Capítulo 11
Que o medo de cair mais uma vez não te impeça de viver mais uma linda história de amor.
Quando colocou sobre o colo a jaqueta de couro, Della sentiu o cheiro masculino tão familiar e fechou os olhos, desfrutando as sensações eróticas que o aroma lhe despertava. A recordação dos momentos passados junto com Alessandro na noite anterior a faziam estremecer. Tudo ainda lhe parecia inacreditável.
Abriu os olhos, procurando concentrar-se no trabalho. Mas não podia esquecer que a jaqueta pertencia a Alessandro e as mãos tremiam ao começar a abrir as costuras. Nunca em sua vida tivera uma experiência tão excitante quanto à da véspera.
Agora, todas as suas expectativas recaíam na noite de sexta-feira, sua noite fora de casa com Alessandro. Queria que tudo fosse muito especial e gostaria de ter uma roupa bonita e feminina para usar. Porém, seu guarda-roupa oferecia pouca escolha: um vestido de vários anos, uma calça comprida quase decente, uma blusa de boa qualidade e uma saia com estampas que comprara em uma liquidação havia dois anos. E isso era tudo, poucas peças de alguns jeans, camisas e camisetas de uso diário. Comprar roupa nova estava fora de cogitação. Talvez pudesse encontrar algo entre os vestidos de sua avó; se fosse o caso, faria uma pequena reforma e com alguma sorte poderia criar algo praticamente novo. Della inclinou-se sobre a jaqueta e suspirou. Seria bom se pudesse arrumar-se um pouco melhor pelo menos naquela noite.
— Vai sobrar algum retalho, mamãe?
Della olhou para Nádia, que a observava de cima de uma cadeira.
— Vou ter de soltar um pouco as costuras, talvez sobre apenas algumas tiras de couro.
— Posso ficar com elas?
— Claro. Se você encontrar na caixa de botões aquela fivelinha que caiu do seu sapato, poderemos fazer um cinto para a boneca.
— Oba! E uma bolsa, também.
— Uma bolsa? Você quer me deixar louca, Nádia Giancinti? — Fazer roupas para as bonecas já era um teste para a paciência de Della, quanto mais uma bolsa minúscula de couro de verdade.
— Você pode fazer uma grande, então... — Nádia suspirou, rindo.
— Vamos ver.
Alguém bateu na porta dos fundos e Nádia correu para atender. O coração de Della deu um pulo, embora ela soubesse que não podia ser Alessandro. Ele saíra da cidade ainda de madrugada, substituindo um dos motoristas, e só estaria de volta tarde da noite. Mesmo assim, ficou com o pulso acelerado até ver Domingas Mendonça entrar na cozinha atrás de Nádia.
— Minha amiga, depois da manhã que eu passei é bom que você tenha um café para me servir.
— Sirva-se e sente aqui para me contar seus problemas.
Domingas pegou uma xícara no armário, encheu-a com café da garrafa térmica e acomodou-se numa cadeira junto à mesa.
— Há ocasiões em que não aguento meus filhos! Eles deixaram o banheiro inundado! Depois, meu gênio do mau sentou-se para tomar café com uma porção de pregos no bolso da calça e fez seis furos no estofado novo do meu sofá, pode um negócio desses?... Meu gênio do mau teve a sorte de não ter furado a bunda com essa travessura. Depois eu terminei de arrumar as cadeiras na semana passada e já estão estragadas outra vez! E o Pedro, o meu caçula abençoado teimou em me ajudar e acabou furando o fundo do saco de lixo que estava levando para fora de casa e agora eu tenho cascas de banana, pó de café e sementes de mamão por todo o corredor. Ninguém é obrigado a enfrentar tudo isso antes das oito da manhã, então eu mandei a casa às favas e vim tomar café com você. Misericórdia, por que eu tive a ideia de ter três filhos homens. E ainda por cima o meu mais velho anda de olho em uma colega de escola.
