A sorte - Capítulo 11
"A vida é assim, displicente.
E muda sem dar a vertente
Nos leva numa correnteza
Nos prende com sua destreza"
(Catedral)
Hoje é o meu dia de alta, e permaneci quatro dias e meio no hospital. Agora me encontro com muletas e com a perna engessada. Daianny me trouxe umas roupas para eu usar e pegou alguns pertences na gaveta próximo a cama que eu utilizava. Coloco a roupa que ela me trouxe – uma calça folgada e uma blusa social – o que para mim foi uma maravilha, pois pude tirar as vestes hospitalares que deixavam parte das minhas nádegas de fora deixando-me constrangida.
— Vamos, Yasmim — diz, Dai.
— Vamos!
— Ah, já ia me esquecendo! Sua mãe está no hospital.
— O quê? Por que você não me avisou antes? — pergunto, bastante preocupada.
— Isso foi ontem. E eu não queria te preocupar.
— Dai! É minha mãe!
— Eu sei. Vê se se acalma. Entra no carro.
— Leve-me para o hospital, Dai.
— Tem certeza?
— Tenho sim.
— Joseph está na galeria, tá?
— Ok, depois a gente fala sobre isso.
Eu me esforço para manter a calma, porém saber que posso perder minha mãe a qualquer instante angustia Minh' alma.
Chegamos no hospital, que se localiza há poucos minutos do que eu estava, e seguimos diretamente para a enfermaria. Ando o mais rápido que posso – o que não me impede de parecer um cágado andando por conta da minha lentidão.
— Olá. Eu sou Yasmim. Sou filha da senhora Margareth Saints... Em que quarto ela está?
— Segundo andar, no corredor à esquerda, primeira porta à direita, leito 20.
— Ok, obrigada!
— Vem, deixa eu te ajudar, Yasmim. — Aceito a sua ajuda.
— Obrigada, Dai. Por que não vamos de elevador? — pergunto, estranhando.
— Está em manutenção — profere.
— Está bem, então. — Inspiro e expiro fundo, preparando-me para enfrentar os degraus.
Subimos a escada com certa dificuldade; sendo mais dificultoso para mim do que para minha amiga. Chegamos até a porta do quarto e eu a abro de fininho. Olho em direção a cama onde minha querida mãe se encontra deitada, porém acordada, e logo me vem uma expressão um pouco tristonha.
— Mãe!
— Minha filha, você está aqui?
— Oi, mãe. — Aproximo-me e beijo sua testa. — Como a senhora está?
— Muito fraca, minha filha.
— Vou esperar lá fora — diz, Dai.
— Está bem — respondo.
— Por que não está no hospital? — Minha mãe questiona.
— Recebi alta hoje. Eu posso me cuidar em casa.
Fico sem falar por alguns instantes, pensativa, levanto-me do assento e digo: — Eu vou aqui e já volto, está bem?
— Tudo bem, meu anjo.
Deixo-a lá e, assim que cogito ir até o médico, que está responsável por ela todo esse tempo, avisto-o adentrando o quarto.
— Doutor, pode me dizer o que houve?
— É bem delicado. Podemos falar lá fora?
— Claro — assinto e o sigo, andando devagar, até a porta.
— Quer ajuda?
— Não precisa, obrigada.
Encosto numa parede, gélida por sinal, para eu ficar mais descansada.
— Então, os remédios que sua mãe estava tomando por todo esse tempo perderam o efeito. O estágio da doença avançou mui rápido. Pelo tempo de tratamento era para ela estar sã, no entanto, descobrimos uma nova extensão para outros órgãos, o que não compreendemos bem o porquê e toda essa metástase está deixando-a cada vez mais fraca; e não sabemos até quando ela irá resistir. Talvez um mês ou dois meses. Eu... Sinto muito, Yasmim. Sei que não era essa a notícia que eu gostaria de te dar.
Começo a deixar algumas lágrimas escoarem pelo meu rosto, então, o doutor Eduard com toda a sua ternura, abraça-me gentilmente. Ele é o médico que sempre cuidou de minha mãe – eles se conheciam desde o colégio, também – desde que descobrimos sua leucemia há alguns anos.
