Bônus - Cinco Anos Depois
"Oh I'll be free just like that blue bird"
- David Bowie, Lazarus
Lágrimas de gelo
A porta bateu com força atrás de mim, o estrondo ecoando pelo corredor. Ergui a mão até minha boca e senti o filete de sangue quente que fluía do meu lábio inferior em direção ao queixo, o pequeno corte ardendo como o inferno.
Felipe é ridículo! Minha mente gritou.
Apertei o botão do elevador várias vezes, como se isso pudesse fazê-lo chegar mais rápido, e bati o pé contra o solo. O corredor era adornado por um pequeno e belo pé de orquídea, algo que sempre me parecera calmante, mas que, naquele momento, só aumentou minha raiva. Estava pensando em mil formas de destruir a planta quando ouvi a porta do apartamento se destravar e Felipe sair por ele. Tinha tirado a camisa que usava antes e exibia o peitoral descoberto, as tatuagens presentes ali totalmente expostas, e jogou uma mochila no meio do corredor – suas bochechas queimando e as pupilas totalmente dilatadas.
- BOM DIVERTIMENTO, TODY! – Berrou.
A porta bateu mais uma vez, a pequena decoração de boas vindas tremendo sob o choque intenso. Bufando, aproximei-me da mochila jogada ao chão e a chutei, pisei e esmaguei antes de finalmente apanhá-la ao ouvir o CLING do elevador. Coloquei-a no ombro, sem ligar se algo ali dentro havia quebrado e entrei no elevador, apertando o botão para o térreo com tanta força que pensei quebrá-lo.
Idiota! Ridículo! Certinho! Xinguei Felipe mentalmente. Meu reflexo no espelho do elevador mostrava um homem transtornado, com os olhos claros brilhando de raiva, o lábio ligeiramente inchado e a camisa totalmente amassada. Haviam se passado anos desde a última vez que tínhamos brigado tão feio e eu nadava no meu próprio ódio.
A descida do 14° andar ao térreo parecia lenta demais, angustiante. O silêncio do elevador me fez perceber minha respiração descompensada e fechei os olhos por alguns segundos, absorvendo o ar com veemência em uma tentativa de me acalmar. Os pontos coloridos em minha visão começaram a desaparecer e meu rosto lentamente voltou à coloração normal, a vermelhidão desaparecendo. Minha mente ainda estava sufocada, a razão distante demais para ser atingida naquele momento, mas minhas mãos passaram a tremer ligeiramente menos.
Custava me ouvir, idiota? Custava? Resmunguei na esperança de que Felipe ouvisse meus pensamentos incendiados. Ouvir o que eu tinha a dizer iria matá-lo, por acaso?
Qual era o grande problema de ir a uma festa com os amigos? O pub que eu estava algumas horas antes tinha sido inaugurado há pouco mais de uma semana e eu, como um dos principais jogadores do time da região, fui convidado para participar do primeiro show ao vivo que aconteceria. Era um local luxuoso, especialmente feito para os mais ricos da cidade, um lugar seleto que eu tinha sido prestigiado ao ganhar um convite para visitar.
O pub estava lotado e é claro que fotos minhas caíram nos sites de fofoca cinco minutos depois que coloquei os pés na festa. O time de futebol que eu jogava era um dos mais conhecidos do país, tornando-me uma espécie de celebridade nacional, fato este que não foi esquecido quando tiraram fotos minhas em meio à multidão. Eu tinha dançado e pulado por horas com meus colegas de trabalho e então, em meio à animação, algumas fotos foram publicadas me mostravam próximo demais de uma mulher. Os sites de fofoca não perdoaram e manchetes de que eu estava beijando uma misteriosa mulher e, consequentemente, traindo meu namorado, tomaram conta das notícias do mundo das celebridades.
Quando finalmente cheguei ao térreo, saí correndo até o carro, percebendo tarde demais que as chaves estavam no apartamento, afinal eu tinha chegado em casa de carona com o dono do pub. Tinha passado o dia sem o carro e isso me fez rugir de raiva como um animal enjaulado. Chutei a porta do meu carro até sentir a dor tomar posse do meu pé. Toda aquela situação – minha briga feia com Felipe, meu acesso de raiva, a dor que irradiava em minha perna – era consequência de um equívoco causado por pessoas que jamais me conheceram. Pessoas que buscavam a todo custo a manchete mais chocante do dia, o fato mais atrativo aos leitores, mesmo que ele não fosse verdadeiro.
Pisando duro, saí do condomínio com passos rápidos e apressados, meus olhos queimando com as lágrimas que tentei segurar ao máximo. Eu não tinha beijado aquela mulher, mesmo que os ângulos da foto mostrassem algo diferente. Era uma dançarina que fora convidada como acompanhante de um rico empresário e que me reconhecera. Ao que parecia, seu pai era um fã meu e me considera um jogador incrível, por isso, implorou por uma foto comigo. Abaixado com o ouvido próximo à boca dela para ouvir suas palavras sobre a música alta da festa, as fotos tinham sido capturadas pouco antes de ela puxar um celular do bolso, tirar uma selfie ao meu lado e desaparecer sorridente logo em seguida.
