Capítulo 1
~ Enfim meus pais contrataram uma babá. Preciso voltar a estudar!. — Pensava pela manhã enquanto preparava o café rapidamente.
Era segunda-feira e as férias haviam terminado. Eu estava exausta de ter a mesma rotina sem precisar frequentar um lugar diferente que não fosse a minha própria casa.
— Sofia, se comporte okay ? Elisa vai chegar daqui a pouco. Preciso pegar o ônibus se não eu vou me atrasar. — Disse à mesma enquanto colocava seu café da manhã acima da mesa. Elisa, é como a babá se chama. Mora a uns quarteirões depois da nossa casa. Ela é legal, eu gostei dela. Confiável.
— Ta. — Respondeu Sofia com sua voz doce e delicada.
Ao ver aquela cena tão meiga, me aproximei dela e dei um beijo em sua bochecha rosada.
— Woont! Que foofa. — Comentei sorrindo com o complemento de um leve riso.
Porém, por mais que sua companhia me acolhesse de uma forma tão satisfatória, eu precisava entrar no ônibus escolar. Então, de forma gentil, dei meia volta e caminhei até as escadas onde estava a minha bolsa. Me olhei no reflexo do espelho e observei meu cabelo preso e meus óculos em conjunto com minha roupa que me davam um toque de "rato de biblioteca". Como diziam. Não é atoa que sou chamada de "Mouse Lóide" no colégio. Típico de um ambiente escolar. Um apelido nunca é apagado, talvez nunca esquecido.
Observando aquela imagem, me neguei continuar a observando, a procurar algo em que eu pudesse ter alguma espécie de orgulho. Assim que me despedi de Sofia e dei as costas para a porta, me dou de encontro com Elisa.
— Oi!. — Ela me cumprimentou com um sorriso estampado em seu rosto. Parecia que amava cuidar de crianças, talvez até fosse verdade... Mas eu iria ter a resposta assim que voltasse do colégio.
— Oi! Sofia está tomando café. Preciso ir agora. Meu ônibus irá passar daqui a pouco tempo. — Em modo ligeiro, já me despedia. Enquanto em minha mente rezava para que ela não inventasse algum assunto.
— Ah, tudo bem!. — Respondeu com um tom de "risada alta". Seu teatro estava sendo um espetáculo de falsidade que acabei notando.
— Boa sorte!. — Já começando a caminhar com passos largos.
Desde que consegui uma boa distância, passei a me esforçar para não perder o ônibus, como dito para Sofia.
Enquanto caminhava até o ponto, sentia a luz do Sol bater em minha pele. Meu cabelo ruivo naquele momento passou a ser chamativo, o que me faz não querer prestar muita atenção no que vão dizer ao meu redor. Precisava ignorar insultos. Como sempre.
— Mouse!. — Alguém gritou ao me aproximar da onde o ônibus iria parar.
Só ignora...
Seus passos rápidos até mim, desde já me deixavam alertada. O que eu não esperava, era que a minha própria atenção quem seria roubada, me obrigando a olhar para onde a voz vinha.
— Esqueceu seu livro de latim que você pegou na biblioteca!. — Era Dorian, um amigo meu, o conheci na biblioteca mas nada que nos levasse a um relacionamento amoroso. Apenas amizade mesmo. E se fosse amizade.
— Ah, Dorian... — Comentei com a cabeça meio baixa, na esperança dele chegar discretamente. — Não grita assim, por favor... — Completei disfarçando para que as outras pessoas que estivessem ali, não voltassem seus focos em nós.
— Desculpa... — Dorian respondeu ao chegar perto enquanto devolvia o livro.
— Valeu. — O agradeci com um sorriso gentil. — Nem se quer me lembrava mais daquele livro.
Sua mão rapidamente veio até mim, meu coração disparou e meu peito esquentou por dentro. De relance achei que ele fosse tentar me beijar. Entretanto, não. Seus gestos foram apenas para tirar algo do meu cabelo mesmo. Ele, após sua cena ameaçadora, arrumou seus óculos e deixou a boca entreaberta. Parecia hesitar em dizer algo ou provavelmente poderia estar pensando no que dizer.
— An... Como foi as suas férias ?. — Ele liberta as palavras como se elas estivessem presas a muito tempo. Tentando fugir do que realmente iria dizer, eu imagino.
Acabei fazendo o mesmo que ele, hesitei em dizer algo por um instante, até que me lembrei das vezes em que me desliguei do mundo real para me conectar com o particular. Minha vida não estava tão "divertida", melhor dizendo.
Quer dizer, não foi ruim, só... Não mudou muita coisa. Sempre fiz o mesmo...
— É... Foi legal. — O respondi.
Me lembro de ter mordido meu lábio inferior enquanto arrumava meu óculos, como uma mania comum, sem intenção alguma de parecer "sexy". Não mesmo. Mas talvez não tenha sido o que Dorian acabou pensando naquele instante.