Choro amargamente, permitindo que a muleta caía no chão, e agarro seus braços amigáveis no qual me apertam forte. Ajo de tal forma pela amizade que obtivemos em todo este tempo, porquanto ele é como um tio para mim.
— Tudo bem, Yasmim! — Dá-me um beijo na testa. — Você sabe que não era essa notícia que queria te dar, an? Você é forte, princesa. E sua mãe também tem sido uma pessoa bastante forte.
— E o que vocês vão fazer agora? — pergunto.
— Vamos deixá-la em observação por hoje e amanhã ela pode ir para casa. Se puder, tente aproveitar o máximo ao lado dela. Leve ela para sair um pouco e chame Manu para ir com vocês. — Refere-se a Emanuelly, sua filha, que é a cuidadora de minha mãe.
— Está bem — digo.
— Vá para casa e descanse um pouco. Vejo que você também está exausta. Aliás o que houve com a sua perna?
— Sofri um acidente há quatro dias.
— Entendo. Mas já se recupera bem, certo?
— Sim, sim.
— Que bom. Agora vá pra casa e descanse. Emanuelly vai ficar com ela, além de que, tem a equipe de enfermagem para cuidar de Margareth.
— Certo. Muito obrigada, Eduard.
— Por nada, meu anjo.
Vou atrás de Daianny, mas antes regresso ao quarto e converso rapidamente com minha mãe, lhe dou um beijo na testa e me retiro.
— Já vamos, maninha? — Dai pergunta.
— Leve para casa, por favor; vou tomar um banho e descansar e depois irei voltar para ficar com ela.
— Certo. Vamos! — Adentramos no carro e seguimos para casa.
Algum tempo depois, já próximo da residência, Dai decide parar o carro em frente a um supermercado.
— Yasmim, espera aqui que eu vou pegar umas coisas no supermercado e já volto. — Tira as chaves do carro e leva consigo.
— Certo.
Mas, como sou teimosa, saio do carro e me sento num banco que há nas proximidades e fico a contemplar a paisagem e a pouca movimentação no local, esse cheio de casas e com a rua dividida em duas vias por árvores. Ainda admirando ao meu redor, olho para o lado e vejo Violetta, usando óculos escuro, o que é raro, e mantendo os cabelos presos em um coque alto e desajeitado. Quanto as vestes, está trajada de um short jeans azul e uma camiseta folgada na cor branca. Sinto-me surpresa ao vê-la por aqui.
—Yasmim! Há quanto tempo, mulher! — Sorri para mim.
— Oi, é mesmo. — Tento falar, meio sem graça.
— Meu Deus! O que houve? — pergunta, olhando para a minha perna.
— Sofri um acidente.
— Entendo... Espero que se recupere logo. Me conta, como você está? Nem para nos fazer uma visita né? — E questiona de uma só vez.
— Estou bem, na medida do possível... Ah! Vi! Você sabe que eu não quero ter que me encontrar com seu irmão. Foi doloroso para mim aquilo.
—Yasmim, eu sinto muito. É uma pena que vocês não estão juntos. Você sabe que eu amo você mais até do que Rebecca, a atual dele. Sei lá... Ela é um pouco sem sal.
— Que eu me lembre você também me dizia que eu era sem sal.
— Isso foi no início. Depois me apeguei a minha cunhadinha predileta. Você sabe... Você foi quem mudou meu irmão de uma forma bastante especial. Sabia que ele já me contou como vocês se conheceram? Isso foi um pouco antes de ele ter tido aquele acidente. É até interessante, porque por mais que ele não tivesse compromissos sérios, ele nunca deixou de possuir certo cavalheirismo.
Dou um leve sorriso, meio sem graça ainda, pois vê-la me faz recordar tanto ele que meu coração dói só por saber que tento, mas não consigo esquecê-lo. Ademais, não sei o que dizer a ela quanto a isto.
— É...
— Violetta? — Ouço uma voz meio rouca e, claro, reconheço de imediato. Abruptamente olho para o lado, e ele me lança um olhar surpreso tanto quanto eu; e Vi me encara sem jeito alternando seu olhar para Caleb.
