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[O RITO DA ESCOLHIDA] CAPÍTULO 3

3/3

Na manhã seguinte, o sol parecia ter tirado férias. A imensidão cinzenta e nublada vista acima da colmeia mostrava isso claramente. Não havia alegria nem tristeza. Apenas uma típica tediosidade. Com a nova Rainha já estabelecida a colméia retomava seu ritmo sem qualquer outra distração. Na alvorada da manhã trilha de operárias podiam ser vistas ao redor dos distritos esperando para que a locomotiva as transportassem. A maioria tinha seus caminhos interligados; A grande fábrica. Outra pequena parcela se locomovia para a periferia que alocava os campos de cultivo, este lugar era destinado para integrantes de distritos mais velhos. Quantidades bem menos relevantes se concentrava em trabalhos específicos como; limpeza de distritos, cozinha, escolta e áreas de lideranças. Apesar dessas diferenciações, o trabalho árduo era o destino de todas elas. A folga programada no dia anterior tinha dado adeus, assim como a alegria e comemoração da noite passada. Em perspectiva apenas uma operária havia se livrado das garras do esforço físico, no entanto, seu destino não era lá muito atraente.

A operária deitada na imensa cama, que em situações contrárias teria se gabado em estar em um lugar tão confortável e macio, dormia pesadamente. Seus sonhos eram os mais variados possíveis. Vez ou outra Haabel se via sentada no tronco de alguma árvore prestes a despencar, depois, a cena mudava para um lugar repleto de flores no qual ela parecia saber o nome e a designação de todas elas, outras vezes a operária se via fugindo de alguma fera irreconhecível. E, em vezes mais racionais, as lembranças da noite passada chegava até seu subconsciente de maneira dolorosa, a cena do rito da escolhida lhe captava. Nesses flashs momentâneos, a expressão adormecida de Haabel endurecia e o medo lhe cobria a face.

Foi em um desses momentos de lucidez que ela acabou despertando. O suor escorreu levemente sobre seu rosto enquanto que a operária parecia se acostumar com toda a luminosidade no qual estava expostas. Os flashs inconstantes de luz que vinham da enorme janela ao lado tornou o despertar mais inconveniente. Haabel limpou o suor com as costas da mão enquanto tentava se situar.

Os olhos franzidos encarou o teto branco com certa confusão, a operária ficou estática por alguns segundos até finalmente lembrar do que havia acontecido na noite anterior. Quando a memória chegou até seu subconsciente Haabel quis chorar, depois gritar e por fim, bater em alguém. Aquilo não era nem um pouco justo. Por que logo ela? Suspirou pesadamente. Estava tão absorta em seus pensamentos que mal notou a figura esguia escorada na parede que a analisava pensativa.

— Sabe — a voz baixa e melodiosa se fez presente — eu não esperava que o seu desejo de ser escolhida fosse tão avassalador ao ponto de te fazer desmaiar.

Haabel arregalou os olhos e virou instantâneame sua cabeça até o som daquela voz. Ela, ao ver a recém coroada Rainha ali parada de um maneira tão austera e relaxada não deixou de sentir um leve tremor. Mesmo estando em uma situação pouco favorável a mente de Haabel não deixou de se intrigar na facilidade com que a outra conseguia transitar entre uma aparência deslumbrosa e inalcançável, semelhante ao momento da coroação, a um semblante tranquilo e levemente gentil no qual usava agora.

— onde estou? — Habbel perguntou debilmente depois de um tempo calada.

Ainda sonolenta, ela tentava processar a chuva de informações que chegavam até ela. A operária se sentou preguiçosamente na cama, seu olhar por um momento pendeu no rosto de Nariah buscando alguma resposta, por sua vez a outra pareceu sorrir e nada disse por um tempo. Sua expressão permanecia em Haabel de uma maneira indecifrável. Elas ficaram naquele impasse até a outra se afastar da parede e caminhar até a direção da operária amedrontada que, ao notar a repentina aproximação, recuou sutilmente.

— Onde você acha? — devolveu a pergunta. Tempo depois Nariah deixou seu olhar pousar até a cabeça da operária, ela então levantou os dedos e pegou delicadamente uma pétala de girassol que se mantinha presa em seus fios bagunçados, ao notar a apreensão da outra com aquele simples gesto Nariah riu discretamente e abandonou a pétala de seus dedos — o sacrifício ocorre no verão e antes disso, há uma cerimônia de purificação. Eu não ousaria te abater antes disso.

A fala da rainha tinha um cerne de tranquilizar, porém, causou um efeito completamente contrário em Haabel. A operária arregalou os olhos sentindo um frio cortante no estômago. Ela não sabia explicar o porquê mas tudo aquilo soava meio delirante, como se a realidade não fizesse um mínimo de sentido. Tentava a custo se despregar daquela sensação frívola. E, talvez, por pensar estar sob algum delírio ruim, Haabel ousou confrontar a razão de tudo aquilo.

— Abater? — perguntou com uma certa aversão — o que isso significa?

Nariah a olhou e deu de ombros: " a sonoridade trás uma entonação errada. Mas em outras palavras eu diria que é uma maneira mais formal de dizer que você vai morrer para um propósito.

Haabel abriu a boca mas a fechou logo em seguida ao constatar que não sabia o que falar diante tal situação. Mesmo se diferenciando de algumas operárias em algumas questões ela ainda detinha seu ciclo inerente de lealdade, não chegava a ser tão extremista, é claro, mas de todo modo existia alguma servidão dentro dela. E isso de certo conseguia segurar a sua língua por alguns minutos. Então ela abaixou a cabeça pensativa, logo após uma ideia surgiu límpida como água, pronta pra despencar como a chuva. Habbel encarou Nariah esperançosa.