Della sorriu quando Domingas terminou de narrar suas desventuras. As duas havia se tornado, boas amigas e Della sabia que a casa de Domingas encontrava-se com frequência em estado de caos por causa dos seus filhos.
— Há biscoitos de chocolate na lata. Coma um punhado e irá se sentir melhor. Chocolate muda o humor de qualquer mulher.
— Isso para não falar da dor nas costas de tanto recolher roupas no chão. Ei, o que é isso que você está costurando?
— É uma jaqueta de Alessandro. Precisava de uma reforma e eu me ofereci para fazer.
Domingas fitou a amiga com um olhar desconfiado, mas não comentou nada. Ajudou Nádia a abrir a caixa de botões e dirigiu-se novamente a Della.
— Vamos viajar este fim de semana. Não fomos a lugar algum o verão inteiro e Joaquim resolveu pescar um pouco. Há um camping fantástico a oeste daqui e decidimos ir para lá na sexta-feira, assim que os meninos saírem da escola. Eles pediram para perguntar se seus filhos podem ir conosco.
— Você está louca? — Della perguntou, fitando a amiga com uma expressão surpresa. — A última coisa de que você precisa é de mais três crianças gritando à sua volta. Belo descanso!
— Não se preocupe comigo. Vou levar seis livros e pretendo ler todos eles. Seus filhos são verdadeiros bálsamos perante aos meus. Nunca vi crianças tão bem educadas e comportadas. Realmente eu não sei educar aqueles três monstrinhos que tenho em minha casa! Falando sério, Della, os meninos querem mesmo companhia e Joaquim lhes disse que não havia problema.
— Podemos ir, mamãe? — Nádia quis saber, com os olhos brilhando de entusiasmo. — A Sra. Mendonça falou que se um dia eu fosse acampar com ela podia dormir na cama de armar!
— Deixe as crianças irem comigo, Della. — Domingas a encorajou. — Eles não darão nenhum trabalho, tenho certeza. Além disso, você poderá ter uma folga.
— Bem... — Della começou indecisa, olhando de Domingas para a filha. — Se você me garante que eles não serão muito incômodo...
— Não será incômodo algum. Se saírem da linha, não terei dúvidas em tratá-los como trato os meus filhos. Pode deixar que meu chinelo dá conta dessa tropa toda. — Ela tomou um gole de café e observou à amiga. Passou-se um momento antes que resolvesse falar: — Quer dizer que tem se encontrado com Alessandro Montserrat?
Della não respondeu de imediato. Quando levantou a cabeça e deparou-se com o olhar direto de Domingas, ergueu os ombros num gesto tímido.
— Depende do que você entende por encontrar.
— Não banque a espertinha comigo, Della Giancinti. Ele falou a seu respeito algumas vezes em nossa casa e eu não sou tola. Nunca vi os olhos do Alessandro brilharem tanto.
— Bem, ele me convidou para jantar na sexta-feira à noite, se é que isto significa alguma coisa. — Ela admitiu enrubescida.
— Significa que muitas mulheres ficarão morrendo de inveja! — Domingas exclamou, rindo.
Continuou a observar a amiga com um olhar satisfeito. Della e Alessandro. Doralice Ramos teria gostado da idéia. E Alessandro certamente a trataria com estilo: os restaurantes mais exclusivos, os melhores vinhos... De repente, Domingas ficou séria e pensativa. — Você tem alguma roupa boa para usar?
— Nada muito especial, mas...
— Calce os sapatos, Nádia... — Domingas disse, levantando-se e tirando a jaqueta do colo de Della. — E você também. Vamos até a minha casa.
— O quê? — Della indagou, espantada com a atitude súbita da amiga.
— Você está olhando para sua fada madrinha. Agora vamos logo. O tempo está passando. Com ser eu vou ser madrinha, ora se vou! Disse quase pulando de alegria.
Quinze minutos depois, Della encontrava-se no quarto de Domingas, olhando espantada para a enorme caixa de roupas que a amiga remexia.