— O que faz por aqui, meu irmão? — questiona.
— Eu vim fazer umas compras. A cozinha do meu apartamento precisa ser reabastecida — diz e olha para mim.
Que mundo pequeno, tantos supermercados e aparece logo nesse.
— Oi, tu-do bem? — pergunta.
— Si-sim.
— É... Pelo visto se recordam bem um do outro, né? — Violetta profere, risonha.
Ele fixa seu olhar em mim e eu faço o mesmo. No entanto, ele vira o rosto e olha na direção de Violetta.
— Maninha... Bom te ver. — Dá um beijo em sua fronte.
— Também, maninho. Vai aparecer lá em casa que dia agora?
— O quê? Eu já fui lá nem tem duas semanas.
— Mas já estamos com saudades.
— Vocês sabem que eu os amo. Amanhã então, está bem?
— Okay.
— Boa tarde, Yasmim. Bom vê-la também. — Olha para mim e sorri.
— Boa. Igualmente. — Minha apreensividade é tamanha que não consigo ser menos rude.
— Bem, vou aqui, agora. Tchau, maninha, juízo. Tchau, Yasmim.
— Tchau! — falamos em uníssono.
No mesmo instante, Dai se aproxima com um carrinho cheio de sacolas.
— Amiga! Foi quem eu vi...
— Sim. — Interrompo-a.
— Deus! — diz, olhando para Violetta. — E essa quem é?
— É a irmã dele: Violetta.
— Sério? Oi, Violetta! Prazer, chamo-me Daianny.
— Oi. Prazer em conhecê-la também. Ah... Yasmim preciso ir, então a gente se vê por aí. Apareça lá em casa e melhoras!
— Está bem, Vi. Obrigada.
Quando Violetta se afasta, miro Daianny que mantém um sorriso que quase não cabe no rosto.
— Ai, meu Deus! Ele é mais lindo pessoalmente. Yasmim, mulher de sorte!
— Não sou mais essa mulher de sorte, Dai.
— Não faz essa cara. Conte-me... O que você sentiu quando o viu?
— Sei lá...
— Sei lá o que, Yasmim! Te conheço!
— Eu não sei... Acho que já me conformo vê-lo distante de mim. Mas não vou negar que meu coração bateu um pouco mais forte, porém... Ter que olhar em seus olhos novamente me dói, sabe...
— Coraçãozinho que não sabe o que sente — fala, Daianny, com um semblante dengoso. — Vem! Precisamos ir agora. Tenho que colocar as coisas dentro do carro.
— Ah, é mesmo. Quer ajuda? — sugiro.
— Tu, com uma mão só, vai me ajudar em que Yasmim? Não precisa. Eu só vou tirando do carrinho e jogando aqui — diz, já pondo em prática.
— Então, tá. — Dou de ombros e aos pouquinhos vou chegando próximo a porta do carro. Abro a mesma e me assento.
— Pronto. Tudo certo. Vamos para casa — responde, fechando o capô traseiro.
— Hum... — respondo, olhando para fora da janela.
— Vou te deixar em casa e vou para meu lar, doce lar, levar as compras e descansar um pouco... — Meus pensamentos voam longe e nem presto atenção ao que Daianny fala. Em minha mente ainda ecoa a voz dele tanto que me recordo de sua expressão que me foi tão...
— Yasmim! Você está me ouvindo?
— An... Oi?
— Deixa pra lá.
— Ok.
Sinto como se minha cabeça estivesse no "mundo da lua" no momento. Não paro de pensar naqueles olhos castanhos, também. Meu coração bate fortemente quando o vejo mesmo que já tenham se passado quase dois anos e meio. E pensava eu que havia enterrado as memórias no fundo do meu coração, em meu inconsciente, mas na verdade elas continuam em meu sub consciente, trazendo-me à consciência o sentimento que tentei deixar para trás.
— Chegamos — profere.
— Ah, Okay. Obrigada, amiga do meu coração.
— De nada. Mais tarde passo aqui para te levar para o hospital. Ah! — exclama, se recordando de algo mais. — Irei dar uma passada na galeria e ver como estão as coisas. Lembre-se que Joseph ficou lá ontem e hoje viu!
