De Pai Pra Filho
Foram raras as vezes que ouvi meu pai dizer "eu te amo". Na verdade, eu mal consigo me lembrar da última vez que isso aconteceu. Ele não costuma me abraçar. Não que essas coisas sejam um problema. Meu pai decidiu dizer "eu te amo" com atitudes. Da infância à vida adulta, tive o privilégio de poder dividir muitos momentos de qualidade ao lado dele. Quando temos um pai tão presente assim, o resultado é ter lembranças impossíveis de serem esquecidas
Meu pai é daqueles que dizem apenas "Vamos pedir ajuda a sua mãe" em qualquer situação, mas quando vou visitá-lo me enche de atenção e me ouve sem fazer muitas perguntas.
Ele está casado com minha mãe há mais de 50 anos. Sempre que chego à casa deles, logo na entrada, já sinto um delicioso aroma do jantar que meu pai está preparando.
Um arroz fresquinho é sempre garantido. Carnes variadas e sempre assadas, com uma vistosa salada muito colorida.
Por isso, papai faz questão de pedir que eu o avise quando aparecerei por lá, para poder me receber da melhor maneira possível. Se esquecer dos seus deliciosos pães de queijo recheados.
Com meu pai aprendi muitas lições, sobre a vida e mesmo sobre mim mesmo. Meu pai terminou os estudos muito cedo, mas por imposição de meus avós maternos seguiu a carreira que não lhe agradava na época. Ele também me ensinou coisas que não consegui aprender na escola.
Quando criança, muitas vezes precisei acompanhar meu pai até o trabalho para não ficar sozinho em casa. Na garupa da bicicleta, eu seguia com ele. Lembro-me de sempre me dizer "Cuidado com os raios, filho", por receio de meus pés ficarem presos nos raios da bike. Esse também era um momento que podíamos conversar pelo caminho todo. Um tempo para lá de proveitoso no qual ele me ajudava os mistérios da vida e entender matemática, que pra mim nunca foi um bicho de sete cabeças. Sim! Enquanto pedalava, meu pai me ensinava algarismos romanos e tabuada, que eram minhas dificuldades escolares da época.
Na verdade, preciso confessar que fingia não entender algumas matérias apenas pra ter o prazer de sua companhia.
Muitos filhos querem distância dos pais quando chegam a uma certa idade, no meu caso isso nunca ocorreu.
Vi meu pai e meu tio avô construindo casas do alicerce ao acabamento. Benedito, Dito para os mais íntimos, era um pedreiro e tanto. Foi ele que me ajudou quando eu precisei me esconder da minha família e do mundo.
Já meu pai, o senhor Luíz Miguel Montserrat veio sozinho da Espanha, órfão e em busca de oportunidade foi acolhido por seu único parente vivo, Dito.
Meu pai lutou muito para que não faltasse nada em casa, em todos os aspectos, materiais e sentimentais.
Inclusive, preocupava-se muito com o meu bem-estar (talvez até mais que o seu próprio).
Tenho na memória uma situação que diz muito sobre isso: Fiz um treinamento profissionalizante de uma semana, os famosos estágios, e o lugar era perto do trabalho do meu pai. No horário de almoço desse treinamento, meu pai aparecia todo feliz para me levar a marmita, que era bem caprichada. Enquanto comia, aproveitava para conversar com ele. Uma vez lhe perguntei: "Você já comeu, não é, pai?" E ele: "Sim, no serviço".
Muito tempo se passou, cerca de dez anos ou mais, e em uma dessas conversas casuais de família, meu pai comentou que me dava a sua marmita, na época do treinamento. Fiquei sem reação, e ele me disse que comia um pouco e deixava o restante para mim. A marmita parecia intocada, por isso custei a acreditar que ele, de fato, tivesse aproveitado algo da refeição. Como disse, meu pai era um homem diferenciado, não tinha medo do trabalho pesado, precisava se alimentar bem, mas, com o seu grande amor paterno, não viu problema em compartilhar a marmita comigo.
Sempre muito presente em minha vida e das minhas irmãs mais velhas, celebramos juntos minhas conquistas, me apoiou em momentos difíceis com seus sábios conselhos, e me fez rir várias vezes (mesmo das histórias e piadas repetidas).
Eu crescia a olhos vistos. Cheguei à adolescência e foi a vez de comentar com meus pais que os apresentaria a minha primeira namorada. Meu pai, nitidamente emocionado (apesar de não derrubar uma só lágrima), disse: "Lembre-se de que você será sempre a meu Caçulinha", ou seja, que não importa o quanto eu cresça, o cuidado e o carinho dele permaneceriam iguais.
Certa vez, ouvi uma frase: "Um filho nunca deve aceitar menos amor de uma mulher do que recebeu de sua mãe".
E sim, era isso que ele me dizia toda a vez que eu e Lindsey íamos visitá-los no sítio.
Bom, não é por acaso que hoje estou completamente fascinado por uma mulher maravilhosa. Sou mesmo um homem de sorte! Mas não sei o que fazer e por fim, recorri a sabedoria dos meus pais.
Conforme envelheço, reconheço mais e mais a forte influência que um pai pode exercer na vida de um filho. Existem muitas formas de dizer "eu te amo" a um filho, e meu pai decidiu fazê-lo com atitudes. Só quero que ele saiba que jamais o desampararei na velhice e que seus ensinamentos e seu amor nunca serão esquecidos.
Eu te criei para ser uma pessoa que não busca a aprovação das outras para tomar as suas decisões e para seguir os seus sonhos. Ainda assim, às vezes quero dar a minha opinião sobre uma coisa ou outra, como sua mãe. Só quero que você saiba que, mesmo nesse caso, a minha opinião nunca deve se sobrepor aos seus desejos. Estou aqui para te incentivar e para te guiar, quando você precisar, e sempre vou aplaudir a sua independência.
Sei o quanto você quer me dar orgulho e realizar os sonhos que tenho para a sua vida. No entanto, o meu maior desejo é que você perca o medo de me decepcionar. O melhor conselho que posso te dar é que você seja fiel a você, sem se preocupar com o que eu vou pensar. Eu já tive a minha chance de errar e foi com ela que aprendi. Não posso tirar isso de você. Arrisque, tente, faça diferente, seja você!
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