— Eu agradeço muito por ser escolhida para um ato tão...— ela parou e procurou uma palavra com a etimologia correta — tão....nobre quanto esse. Mas, apesar da sua bela escolha, sinto que há outras operárias mais aptas para isso. Conheço pessoas que brigariam por isso, sabe? E que sem dúvida serviriam melhor do que eu. A questão é; eu estou disposta a ceder minha vaga a qualquer uma delas. Pois não acredito que eu seja a pessoa certa. — A operária tentava ao máximo ornar a sua fala na esperança de que não soasse fingida para que sua verdadeira intenção não fosse descoberta. Ao terminar Habbel limpou a garganta e desceu levemente os ombros aguardando uma resposta.

A rainha, no entanto, parecia não prestar a atenção no que a outra dizia. Seu olhar se perdeu por alguns instantes na paisagem que se estendia janela á fora. Aquele era um dos quartos que ficavam em uma ala mais discreta do grande castelo, sua vista dava exclusivamente para o jardim tropical, além deste, havia cerca de mais oito tipos de jardins separados pelo arredor do castelo em categorias diversas confeccionados por rainhas anteriores. Apesar da vista ser panorâmica e ilimitada, visto a posição com que ela estava, ainda sim, algo ali parecia chamar a atenção de Nariah que contemplava a imagem pensativa. Haabel não ousou dizer nada e aguardou a resposta de boca fechada. Se passou algum tempo até que finalmente a outra virasse sua atenção para a operária novamente.

— Você é a pessoa certa, Haabel, não se preocupe — ela disse com tenacidade.

Aquela altura Haabel não se sentia mais em uma utopia, a realidade pareceu bater em sua porta junto com uma obscura sensação que, ao seu primeiro contato, não soube descrevê-la claramente, porém, era diferente de qualquer sentimento que já tinha experimentado. Algo completamente novo.

— Entendo — foi tudo o que ela disse.

Seu tom estava baixo e um pouco embargado, Haabel, mesmo diante da situação submetida, não quis discutir ou revelar a sua opinião sobre o rito da escolhida, então ela apenas fingiu concordar enquanto que, por hora, pareceu deixar o fato de que iria morrer para lá. Apesar disso, Nariah captou instantâneamente o atípico desânimo da operária mas não disse absolutamente nada.

— É verdade? — Haabel levantou a cabeça, após alguns segundos quieta.

— o quê?

— as dançarinas na noite passada contaram a história de como você se tornou Rainha. Aquilo sobre você ter sido uma estrela... é verdade?

A rainha pareceu achar graça da pergunta, seu olhar pendeu em Haabel com curiosidade: — Você acha que é verdade?

— Eu... — Haabel franziu o cenho — Eu não acreditei cem por cento, me desculpe.

— É compreensível — Nariah comentou sem se irritar, sua pretensão era parar ali, mas o olhar curioso e ansioso por resposta da operária a fez continuar — É uma alegoria. Não a leve tão ao pé da letra.

Haabel acenou lealmente mesmo sem entender muito bem o que a outra havia dito. De certo, suas suspeitas pareciam ser verdadeiras. Nunca imaginou realmente que as histórias que eram contadas por aí fossem cem por cento verídicas.

— Bem — Nariah chamou a atenção da operária que se encontrava, até então, calada — Eu só vim aqui para lhe dar as boas vindas. Espero que aproveite a sua curta estadia aqui, Haabel. — A Rainha sorriu brevemente, no entanto, havia mais do que uma simples cordialidade naquele sorriso — Vou deixar a Capitã da guarda á suas ordens, a partir de agora ela irá te direcionar nos preparativos do ritual.

Haabel não tinha muito o que dizer então apenas acenou sem saber corretamente com o quê estava concordando. A Rainha a olhou por alguns instantes e, logo após, caminhou sublimemene até a porta. Sua mão deslizava na haste fria da maçaneta quando ouviu a voz receosa da operária chamando sua atenção mais uma vez.

— o que acontece? 

Nariah se virou e tombou a cabeça encarando Haabel com curiosidade: —como?

Haabel suspirou. Mentalmente, ela reunia todos os resquícios de coragem que existia dentro dela. Sabia que, de uma forma ou de outra, seu destino estava traçado. Mas, definitivamente, a operária não iria se render sem lutar, mesmo que isso significasse ir contra alguém que ela deveria adorar, ir contra alguém que em teoria era basicamente a lei ponderal que regia tudo e todos ali dentro daquela comunidade.

— se eu recusar a me sacrificar, o que acontece? — Apesar do medo e de toda apreensão, seu tom saiu alto e claro. Sem fraquejar.

Os olhos de Nariah cintilaram e, por um momento, uma sombra de irritação foi vista em seu rosto delicado e suave. Tempo depois, seus lábios tremularam em um sorriso completamente melancólico. Parecia que, aquela simples pergunta, fora capaz de trazer em seu encalço um clima completamente frívolo e desgastante.

— E por que exatamente você se recusaria, Haabel? — Nariah pronunciou as duas sílabas do nome de Haabel, Haa-bel, com escárnio.

Os ombros de Haabel encolheram-se instantâneamente. Derrepente, ela havia começado a se sentir bastante vulnerável, sentada ali, daquela forma. O destino parecia ter pregado a custo uma grande peça nela. Quem diria que, Haabel Quinn, a primeira operária a se impor diante á crueldade da grande fábrica, estaria retida e amedrontada fronte a matriarca da colméia. De fato, o poder de soberania que a outra emitia era capaz de massacrar qualquer sombra de revelia que ela quisesse impor. Aquela realmente era a Rainha mostrada no dia da coroação, pensou ela, toda a calma e tenacidade mostrada a si não passava de uma fachada facilmente elaborada. Em questão de segundos, Nariah conseguia transitar de uma jovem tranquila e doce para uma nobre fria e imponente. A operária engoliu em seco.

