconhecível — o aplique saiu me livrando de suas garras.
Meu corpo doía ao máximo, minhas forças se esvaíam.
Ele se rastejou mais uma vez e meu chute foi forte em seu nariz, provavelmente quebrando-o. E foi então que eu o enlacei com minhas pernas o seu pescoço, estrangulando-o.
Eu chorei enquanto apertava seu pescoço - uma mistura de dor, raiva, medo.
Ele me batia com forças, tentava a todo custo se soltar, só que eu tinha força nas pernas, e como nós já estávamos no chão, ele não conseguiu usar da mesma técnica anterior.
— MORRAAAAAA — gritei, segurando-me na borda da cama para não ser movida, apertando com força seu pescoço até que ele cedeu... e esmoreceu.
Dor.
O som continuava alto lá fora, isso me garantia que ninguém tinha ouvido.
Muita dor.
Me arrastei até o canto sem conseguir respirar tamanha dor que eu sentia.
Inferno.
Olhei a pequena janela na lateral do carro. Dava pra passar fácil, mas com a dor que eu sentia, ia ser foda caminhar pela mata até chegar a alguma avenida.
"Eu não vou embora, Rebeca. Se puder entrar em contato comigo, eu vou te buscar onde estiver. Eu sei que sabe meu telefone de cor."
Miguel era minha única esperança.
Peguei o celular da calça de Fernandes e como eu não sabia a senha, coloquei o dedo dele no sensor e foi então que eu vi que ali não tinha sinal.
As desgraças não vinham a prestação.
Olhei para o dedo de Fernandes com aquele anel gigantesco e sabia que aquilo tinha um significado. Matteo também tinha o anel do avô. Era algo de família, um símbolo forte, alguns até tinham brasão de tempos remotos.
Sem acreditar no que eu estava fazendo, abri vários dos armários até achar um cutelo grande bem afiado.
Fechei os olhos e decepei a mão que tinha o anel. Acho que aquilo mexeu mais comigo que matar propriamente dito. Eu matei num momento de necessidade, de desespero. Aquilo era uma carnificina.
Era como se eu tivesse perdido toda minha humanidade.
Ele nem sentiu, Rebeca. Ele já está morto.
Vesti minha roupa, pulei a janela e vi ao lado um depósito cheio de material de limpeza e até botijões de gás.
Ali não tinha carpete para causar um incêndio de grandes proporções. Eu acho.
E me embrenhei na mata.
A explosão foi forte o suficiente para ser visto à distância. Miguel veria o meu sinal.
Corri, ou pelo menos era o que eu tentava fazer.
Sedenta, cheia de dor, quase desfalecendo sem conseguir respirar, cheguei a uma estrada. Foi quando eu me lembrei do celular e da mão de Fernandes.
E eu mandei minha localização. Agora era torcer que em algum momento, a mensagem chegaria.
Eu não tinha forças para caminhar mais, mas vi um casebre a distância de uns dois quilômetros.
Nunca levei tanto tempo para caminhar até ele.
Entrei quando a porta cedeu ao meu peso. Lágrimas de dor escorriam. Minhas forças sumiam. Eu só queria me deitar. Eu não sabia se sairia dali, mas ao menos eu havia salvado meu filho.
Me deitei no chão quando ouvi um carro parar na entrada. Se era Miguel ou outro, eu não sabia. Não tinha forças nem para gritar. Ainda estava zonza, levemente surda pela explosão e exausta.
Eu já disse que desgraça nunca vem a prestação, vem em uma conta só.
— Achamos a piranha — um homem do grupo de Fernandes entra e aponta a arma para mim.
Fodeu...
Eu não lutaria nem que eu houvesse uma chance de sobreviver
Fechei os olhos esperando o tiro quando ouvi dois estalos fortes. Nenhum em mim.
Foi então que Miguel apareceu à porta e eu tive um pequeno vislumbre de sobreviver.
— Moça bonita. Como sai com o celular do chefe e ainda manda sua localização? — ele me pega nos braços e eu grito de dor. — Vamos embora antes que a comitiva chegue.
Miguel saiu em disparada depois de me acomodar no banco do carona e colocar o cinto. Acho que se o carro não fosse um 4x4, capotaríamos por entre as curvas acentuadas da estrada de barro.
Cada curva, eu sentia minha alma sair do corpo.
Apaguei.
Acordei quando ele me pegou e me levou até um barco simples de turismo.
— Vamos! — ordena enquanto me leva para um compartimento reservado, fechando a porta.
— Obrigada — agradeço sem conseguir respirar.
A dor havia aumentado. Na verdade, tudo me doía.
— Não me agradeça agora. Você está horrível. — ele sai e volta com uma maleta. — Ponha esse gelo no rosto! — manda e eu só obedeço sem a menor noção do meu estado.
— Você realmente sabe como elogiar uma mulher — brinco e seu olhar não era nada divertido.
— Eu sabia que ia dar merda — fala como um pai que briga com o filho. — Você está viva só Deus sabe como.