Apertei a alça da mochila e puxei o capuz para esconder meu rosto. Caminhei pela calçada de forma agitada, as luzes da noite deixando o meu cérebro confuso. Amanheceria em pouco mais de duas horas e por isso a cidade repousava no quase absoluto silêncio, as pessoas aproveitando seus últimos momentos de sono antes de começar mais um dia longo e cansativo. As calçadas estavam vazias, os carros raríssimos, e podíamos quase pensar estarmos em uma cidade fantasma.
Custava me ouvir?
Felipe explodiu quando entrei em casa às três horas da manhã. Em sua mão, repousava um tablet com uma matéria do meu suposto beijo aberta. Eu estava zonzo, ligeiramente bêbado, quando me chamou de cretino e disse que não era capaz sequer de avisar que estava indo para uma festa e chegaria tarde. Ele conhecia minha vida e sabia que eu saia muito, mesmo que muitas das vezes ele me acompanhava nas festa, entretanto, aquela fora a primeira vez que esqueci totalmente de avisá-lo. Nossa discussão entrou em chamas pouco depois quando respondi-o de maneira ríspida, cansado demais para continuar aquela conversa. Irritado e sentindo-se traído, Felipe havia me dado um soco no rosto que, mesmo não sendo muito forte, fez meu lábio inferior se abrir.
Admiti: não tinha telefonado para ele. O convite fora em cima da hora e pensei em voltar cedo para casa, mas as coisas não aconteceram da forma que eu gostaria. As finais do campeonato nacional de futebol americano estava chegando e eu tinha passado as últimas semanas treinando como um louco, o que resultava em longos dias fora de casa, exaustão e irritação. Pela primeira vez em semanas, estava aproveitando de algo que não era trabalho, dançando furiosamente naquela festa de pub.
Ergui o rosto, que antes estava observando o movimento rápido dos meus pés, e percebi que estava completamente perdido. Tinha andado pelas ruas sem prestar atenção onde ia e não reconheci o lugar imediatamente. Era uma avenida que sempre evitávamos por ter muito tráfico durante o dia, então levei longos segundos para notar onde estava.
Rodopiei sobre mim mesmo, a procura de algo que não sabia o que era. Nesse momento, algo em mim quebrou e sentei na ponta da calçada vazia, as lágrimas inundando meu rosto quase que de imediato. Os soluços vieram fortes, cortantes, e o vento úmido e frio fazia as lágrimas parecerem de gelo, escorrendo sobre minha pele aos poucos. Chorei por tudo que aconteceu naquela noite. Chorei por todos os sentimentos que se misturavam dentro de mim. A raiva se diluiu, tornando-se água, e saiu de mim dolorosamente, como se fizesse questão de devastar tudo antes de partir.
Eventualmente, ergui o rosto para limpar o nariz e foi somente então que pude perceber que, do outro lado da avenida, estava o cinema. As paredes do prédio tinham pôsteres dos mais recentes lançamento e um dos filmes afixados era um desenho animado que Felipe tinha produzido. O vi trabalhando por meses e meses seguidos para preparar as cenas do filme e senti um orgulho enorme quando a data de lançamento foi finalmente anunciada, após cerca de dois anos de trabalho. Aquele era o terceiro filme infantil em que Fé trabalhava, sendo os dois primeiros xodós da população infantil nacional – e dos pais.
Felipe.
Ver aquilo me fez chorar ainda mais, pois Fê sempre dizia que o príncipe encantado da história era parecido comigo. Vendo o pôster, era impossível negar a semelhança: o príncipe sorria de lado, o peitoral estufado, tinha olhos dourados semelhantes aos meus e o cabelo com o mesmo tom do meu. Até mesmo a forma como a barba do personagem era cortado lembrava a forma que eu gostava de fazer a barba.
Soluçando, levantei-me dali antes que me sentisse ainda pior do que já estava e puxei o capuz novamente antes de correr para longe dali. Cortando entre as ruas quase vazias , ouvindo meus passos fazerem um barulho exagerado sobre o chão, percebi que eu deveria ser o príncipe da vida de Felipe, mas as coisas não eram assim. Naquele momento, eu também corria para longe dele.
E eu estava perdido.
••••
A recepcionista e os seguranças me olharam desconfiados quando passei pela portaria do hotel quatro estrelas. A garota parecia ter acabado de completar seus 18 anos, tinha o cabelo loiro preso em um coque perfeito e estava formalmente sentada atrás do balcão da recepção. Ela me observou com cuidado, passando o olhar pelas minhas roupas amassadas, o lábio cortado e a pequena mochila em minhas costas. Percebi sua tensão, o olhar assustado sobre a minha figura encapuzada.
- Posso ajudar, senhor? – Ergueu-se e percebi que ela estava a um movimento de chamar os seguranças do hotel.
Puxei completamente o capuz para trás e ergui o rosto, percebendo de imediato o olhar da recepcionista suavizar ao me reconhecer. Era um dos pontos positivos de ser conhecido, mesmo que muitas outras situações negativas acompanhassem.
- Gostaria do melhor quarto disponível, por favor. – Pedi em um sussurro, deslizando meu cartão de débito pelo balcão.
A garota assentiu e passou a teclar o computador diante de si com velocidade, copiando as informações sobre o meu cartão. Pediu que eu fornecesse a senha do cartão e logo a primeira diária do hotel foi debitada da minha conta bancária.