— eu não sei — murmurou com a voz baixa — É só que, para algumas pessoas, a morte não parece algo tão desejável. — Ela a olhou por baixo dos cílios escuros.

— E ela não é — Nariah se escorou preguiçosamente no batente da porta, sua aparência serena havia voltado. — Mas isso aqui não se trata de morte, e você sabe disso. Todas operárias tem uma missão, e é isso que garante o funcionamento dessa colmeia. Umas são destinadas à fábrica, outras ao plantio, colheita e por ai vai e você...— ela acrescentou com um leve sorriso — Foi predestinada a mim. E nada vai mudar isso, nem mesmo algo tão trivial quanto o seu conssentimento.

Habbel sentiu um leve calafrio passear sobre o seu corpo. Tentou até mesmo dizer alguma coisa, mas a surpresa pelas palavras da outra quebraram toda a sua tentativa de defesa. Então, calada e assustada, ela viu impotente a Rainha sair e bater levemente a porta a deixando ali sozinha com apenas um turbilhão de pensamentos lhe fazendo companhia.

Aquela era a rainha bondosa e nobre que todo mundo idolatrava? Pensou desacreditada.

Habbel, decidiu que, Nariah não passava de uma bárbara dissimulada. Naquele instante, ao perceber definitivamente quem era a sua rainha, Haabel sentiu vontade de gritar. Como poderia? Como poderia dar á sua vida para alguém como ela?

Um sacrifício sem o conssentimento não é assassinato? Deslizou ela.

Seu mundo pareceu desabar.

[...]

A realeira possuia uma divisão simples e categórica. Em teoria, ali, deveria ser o meio criador e acolhedor de novas rainhas. Na prática, isso acontecia, entretanto existia muitas nuances. Por mais que ninguém admitisse, ali era uma espécie de área exclusiva. Era óbvio que tal nomenclatura não fosse usual, mas no fundo, cada operária da colméia compartilhava desse mesmo pensamento. E era por isso que muitas delas viam no trabalho uma espécie de trampolim para migrar de uma zona á outra. Afinal, quem não queria ursufruir da honra de estar perto da Rainha?

O Castelo, era o centro do distrito real, á sua volta casas e estátuas de antigas rainhas podiam ser vistas ao horizonte. O ambiente era tão característico, que até mesmo uma simples operária, sem nunca ter pisado na realeira, poderia reconhecê-lo. Em dias como aqueles, que precendiam datas comemorativas, era comum ver algumas operárias limpando e reorganizando áreas usuais. Periodicamente, a tropa de patrulha poderia ser vista á longe vigiando e guardando a "fronteira" da realeira. Verdade seja dita que, aquele trabalho era considerado meio escusável , já que ameaças sob a perspectiva de invasão eram raras, quase escassas. Nenhuma operária, dentro do controle, teria uma ideia tão absurda quanto aquela.

A classe de operárias que residiam dentro do distrito real retomavam seus afazeres corriqueiros normalmente. Ao redor da realeira podiam ser vistas dançarinas, ensaiando ou se apresentando para pedestres que passavam, guardas de ronda e operárias-mestres que detinham algum cargo de confiança, seja na grande fábrica ou, em outros distritos, passando apressadamente rumo ao seu destino. De certo modo, a Realeira pouco se diferia dos demais distritos. A maior diferença, sem dúvida, estava na presença de butiques e armazéns ali dentro.

Em tese, nenhuma operária detinha poder de compra, no entanto, pequenos grupos que residiam na realeira, através de passes de honraria, conseguia, de certa forma, obter bens que outras operárias, habitantes de distritos subalternos, não conseguiria adquirir. O passe nada mais era que um cartão dourado assinado pela conselheira Real, através deste, as operárias conseguiam obter matériais supérfluos como; Perfumes, tecidos raros, ornarias e até mesmo algumas iguarias diferentes da culinária habitual e boa parte das coisas que a Colmeia não garantia como bens necessários.

Então, como um novo tópico subliminar para legitimar a ordem, podia se dizer que a meritocracia estava tão inerente dentro da Colmeia que até mesmo operárias desinformadas e alheias conseguia ver pequenas manifestações desta sobre o seu modo de viver, e isso, consequentemente, fazia com que a haste da ordem prevalecesse, mesmo que sua essência fosse contra a ideologia pregada na lei da Unidade.

E na regra, surgiu a exceção:

Todos são iguais e merecem os mesmos direitos, no entanto, alguns direitos tem poucos merecedores.

[...]

Já era tarde quando Habbel finalmente pôde sair de seu quarto. Havia passado parte do tempo tentando encaixar as ideias no lugar, de certa forma, ela se esforçava para manter a calma. No dia passado havia acontecido tantas coisas que até mesmo uma operária bagunceira como ela precisava de uma certa calmaria. Depois disso, já calma e firme a realidade, Habbel se deixou vislumbrar pela paisagem da janela á fora, e, antes disso, ela analisou parte a parte do extenso quarto em que estava. A ingênua operária havia se sentido bastante instigada por alguns móveis antigos e clássicos que ali se encontrava, um deles, estava no banheiro: Uma enorme bacia de porcelana, vazia com uma torneira de prata reluzente ao lado.

Uma espécie de cama de água? Pensou ela confusa.

Fora em um desses momentos de pura curiosidade e exploração que Rebecca apareceu para buscar a operária. A capitã, ao abrir a porta, acabou dando de cara com a figura suspeita de Haabel pendurada no pé da cama tentando se pendurar no enorme lustre de cristal. Seu corpo estava completamente estendido e prestes a tomar impulso, parecia que ela tentava pegar algo ali acima. Rebecca, primeiro, arregalou os olhos, depois cruzou os braços e olhou com irritação para a operária que, até então, não havia visto a entrada repentina da outra ali em seu quarto.

