38 - Homens são como equinos
"Existem tantas formas de amor quanto momentos no tempo".
— Jane Austin
Na manhã seguinte, ao despertar, Joan desceu da cama e fitou de esguelha a figura de Helen que se arrumava em frente ao espelho. A moça tentava mascarar os inchaços dos olhos com maquilhagem, mas tanto ela como Joan sabiam que nada poderia disfarçar que a moça havia chorado.
Sentindo-se momentaneamente culpada, Joan começou a se trocar em silêncio, respeitando o sofrimento de sua parceira de quarto. Sabia que qualquer conversa que iniciasse, pioraria a situação. Sentiu pena da jovem por estar noiva de Albert. Ele era um homem de coração amargurado que amava apenas a si próprio. Joan devia advertir Helen que se casar com conde era um erro, porém, ela não era a melhor pessoa para conceder tal conselho, visto que, em um passado distante, também fora vítima do charme convincente de lorde Davies.
Sem proferir quaisquer palavras, ambas se ajeitaram para o desjejum. Helena saiu primeiro, Joan pegou o envelope que guardara sob o travesseiro e deixou o quarto logo a seguir.
No corredor, encontrou um dos empregados da casa e pediu um favor:
— Preciso que entregue esse bilhete ao lorde Albert Davies, assim que eu tomar o meu lugar na mesa, com total discrição. — Entregou o envelope ao homem que assentiu concordando.
Então ela desceu as escadas, sorrindo, chegou à sala de refeições no momento certo, ocupou o assento ao lado de seu amigo Russel e aguardou pela reação de Albert ao ler a réplica que escrevera.
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Albert Davies, tentando recuperar a dignidade perante a sua noiva, pediu desculpas por ter sido um tremendo canalha e implorou para que Helen o perdoasse. A moça, ingênua, acatou aquele pedido como uma espécie de declaração de amor e o desculpou de uma meiga.
Davies prometeu, em silêncio, que jamais deixaria Joan atrapalhar seu relacionamento, entretanto a promessa durou apenas meros instantes, pois quando seus olhos repousaram em Joan sentada ao lado de Russel, esqueceu-se completamente de tudo.
— Senhor, mandaram lhe entregar esse bilhete. — Um dos empregados passou o envelope discretamente por debaixo da mesa.
Albert sabia que aquilo vinha de Joan, por isso aguardou o momento em que sua noiva estivesse distraída para lê-lo. Quando Helen engatou uma conversa sobre livros de romance com uma das moças, ele, com muita cautela, abriu o envelope e o leu o bilhete.
— SANTO DEUS! — exclamou alto, cuspindo o gole de café que acabara de beber, atraindo todos os olhares para ele.
Joan, satisfeita com aquela reação, apenas levou a xícara de chá a boca de modo a esconder o leve sorriso que se formou em seus lábios.
— Está tudo bem, querido? — questionou Helen, preocupada.
— Sim, está. Apenas me esqueci de adoçar o café. — mentiu, afrouxando a gravata que pareceu o sufocar.
Joan realmente era a pessoa mais descarada que ele se deparou na vida.
Por sorte, lady Foster logo direcionou a conversa, pronta para explicar qual seria a dinâmica daquele dia.
— Bom dia, ladies e lordes! Espero que tenham usufruído de um boa noite de sono. — começou a anfitriã. — Acredito que todos estão ansiosos para saber o que preparei para hoje, portanto, colocarei um fim na ansiedade de vocês e revelarei qual será a próxima dinâmica. — Todos os presentes a olharam com atenção. — Agulhas! — disse ela, deixando os convidados confusos. — Acalmem-se, eu explicarei melhor... Na verdade, essa dinâmica ocorrerá de forma separa: as ladies terão de realizar um lindo bordado, enquanto os lordes deverão e exibir suas habilidades em esgrima. Vencerá o casal que obter a melhor classificação. E, em caso de empate, a vitória será decidida com uma partida de xadrez. As dinâmicas ocorrerão na parte da tarde, deixando a manhã livre para que possam estudar a melhor estratégia para vitória. O prêmio, como bem sabem, é segredo. Todavia, garanto que está devidamente a altura dos vencedores. Boa sorte.
— Merda! — exclamou Joan para que somente Russel ouvisse. — Eu sou péssima com bordados.
Russel segurou a mão dela e disse.
— Não se preocupe. Sou um esgrimista nato. Tenho certeza de que poderemos equilibrar a situação e vencer essa disputa. — assegurou, deixando Joan um pouco mais aliviada.
— Helen, minha querida... devo confessar que sou péssimo esgrimista. Não estou à altura desse desafio. — sussurrou Davies, preocupado.
— Fique tranquilo, Albert. Meus bordados são impecáveis. De certo conseguiremos uma boa pontuação. E se não conseguirmos, não há nada de mal em perder, afinal, já vencemos o primeiro desafio. — Sorriu graciosamente.