— Ele também é competente, ficou em boas mãos a galeria. Nem estou preocupada — digo, sendo sincera.
— Certo. Tchau, amiga. — Aceno com uma das mãos e entro em casa, não perdendo tempo e indo em direção ao sofá, jogando-me sobre ele, sem deixar de pensar em Caleb. Esse nome não sai da minha cabeça. A vontade que me surgiu ao vê-lo novamente era de beijá-lo, abraçá-lo, porém está longe de acontecer mais uma vez. Que sorte eu tive de conhecer alguém como ele. Um homem maravilhoso em tudo, por mais que antes de me conhecer não fosse um dos melhores partidos. Lembro-me como se fosse a primeira vez, quando os nossos corpos se chocaram e meus papéis caíram no chão...
— Desculpe-me, eu não...
— Não, tudo bem. Não tem problema.
— Espera eu te ajudo.
— Obrigada.
— De nada, linda. — Sorriu.
(...)
— Ei! Você por aqui?
— Nossa! Se não é o homem com quem me esbarrei da última vez.
— Estou gostando disso.
— Não sei se posso dizer o mesmo.
— Mas é claro que não! Você pode me dizer... O que você gostaria de me dizer, então? — riu.
— Que é uma coincidência, bem gentil, talvez...
— Muito sem graça. Te dou uma segunda chance de mudar as palavras.
— Para de fazer graça! — gargalhei.
— Prazer, meu nome é Caleb.
—Yasmim.
— Hum... Acho que faltou você me dizer que também fica muito feliz em me conhecer.
— Que convencido!
— Que rude, você! — sorriu.
— Ei!
— Que bom que você não quer me expulsar daqui. Gostei de te conhecer.
— Bem que eu gostaria de expulsá-lo. Mas, também gostei de conhecer-te.
— Que tal pedirmos algo para comer?
— É mesmo, eu até tinha esquecido!
— Diz, que eu pago.
— Não. Eu posso pagar o meu.
— Não, senhorita. Eu pago para você. Veja isto como uma pequena lembrancinha para não esquecer de mim.
— Como pode ser uma lembrança?
— Memórias, minha linda. — Mirou-me nos olhos e sorriu novamente.
— Não me olha assim, Caleb. Vou querer isso aqui e um café. — disse, mostrando o cardápio.
— Então vou pedir o mesmo... — bagunçou levemente os cabelos dando um perfil mais sedutor. — Gostei muito de você, sabia?
— Também — admiti.
— Quer ser mais especifica?
— Eu também gostei de você, Caleb.
— Agora sim. — E eu sorri.
(...)
— Toma o meu número e me liga.
— Pronto.
— Alô! — dissemos em uníssono.
— Está tudo ok, agora. — Beijou-me à face.
— A gente se fala. Tenha uma boa tarde.
—Você também. — Dei uma piscadinha.
Eu, jogada em minhas memórias, acabo adormecendo no sofá e, quando desperto, percebo que já está em cima do horário.
— Meu Deus! Preciso tomar banho.
Corro o máximo que consigo para o quarto. Apressadamente, pego uma roupa simples no closet – nada mais que uma saia azul-celeste e uma blusa branca com um colete cinza por cima e peças íntimas; e vou tomar meu banho. Quando termino, olho para o celular que está em cima da cama e vejo que nele há uma chamada perdida.
— Como que eu não ouvi? Ah... Esqueci. Coloquei no vibratório — respondo a mim mesma.
Daianny tinha me ligado e provavelmente ela já estava vindo me buscar. Arrumo uma pequena sacola e coloco o necessário para levar para o hospital. Pego a minha bolsa com os documentos e desço a escada lentamente, seguindo em direção a cozinha, logo após. No cômodo, faço um lámen por ser mais rápido, como, depois apanho uma fatia de pizza; devoro também, e, vou logo em seguida ao banheiro, escovar os dentes e fazer as minhas necessidades fisiológicas. Quando saio de lá, espero Daianny chegar, na sala de estar, mas acabo deitando e cochilando novamente.
Continua...
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Amores, e aí o que estão achando? Capítulos longos, né?
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😚❤
Dedicado a VeridianaElza5
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