— O quê você pensa que está fazendo, Haabel? — Inqueriu.

Talvez fora o tom aborrecido usado, ou a maneira que a operária havia virado a cabeça assustada em direção da voz, mas assim que Haabel notou a presença repentina da outra seu equilíbrio se alterou e ela caiu de cara no chão. Rebecca revirou os olhos e abservou enquanto a operária se levantava meio envergonhada, ela limpou brevemente sua roupa e encarou a capitã com certa irritação.

— Por que não bateu? — Perguntou empurrando o cabelo para longe do rosto.

— E eu deveria? — Rebecca caminhou lentamente para dentro do quarto. Seus olhos examinadores sobrevoaram por todo o cômodo, era como se procurasse alguma inconformidade. Tempo depois, ela levantou e fitou o lustre acima, onde Haabel concentrava as suas atenções minutos atrás. — o que estava aprontando, hein?

— Aprontando? — Haabel a encarou — Por que todo mundo pensa isso de mim?

A capitã desceu seu olhar e cruzou os braços, em sua expressão havia uma ligeira sombra de sarcasmo, no entanto, ela nada disse. Rebecca aguardou pacientemente a resposta da outra. Haabel, vendo o semblante serio e impassível direcionado a si, acabou se rendendo e deu de ombros ligeiramente.

— Eu queria ver as luzes coloridas de perto...— começou debilmente — na grande fábrica a luminosidade é tão amarelada e sem graça, não imita em nada os raios do sol. Mas... esse... esse — suas sobrancelhas se curvaram.

— Lustre — completou Rebecca tentando entender onde ela queria chegar.

— Isso mesmo — Haabel sorriu aliviada — esse lustre consegue captar a irradiação solar em todas as suas nuances, desde o vermelho opaco até o laranja fluorescente, é muito bonito! — os olhos da operária brilharam e ela suspirou — eu queria ver de perto, ao menos tocar e ter a sensação de estar perto do sol..."

— E aí você teve a brilhante ideia de se pendurar em um lustre? — Zombou Rebecca.

Haabel esfregou os olhos:

— A ideia não se mostrou tão idiota quanto parece agora.

— imagino — Foi tudo que ela disse, seu olhar vagou acima do lustre por algum tempo, depois, a capitã soltou os braços e abandonou aquele assunto — Vim prepara-lá para a purificação. Como deve saber, ela ocorrerá no final da semana. Até lá, outros rituais precisam ser feitos. Estou aqui pra isso.

Haabel franziu os olhos, porém, nada disse. Até aquele momento, ela procurava enfrentar o mínimo possível o fato de ter sido escolhida para o sacrifício da Rainha, de acordo com ela, essa seria a maneira mais perspicaz de lidar com algo tão pertubador quanto sua morte. Isso não significava, é claro, que ela havia se condensado a essa ideia, de forma alguma, Haabel só esperava o momento certo para enfim poder mostrar todo a sua recusa.

Um outro motivo para ela tentar expurgar aquele pensamento ao máximo era porque pensar em em fugir de algo tão intrínseco tornava-se um ato desgastante. De fato, se ecapasse das garras da Rainha, alegando amor a sua vida, as demais operárias a receberiam com paus e pedras. Nunca perdoariam alguém que negasse submissão a matriarca. Nesse caso, se fugisse, seria questão de tempo para a encontrarem e a entregarem novamente á Nariah. As alternativas pareciam bastante escassas, então, no tempo em que tentou colocar os pensamentos no lugar, Haabel decidiu que a sua única alternativa era de se mostrar indigna daquela posição.

No conto do rito, na noite da coroação, as dançarinas narraram a história da escolhida da Colméia. Somente operárias insignes de boas obras, refinadas, gentis e devotas ao trabalho poderiam ter a chance de, algum dia, servir uma Rainha como sacrifício vivo. Em todo o seu reinado a Rainha só poderia escolher apenas uma operária para o rito, nesse caso, a escolha deveria ser perfeita e irredutível, já que, se o sacrifício fosse feito com alguém indigno, como consequência de uma má escolha, o reinado daquela Rainha fadaria ao fracasso. Nesse caso, escolher alguém adequado as expectativas era imprescindível.

Nunca na história da grande Colmeia uma Rainha havia voltado atrás na sua escolha. Mas, Haabel se firmava na expectativa de que aquilo não era lei, e, nesse caso, exceções poderiam ocorrer. Caso isso acontecesse a Rainha em si não perderia o seu prestígio, pensou ela uma certa vez, a única envergonhada seria a operária indigna que teria que voltar a trabalhar em seu período sem mérito algum. Isso é claro, não seria obstáculo algum para Haabel, já que sua reputação já estava manchada a muito tempo e olhares de acusações eram cotidianos em seu dia-a-dia.

— você me ouviu? — Rebecca perguntou, seu olhar chegava com insatisfação na operária que parecia perdida em pensamentos.

Haabel abanou a cabeça, mas não se livrou de seus pensamentos. Ao perceber que aquela era sua única esperança de se ver livre das garras de um sacrifício infortúnio ela se agarrou fielmente a ideia e decidiu a colocar em prática o quanto antes. Ser mostrar indigna e preguiçosa não era nenhum sacrifício para ela. Sua expressão era de repleta curiosidade, e uma pitada de esperança, quando seu olhar voltou para a capitã.

— Sim. Eu escutei — Haabel empertigou os ombros  — O que é o ritual de purificação?