- O senhor será acompanhado até nossa Suíte Master. – Falou, entregando-me um cartão magnético com o número 28 na frente. – O restante do pagamento poderá ser realizado no check-out.
Assenti, porém não prestara atenção na última parte. Meus olhos dançavam sobre o número do quarto: 28 era o nosso aniversário de namoro. Durante os anos em que eu e Felipe estivemos juntos, sempre tentávamos fazer algo especial nessa data, nem que isso significasse somente ficarmos horas agarrados no sofá, assistindo pela milésima vez os filmes de Harry Potter.
Sacudi a cabeça enquanto seguia o funcionário até o elevador do hotel, uma tentativa frustrada de afastar meus pensamentos de Felipe. Não funcionou e involuntariamente os acontecimentos de mais cedo retornaram. Eu não podia associar tudo a ele, mas fora impossível não fazê-lo quando entrei no espaçoso quarto do hotel e não senti o familiar perfume das velas que Felipe tinha o hábito de acender para perfumar o apartamento.
O quarto era espaçoso: um televisão de 52’ repousava na parede, a cama gigantesca caberia três pessoas sem problemas, o balcão estava carregado de doces e haviam duas rosas sobre os lençóis de cama. O quarto perdia para o banheiro, entretanto: a banheira circular ocupava o espaço quase inteiro, as duas pias brilhavam em mármore branco, as torneiras eram claramente revestidas de ouro.
- Caso o senhor deseje, o café da manhã será fornecido a partir das 7 da manhã. – O funcionário informou.
- Obrigado. – Tranquei porta e me joguei na cama, ainda com as roupas e os sapatos. O cheiro ali era sintético, vindo dos mais diversos produtos de limpeza utilizados, e me lembravam coisas falsificadas.
Rodopiei na cama, usando os pés para deslizar meus sapatos para fora, e percebi os primeiros raios da manhã entrando pela grande janela que dava vista a quase a cidade toda. Ali era mais alto que nosso apartamento e até isso me parecia estranho. Com a raiva desaparecida, a razão voltava lentamente e a culpa começou a se apossar da minha mente: como eu teria reagido se os papéis fossem invertidos?
Pensei em como Felipe deve ter ficado chocado ao ver as fotos do meu "beijo" postado nas redes sociais e sites de fofoca, mas eu sabia que ele não havia acreditado nas manchetes. Pude imaginar perfeitamente suas sobrancelhas franzidas ao tentar me telefonar e não conseguir falar comigo. Não, o que o havia chateado fora o meu sumiço. Sem notícias minhas, ele tinha ficado totalmente preocupado, assim como eu ficava quando ele saia de casa e demorava demais para chegar.
Virei-me para puxar o celular do bolso e vi 13 chamadas não atendidas com seu nome e imediatamente as lágrimas voltaram a escorrer pelo meu rosto. As mensagens carregavam o mesmo tom preocupado, quase desesperado.
Meus olhos correram pelo quarto de hotel, absorvendo detalhes que eu não havia percebido de início. A angústia se apossou de mim, uma apreensão que fez meu coração ficar apertado: aquela cama não era a minha, o travesseiro ao lado do meu não tinha o maravilhoso perfume de Felipe, o som de sua voz não se fazia presente no espaço e não haviam pinturas feitas por ele nas paredes.
Eu era um idiota.
Ouvi o celular vibrar na minha mão e vi o nome de Scott no identificador de chamadas. Meu melhor amigo devia ter visto as fotos que estavam espalhadas aos quatro cantos do mundo assim que acordara para sua corrida matinal. A simples ideia de falar com ele naquele momento me deixou completamente desesperado, então grunhi e joguei o celular sobre a cama, fazendo o aparelho desaparecer sob um dos travesseiros, abafando assim a vibração.
Enrolei-me nos lençóis e afundei a cabeça entre eles, sentindo o efeito do álcool passar aos poucos e a noção do que eu tinha feito tomar posse de mim. O dia tinha amanhecido, mas ainda era cedo, ou seja, em qualquer outro dia eu estaria naquele momento deitado ao lado de Felipe, aproveitando juntos nossas últimas horas de sono. Depois, faríamos nosso café da manhã e ele partiria para o trabalho enquanto eu iria treinar.
O futebol acabava me fazendo viajar muito pelo país porém, graças ao tipo de emprego que Felipe tinha, ele podia quase sempre me acompanhar. Aproveitávamos essas viagens para criar memórias, conhecer novos lugares e pessoas, inspirar a arte de Felipe, comemorar minhas vitórias ou bebermos juntos para esquecer minhas derrotas. Com a temporada de jogos se intensificando com a aproximação das finais, não conseguia vislumbrar passar por esses momentos sem Felipe ao meu lado.
A passagem do tempo se confundiu enquanto eu relembrava nossos momentos juntos e, sem que eu me desse conta, adormeci abraçando os lençóis.
••••
Acordei totalmente perdido e observei o quarto com o cenho franzido, achando estranho a posição da cama e dos móveis. O sol estava alto no horizonte, a luz adentrando por completo o local e fechei ligeiramente os olhos graças a ela, coçando-os em seguida. Bocejei e levantei meu corpo preguiçoso, esticando os braços para cima ao mesmo tempo que chamava:
- Fê?
