Capítulo 41
Matteo.
— Gilvan, boa tarde. Conseguiu o que eu mandei?
Gilvan foi o homem contratado por Lucca para monitorar se Rebeca entraria em contato com a família durante o tempo que ela estava fugindo. Ele não era especialista, mas conhecia pessoas que podiam fazer isso além de ser um facilitador da organização aqui no Brasil.
Brasileiro de nascença com pais italianos, Gilvan conhecia muita gente importante, além de dominar perfeitamente esse idioma que eu nunca tive o interesse em aprender.
Foda!
— Patrícia e Jamil Monteiro dos Santos são golpistas. Eles vendem o que não tem desde imóveis a serviços. Às vezes ela seduz algum homem casado para depois chantageá-lo, extorqui-lo em troca de silêncio, isso sempre com a ajuda do irmão.
— Drogas? — Ele nega.
— Não. Até estranhei que eles não têm essa infração em suas costas. Mesmo assim, eles são procurados pela polícia por estelionato, mas como eles nunca usam suas identidades verdadeiras, nunca chegaram a eles. Isso sem falar que onde eles moram, polícia não entra.
Era óbvio.
— Doutor Matteo, se me permite dizer, Jamil é muito querido aqui na comunidade mesmo que não trabalhe com os donos do lugar. Tentar algo contra ele tem que ser muito cuidadoso para não deixar rastros.
Quem era aquele merda para me dar conselho?
— Está me estranhando? Só porque não estou no meu país não quer dizer que não sei fazer muito bem-feito. — Ele baixa a cabeça reconhecendo sua tolice. — Mas não estou interessado em eliminá-los — mas não me impede de lembrá-lo do que fez a Rebeca para ela fugir daqui.
— O que o senhor mandar. — Gosto da sua presteza. Se bem que ele está recebendo uma fortuna para me ajudar em tudo que eu necessitar.
— Outra coisa. A avó de Rebeca parece estar morrendo — não que eu seja médico, mas olhar para ela é ver um cadáver que por um milagre ainda respira. — Eu prometi a Rebeca ajudá-la.
— Farei o que puder.
— Você pode. Preciso de um gastroenterologista de referência para ontem. Pague o que for preciso para que a idosa tenha o melhor atendimento na melhor clínica do estado.
— Farei como o senhor manda.
— Outra coisa. — Não que eu deseje, mas conhecendo a minha mulher, essa é a melhor alternativa. — Preciso de uma casa nas redondezas. Imagino que ela não vai querer sair de perto da vó então eu preciso que você me ajude a achar uma casa agradável com o mínimo de conforto possível sem levantar suspeitas ao meu respeito.
Eu sou um simples italiano que veio ao Brasil a procura da mãe do meu filho, e o contato de Gilvan abriu as portas para que eu entrasse na comunidade sem sequer ser questionado.
— Eu já imaginava isso, doutor. Inclusive eu soube que a senhorita Rebeca já estava buscando um lugar para morar. Eu aluguei uma casa próxima à dela para monitorar sua família antes mesmo de ela voltar. — Interessante. — Posso passar para o senhor.
— Faça isso. Meu filho precisa de um canto até ela aceitar vir morar comigo em um lugar digno dela. Só que a ideia de ela dormir mais uma noite na casa da avó é inconcebível. — Ela falar da minha família com a que tem chega a ser uma incoerência. — Eu imagino que a casa está equipada com o melhor. — Ele meneia a cabeça. — Providencie o que há de melhor para os padrões do lugar.
— Farei o mais rápido possível.
— Ótimo. Quero a chave no mais tardar para o fim de semana. — Ele assente — E faça um contrato simples para minha identidade falsa. Não quero ninguém sabendo quem sou aqui nesse muquifo.
Ele confirma e eu o dispenso voltando para meu apartamento pois tinha uma reunião com todos os diretores executivos mais meu irmão.
Inferno.
Parecia que ninguém tinha cérebro naquele lugar ou tinha medo de tomar decisões, isso porque estávamos tratando da parte legal, decente da corporação.
E quando acabou, pensando que estaria livre, meu irmão pediu para falar comigo a sós.
— Como estão as coisas aí? — Questiona-me parecendo realmente preocupado.
— Indo.
— Gilvan está te assistindo em tudo?
— Sim. Não tenho o que reclamar dele. — Ele assente satisfeito.
— Ótimo. E quando você volta?
— Ainda não sei.
Ele passa a mão na cabeça.
— Você não pode me deixar nessa merda sozinho, Matteo — reclama como se eu não tivesse acabado de me reunir com o grupo.
— O que está te faltando, Lucca? — Não quero perder mais tempo nessa conversa interminável. As horas passam e eu já deveria ter saído daqui.
— Você. Acha que eu consigo dar conta de tudo sozinho?
Acho que eu não o vejo nesse estado desde quando não passava de um pré-adolescente iniciando.
— Você não está sozinho, Lucca. Eu estou longe, mas estou monitorando e pronto a ajudá-lo no que vier.
Ele nega.
— Não é a mesma coisa. Eu sei que nosso grupo é bom, forte, mas a vinícola é somente nossa e eu não sei como administrá-la tendo um escritório advocatício para limpar, minha mãe para tirar da cadeia e um grupo que ainda está se reerguendo depois do caos.
Eu sabia que Lucca sentiria minha falta, ainda mais porque ele sempre foi minha extensão, um cooperador do meu pai. Agora ele estava à frente e às vezes sozinho.
— Infelizmente eu não posso fazer nada.
— Pode, Matteo. Voltando. — Sem minha família?
— Eu não vou voltar sem Rebeca e sem Filipo.
— E se ela não quiser vir? Vai ficar nessa merda de país vivendo um conto de fadas quando há um império aqui para construir?
Eu não queria brigar com meu irmão, mas...
— Olha bem, Lucca. Eu passei a minha vida inteira aceitando as ordens do meu pai, do meu tio, abdicando daquilo que eu queria, desejava. Acontece que eu cansei e pela primeira vez na vida eu vou fazer aquilo que eu quero e não vai ser nem você nem ninguém que vai me impedir. Se precisar largar tudo, eu estou disposto.
Ele me olhou estarrecido como se eu tivesse cometido o maior dos crimes e acabava de confessar.
— Você não pode estar falando sério.
— Estou, Lucca. Apesar dos pesares, de sentir falta de tudo aí, nada se compara a ver meu filho crescer, brincar. Isso sem falar de Rebeca.
— Já voltaram?
— Não — ele ri. — Mas é só uma questão de tempo. Ela ainda está magoada comigo e sente medo de voltar depois de tudo que fez, mesmo eu jurando que ninguém sabe nem nunca saberá, que ao meu lado ela estará protegida.
— Matteo, por favor. Essa situação é ridícula. Você está se submetendo aos caprichos...
— Da mulher que eu amo e que estou disposto a lutar até as últimas consequências, passando por cima de quem ousar atrapalhar. — Ele nega. — De qualquer forma, Rebeca está cuidando da avó que está doente. Assim que as coisas se definirem com a senhora, eu terei novamente uma conversa com Rebeca. — Ele concorda. — Outra coisa, chegou a alguma decisão com relação ao Filipo?
Ele assente.
— Sim. Como o caso do assassinato de Graziela foi arquivado por falta de provas, não acho uma boa ideia deixar vir à tona o fato de ela ter roubado o filho de Rebeca. Isso seria uma boa razão para um assassinato e como Graziela era filha de empresário conhecido, rico mesmo sendo da máfia, e Rebeca não é ninguém importante além de ser estrangeira, melhor não levar o exame de DNA para alteração de certidão de nascimento e correr o risco de ver o caso sendo reaberto.
— Ela não vai aceitar o filho dela vinculado ao nome da outra.
— Eu sei. Então, como temos provas que Graziela envenenava o filho, e acaso vocês contraiam matrimônio — acaso? — acho mais fácil entrar com um tipo de processo de adoção. A criança acabaria tendo Rebeca como mãe do mesmo jeito.
— E não teríamos problemas com relação a semelhança que ele tem de Rebeca e não Graziela — a ideia não era de todo ruim, mesmo com esse detalhe.
— Delicado como você é, quem perguntasse receberia uma resposta A la Matteo Mancinni e foda-se quem achar ruim. — Por muito menos eu eliminaria da face da terra. — Não é da conta de ninguém.
Concordei. Agora era convencer Rebeca.
— Perfeito então.
— Só lembrando. Eu preciso de um relacionamento entre os pais para que a coisa seja mais fácil. Passar seu filho para uma mulher desconhecida não é lá uma atitude de um pai.
— Você receberá nossa certidão de casamento, imbecil. — E eu me irritei com a risada dele, desligando o telefone em sua cara.
Passava das oito horas da noite. Atrasei demais, não acompanhei minha morena para pegar nosso filho na escola, não os trouxe para jantar muito menos para dormir aqui em casa.
Merda!
Tomei um banho rapidamente e fui até sua casa esperando encontrar meu filho ainda acordado.
Saudades.
— Boa noite, linda — cumprimento-a assim que ela abre a porta.
— Oi. — Seu sorriso é lindo mesmo com um semblante de alguém cansada.
— Posso te convidar para jantar?
Ela nega.
— Já comi alguma coisa — merda. — Mas entra!
Eu não queria me demorar. Eu queria tirá-la dali o mais rápido possível,
— Filipo já dormiu? — Ela nega.
— Eu ia dar a mamadeira dele agora para colocá-lo para dormir — entro e me deparo com o colchão de solteiro no canto da sala que para mim era um insulto.
— Rebeca, não quer dormir lá no meu apartamento? — Filipo vem até mim e me abraça as pernas quando eu o levanto e o abraço sentindo seu cheirinho de sabonete infantil. — Lá é infinitamente mais confortável — e decente.
— Não precisa, Matteo. Assim que ele tomar a mamadeira, ele dorme que nada nem ninguém o acorda. — Ela me convida a sentar. — Toma, mozinho.
Rebeca o acomoda melhor e dá a mamadeira que ele quase não consegue tomar toda do sono que sente e acaba dormindo em questão de segundos com a mãe acariciando seus cabelos.
Era um anjo enquanto dormia. Os cabelos grandes cobrem o rostinho dele, e que eu já pensei em cortar, mas assim como a mãe, temos pena.
— Aconteceu alguma coisa? — ela me pergunta assim que o acomoda melhor sem parar de acariciá-lo.
— Como assim "aconteceu"?
Ela abre um sorriso de lado.
— É que você não veio buscá-lo, e eu, sei lá... estranhei.
Sentindo minha falta, morena?
— Fiquei preso em uma reunião. — Ela fica logo séria. — Não, não tem nada a ver. Eu sou o diretor da holding, lembra? Temos muitos outros diretores executivos, mas quando precisa fazer algo a nível macro que englobe a todos, eu preciso estar presente.
— Isso pode te prejudicar? — Não sabia até que ponto ela estava realmente preocupada. — Tirar você da liderança?
Eles não seriam tão idiotas.
— Podem me tirar do comando, mas aí eu os lembrarei que a maior empresa é a minha, que eu sou dono absoluto junto com meu irmão e que se eu não quiser, não voto em mim pela retirada.
Ela sorri.
— Você é bem convincente.
— Eu queria ser mais — digo, olhando em seus olhos. — E isso me leva a uma pergunta muito séria: — ela baixa a cabeça e nega antes mesmo de eu perguntar. — Quer namorar comigo?
Aquilo a fez levantar a cabeça surpresa.
— Não acha meio estranho isso? Nós já temos um filho, um passado...
— Um passado que eu menti quando não fui honesto. Agora você me conhece, sabe quem sou, o que fiz e eu quero fazer tudo direitinho. E como você me pediu para ir devagar, eu estou começando pelo namoro.
— Me pedindo em namoro é meio brega, não acha?
Faço uma careta concordando.
— Se eu precisar bancar um brega para conseguir outro beijo dessa morena linda, eu sou capaz de pedir permissão à sua avó.
Ela ri baixo para não acordar o filho, se bem que Filipo parece que desmaiou.
— Vai ter que pedir permissão ao meu tio — meu sorriso passou e ela gargalhou.
— Falando sério, Rebeca. Eu estou dando o tempo que você precisa, dando-lhe espaço, deixando-a à vontade, mas isso é porque você pediu. No instante que você quiser, nós voltaremos para a Itália, nos casaríamos e eu te daria o mundo que você merece. — Encosto-me mais nela.
— Acho que precisamos rever seus conceitos de dando-me um tempo. — Brinco com um cachinho dela.
— Ah, meu amor. Já perdi tempo demais longe de você.
— E quanto a casar? — Ela solta um longo suspiro. — Não sei se quero me casar.
Não quer se casar?
Calma, Matteo. Pedir em namoro seguido de um casamento não é lá muito inteligente.
— Essa situação me deixa muito mal — e aponto para o chão que Filipo deveria dormir, mudando de assunto.
—Olha, Matteo, eu não vou dizer que não temos qualquer chance porque eu... eu ainda gosto de você e adoro sua relação com Filipo. Mas ainda não está na hora para um compromisso — assinto mesmo não concordando.
— Nem meu pedido de namoro? — tento brincar tirando dela o clima chato que ficou.
— E com relação a isso — aponta para as coisas deles dentro de caixas e malas, ignorando minha pergunta —, eu já estou buscando um canto para nós...
— Falando nisso, eu já consegui, Rebeca. Eu já achei um lugar para nós.
Ela nega, desacreditada.
— Quando eu disse nós, eu pensei em mim e em Filipo.
Eu sabia, mas não preciso confessar.
— Jura que não pensou em mim? —me aproximo dela ainda mais. — Lembrar daquele tempo em que eu ia para sua casa passar o fim de semana contigo, fazendo um Filipo enquanto você se empanturrava de porcaria?
Ela ri.
— Até hoje eu não esqueço de quando a peguei nos braços completamente fraca, doente e desmaiada. Ali eu descobri o quanto eu temia te perder como eu te perdi. — Cheiro uma mecha do seu cabelo com o perfume dela.
— Você achou um lugar? — ela muda de assunto. — Onde?
— Uma longa história — ela faz um bico de lado e cruza os braços esperando minha explanação — Tá, mas só vou dizer que havia um grupo que monitorava sua família para saber se você tinha entrado em contato.
— Como os homens que me protegiam e eu não tinha conhecimento?
— Sim e não. Nesse caso era meu desespero mesmo em te achar e não em te proteger.
Ela aceita.
— E eu sei que a casa é para você e Filipo. Eu não viria morar com você, só estava brincando. — Ela sorri sem graça. — É mais porque eu quero dar um pouco de conforto a você, a Filipo, como também quero me sentir mais a vontade em vê-los sem a presença de seu tio. De sua avó eu até gosto.
— Mas eu pago o aluguel?
— Não! Inclusive está em meu nome.
Ela olha para o filho que tem a testa toda suada.
— Desculpa, Matteo se eu ainda não consigo dar um passo adiante. A nossa situação, nosso passado e minha avó são coisas não estão me deixando raciocinar direito.
Era cansativo, mas eu entendi toda dor que ela tinha passado. Quem sabe nunca fui tão solidário com o sentimento dos outros, até porque eu sabia o que ela tinha sofrido e eu precisava respeitar e esperar.
— Não estou te cobrando nada, Rebecca. Já disse que você tem o tempo que precisar.
— E sim. — Ela olha para mim. — Eu acho que deveríamos tentar novamente, mas dessa vez sem mentiras.
Foi então que ela cedeu ao meu beijo. Um beijo que aumentava nossas vontades. Um beijo doce, profundo e longo.
Era notório que ela ainda me amava.
Infelizmente ouvimos a porta da frente abrir e nos afastamos dando de cara com aquele tio dela que eu tenho horror e seu sorriso debochado.
Ele nos cumprimentou se é que aquilo foi um comprimento porque eu não entendia nada. Na verdade, eu até já estava pegando algumas palavras, a questão era que a presença dele me fazia pensar em como eu desejava eliminá-lo.
A mãe entrou logo depois esbaforida, contando algo para Rebeca que pelo jeito era grave e eu continuei alheio a toda aquela conversa, observando o tio caminhar sem os devidos cuidados ao pisar nos vários brinquedos encostados à parede, e ainda se sentar na cama do meu filho, colocando os sapatos sobre o lençol.
Que porra era aquela?!
Meu ódio só crescia.
Rebeca segurou minha mão apertando e falou algo pra ele que soltou uma risada e tirou os sapatos. Quando eu pensei em intervir, eu ouvi o primeiro tiro.
— Isso foi tiro — digo para Rebeca que assente.
— Sim, foi. — Só que eu não fiz uma pergunta, era uma afirmação pois eu conhecia muito bem aquele estampido
Patrícia e Jamil resolveram entrar em seus quartos deixando-nos a sós.
—Isso é normal acontecer aqui? — Porque Gilvan falou que onde eles moravam não tinha esse tipo de problema
— Não, mas pelo que minha mãe disse, alguém do grupo foi presou ou assassinado, não se sabe bem, e eles resolveram mostrar o seu poderio de fogo.
— Vamos embora agora!
Ela olha para mim e nega assustada.
— Eu não vou ficar aqui e não vou deixar vocês! — aquilo não era um pedido. Era a vida de meu filho em risco.
— Não dá, Matteo. Quando recebemos uma ordem, nós temos que obedecer. A comunidade da mangueira não é muito perigosa, mas isso não quer dizer que de vez em quando não aconteça algo assim. — Eu me sentia de mãos atadas. Isso jamais aconteceria comigo em meu país. — Fica aqui comigo hoje pela nossa segurança.
Numa porra de uma tapera, debaixo do mesmo teto que aquele energúmeno, era demais para meu juízo e meu papel de bom moço arrependido e apaixonado.
Preocupada com o filho, Rebeca o pegou nos braços e o abraçou mantendo-o todo o tempo com ela.
Os tiros não cessavam.
E ela acabou dormindo enquanto eu velava seu sono desacreditado daquela merda de situação que eu me encontrava.
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