— O nome é bem auto explicativo.— Seu rosto estava desprovido de expressão — É uma série de ritos com cerne de preparar a escolhida para o sacrifício. Não pode haver nenhuma imperfeição física e psíquica na operária no dia do sacrifício, dessa forma, a purificação lidará com isso da melhor forma possível. E olhando pra você — Rebecca a mediu — vejo que o ritual precisa ser aplicado de maneira intensiva.

Haabel levantou o queixo fingindo não ligar para a ofensa da outra, mas no fundo seu ego pareceu ter sido ferido:

—Se eu sou tão impura assim porque é que fui escolhida?

Rebecca deu de ombros, e, logo após estendeu um pergaminho enrolado á um fino fecho de seda na direção da operária. Haabel pegou o objeto com uma leve careta de curiosidade, seu dedo deslizou sobre o laço de seda vermelho, que ao ser tocado, se desamarrou liberando o acesso ao conteúdo do pergaminho. A operária o abriu sem hesitar e leu os tópicos ali descritos.

— Desintoxicação alimentar: Alimentação Balanceada de leguminosas, grãos e frutos. Imersão em ervas medicinais três vezes ao dia. Depilação e tosa de pelos indesejados uma vez por semana. Interpretação do ritual de sacrifício e história dos reinados anteriores... — Haabel leu aquelas palavras mecanicamente sem pensar em seu significado, tempo depois ela voltou aos tópicos e os leu mais uma vez tentando entender ao máximo o que eles queriam dizer — Tosa de pelos indesejados? qual é o motivo disso? — Perguntou em confusão.

— Um corpo perfeito ao sacrifício é um corpo livre de aquisições indesejadas, nesse caso tudo o que não coopera para a pureza deve ser arrancado — Rebecca ditou mónotonamanete, de certa forma, era como se ela recitasse um texto decorado á revelia.

Haabel arregalou os olhos:
— Meu cabelo... é algo indesejado?

A capitã a olhou preguiçosamente:
— isso a Rainha que ditará. De qualquer forma, não acredito que ela vai querer manter fios tão rebeldes e mal alinhados dessa maneira.— Sua atenção estava nas tranças que ainda não haviam sidos desmanchadas perfeitamente, os fios morenos se desatavam desordenadamente sob ombros da operária.

Haabel passou as mãos no fruto da atenção da capitã e de uma maneira indelicada ela ajeitou os fios soltos atrás da orelha. Rebecca fez um pequeno gesto de desinteresse e pegou pergaminho da mão da operária.

— Essa será a sua rotina até o final da primaveira que é quando o sacrifício acontecerá. No entanto hoje a Rainha abriu uma exceção para lhe mostrar algumas partes do castelo, se assim desejar.

Haabel sorriu animada:
— eu quero !

Rebecca nada disse. "É claro que quer", pensou enquanto massageava as têmporas:

— Certo. Primeiro, você pode ser banhar como faz normalmente em seu distrito, alguém lhe trará o que comer depois disso. Assim que terminar eu lhe buscarei.

Haabel parecia uma operária recém nascida, daquelas que ao ouvir algo de seu agrado seguiria dando pulinhos e sorrisos durante um bom período de tempo. E foi de fato isso o que aconteceu, ela entrou no banheiro sorrindo, se lavou sorrindo e se trocou sorrindo. Sua alegria foi diminuir consideravelmente quando teve que abandonar o traje da cerimônia de coroação e colocar outro completamente opaco e sem vida.

Em dias comuns o traje das operárias não se diferiam em nada, eram todos iguais; um macacão amarelo mostarda, fosco e surrado. A colméia tinha uma numeração padrão de trajes para cada operária, por período eram entregues cerca de vinte uniformes e eles só eram renovados em situações extremas, certa vez, Habbel havia inventado de personalizar a roupagem. Cortou partes difusas de uns dez macacões, e depois tentou modelá-los para fazer uma espécie de conjunto entre blusa e calça separado e cheio de retalhos colados um a um, o primeiro, de acordo com ela, saiu um desastre. E daí, novamente, ela pegou os outros dez restantes e fez uma nova tentativa. Haabel achou que o resultado tinha sido perfeito, os retalhos se remodelaram de uma maneira única, formando uma blusa baby doll de manga longa e uma calça agarrada ao corpo com uma abertura alargada nos pés. No entanto, a aprovação do traje fora só dela, as demais operárias, principalmente sua supervisora, achou aquilo um absurdo e além de repreende-lá em público, a operária havia aumentado a carga horária de Haabel como repreensão. No final, ela terminou sobrecarregada com o trabalho e ainda mal vestida com o uniforme padrão da Colméia.

Aquele macacão era bastante parecido com o seu anterior, no entanto o tom de amarelo era mais luminoso, menos apagado. E, arrematado junto ao peito, estava um hexágono traçado com linhas brilhosas e, dentro dele, o seu nome aparecia:

Haabel Quinn.

Talvez, o fato de ter seu nome escrito ali fora o culpado da operária se sentir meio incomodada com aquela roupagem. Haabel, ficou cerca de alguns minutos divagando mentalmente até, por fim, dar de ombros e colocá-lo sem mais cerimônias. Tempo depois, uma outra operária veio lhe trazer o almoço. A comida, ao contrário das vestes, era muito diferente da que ela estava acostumada. Haabel não sabia explicar, se era a forma com que temperavam ou a maneira que preparavam e cuidavam do alimento ali. Mas a comida era muito saborosa e Haabel não demorou para ataca-lá. E, como prometido, quando Haabel estava completamente limpa e alimentada, lá estava Rebecca para buscá-la.