Levei alguns segundos a mais para compreender que eu não estava em casa. Os móveis do meu quarto não tinham saído do lugar: eu que estava em um quarto diferente. O que estava fazendo ali? Por que eu fedia a bebida e não estava em casa?
Foi quando vi a mochila jogada no chão, perto da cama. Vê-la ali fez todo o acontecido de algumas horas antes me atingir bruscamente, como um raio. Virei o rosto rápido demais para procurar meu celular, mas isso causou uma pontada extrema na minha cabeça e levei as mãos até as sobrancelhas, massageando-as. Eu estava de ressaca, mas com o organismo já limpo de todo o álcool, permitindo-me perceber as consequências desastrosas do que tinha acontecido.
Justo quando tudo estava planejado!
Na intensidade da noite anterior tinha esquecido completamente um pequeno detalhe e me senti um lixo por causa disso: Felipe nunca diria "sim" à minha proposta, que estava sendo cuidadosamente planejada, depois da nossa briga. Ele havia perdido parte da confiança em mim e estava com o coração partido e eu, enquanto isso, afundava-me em culpa e mágoa. A noite anterior não poderia ser esquecida e meu lábio inchado era um lembrete doloroso e constante. Nós nunca tínhamos brigado tão violentamente antes.
Com um suspiro resignado, puxei a mochila para o meu colo e a abri pela primeira vez. Ao perceber o que tinha em seu interior, fechei os olhos e senti meu peito travar, como se uma mão fria e forte se fechasse em punho contra meu coração: mesmo controlado pela raiva, sentindo-se traído e fora de si, Felipe tinha em tudo que eu precisava ao jogar as coisas dentro da mochila. Encontrei uma muda de roupas limpas, minha escova de dentes, o vidrinho de perfume, barrinhas de cereal e até mesmo a velha camisa que um dia já pertencera a ele que eu adorava usar para dormir. Como se imaginasse que ficaria com ressaca, Felipe também tinha encaixado entre as roupas uma cartela de remédios para dor de cabeça.
Senti meus olhos se encherem de lágrimas e levei a camisa até o nariz, sentindo o cheiro de Felipe preso no tecido por dormir abraçado a mim quase todas as noites. Enquanto eu dormia sempre com o peito coberto – um hábito antigo, vindo do tempo que passei odiando a enorme cicatriz presente ali –, Felipe amava deixar sua pele descoberta, permitindo que seu cheiro passasse para mim enquanto dormíamos. Seu peitoral e braços haviam ganhado uma grande quantidade de tatuagens nos últimos anos e, quando eu não conseguia dormir, gostava de criar teorias para cada uma delas até adormecer.
Por que perdi o controle e sequer me esforcei para explicar? Meus ombros tremiam e molhei a camisa com as lágrimas que escorriam em um fluxo frequente. Eu poderia ter explicado, dado e pedido calma, não ter surtado por um soco que, sinceramente, eu já merecia receber há tempos. Mais uma vez, peguei-me pensando em como seria se a situação fosse ao contrário.
Por fim, joguei a camisa na mochila novamente e andei até o banheiro, parando diante do espelho. Sob meus olhos repousavam bolsas escuras que denunciavam as poucas horas de sono, meu cabelo estava caótico, a barba precisava ser feita e o corte no lábio inferior fazia meu rosto ganhar uma estranha desproporcionalidade.
Como alguém podia ser tão imbecil quanto eu fora? O questionamento bateu forte quando me vi completamente nu diante do espelho. Deslizei os dedos pela pele mais escura sobre meu abdômen e peitoral, a mancha que jamais sairia de mim. Durante os anos, a vergonha da queimadura desaparecera e, muito antes de ela se tornar um diferencial nas campanhas fotográficas da qual eu participava, Felipe fora o primeiro e me fazer aceitá-la. Todas as vezes que minha autoestima ameaçava falhar, ele estava ali, beijando a pele deformada, sorrindo e dizendo que ela era linda. Diariamente, Fê me salvava de tudo e todos, inclusive de mim mesmo.
Estranhamente, optei pela água quente. Assim que senti as gotas escorrerem pelo meu corpo, revi na mente a imagem de Felipe: seus olhos avermelhados, as lágrimas presas ali, as mãos trêmulas e o cabelo puxado para um dos lados. Ele tinha me esperado no escuro, sentado no sofá da sala e surpreendendo-me quando acendi a luz. Nossa briga, entretanto, fora a explosão de pequena situações que tinham se acumulado nos últimos meses, quando ambos estávamos estressados ao máximo com nossos trabalhos. Enquanto Fê tinha os últimos detalhes para resolver antes do lançamento do filme que produzia, viajando o país para divulgá-lo, eu estava em plena temporada no futebol e submetido à pressão de ser uma das figuras principais do time. Para piorar a situação, Fê tinha sido convidado a expor seus quadros em uma importante galeria de arte do país e isso estava mexendo com sua confiança no que pinta.
Abri os olhos sob a água, sentindo-os pinicarem pela força na qual eram atingidos pela água corrente. Uma situação como a que ocorrera durante a noite jamais nos teria feito brigar daquela forma se já não estivéssemos sob o máximo de tensão possível. Precisávamos estar unidos em momentos difíceis.