— An... Legal também. Quer dizer... Foi legal. Não pera, quero dizer legal foi a minha também. — De palavra em palavra, não sobrava uma sem que fosse atropelada pelo seu desespero enquanto ainda insistia em tentar dizer algo sem perder seu controle do tal gaguejo momentâneo.— Ah, deixa. — Ele complementa, desistindo, hesitando novamente e se negando a continuar tentando.
Um leve riso escapuliu de mim ao ouvir suas breves palavras embaralhadas. Por sorte, no mesmo momento vi o ônibus chegar.
— Salvo pelo gongo. — Comentei de modo sarcástico.
Sem mais delongas, comecei a andar em direção à porta do ônibus.
Enquanto adentrava, ouvi sussurros e deboches de algumas pessoas enquanto caminhava pelos bancos. Simplesmente sentei o mais rápido possível no primeiro banco que vi, tentando ignorar os insultos. Não davam trégua nem mesmo em um dia de segunda.
— Dizem que ela não gosta de garotos... — Alguém sussurrou.
— Ela não gosta ou os garotos não gostam dela ?. — Algum outro indivíduo respondeu com deboche e riu.
Revirei os olhos enquanto automaticamente me decepcionava por não frequentar uma escola com mais amigos. Para mim, o melhor a se fazer foi pôr os fones de ouvido e uma música bem alta para tocar por um longo tempo, enquanto ignorava todos ao meu redor. Talvez até Dorian que se encontrava ao meu lado. Logo ele, que ama puxar assunto comigo quando não tenho muito o que falar. Não me estranharia se ele dissesse algo e eu não o respondesse.
Sobre os comentários; não deveria estar impressionada, isso vem acontecendo a minha vida toda mesmo. Quem perderia a chance de caçoar de uma "rata de biblioteca" para ter um pingo de popularidade? Ninguém nunca se importou em mover "um dedo" para mudar a situação de quem sofre bullying nesta escola. O tema nem sempre faz sentido para os integrantes do colegial.
Olhei pela janela e passei a observar a paisagem atrás daquela placa de vidro. Por um mísero segundo eu poderia me ver correndo e pulando de telhado a telhado, dando mortais com meu cabelo solto e uma roupa que me ajudava na flexibilidade dos movimentos. Estava me aventurando nas manobras (parkour).
Ao pular de um terraço bem alto, dei uma cambalhota e simplesmente mergulhei no ar, dando outra cambalhota para não me machucar na queda.
Claramente com a luz batendo em meu rosto, conseguia sentir o sorriso e a adrenalina sendo bombardeada pelo meu corpo numa mistura de sentimentos de liberdade e paz.
Em minha visão de um piscar de olhos, o ônibus já havia chego no ponto da escola. Saí de meu mundo particular olhando para o lado. Ao perceber que já havia muita gente em pé, decidi esperar todos descerem do ônibus primeiro.
Kath, a garota popular da escola, passa por mim no caminho da descida do ônibus, com um olhar de cínica e safada que nunca desgruda do rosto dela.
—Tchau Mouse Lóide!. — Ela gritou e começou a rir com as amigas que mais parecem ser "sombras", enquanto a mesma iria descendo do ônibus.
A playlist que havia colocado para tocar já terminara e eu nem havia percebido. Quando me dei conta que já não ouvia nenhum fundo musical para a minha vida dramática, guardei meus fones de ouvido e me levantei. Por sorte, desci do ônibus junto de Dorian. Uma das poucas companhias que eu poderia ter até a escola. Como se eu tivesse mais alguém.
Durante o caminho até dentro da escola, Dorian se distanciou e seguiu seu caminho. De relance percebia que as outras pessoas, digo, a maioria das outras pessoas, estavam comentando sobre mim. E aquilo tudo já estava começando a me deixar com raiva, mas me controlava o máximo possível como todos os dias, para não acabar explodindo. Sabia que não iria durar para sempre. Todavia, era o que eu deveria fazer, portanto, eu continuava frequentando a escola.
Andei até meu armário e o abri. Tudo era tão perceptível e irritante que em um berro de uma das sombras que estava a uns metros de distância do meu armário eu já poderia saber que algo iria acontecer. Entretanto, o meu reflexo não fora tão rápido. Suspirar foi a única coisa que eu pude fazer antes de ser surpreendida com uma ducha d'água em meu rosto.
Mesmo sabendo que algo iria acontecer, acabei me assustando com aquilo, sem contar que a água estava muito fria. O ódio me consumiu de tal forma que bati a porta do armário e saí correndo em direção ao banheiro enquanto tentava me esconder dos risos e gargalhadas que davam no corredor. Certamente não perderam tempo e já gravaram pra compartilhar para todos a "incrível" zoação dos esnobes. O bullying nunca será bom para quem sofre com o ato, nunca. Por mais que digam "Ah, foi engraçado", é sempre bom ressaltar que a graça custou uma certa porcentagem psicológica bem sucedida. Uma porcentagem não sua.