Todavia, Albert detestava perder em qualquer ocasião. Se ele perdesse para Joan, seria tremendamente horrível.
Davies lançou um olhar avaliador para o casal ao seu lado, tentando obter alguma informação preciosa na face de sua rival, mas encontrou somente um semblante despreocupado que o deixou à beira de nervos.
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No decorrer da manhã, todos trataram de exercer atividades diversas, menos as jovens ladies que logo aventaram de começar a praticar seus bordados, ávidas pela vitória.
Joan, contudo, sequer desperdiçou seu tempo com aquela bobagem. Não haveria qualquer hipótese dela sair vitoriosa daquela disputa, jamais fora boa com agulhas, não ganharia tal habilidade de uma hora para outra. Por isso, ela decidiu ocupar seu tempo da melhor forma possível: captando clientes para o novo negócio que abriria em Londres.
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A biblioteca da casa de campo de lady Foster era um lugar de encantamento e autoridade. O ambiente estava inundado pela luz de uma manhã de verão, que atravessava as janelas altas com cortinas de renda, projetando padrões delicados no chão de madeira polida. As prateleiras altas estavam cheias de livros encadernados em couro, enquanto um globo terrestre e pequenos ornamentos de bronze decoravam o espaço.
Lady Joan estava sentada na poltrona de couro próxima à mesa central, exalando sua notória confiança. Diante dela encontravam-se três homens de aparência distinta — Sir Henry Collins, Lorde Edward Thompson e o jovem Sir Arthur Morgan.
— Senhores, é um prazer tê-los aqui nesta manhã. Permitam-me apresentar algo que acredito ser de grande interesse para vossas excelências. — Gesticulou elegantemente para um conjunto de papéis sobre a mesa.
Tratava-se de registros detalhados sobre cavalos, esquemas de treinamentos e até cartas de recomendação de outros nobres que já haviam contratado seus serviços.
Lorde Edward inclinou-se para frente, curioso.
— Então, lady Morrison, diga-nos: como uma dama da sua posição se envolveu tão profundamente no trato de equinos?
Joan abriu um leve sorriso antes de responder.
— Ah, caro lorde Edward, desde jovem eu compreendi algo que muitos ainda ignoram... os cavalos têm uma linguagem própria e poucos se dedicam a ouvi-los. Enquanto as damas se ocupavam com bordados, eu observava os cavalos do meu pai. Era fascinante! Aprendi que cada movimento, cada som, conta uma história.
Sir Henry, arqueando a sobrancelha, inquiriu:
— A senhorita afirma que pode treinar qualquer cavalo, mesmo os mais difíceis?
Joan olhou diretamente para Sir Henry, mantendo uma postura desafiadora.
— Não apenas posso, mas já o fiz inúmeras vezes. O famoso garanhão Nightshade, de New York, que todos acreditavam ser indomável, agora é o orgulho de lorde Wessex. Ele já venceu duas corridas desde que saiu de minhas mãos.
Os homens se entreolharam, impressionados. Sir Arthur, o mais jovem do grupo, parecia particularmente intrigado.
— E qual seria o diferencial do vosso método, lady Morrison? Não é todo dia que encontramos uma dama com habilidades tão singulares.
Joan, recostando-se na cadeira e mantendo o tom firme, assegurou:
— É simples, Sir Arthur. Não imponho obediência. Eu construo confiança. Cavalos são como os homens, sabem? Se tratados apenas com força, tornam-se resistentes. Mas, quando compreendidos, tornam-se leais até o fim.
Edward, com um sorriso irônico, logo questionou:
— E suponho que isso venha com um preço?
Joan, sorrindo de volta, de forma cortante, respondeu:
— Certamente. Mas é um preço justo. Afinal, os senhores não procuram apenas um cavalo bem treinado, mas um parceiro digno das caçadas, corridas e, quem sabe, até mesmo de batalhas.
Henry inclinou-se para a frente, ajustando o monóculo.
— E o que nos garante que esse investimento valerá a pena?
Joan, sem hesitar, respondeu:
— Meu histórico, Sir Henry. Consultem qualquer um que tenha confiado seus cavalos a mim. Além disso, ofereço algo que nenhum outro tratador pode prometer: um vínculo inquebrável entre homem e cavalo.
Os lordes ficaram em silêncio por um momento, ponderando as palavras daquela mulher imponente. Joan aproveitou a ocasião para se levantar e caminhar até a janela, em que a luz do Sol destacou sua figura elegante. Por fim, virou-se, encarando os três com determinação.
— A escolha cabe apenas aos senhores. Podem continuar a investir em métodos antiquados e treinadores que tratam cavalos como máquinas, ou podem confiar em mim para criar um animal que será não apenas obediente, mas também extraordinário.