Suspirei. Eu precisava voltar para casa.
••••
Olhei para a fechadura de casa, segurando o molho de chave entre os dedos. O chaveiro era uma pequena bússola, um presente que Felipe havia me dado quando as viagens a trabalho ficaram mais frequentes, sob a justificativa que de que eu sempre deveria encontrar meu caminho de volta para casa. Puxei um pouco a gravata que estava usando para respirar melhor e engoli em seco, sem saber se entrava de uma vez ou batia na porta.
Por fim, optei pela segunda opção, tocando a campainha com os dedos trêmulos. Segundos depois, a porta se abriu e me deparei com meu melhor amigo parado diante de mim. Scott estava descalço e usava um velho avental que um dia pertencera à mãe de Felipe, com os dizeres “I am the cooker!”. Confuso com sua presença em minha casa, resmunguei:
- O que você está fazendo aqui?
Scott ainda me observa, a mandíbula travada com força e as sobrancelhas claras franzidas. Estava com o cabelo mais longo que o normal e a barba cuidadosamente aparada, algo que deveria ser uma tentativa de mudar seu estilo um pouco. De repente, ele soltou um rosnado quase animal e bateu na minha testa com a palma da mão:
- VOCÊ É IDIOTA ASSIM POR NATUREZA OU FEZ CURSINHO? – Gritou. – Tem ideia de quantas vezes ligamos hoje? Você simplesmente sumiu!
Baixei o olhar, envergonhado. Isso me fez perceber os respingos de tinta sobre o tapete de entrada, que estavam ali desde o dia em que nos mudamos para o apartamento e Fê derrubou tinta no tapete enquanto pintávamos a sala. Mesmo manchado, jamais tínhamos comprado um novo tapete pelo simples fato de ele nos trazer memórias boas de um tempo que não voltaria. Esse pensamento fez minha voz falhar quando sussurrei:
- Eu posso entrar?
Scott revirou os olhos e simplesmente me puxou pelo braço para dentro, fechando a porta atrás de mim. O cheiro de casa imediatamente me rodeou, inexplicavelmente acolhedor, e senti a vontade absoluta de chorar de novo. Teria continuado parado no centro da sala se, de repente, uma voz feminina não tivesse se sobreposto aos meus pensamentos:
- Quem é, querido?
Deparei-me com a visão de Marie Elizabeth saindo da cozinha, secando as mãos em um pano de prato. Ela usava uma regata rosa e calças folgadas de moletom, tinha o longo e cacheado cabelo castanho preso em um coque, também estava descalça e usava seus recém-comprados óculos de armação preta. Percebendo-me na sala, sorriu fraco e ergueu uma sobrancelha:
- Por que tocou a campainha para entrar na própria casa, Tody?
Suspirei e esse foi o ponto de ruptura. Senti minha visão ficar turva com as lágrimas que se acumularam e que eu segurava com certo esforço. Com um suspiro triste, Marie abriu os braços e eu sequer hesitei um segundo antes de me lançar em seu abraço. Afundei o rosto no pescoço da minha melhor amiga, aspirando o familiar perfume de rosas, e passei a respirar estranhamente forte.
Ela começou a massagear minhas costas e então sussurrou perto do meu ouvido:
- Quando você não atendeu o telefone, viemos ver o que estava acontecendo pessoalmente. Não sei por onde você andou o dia todo para voltar para casa com essas roupas, mas espero que saiba o que está fazendo. – Marie deixou um beijo no meu cabelo. – O telefone fixo não parava de tocar com jornalistas, então tiramos ele da tomada hoje mais cedo.
- Eu não traí ele. – Sussurrei, sufocado e apertando-a ainda mais.
- Nós sabemos, Tody. – Respondeu, empurrando-me ligeiramente para que eu pudesse vê-la. Segurou meu rosto com as mãos e abriu um pequeno sorriso. – O jantar vai ficar pronto daqui a pouco, então sugiro que vá resolver isso tudo logo. Fê não saiu do quarto de pintura desde que chegamos e preferíamos não invadir o espaço.
- Vocês cozinharam o jantar? – Perguntei, desconfiado.
- Não se preocupe, eu fiz tudo sozinho. – Scott respondeu. Estava encostado na bancada da cozinha, observando-nos. – Marie ajudou somente a cortar os legumes.
- Nosso paladar agradece. – Respondi, um pequeno riso saindo de meus lábios ao mesmo tempo de um soluço triste.
- Parem de difamar meus dotes culinários! – Ela brigou conosco.
- Não estamos difamando seus dotes culinários, amor. – Scott respondeu, um sorriso irônico surgindo em seus lábios. – Até porque eles são inexistentes.
Vi quando ela se aproximou do namorado e bateu nele com o pano de prato. Ele somente riu e a puxou pelo quadril para colá-la ao seu corpo, lançando um beijo barulhento na bochecha de uma Marie emburrada. Aquela cena entre os dois fez meu coração se apertar ainda mais e, antes que eu desabasse no chão da sala em um choro estrondoso, forcei minhas pernas a andarem. Cruzei o corredor que levava aos quartos com passos rápidos, deixando meus dois melhores amigos discutindo sobre cozinha para trás.