Haabel, quando finalmente saiu de seu cárcere não deixou de respirar profundamente o ar gélido do enorme corredor em que estava. Uma das primeiras coisas que notou quando pisou fora de se quarto foi a localização, ali parecia um local deserto e um pouco abandonado. Poucos guardas eram vistos naquela ala, talvez um a cada 50 metros, e, alguns objetos decorativos, como estátuas e quadros, demonstravam uma certa solidão, como se tivessem sido esquecidos ali. Isso é claro não diminuía a beleza do lugar, mesmo um canto tão abandonado e perdido conseguia exalar um ar de beleza e elegância. As paredes eram ornadas de caminhos entre rosas e até mesmos seus espinhos eram mostrado perfeitamente, apesar de grande parte da ala ser vazia. Rebecca pareceu notar o olhar de dúvida da operárias.

— Aqui é ala Noroeste, incialmente, ela foi subdividida para o uso de hóspedes próximos da Rainha. Hoje em dia a ala é considerada vaga e pouco usual, já que a Rainha não detém tanta proximidade com outras operárias — explicou enquanto caminhava ao lado de Haabel.

— O que quer dizer? Ela não quer ficar perto da gente?— Haabel Perguntou virando seu rosto para a capitã.

— Eu não disse isso.

Haabel inclinou a cabeça e esperou pacientemente a outra continuar mas, ao que parecia, Rebecca não fazia nenhuma questão de prosseguir. Era sempre assim, pensou Haabel enquanto analisava algumas pinturas, assuntos relacionados a Rainha sempre eram um tabu. Se não fossem elogios o assunto terminava sem nem começar.

— Você mora no castelo? — Haabel perguntou sorrateiramente.

— Sim e Não, existe uma ala separada para soldados que não é realmente no castelo mas é uma divisão dele. — Foi tudo o que ela disse, seu olhar se mantinha focado no caminho á frente.

A ala Noroeste apesar de ser quase abandonada possuia um tamanho extenso e um longo corredor, nesse caso, por não ter nada de importante para analisar ou comentar, a capitã decidiu ficar quieta e seguir adiante, seu desejo era terminar aquilo o quanto antes.

—E você sempre é assim?

Rebecca franziu o cenho e virou levemente seu olhar para a operária:
— Assim como?

Haabel deu de ombros:
— Séria e mal-encarada. Como capitã da guarda eu acho que esperam isso de você, Não? Eu entendo mas não concordo, não cem por cento. Se eu fosse a capitã possivelmente iria me comportar de maneira diferente.

— Ah, é? — Rebecca murmurou pouco interessada.

— Sim! — Haabel sorriu, estava pronta pra começar a sua mais nova tentativa — Primeiro, eu trocaria as roupas do meu esquadrão. Esse uniforme acinzentado que vocês usam está ultrapassado demais. Depois, daria um jeito de convencer a Rainha a nos alocar para essa ala desabitada do Castelo. E então bem vestidos e alocados eu e meu esquadrão daríamos uma uma festa como comemoração.

— E mais o quê? — Perguntou Rebecca, seu tom era de puro deboche.

— Bem, quem sabe? — Haabel fez uma careta de susto quando passou próximo a um soldado parado sorrateiro no canto inferior — talvez eu iria querer arrumar um jeito de dar uma folga programada para algumas operárias — comentou despreocupadamente.

O trabalho era algo considerado sagrado na colméia, falar ou mencionar algo que fosse contra aquele dogma era de fato muito arriscado e Haabel sabia disso. E não era por acaso que ela tinha citado a sua ideia subversiva. A operária imaginou que, ao proclamar aquelas palavras Rebecca iria instantaneamente lhe repreender, e com sorte, mencionar o ocorrido a Rainha. Mas não foi isso o quê aconteceu. Tudo o que a capitã fez foi lançar um olhar curioso para a operária e, depois, voltar sua atenção para o caminho que seguiam.

Quando chegaram, ao que parecia ser o final da ala, Haabel deixou seu olhar vagar por entre as possível saídas. O corredor terminava em um hall que dava entrada para quatro corredores distintos. Uma enorme janela se estendia á sua frente e apenas uma guarda quieta e imóvel se mantinha ali. A operária caminhou até a janela e espiou rapidamente a paisagem abaixo.

— Esses são os campos de cultivo próprios da Realeira— comentou Rebecca em relação a vista da janela. A capitã caminhou até um quadro adjacente ao lado de Haabel, ela olhou brevemente para as instruções que ali estavam contidas — Venha até aqui Haabel."

A operária largou o olhar dos extensos campos de cultivo e obedeceu a capitã, ao ver a atenção desta direcionada a um quadro suspeito, Haabel tombou levemente a cabeça e com curiosidade perguntou:

— o que é isso?

— Um mapa da subdivisão do castelo, ele não contém informações detalhadas mas é bem útil caso você se perca. Ao final de qualquer ala sempre haverá um desses, é só procurar.

Haabel acenou e nada disse enquanto parecia decorar as informações ali. Assim como a capitã havia dito o mapa não era muito detalhado, seu interior era constituído de pequenos esboços que representavam as alas, os nomes delas eram mostrados acima desses desenhos. Havia pelo menos cerca de vinte alas e subalas distintas, muitas delas se interligavam e apresentavam passagens para as mais variadas áreas no castelo; Salão Principal, Bibliotecas, Jardins, torres, cozinha. Algo que chamou a atenção de Haabel foi o fato de algumas áreas ali mencionadas serem enquadradas como restrita ou, sob uso autorizado. Ela é claro, não deixou de perguntar para a capitã, que respondeu apenas que ali eram áreas de uso recorrente da Rainha e Haabel não ficou surpresa.

— Então não iremos visitar essas Alas? — Perguntou a operária com decepção.