— São de minha irmã mais nova. — Domingas explicou. — Ela me mandou esta caixa quando soube que eu estava coletando roupas para doação. Estava pensando em vender no bazar, assim arrecadaria um dinheirinho extra. Dê só uma espiada! — Domingas jogou sobre a cama uma blusa de seda, um par de sapatos e uma bolsa. — Acha que isto é o tipo de coisa que um desabrigado, precisa? Minha irmã tem dinheiro para jogar fora e adora dar lucro às confecções de BH. Aposto que me mandou estas peças apenas como uma desculpa para desocupar o armário e poder comprar roupas novas. Tenho dó do meu cunhado, pois minha irmã praticamente come dinheiro. — Ela encontrou na caixa uma calça preta de seda e um vestido vermelho.
Della arregalou os olhos ao ver o vestido. Feito de crepe de seda vermelho; era um dos trajes mais lindos que ela já vira. Tinha o corpo, a saia e as mangas plissadas. Com os ombros bem estruturados, o modelo era acentuado por um cinto justo feito do mesmo tecido. As mangas longas, com fendas deixando um ar bastante sensual, terminavam nos punhos largos fechados por pequenos botões dourados.
— Experimente isso... — Domingas sugeriu. — Acho que vai servir direitinho para você.
— Não posso Domingas. Este vestido deve valer uma fortuna. Eu não me sentiria bem o tomando emprestado.
— Não seja ridícula. Lúcia o mandou para ser doado, o que significa que ela não o quer mais. Se eu fosse magra como você, pegaria o vestido para mim e nem a deixaria chegar perto dele. Agora experimente. Vamos ver como fica.
— Eu não sei se é certo...
— Chega Della. Se vista logo. Você não tem tempo para bobagens e nem euzinha aqui.
Della continuou a olhando meio cismada, Domingas revirou os olhos ficando irritada com a teimosia da amiga.
— Nem tente atrapalhar os planos dessa fada madrinha. Agora vista este vestido logo.
Com um misto de receio e entusiasmo, Della colocou o vestido com cuidado e mirou- se no espelho. Mal podia acreditar em seus olhos. A roupa parecia ter sido feita sob medida para ela e a tonalidade vibrante combinava perfeitamente com seu tom de pele.
— Perfeito! A cor da paixão combina perfeitamente com você! Elegante e sexy! Além disso, fácil de tirar!... — Domingas exclamou, fazendo um gesto de aprovação com a cabeça. Pegou os sapatos sobre a cama e os examinou antes de entregá-los a Della. — Dá para acreditar? Nem estão usados! Minha irmã jogou fora sapatos novos! Experimente com o vestido.
Della passou o dedo pelo couro macio e olhou para Domingas.
— Será que eles não servem para você?
— De jeito nenhum. Meus pés também são gordinhos e enormes. Eu nem pareço com minha irmã, mas você, misericórdia tem o mesmo corpo. Os sapatos com certeza vão servir também.
Um pouco hesitante; Della calçou os sapatos de salto alto. Depois alisou o tecido delicado do vestido e admirou-se no espelho. Nem parecia ser a mesma Della.
Domingas observou a amiga com atenção, depois a segurou pelo braço e levou-a até o banheiro.
— Agora vamos cuidar da maquilagem.
— Domingas, eu não posso deixar você...
— Fique quieta, Della. Pare de ser desmancha-prazeres. Faz anos que não faço um projeto tão audacioso assim. — Domingas era a representante local de uma conhecia marca de cosméticos e há tempos vinha insistindo com a amiga para fazer uma demonstração, mas Della sempre recusara, sabendo que não poderia comprar nem o mais barato daqueles produtos. Daquela vez, porém, percebeu que seria inútil resistir. Domingas estava mesmo decidida em fazê-la o seu mais novo projeto..
Della nunca usara maquilagem, pois era um luxo que não podia permitir-se. Assim, os efeitos obtidos pelas mãos habilidosas de Domingas a pegaram de surpresa. A transformação era inacreditável e ela olhava para o espelho sem se reconhecer.
— Você está tão bonita, mamãe! — Nádia exclamou, arregalando os olhos. — Parece minha boneca.
— Obrigada, querida. — Della disse, sorrindo para a filha. — Isso é exatamente o que toda mulher quer ouvir.
Domingas riu enquanto colocava os apetrechos de maquilagem numa sacola plástica.
— Você está mesmo linda.
— É um pouco estranho. Não parece que sou eu mesma.
— É só uma questão de se acostumar. Uma mulher precisa se cuidar para ter uma boa autoestima. — Domingas garantiu, colocando a sacola plástica nas mãos de Della.
— Domingas, eu não posso...
— Pode, sim. — A amiga revidou com firmeza. — A maior parte são amostras, por isso não há motivo para discussão. Eu quero que você os leve. Cuide-se e seja feliz pela primeira vez na vida.
— Mas, Domingas, eu estou levando coisas demais! As roupas, a maquilagem...
— Depois de todas as costuras que você fez para mim, não vai querer que eu lhe venda alguns poucos itens de maquilagem fora de linha e roupas de segunda mão, vai?
— É difícil dizer que estas roupas sejam de segunda mão.
— Della, eu não quero ouvir mais nada, está bem? Estou sedo a sua fada madrinha. Quer aproveitar logo de uma vez.
Della ainda tentou resistir, mas acabou cedendo. O vestido era lindo e sabia que Domingas estava sendo sincera ao lhe dizer que podia levá-lo. Emocionada com a solidariedade da amiga, levantou os olhos e sorriu.
— Obrigada, Domingas. Eu nunca tive uma fada madrinha antes.
— Então já era tempo de ganhar uma. Todos nós merecemos isso pelo menos uma vez na vida. — O telefone tocou e Domingas correu à sala para atender. Retornou ao banheiro poucos minutos depois. — Era Joaquim. Ele teve um problema e precisa que eu lhe compre uma ferramenta de nome estranho na cidade vizinha. Por que não veste suas roupas normais e vem comigo? Vamos dar um belo passeio. — Ela viu Della olhar para o relógio e leu seus pensamentos. — Não se preocupe com as crianças. Deixe Nádia aqui e eu pedirei à Sra. Valverde que tome conta dela. Sei que ela não vai se importa. As netas dela estão lá e a mesma se queixou que as meninas não conhecem ninguém, então as pequenas vão adorar a sua filha. Nádia pegue a sua boneca, vou lhe levar para brincar com algumas amigas novas. — A menina sorriu entusiasmada. — Além disso, será uma viagem relâmpago e provavelmente estaremos aqui antes que os meninos voltem para o almoço. De qualquer forma, vou ligar para a escola e deixar um recado. Se você quiser, posso deixá-la no shopping center e pegá-la na volta, depois de conseguir a ferramenta.
— Eu adoraria Domingas. Faz muito tempo que não vou a um shopping e há algumas coisas que preciso comprar. Tem certeza de que a Sra. Valverde não se importa?
— Absoluta. Vá se arrumar enquanto eu dou os telefonemas. Pego você dentro de dez minutos. Deixe tudo nas mãos de sua fada madrinha.
Após voltar da viagem a cidade vizinha, Della não conseguiu se concentrar em mais nada além do encontro com Alessandro na noite seguinte. Comprara um diafragma contraceptivo numa farmácia do shopping center e, assim que o vira guardado na bolsa, sentira-se invadida por uma ansiedade que nunca experimentara antes.
Mesmo inquieta como se encontrava, conseguiu acabar a reforma da jaqueta de Alessandro, deixando completamente diferente do que era. Depois de deixá-la em sua casa, voltou e examinou as roupas que domingas havia lhe dado. Além do vestido, da bolsa e dos sapatos, trouxera também a bulsa e a calça de seda e um cardigan de cashmere escuro. Pregou vários botões soltos, cerziu três pequenos defeitos que encontrou no cardigan, passou todas as peças e as guardou. Ao terminar, ainda se sentia tomada por uma intensa inquietude. Sabia que teria pela frente mais uma longa noite de insónia.
2550 Palavras
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