Ao adentrar, joguei minha bolsa acima da pia e me olhei no reflexo do espelho. Meu cabelo estava todo encharcado e meu rosto estava um tanto pálido. A temperatura da água pela manhã não foi lá tão agradável. Ao menos pude contemplar meu semblante antes de começar a chorar. Estava prestes a explodir. Não aguentava mais. Um lado meu, de forma sensata, dizia;
— Vai! Ataca!
Mas o outro apenas dizia;
— Não liga. Isso vai passar.
Por mais que eu dissesse "sim, vai terminar", eu sentia que não iria, na verdade, eu sempre soube. Aquilo iria aumentar mais e mais e eu não tinha força alguma para combater. Porém, a história de hoje não foi sobre como eu lamentei. Eu precisava continuar com os meus estudos. Peguei uma certa quantidade de papel e comecei a me secar. Mas nesses tipos de histórias sempre há um "porém"... Como reparar um psicológico abatido?
Enquanto meus olhos se enchiam de mais lágrimas e ganhavam mais força ao seu tom rigorosamente avermelhado, meus dentes rangiam entre si com seus ferimentos sentimentalmente internos.
Joguei os papéis no lixo e peguei minha bolsa, saindo do banheiro sem olhar para trás, sem olhar para os lados nem mesmo para frente. Apenas para o chão. Como um rato qualquer.
A aula mal começou e eu já precisava aguentar os sussurros debochados sobre a minha pessoa. Assim foi a aula inteira, a não ser quando o professor mandou ficarem quietos. Senti uma fagulha de sorte naquele momento, mas não durou muito depois que uns minutos se passaram. era nítido que uma mensagem estava sendo passada de mesa em mesa, escrita em um papel. Não era sorte, nunca foi sorte.
Salva pelo sinal que indicava o fim da aula, me levantei da cadeira, peguei meus livros e comecei a caminhar rapidamente, sem olhar para trás e com o olhar para baixo. De certo modo eu acreditava que essa era a forma de me proteger de todos. Enquanto me direcionava até a porta de entrada, acabei esbarrando em alguém.
— Vê se acorda Mouse Lóide. — Alguém disse.
Logo reconheci a voz, era Kath incansável, debochando mais uma vez. Tentei me controlar mas não consegui, levantei meu olhar até o seu rosto e pude ver sua expressão, o que me deu mais raiva ainda. Respirei bem fundo enquanto a olhava.
— Woon... A Mouse Lóide vai chorar geente. — Seu deboche soou com aquele ar arrogante de todos os dias. Todavia, talvez eu devesse dar razão ao que ela disse.
Talvez essa tenha sido a última gota. Dei um grito tão alto, que pude fazer tanto ela, quanto suas sombras voarem para bem longe e acabei por quebrar todos os armários que tinham em minha frente apenas com isto.
Ao engolir meu respirar ofegante, recuperando meu fôlego, olhei assustada para o estrago que eu havia feito a minha frente, porém nem um pouco arrependida, dei um sorriso de lado.
— Ei!. — Alguém disse, me desligando do meu mundo particular.
Olhei um tanto sem entender e percebi que tudo não se passou de uma das minhas viagens ao meu mundo. Talvez, essa pudesse ter sido a última gota.
Ao entender, fiquei frustrada e com mais raiva ainda por não ter feito nada.
— Ratos hibernam ?. — Kath perguntou olhando para a sua plateia.
Ao ouvi-la, me virei de costas e comecei a andar rápido em direção ao ponto de ônibus enquanto ouvia seus comentários e risos. Estava realmente ficando difícil de aturar.
Chegando em casa corri até o meu quarto e joguei a mochila atrás da porta. Com raiva me sentei de frente para a penteadeira que cujo se encontrava cheia de livros e mal dava pra se olhar no reflexo no espelho. Empurrei todos os livros, os jogando no chão e então pude olhar para mim mesma. Dava para ver a tensão no ar e o olhar de ódio que transmitia de meu rosto.
Mas eu precisava mudar o meu estado. Precisava aliviar toda essa tensão que o rancor corroía por dentro. Abri a gaveta e peguei uma escova que continha ali dentro, começando a escovar meu cabelo. Sem som, sem clima alegre, sem trilha sonora nem nada. A transição do espelho para o cabelo e do cabelo para a cama não precisava fazer sentido. Só o que eu precisava fazer naquele momento era continuar me esforçando para bloquear todas as lembranças e pensamentos negativos. Eu não poderia ter outra recaída, ou então, minha mãe acharia que eu não estivesse sendo "obediente" o bastante. Depois de um tempo, passei a vivenciar uma farsa com toda essa história de família. Agora, o apoio e carinho que me resta, dedico à minhas irmãs. Já deitada em minha cama, sentindo uma lágrima acariciar o meu rosto, anseio para que o sono me domine o mais rápido que ele puder.
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