— Algumas não, outras nós tivemos autorização — Respondeu e logo após seu dedo deslizou de encontro ao mapa, apontando para uma ala em particular — Aqui é onde estamos, essa área se interliga á varios cantos do castelo então, se formos rápidas terminaremos de visitar tudo ainda hoje. Primeiro seguiremos nesse corredor á esquerda, ele dará entrada para alas de exposição.

Haabel sorriu ansiosa e não tardou em seguir os passos da capitã assim que ela se pos a caminhar. Apesar daquela excursão de última hora ser fruto de algo que lhe incomodava ela, ainda sim, não deixou de aproveitar e se sentir feliz, de alguma forma. Ser contra o trabalho árduo submetida na grande fábrica não a dava o privilégio de ter uma dispensa, pelo contrário, Haabel cansou de trabalhar fora de seu horário comum por causa de suas ideias contrárias e, por isso, ela mal tinha tempo para bisbilhotar ou fazer algo que gostasse realmente. Nesse caso, ninguém poderia a culpar por estar se rendendo aos encantos do enorme castelo, estar ali, independente da forma submetida, era de fato muito instigante, seu cérebro curioso trabalhava como uma máquina incansável. A forma de agir de Haabel, ante a algo que ela se interessasse era muito característica: primeiro, ela arregalava os olhos se aproximava do objeto de sua curiosidade e fazia uma careta pensativa, depois virava-se para Rebecca e com um sorriso perguntava sem diligência alguma o que era a aquilo. Era sempre assim. A capitã, por sua vez, também tinha uma expressão característica ao receber as perguntas bobas de Haabel: revirar os olhos e responder friamente como se tivesse lidando com alguém muito insuportável.

Ao adentrar o castelo, a recepção era o primeiro ambiente em que os visitantes se deparariam, e foi por esse lugar que as duas começaram. O hall, com tetos altíssimos sustentados por colunas de mármore branco, era iluminado por um imenso lustre que deixou Haabel deslumbrada e hipnotizada. Conforme exploravam o castelo, as duas jovens se depararam com outras áreas igualmente interessantes. A ala principal era magnífica, com destaque para a sala de banquete. A mesa longa, talhada à mão, tinha um charme especial e certamente promovia momentos de puro requinte e festividades para os residentes e convidados do castelo. Um pouco mais afastado dali, encontrava-se o salão de festas, que era tão imponente em tamanho que possuía uma ala exclusiva para ele e sua organização.

À medida que adentravam em outros cômodos, Haabel  percebeu que a decoração se tornava mais simples. A ala residencial era composta por diversos quartos, apesar de não fazer muito sentido, uma vez que a rainha raramente recebia visitantes de fora. Os aposentos pareciam estar ali apenas para fins protocolares ou para eventuais ocasiões em que a rainha precisasse acomodar operárias importantes.Entre os cômodos, também se destacavam a sala de reunião e outras salas que guardavam arquivos, esse que ironicamente foi o lugar onde a operária fora pega por Nariah bisbilhotando clandestinamente. Por conta do tempo elas não conseguiram visitar a parte externa do castelo, mas Rebecca lhe disse enquanto caminhavam que está era dividida entre os jardins, fontes, campo de cultivo da Realeira, estábulo e borboletario.

A biblioteca foi outro destino que elas tiveram. Ao passar pela porta dupla de madeira maciça, Haabel foi imediatamente envolvida pelo aroma característico de livros e pela atmosfera tranquila e intelectual que permeava o ambiente. As estantes, que alcançavam alturas impressionantes, abrigavam uma vasta coleção de livros, abrangendo diversos assuntos e períodos históricos. A sala era iluminada por grandes janelas que deixavam a luz do sol entrar e iluminar os corredores de estantes. O chão de madeira polida contribuía para a sensação de calor e aconchego. No centro da biblioteca, havia uma mesa grande e robusta, rodeada por cadeiras confortáveis.

Haabel sentiu a energia dos livros ao seu redor, como se cada um deles carregasse um pedaço de conhecimento e sabedoria. Não existia uma biblioteca propriamente dita nos distritos, a não ser pequenos livretos ou folhetos nos jardins recreativos de histórias e ritos de Rainhas, agora que a Rainha Esther tinha falecido todos esses livros e folhetos já haviam sido retirados e recolocados com o foco principal em Nariah, depois de sua Coroação tudo seria sobre ela, histórias, notícias e eventos da natureza. Aquela biblioteca era diferente pois as informações ali contidas iam muito além de Nariah. Ali estava a história da colmeia, das Rainhas e do habitat na qual estavam inseridos. E era por isso que a operária se sentiu tão reduzida diante aquele cenário.

Os demais lugares em que visitaram nao foram lá tão chamativos assim, muito deles eram parecidos com alguns cômodos da grande fábrica e Haabel não quis se estender neles. A cozinha também, apesar de exalar um cheiro maravilhoso e excitante ainda sim não conseguiu animar Haabel que ao ver tantas operárias vestidas com aventais e cobertas de fumaça ao derredor não deixou de se sentir incomodada. Aquela altura estava ansiosa para ver apenas um coisa: as Áreas restritas pela rainha.

Rebecca pareceu captar a extrema aura de ansiosidade da outra porque assim que saíram da imensa biblioteca do castelo seu novo destino não estava ilustrado no mapa. Haabel seguiu fielmente a capitã por uma série de corredores idênticos e pouco atrativos. Foi quando Haabel estava prestes a abrir a boca para reclamar da demora que uma nova paisagem surgiu após virar-se a esquerda do corredor anterior.