Quando minha carreira como jogador de futebol americano se firmou e Felipe lançou seu primeiro filme, tínhamos conseguido dinheiro suficiente para comprar aquele apartamento e finalmente sairmos da casa de nossos pais. O apartamento não era grande:, mas pelo menos era nosso: tínhamos uma cozinha americana colada a uma sala pequena, uma área de serviço minúscula e somente dois quartos, sendo um deles suíte. Logo um dos quartos se tornou o escritório de Fê.
Passei pela porta do nosso quarto e ignorei o cômodo, seguindo direto para o segundo quarto. Quando passamos a morar juntos, sabíamos que Felipe precisaria de seu próprio espaço, então o segundo quarto do apartamento recebeu os potes de tinta, as telas, um computador de ultima geração e o que mais ele precisasse para trabalhar ali. Eu tinha perdido a conta de quantas vezes ele havia se escondido no quarto de pintura, ressurgindo depois de horas com os dedos e camisa manchados por tinta, giz ou até mesmo carvão.
A porta estava aberta ligeiramente e eu a empurrei com cuidado, entrando no quarto silenciosamente. Felipe estava sentado no pequeno sofá cor vinho, encostado em um dos cantos, e seus magníficos olhos azuis se perdiam no vazio, desfocados e distantes. Ele estava sem camisa, as tatuagens brilhando graças ao suor, e percebi as duas luvas de boxe pousadas sobre seu colo, o que provava que estava socando o saco de areia – a mais nova e deslocada aquisição para aquele quarto. Em meio às cores, plásticos, potes e lápis, o saco de areia preto ficava pendurado próximo ao sofá e era utilizado por nós dois em alguns casos. Repousando no peitoral de Felipe, preso por uma longa corrente, estava o pingente de ouro que eu havia lhe dado de presente anos antes, logo depois que ele descobrira sobre a aposta que nos aproximou.
Caminhei devagar. Meu peito parecia queimar e meu coração parecia bater dez vezes mais rápido que o normal quando os olhos azuis se voltaram para mim. Eu tinha passado um único dia longe dele e sentia como se meu mundo inteiro estivesse adormecido: sequer conseguia pensar em como seria perdê-lo para sempre.
- Fê. – Chamei, entretanto outras palavras não conseguiram se produzir.
- Tody. – Sua voz estava fraca e ele limpou a garganta. – Estou surpreso que achou o caminho para casa.
Aproximei-me ainda mais e sentei diante dele, no chão frio. Vê-lo daquela forma – caoticamente despenteado e com os olhos carregados de veias vermelhas – me fez perceber que eu jamais poderia viver longe dele. Felipe era o meu vício e eu precisava de uma dose dele todos os dias para continuar existindo. Nosso tempo juntos não era tão longo assim quando comparado com outros casais, mas nós éramos uma dupla, um par que lutava juntos para superar as dificuldade que se apresentavam.
- Me deixa explicar, por favor. – Sussurrei.
Ele travou o maxilar, claramente se segurando para não chorar e resmungou:
- Fale logo, Tody.
Suspirei.
- Eu sei que estou errado e tive que esperar o efeito do álcool passar para me dar conta disso. Eu juro que não telefonei para avisar porque pensei em passar naquele maldito pub só por alguns minutos e depois voltar para casa, mas acabei bebendo e perdendo a hora. - Ergui o corpo, passando a sentar no sofá, sendo analisado pelo seu olhar inspecionador. – Eu não percebi o tempo passar e me deixei levar pela música e fiquei. Nunca beijei aquela mulher e só pareceu que isso aconteceu porque me abaixei para ouvi-la.
Felipe fechou os olhos com força e aproveitei para respirar mais fundo, tentando controlar minhas emoções e explicar tudo sem fraquejar. Ele suspirou profundamente e então respondeu:
- Eu sei. – Estendeu a mão para o bolso da calça que usava e tirou seu celular de lá, desbloqueando-o e virando-o para mim. – Nunca duvidei dessa parte, mas foi bom ter a confirmação.
Peguei o aparelho celular e vi o título da matéria que estava afixado no alto para então correr os olhos pelo restante do texto, lendo-o de maneira superficial.
Mulher misteriosa das fotos desmente a suposta traição de Tody Benson
Na última sexta (21) fotos do jogador Tody Benson supostamente beijando uma mulher misteriosa na festa do mais novo pub da cidade se tornou notícia nacional. Enquanto muitos comemoravam a comprovação de que o jogador não é gay, outros não acreditaram que ele poderia trair seu companheiro de longa data, o produtor Felipe Clavien.
Horas depois do fato se tornar público, finalmente foi revelada a identidade da mulher misteriosa nas fotos: ela é Sasha Brendon, dançarina profissional. Em seu Instagram, ela postou uma selfie ao lado de Tody Benson com uma explicação na legenda, a qual transcrevemos integralmente a seguir.
“Fico profundamente triste ver tantas notícias falsas serem espalhadas pelas redes sociais prejudicando a vida de uma pessoa que não prejudicou ninguém. Noite passada tive a honra de conhecer Tody Benson, um homem educado e tranquilo que não se incomodou em tirar uma foto comigo. Nunca tivemos ou teremos qualquer envolvimento semelhante ao que está sendo dito por ai. Espero que esse episódio seja rapidamente esquecido para que todos nós possamos seguir com nossas vidas.”
No fim da matéria estava a foto que Sasha Brendon postara, mostrando-nos lado a lado com sorrisos nos lábios. Estávamos claramente bêbados e meu braço que rodeava os ombros dela também segurava um copo de bebida.
- O que machucou de verdade foi a sua indiferença, Tody. – Fê disse, guardando o celular. – E se o que tiver me machucado mais foi a preocupação com você? Ou os seus gritos? Ou como você sequer se importou em explicar quando chegou?
Minha respiração era superficial e tive que abri e fechar a boca algumas vezes antes de formular uma pequena frase. Fixei meu olhar nos profundos poços azuis antes de implorar:
- Me perdoa, por favor. Eu nunca devia ter gritado, especialmente porque estava errado o tempo todo.
- Ainda bem que admite isso. – Seu queixo tremeu e Felipe não segurou mais as lágrimas. Hesitante, ergueu o braço e tocou meu lábio inferior com a ponta dos dedos delicadamente. – E eu também errei ao te dar aquele soco. Fiquei fora de mim e perdi a cabeça.
Todo meu corpo se encheu de emoção: meu coração bateu ainda mais rápido, meus pelos se arrepiaram, minha respiração se tornou superficial. Meus olhos ficaram nublados pelas lágrimas e, em um único movimento, puxei Felipe para mim. Apertei-o contra meu corpo, afundando meu rosto em seus cabelos negros e inalando seu perfume. Eu estava em casa de novo e esse sentimento estava relacionado a uma pessoa, não a um lugar.
- Me perdoe. Me perdoe. Me perdoe, por favor. Não consigo ficar sem você, Fê.
Sua respiração se tornou forte contra minha pele e ele apenas assentiu, contornando seus braços em minha cintura. Felipe me segurou com força e ficamos ali por vários minutos, apenas ouvindo o coração um do outro. Era maravilhoso sentir seu perfume me envolver novamente e, inconscientemente, tracei com a ponta dos dedos uma das tatuagens que repousavam sobre seu peitoral – era um delicado dragão chinês que não ultrapassava o tamanho da palma de uma mão. Senti a risada baixa sobre meu pescoço e então Felipe disse:
- Precisava vestir um terno para me pedir perdão?
- Fiquei elegante, não foi? – Brinquei, rindo e fungando ao mesmo tempo, meu corpo ainda acostumado com o choro. – Comprei esse terno para usar um momento bem diferente desse, um mais romântico que estive planejando há algum tempo, mas decidi que não queria mais esperar. Fê, eu preciso te perguntar uma coisa muito importante.
Pude ver Felipe franzir o cenho e afastar o rosto do meu pescoço para me ver melhor. Observei seu curioso olhar azul, meu mar do Caribe pessoal, e qualquer dúvida que eu tinha se dissipou. Era um grande passo, mas estava pronto, então levei a mão até o bolso interno do meu terno e puxei a pequena caixa de veludo vermelho de lá, ajoelhando-me diante dele e brindo-a sob o olhar pasmo de Felipe.
Seu queixo caiu e eu ri de sua expressão ao notar os anéis cuidadosamente guardados pela caixa. Eu estava mais do que nervoso, minhas mãos tremendo visivelmente e as palavras do enorme discurso que eu havia planejado simplesmente desapareceram. Então, gaguejando, somente perguntei:
- Então, Felipe Clavien Chevalley, aceita se casar comigo?
- Oh, merda. – Ele resmungou, chocado, e eu ergui uma sobrancelha pela sua resposta inusitada. Seus olhos azuis iam das alianças até meu rosto e voltavam para as alianças novamente, sempre. De repente, ele ficou de pé e se afastou de mim rapidamente, falando ao fazer isso: – Não se mova, Tody. Me dê um segundo.
Comecei a tremer e senti meus olhos se enxerem de lágrimas de novo. Eu tinha estragado tudo mais uma vez e baixei a cabeça em pura autopiedade. O pedido não seria suficiente para Felipe terminar nossa história, porém, com toda a certeza, o deixaria pisando em ovos em relação a mim. Sua reação obviamente prometia uma resposta negativa e uma gélida lágrima escorreu por minha bochecha.
Ouvi o som de potes de tinta batendo e ergui o rosto para ver Felipe vasculhando sua mesa de trabalho: empurrou as tintas, virou o pote com os pincéis e lápis de cor, ergueu alguns papéis. Estava agitado, quase desesperado, os músculos de suas costas trêmulos e me senti culpado por deixá-lo daquela forma. Sem saber o que fazer, observei as alianças dentro da caixa que eu segurava com tanta força e permaneci como antes: ajoelhado e miserável ao chão. Mesmo sabendo que ele me amava tanto quanto eu o amava, claramente não estava pronto para se entregar a algo tão profundo quanto um casamento.
De repente, Felipe soltou uma exclamação de contentamento, provavelmente encontrando algo que procurava. Virou-se para mim e franziu o cenho:
- Ei, por que está chorando? – Isso acabou me fazendo chorar mais.
- Eu me precipitei. – Sussurrei, fechando a caixa com as alianças dentro. – Me desculpe.
Felipe se aproximou e se ajoelhou diante de mim, ficando com o rosto na minha altura. Colocou a mão contra meu queixo, ergueu meu rosto e tive a visão de seu sorriso maravilhoso e brilhante. Depois de um dia caótico para nós, ele parecia um profundo poço de calma quando falou:
- Vamos fazer um acordo, Dy. – Seu sorriso era gigantesco e isso me deixou ainda mais desesperado. – Eu digo sim se você disser, ok?
Arregalei os olhos quando ele estendeu para mim uma caixinha de veludo preto, idêntica a que estava entre os meus dedos. Aberta, ela revelava um par de alianças douradas magníficas e senti meu mundo virar de cabeça para baixo, tamanha a emoção que senti. Meu queixo tremia e meu olhar se inundou de lágrimas.
- I-Isso é s-sério? – Gaguejei.
Fê sorriu e seu rosto tremeu, duas gordas lágrimas descendo por suas bochechas quando sorriu ainda mais. Seus dedos envolveram os meus e os apertaram.
- Foi bom v-você ter pedido a-antes, porque eu realmente n-não sabia o que dizer. – Um soluço rouco saiu pela minha garganta quando ele encostou sua testa na minha, os poços azuis lindamente focados somente em mim ao continuar: – Fiquei com m-medo de que você não quisesse, Dy.
O maior sorriso do mundo explodiu de mim e saltei para a frente. Enterrei meus dedos em seu cabelo escuro e o puxei para mim, enrolando minhas pernas em sua cintura enquanto chorávamos juntos. Suas mãos entraram sob o tecido do terno e apertaram minhas costas firmemente contra si.
- Sim. – Ele sussurrou. – Mil vezes sim, Tody Benson.
- Mil vezes sim, Felipe Clavien. – Sussurrei de volta.
Meu menino de olhos azuis gargalhou e deslizou os lábios sobre minha pele, beijando minhas bochechas, testa, ponta do nariz e, por fim, a boca. Agarrei-me ainda mais a ele, tocando a pele descoberta de seu peitoral como se fosse a mais pura porcelana, sentindo o calor se espalhar pelas palmas das minhas mãos. Ri também, tão feliz que minhas reações se tornaram confusas.
- Percebeu que temos quatro alianças agora? – Resmunguei entre o riso.
- Sempre fomos um casal peculiar de qualquer forma. – Respondeu e então segurou meu rosto entre suas mãos. – Nunca mais faça o que fez ontem, Tody. Tantas coisas ruins passaram pela minha cabeça e fiquei com tanto medo
- Nunca mais vou te decepcionar, meu amor. – Sussurrei, beijando sua testa.
- Outra coisa: espero que não se importe se eu for todo de preto no meu próprio casamento. – O sorriso travesso pelo qual eu me apaixonara estava presente.
- Você poderia ir até de cueca que eu não me importaria. – Pisquei um dos olhos.
Ele revirou os olhos e beliscou as peles da minha cintura, fazendo-me cócegas.
Éramos um bolo de roupas e corpos no chão, um emaranhado de braços e pernas tão confuso que eu não poderia saber onde ele terminava e eu começava. O mundo não mudaria sua opinião sobre nós – eu ainda seria humilhado milhares de vezes por ser um jogador em um relacionamento com outro homem e Felipe ainda sofreria com o preconceito todas as vezes que quisesse fazer um novo trabalho – mas eu teria orgulho de mostrar a todos que isso não nos afetaria. Não deixaríamos nada nem ninguém dizer que nosso amor era errado.
- Devíamos dar a notícia a Marie e Scott, não é? – Fê disse.
Em resposta, apertei-o ainda mais com os braços e pernas, meu peso completamente colocado sobre suas coxas, a calça social que eu usava esticada até o limite sobre minhas pernas. Respirei profundamente seu perfume, adorando como, mesmo suado, ele continuava inexplicavelmente cheiroso.
- Não. – Falei, passando meu nariz por seu pescoço. – Quero ficar aqui mais um pouco.
Riu e ajeitou o corpo sob mim, encostando suas costas no sofá para aguentar melhor meu abraço possessivo. Suas mãos massagearam meu couro cabeludo e Felipe resmungou, brincalhão:
- Uma vez um polvo, sempre um polvo.
- Romântico como sempre. – Respondi, irônico e rindo.
Seu corpo tremeu quando riu também. Era maravilhoso estar em casa.
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Uou. Uou. Uou. Eu amo esse capítulo.
Tenho certeza que vocês ficaram bem confusos no começo, mas essa era a intensão. Gosto de Felipe e Tody como pessoas imperfeitas, que brigam e perdem o juízo às vezes.
Estou MUITO ocupada esses tempos, então me desculpem pela demora.
NÃO TIREM A HISTÓRIA DA BIBLIOTECA! Durante os próximos meses, postarei mais capítulos bônus, todos eles inéditos!
Muito obrigada pelas mensagens e o apoio eterno. Vocês mudaram a minha vida. Muito, muito obrigada.
Kyv❤
IMPORTANTE: recentemente postei um conto gay chamado “Colorido”. Dê uma olhadinha nele lá no meu perfil, prometo que não se arrependerão!
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