Após um instante de silêncio, Edward foi o primeiro a falar, com um sorriso no rosto:
— Muito bem, lady Joan. Creio que tenha me convencido. Tenho um potro em minha propriedade que gostaria que visse.
— Estou ao seu dispor. — disse Joan, animada.
Sir Henry, rindo, declarou:
— Parece que a senhorita sabe como negociar. Eu também possuo um cavalo... bastante teimoso. Vamos ver se é tão boa quanto diz.
Joan, com um brilho augas nos olhos, assegurou:
— Não irão se decepcionar, senhores. Agora, se me dão licença, preciso preparar os arranjos para receber os vossos animais.
Todavia, quando se virou sentido a porta, deparou-se com Alber Davies analisando os papeis dispostos à mesa.
— Então é dessa forma que pretende se instalar em Londres. Apunhalando seu tão estimado sócio pelas costas? — indagou com certa ironia.
— Não sabia que Davies era seu sócio nesse negócio. — disse Arthur, confuso.
Joan se voltou para os senhores com quem firmara o acordo.
— E não é. — afirmou assertiva. — Lorde Davies tem sua parcela de sociedade em New York, devido ao fato de que eu, juntamente com a irmã dele, lady Stephanie Davies e a senhorita Beatriz Vanderbilt, usamos de sua propriedade em Staten Island para firmar nosso primeiro negócio nesse ramo. A oferta que propus aqui, nada tem a ver com este senhor e tão somente com minhas socias na América. Expandiremos o negócio instalando-se na propriedade do meu irmão, Matthew Morrison, o duque de Hereford, onde minha mãe reside junto a minha irmã. A princípio, eu e meu estimado empregado Dursley, cuidaremos pessoalmente de seus equinos. Assim que estivermos devidamente instalados e em pleno funcionamento, trarei pessoas de confiança diretamente de New York para fazer o serviço com a mesma qualidade de sempre.
Albert trincou o maxilar ao perguntar severamente:
— Minha irmã sabia desse projeto e não me disse nada?
— O senhor sequer deu notícias durante cinco anos e agora achas que tem o direito de se intrometer em nosso negócio? — Joan rebateu, indignada.
— É isso que sócios costumam fazer, lady Morrison. — proferiu o sobrenome dela com certa aspereza.
— O senhor acredita mesmo que eu lhe diria algo, quando desejo livrar-me de ti comprado sua propriedade em Staten Island?
— Já lhe disse mais de mil vezes que isso é inegociável. — Albert declarou com bravura.
Diante daquela discussão que se tornara muito pessoal, os demais senhores se retiraram da biblioteca deixando os dois com seus embates.
— Como pode ser tão teimoso? — Joan indagou enfurecida.
Albert, tomado pela súbita ira, aproximou-se da mulher, os narizes quase se tocando e as respirações alteradas se mesclando.
— Digo o mesmo da senhorita!
Joan bufou impaciente.
— Trata-se somente de uma das muitas propriedades que o senhor detém.
— Não é qualquer propriedade, oras! Aquela casa possui recordações!
— Que tipo de recordação é tão preciosa que leve o senhor a se apegar aquele lugar?
— Esta... — Abert fitou os lábios trêmulos da mulher, e sem pensar em mais nada, agarrou a cintura dela, puxando para si, e a beijou da forma que a muito desejava.
O beijo foi ardente, carregado de tudo o que haviam perdido e de tudo o que ainda restava entre eles. Foi um encontro de mágoas e saudades, de batalhas passadas e promessas não cumpridas. Joan, por um momento, tentou se agarrar à raiva, mas essa foi rapidamente consumida pelo calor que irradiava de Albert, dissolvendo suas defesas como gelo sob o Sol.
Naquele instante, o tempo pareceu parar. Não havia mais o eco das palavras duras, nem a dor das escolhas feitas no passado. Tudo se reduziu aquele único momento, ao entrelaçar de emoções que nenhum dos dois podia mais ignorar.
Quando finalmente se afastaram, seus olhares permaneceram conectados, carregados de tudo o que as palavras jamais poderiam explicar.
Em silêncio, Abert saiu da biblioteca de forma abrupta, deixando Joan, ainda ofegante, para trás.
E então ambos se deram conta de que, cinco anos não foram o suficiente para apagar antigas recordações. Ainda havia a faísca de um amor, afinal
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Olá, ladies!
Espero que estejam bem e que tenham apreciado a leitura desse capítulo.
Além de retomar a escrita desse livro, estou me dedicando a revisão de "Como Domar Uma Lady Selvagem" para se inscrever no Wattys desse ano. Essa obra já entrou na lista de finalistas do concurso uma vez e quem sabe agora eu consiga ganhar mais um Wattys com uma nova obra? Seria incrível e um retorno memorável a escrita.
Bem... Não custa sonhar!
bjos, Luana
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