Ele tira minha camiseta e eu faço a maior cara de dor.
E eu tive vergonha de me despir.
— Acho que você quebrou uma costela — diz, como se fosse um médico. — Seu marido vai nos matar.
Ele abriu uma caixa de remédios e me deu uns cinco comprimidos.
— Tome! — E me entrega um copo de água — O tempo de navegação será suficiente para o remédio fazer efeito.
— Miguel, não ligue pra Matteo — peço e ele nega. — É sério. Há muitas coisas em jogo além de você.
— Você precisa de cuidados médicos urgentes — argumenta.
— E eu vou ao médico assim que eu sair daqui, mas pense: a pior parte já foi, agora é a questão da honra, da dignidade.
— Honra?! Dignidade?! Você só está viva por um milagre e pensa em honra? — ele começa a limpar e fazer curativos em todos os meus machucados.
Ele não entendia.
Eu não queria mais ser a pobretona, a pobre coitada, a empregada que Matteo pegou pra cuidar do filho dele. Eu quero estar vendo as coisas de longe, não cega. Eu quero ser respeitada. Eu quero ser mais que um corpo bonito que Matteo usava ao seu bel prazer.
Eu não quero mais ser comparada com a ex e ser desqualificada.
E principalmente, eu quero que meu esposo me veja como alguém a altura dele, que ele pode contar quando precisar.
— Você não entenderia — digo e ele nega.
Ele olha para mim, acaricia meus cabelos duros do tanto que eu apliquei gel para ficar liso e preso pelo aplique,
— Você não precisa entrar em um corpo a corpo com um homem para provar o seu valor, Rebeca. Você é especial exatamente do jeito que você é. Matteo está cometendo o mesmo erro que Don Carlo quando excluiu a esposa de tudo e com isso perdeu a melhor e mais perfeita parceira que um homem pode ter.
Era a primeira vez que eu o ouvia falar com tanto carinho e amor por aquela víbora.
— Eu pedi para ele me excluir — confesso e ele se surpreende mas depois sorri.
— Você não quer provar o doce, a textura, muito menos saber a receita, mas não abre mão de saber que ele existe e que seu esposo se alimenta dele — ele resumiu bem. — Hoje, você quer mostrar que não só conhece como sabe fazer tão bem se precisar.
Eu confirmei achando a analogia bem interessante.
— Mulheres... e seus orgulhos feridos — ele abre um sorriso gigante — Por isso eu respeito tanto Caterina e suas decisões. Só que ela nunca foi louca o suficiente para fazer o que você fez. Caterina nunca bateu em ninguém... aliás, só em mim quando treinamos e fazemos outras coisas mais — e pisca o olho fazendo-me sorrir.
— Eu estava enferrujada — digo — Há muito que eu não treino. Não tenho você e Adriano mais.
— Descanse um pouquinho. Quando chegar, eu te chamo — e me beija a testa, deixando-me sozinha.
O cansaço, o remédio e o embalo do barco me fez cair em sono profundo.
Estava amanhecendo quando ele entrou com uma bandeja de comida. Só então eu vi que dormi por algumas horas e que já deveríamos estar ancorados há tempos.
Eu tinha uma dívida de gratidão com Miguel.
— Bom dia, princesa — ele põe a bandeja com café, pães e alguns frio que provavelmente fora comprado em uma padaria. — Achei melhor deixá-la dormir mais um pouco.
Ele me fez companhia. Conversamos e eu vi o quanto ele era especial, cuidadoso, doce. Entendi o motivo pelo qual Caterina se apaixonou por aquele homem que, por incrível que pareça, amava perdidamente aquela bruxa.
Uma amizade verdadeira começou ali.
Me despedi de Miguel e pedi a ele que saísse de Palermo o mais rápido possível enquanto eu me vestia para o confronto.
A maquiagem forte escondia meus arroxeados.
A roupa sóbria mostraria que eu não era somente um corpo bonito.
Fui até a casa de Lucca onde todos estavam reunidos e entrei, agradecendo os vários comprimidos de analgésicos que adormeceram todos os meus músculos, e ainda me permitiu caminhar sobre saltos altos.
— Bom dia, Don — eu não queria a glória para mim. Eu queria o respeito, e por isso eu interpretei. — Aqui está o que o senhor me pediu.
Eu conhecia meu esposo para saber que ele jamais me insultaria, gritaria, brigaria comigo diante de tanta gente. Muito menos me desmentiria.
Seu olhar ao pegar aquela mão me passou tanta coisa. Mas o que mexeu dentro de mim foi o amor com que me olhou ao perceber que poderia ter me perdido.
— Vá para o quarto, esposa, e me espere que já iremos conversar — eu me questionei se realmente eu odiava o que ele fazia. — E a propósito, obrigado. Você fez um excelente trabalho. — Não, eu não odiava o que ele fazia.
E eu descobri o prazer que é ser respeitada... e temida.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro