Capítulo 12
Matteo
Cheguei à unidade pediátrica do hospital o mais rápido possível. Procurei saber onde minha mãe estava e corri como um alucinado para a unidade de terapia intensiva.
UTI! Meu filho estava na UTI?
Odeio a mãe do meu filho. Nunca a toquei, nunca a procurei, mas a tolero, falo com ela e até a ouço por causa de Filipo, mas nem no hospital eu consegui buscá-la ou mesmo liguei para ela.
― Mama, o que aconteceu? ― pergunto assim que entro na sala de espera da UTI pediátrica.
Graziela é a primeira a me ver e me abraça chorando, fazendo-me esperar o pior.
― Eu não vi, meu amor ― chora a ponto de soluçar. ― Foi aquela assassina da babá.
Eu não estava entendendo muita coisa. Minha mãe falou que fora um acidente, a outra falou que foi a assassina. Que porra estava acontecendo?
― O que exatamente aconteceu? ― Olho para minha mãe um pouco mais afastada. Era dela que eu queria ouvir.
Mamãe estava compenetrada, levemente desgrenhada para os padrões dela.
― Foi ela, amor. Foi ela, a babá ― Graziela continuava a chorar abraçando-me e eu só olho para minha mãe pedindo uma explicação.
Mamãe solta um longo suspiro.
― Ah meu filho, não sei o que pensar. A babá ia dar banho em Filipo para colocá-lo para dormir. Ele estava bem agitado, chorando muito. ― Começa a explicação. ― Graziela viu ― e aponta para minha esposa que confirma.
― Nem eu conseguia acalmá-lo ― completa e eu só penso quando foi que minha esposa tentou o fazer dormir. Tanto que sou eu que dou a mamadeira dele quando estou em casa e o ponho no berço.
Sim, sou um filho da puta apaixonado pelo meu filho.
― Eu a mandei preparar o banho enquanto eu tentava acalmá-lo ― justifica.
― Infelizmente, a água da banheira estava quente demais, queimando-o ― mamãe termina deixando-me atônito.
― Como assim?! ― aquilo era erro de amador ou tentativa de assassinato como minha esposa falou.
― Ele estava chorando muito, como tia Francesca falou, e aos gritos ― Graziella baixa a cabeça e começa a chorar. ― Ele não chorava só, ele berrava.
Foi nesse momento que um médico saiu da ala e caminhou em nossa direção, tirando-me da concentração.
― Senhora Mancini ― ele chama minha esposa que prontamente se revela.
― Como Filipo está, doutor? ― estou que sou ódio, por isso tomei à frente.
― O senhor deve ser o pai ― confirmo. ― Então, o pequeno Filipo chegou aqui com queimaduras de primeiro e segundo graus em cerca de sessenta por cento do corpo. ― Aperto as têmporas tentando manter um pouco da minha sanidade. ― As partes mais afetadas foram pés, pernas e principalmente região genital por conta da sensibilidade da pele.
Meu Deus! Meu coração aperta ao pensar na dor que meu filho de um pouco mais de quatro meses deve ter passado.
― Ele agora está medicado e dormindo ― completa. ― Vai sair dessa bem, mas achamos melhor deixá-lo internado para evitar infecção. Se tudo ocorrer bem, amanhã mesmo ele recebe alta.
Confirmo, desacreditado do que estava acontecendo.
― Posso vê-lo? ― pergunto e o médico confirma informando que por se tratar de um bebê, a presença do responsável se faz necessário.
― Eu entro com você. Preciso ver meu bebê ― Graziella diz e eu prefiro ignorar suas atuações exageradas. Não que eu ache que ela não gosta do filho, mas a futilidade dela me choca. Filipo não vem antes de sua lista de prioridades que inclui personal, spa, cabeleireiro e outras tolices bem típicas de alguém medíocre.
Entramos juntos com ela ao meu lado. Mama preferiu ficar na sala e me esperar.
Parte meu coração ao ver o acesso pequeno em sua mão. Dormindo tranquilo, ele me transmite a inocência que perderá tão prontamente ao ser iniciado ainda na adolescência.
Hoje, como pai, temo pela sua vida e chego a desejar que as coisas fossem diferentes, ao menos para ele, porque eu já tenho entranhado em minhas veias o que eu realmente sou. Com ele, eu gostaria que fosse diferente, e me pergunto como alguém como eu pode sentir um amor tão grande e tão profundo por um ser que há tão pouco tempo nasceu. Daria facilmente minha vida por Filipo.
Meu filho.
Ele é meu e não há como negar. E cada dia que passa, seus traços vão se tornando mais nítidos. Seus olhos estão clareando, definindo dia a dia mais a cor igual ao da família - cinza-azulado. Seu nariz ainda é bem pequenino, mas é visível o sangue italiano. Mama disse que ele parece cada dia mais comigo quando era bebê. E é verdade.
Seus cabelos caíram. Hoje ele está careca depois de ter nascido com uma vasta cabeleira escura.
Tudo nele é perfeito.
Até que eu pude notar a enorme mancha vermelha em sua perna, as bolhas em seus pés, trazendo-me à tona o motivo de estar ali.
― Meu bebê... ― Graziella toca no pé do filho. ― O que fizeram com você, meu amor?
Ele choraminga um pouco e a enfermeira que nos acompanha toca em suas costas.
― Boa noite ― acaricia o cabelo de meu filho, acalentando-o. ― O piupiu dele está queimado, então quando ele se mexe, a pele que está muito sensível roça na fralda causando-lhe desconforto ― chego a fechar os punhos várias vezes. ― O bumbum também. Tentamos colocar uma fralda maior para evitar assim como fizemos com a camisola, mas é mais difícil.
Eu, que tenho uma carreira de assassinatos nas minhas costas estou bem, enquanto Filipo, que nada fez, já sofre tanto. Daria minha fortuna para trocar de lugar com ele.
- Eu sei que é difícil, mas só podemos ter um acompanhante - A enfermeira fala, lembrando-nos de onde estamos.
― Tudo bem - solto um longo suspiro desolador. - Graziella, você vai ficar aqui cuidando dele. ― Ela faz uma careta de quem não gostou em nada de ser incumbida, mas se cala. Ai dela se falasse alguma coisa.
― Para onde você vai? ― Nem preciso responder. ― Volta ainda hoje?
― Provavelmente. Não confio nem em você cuidando dele. - Ela faz um bico de lado. - Se eu não voltar hoje à noite, amanhã cedo estarei aqui.
― Hoje, por favor. Faça um esforço para vir hoje ainda.
― E se eu não puder, algum problema? ― Não estou com paciência alguma.
― É que amanhã eu tenho um brunch e não quero chegar com olheiras, sabe como é...!
A enfermeira a olha estarrecida. Já eu não me choco com nada que vem dela.
― Manda o brunch para o inferno, Graziella. Sua obrigação de mãe é ficar aqui.
― Mas ele está bem, tanto que vai receber alta amanhã ― seu argumento é tão absurdo que eu só olho para enfermeira que sai de fininho.
― Ou você fica aqui cuidando do nosso filho com muito afinco, amor e dedicação, ou desse hospital você sequer sai da surra que eu vou te dar ― sussurro. ― E não será olheiras que você terá nessa sua carinha bonita e ordinária. - Minha ameaça foi clara
Ela balança a cabeça entendendo que a minha paciência tem limites. Esposa e filhos estão no ápice do código de ética de proteção da máfia, contudo Graziella me deixa no limiar.
Saí da CTI ignorando Graziella que está questionando onde tem uma cama para ela dormir como se estivesse hospedada em um hotel. Quem sabe uma noite sentada ao lado do filho dará a ela o papel de mãe que parece que esqueceu.
Lucca já está conversando com mamãe quando apareço
― E aí, como está meu neto? ― Machucado por uma incompetente.
― A senhora chegou a ver os pés dele? - os pés estavam piores e mais visíveis.
― Claro, filho. Me partiu o coração os gritos dele. ― E o meu depois de ver.
― Mama estava me contando, Matteo. Inclusive já mandei pegar a infeliz pra gente bater um papo com ela. ― Adoro que meu irmão pensa como eu, que é minha extensão. ― Acredita que ela estava arrumando as coisas para fugir?
Fugir! Ela não sabe o que a espera.
― Mas e agora, como ele está? ― Mamãe refaz a pergunta visivelmente preocupada com Filipo.
― Dormindo mesmo que eu tenha colocado uma cobra ao lado dele. ― Mama assente.
― Não quer que eu fique aqui? ― Ela se oferece e eu nego.
― Graziella é a mãe. Nada mais justo que ela assuma esse papel.
Mama concorda sem muita convicção.
― Lucca, vamos! Preciso ter uma conversa com essa babá ainda hoje com o sangue quente.
Lucca deixou o carro dele no estacionamento e mandou um dos soldados levar de volta, acompanhando-me.
E qual não foi a minha surpresa ao ver a babá - a senhora que tinha uma grande experiência e que fora muito bem recomendada
Puxo uma cadeira e me sento nela com o encosto pra frente.
― Eu pensava que tinha sido a outra babá que tivesse machucado meu filho ― a senhora me olha com lágrimas nos olhos, levemente machucada.
― Como está meu anjinho? ― Queimado, bruxa. ― Eu nunca machucaria uma pessoa, quanto mais um bebê, doutor. ― Se eu não convivesse com gente tão hipócrita, falsa e mentirosa, eu juraria que ela falava a verdade. ― Meu Deus!
― Você queimou meu bebê - lembro-a.
― Não ― nega a cabeça veementemente. ― Nunca! Eu vi o termômetro, eu coloquei a mão na água da banheira, meu Deus.
― E por uma combustão natural, a água esquentou? - Ironizo sem a menor graça.
Quero sentir seu medo.
― Eu não sei ― chora. ― Eu juro que não sei o que aconteceu.
― E o que aconteceu antes? ― Eu só precisava entender o que porra tinha acontecido. ― Quem sabe eu possa ver o que a senhora não viu.
Não que eu tivesse dúvida, só querendo postergar e dar o direito da pessoa saber porque perdeu a vida antes de eu a matar.
― Ele estava acordado, brincando com seus móbiles. ― Ela sorri olhando para cima. ― Ele estava bem, feliz enquanto eu arrumava suas coisas no armário.
Não foi bem isso que eu soube e minha mãe não é de mentir.
― Dona Graziella chegou e me pediu para pegar umas coisas que tinha comprado e deixado no quarto dela. ― Está postergando a explicação demais.
― Certo, e daí? Minha esposa compra coisas para o filho.
― Claro, senhor. ― Ela assente. ― Arrumei as coisas que peguei enquanto a mãe brincava com o filho. Claro que eu achei estranho, mas sei lá.
- Achou estranho o quê? - que merda ela estava falando.
- Dona Graziella brincar. Ela parece que nem gosta do filho. - Eu não estou gostando em nada da direção que essa conversa está indo. Ou ela acha que pode acusar a mãe de maltratos?
- Mas ele estava bem, sorrindo.
- Até aquele instante sim, mas não demorou muito, Filipo começou a chorar. ― Ela começa a negar. ― Dona Graziella pegou ele nos braços e até tentou acalentá-lo, mas nada. Ele só piorava. Foi quando ficou nervosa, impaciente e me entregou Filipo para ver se eu tinha mais sorte.
― Ele parou de chorar?
― Não ― ela volta a chorar. ― Ele parecia estar sentindo alguma dor. Estava vermelho, suando do tanto que chorava. Dona Graziela também ficou muito estressada. Eu cheguei a pensar que fosse o cheiro da tinta, solvente que o estava deixando irritado...
― Tinta? Solvente?
― Sim. Só que eu imaginei ser dos brinquedos que ela comprou.
Brinquedos com tinta, solvente, não é bem uma combinação para se ter em um quarto de um bebê.
― Foi quando eu sugeri tirar a roupa dele. ― completa. ― Eu precisava ver se tinha algo incomodando seu corpo, um bichinho mordendo, uma linha que puxava um pelinho, sei lá... Tantas coisas passaram em minha cabeça. Eu só queria aliviar meu anjinho.
― Tinha?
― Não. Na verdade, quando eu pensei em tirar a roupinha dele, dona Graziella sugeriu um banho morno.
Minha mulher sugerindo algo para o conforto do meu filho?
― Foi nessa hora que a senhora saiu para preparar o banho? ― Ela assente.
― Sim. Dona Graziella disse que tiraria a roupa do bebê enquanto eu providenciava o banho.
Realmente é estranho o fato de Graziella estar ajudando quando ela nunca se preocupou com o filho.
― Preparei o banho, medi a temperatura da água em torno dos trinta e sete graus e voltei ao quarto. Dona Graziella já tinha tirado o macacão dele, deixando-o só de fralda e meia.
― Você viu se ele tinha alguma marca, alguma coisa no corpo dele? ― ela nega. ― E Graziella, ficou ao seu lado?
Lucca me olha estranhando meu questionamento e eu tampouco entendo.
Está desconfiando de sua esposa, Matteo?
― Ela foi buscar um algodão umedecido já que ele tinha feito cocô e eu precisava deixar ele limpo antes do banho.
― Não havia nada de estranho? ― Ela olha mais uma vez para cima, buscando a memória. ― Ainda sentia o cheiro de tinha? ― nega.
― Aí você o colocou na banheira?
― Não. Para dormir, eu prefiro na banheirinha de ofurô.
Por isso ela não sentiu a temperatura da água. A criança toma banho sentada, num lugar apertado para trazer a segurança e memória do tempo que estava na barriga. Os pés e pernas tiveram mais tempo de contato.
Meu Deus! Que dor ele não deve ter sentido.
― Enfiou meu filho dentro da água fervendo? ― Meu ódio volta a florescer.
Ela assente e começa a chorar.
― Ele gritou ― chora desolada. ― Eu não entendia até que minha mão tocou na água e eu senti que estava quente acima do que eu havia preparado.
Ao menos confessou.
― Eu tirei ele correndo da banheira, entrei com ele debaixo da ducha de água fria para amenizar a dor. ― Chora de soluçar. ― Dona Graziella gritava comigo... as bolhas apareceram... ― Cai em prantos. ― Oh, Deus! O que eu fiz?
Eu me levanto e me aproximo da bruxa assassina.
― Você o queimou ― digo, e aperto seu pescoço fino. ― Você queria matá-lo ― ela nega, segurando minhas mãos, arregalando os olhos ― mas não conseguiu.
- Eu amo seu filho - sussurra. - Eu não sei o que acon-teceu.
- E por que tentou fugir? - pergunto.
- Ela jurou me matar - a única coisa certa que fez.
- Ela jurou, mas sou eu que executo.
― Nã-o fu-i eu ― sussurra com a falta de ar, bate em minhas mãos - Ju... - e morre.
Esse é o futuro de quem machuca meu filho - morte certa.
Seu corpo cai inerte no chão.
― Podia ter me entregado ― Lucca se aproxima. ― Eu já tinha pensado em uma banheira de ácido que a corroesse até os ossos.
O solvente não saía da minha cabeça. Queimadura química seguido de água quente esconderia a causa inicial. Nas meias?
― Matteo?
― Lucca, me faça um favor. ― Ele assente. ― Eu devo ir para a fazenda esse fim de semana com Graziella, Filipo e mamãe ― Ele me olha sem entender. ― Mande pôr câmeras escondidas no quarto e banheiro de Filipo.
― Claro, meu irmão. - Vamos ver se alguém terá coragem de machucar meu filho novamente.
― Perfeito. Agora, manda darem fim nesse corpo. A ideia do ácido até que é boa.
― Mandarei, mano. Sem corpo, sem crime.
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