A maioria dos cômodos que Haabel tinha visto até aquele momento apesar de bonitos não detinha algo que os diferenciava tão nitidamente. O novo hall de entrada da ala restrita, no entanto, era uma grande excessão. Suas paredes tinham um tom amarelho brilhoso que parecia cintilar em tons diferentes se olhado de longe. Quando Haabel se aproximou da extensa parede ela notou, completamente supresa, que aqueles tons se mesclavam para formar imagens de vários girassóis ornados com pontinhos de luminescência brilhosa que pareciam se mover e mudar sua conformação de uma maneira muito espantosa. Haabel ficou boquiaberta e espantada com a beleza do lugar.

— As alas restritas são definidas de acordo com os gostos de suas respectivas Rainhas. Quando outra rainha ascender provavelmente essas alas mudarão e se conformarão em um novo design — Comentou Rebecca com os braços cruzados enquanto esperava a outra terminar de admirar a obra.

Se passaram cerca de cinco minutos e Haabel ainda continuava a olhar para os desenhos estendidos ao redor em completo transe. Seu olhar curioso e hipnotizado migrava de um canto a outro completamente viciado nos movimentos coordenados que as flores faziam. Ela teria passado a tarde inteira ali se não fosse interrompida pelo toque chamativo de Rebecca em seu ombro.

— Vamos — seu tom, apesar de apressado, não demonstrava irritação.

Haabel despertou, acenou levemente com a cabeça e seguiu a capitã adentrando no enorme saguão que se estendia a frente do hall em que estava. Enquanto caminhavam, Rebecca explicou mecanicamente que aquela era a ala de exposição feita exclusivamente para homenagear as outras matriarcas.

Devido à grande quantidade de Rainhas ao longo do tempo, a ala de exposição era constantemente reorganizada para prestar homenagem apenas às dez últimas soberanas, cada uma tendo sua própria sala reservada. No final da Ala, um impressionante salão era usado para exibir, por meio de quadros e pequenas histórias, todas as Rainhas que já haviam reinado sobre a colmeia, pelo menos desde que esse registro começou a ser feito. Em ordem decrescente, a disposição das salas era a seguinte:

10° Victoria
9° Jasmin
8° Violet
7° Aurora
6° Selena
5° Elizabeth
4° Maria
3° Ísis
2° Luna
1° Esther

Haabel entrou em todas as salas, embora, devido ao tempo limitado, não tenha conseguido absorver muita coisa. Cada detalhe das exposições havia sido cuidadosamente planejado para homenagear a realeza escolhida e os feitos de seu reinado. No ar, pairava o aroma suave das velas perfumadas, criando uma sensação aconchegante enquanto ela explorava os diferentes ambientes. Logo na entrada de cada exposição, havia uma estátua majestosa da Rainha no trono, esculpida com ritos sobre ela. Em seguida, corredores cheios de vitrines exibiam os pertences pessoais das matriarcas, como joias, vestidos e adornos acompanhado de histórias e feitos delas durante o reinado. Toda a exposição era envolvida pelo perfume dos incensos recentemente queimados, como se dissessem que a Rainha ainda estava presente.

Embora adoração às Rainhas antigas fosse proibida dentro da Colmeia, ali, no castelo, a homenagem era uma honra suave que assegurava que elas nunca seriam esquecidas. Por isso que a exposição se encontrava na ala restrita.

Assim que terminou de ver as alas das homenageadas, Haabel caminhou para o final da Ala onde foi envolta instantaneamente pela aura cativante do enorme salão de exposição. Cada centímetro da extensão do espaço era coberto por uma imponente coleção de quadros retratando as rainhas passadas. O suave perfume do incenso preenchia o ar, criando uma atmosfera intoxicante que envolvia todos os sentidos de Haabel. Guiada por uma inexplicável sensação de nostalgia, ela caminhava pelo salão, absorvendo cada detalhe e mergulhando na majestade e grandiosidade daquele lugar. Cada parede do salão era um espelho da história da Colmeia, a terra que Haabel chamava de lar. Ela podia sentir pesar sobre si a profunda importância que aquele espaço detinha, um símbolo vivo de todas as conquistas e desafios que a comunidade havia enfrentado ao longo dos anos. A emoção transbordou em seu peito, fazendo-a estremecer involuntariamente diante da grandiosidade e significado daquele local. Foi só naquele momento que Haabel compreendeu que estava imersa em algo muito maior do que ela mesma. Era uma conexão palpável com o legado de suas antecessoras, com as histórias que permeavam as paredes, cujas pinceladas imortais retratavam a força e a coragem das rainhas que a precederam.

O salão de exposição deixou Haabel maravilhada e, ao mesmo tempo, assustada. Ali, naquelas paredes, estava escrita a história da Colmeia, sua história. A experiência deixou claro para ela onde e estava, e por quê, estava ali. E, quando saiu dali, ela não conseguiu conter a sensação que crescia sob o seu peito. Ela seguia, agora, Rebecca mecanicamente enquanto parecia pensar, estava tão absorta em pensamentos que mal notou que havia entrado em uma nova galeria; esta que era cheia de livros e acomodada de alguns assentos e uma enorme mesa. Ela não teria notado a presença de ninguém ali se não visse Rebecca fazer uma leve reverência e pronunciar em seguida:

— Me perdoe vossa alteza, não imaginava que a senhora estivesse por aqui — enunciou com um tom calmo e reverente.

Haabel franziu o cenho e virou o rosto tentando procurar alguém ali, a vista. No entanto, ao seu redor, ela não conseguiu reconhecer a presença de ninguém. Foi apenas quando voltou seu olhar novamente para a capitã que viu uma figura sair do meio das estantes de livros e caminhar despreocupadamente até elas. Como Rebecca havia visto a Rainha ali era um mistério para Haabel.

— Não se preocupe — sua voz saiu serena — Eu já estou de saída.

Haabel levantou a cabeça e viu a imagem bela e delicada da Rainha a encarando. Diferente das outras vezes Haabel, guiada por um impulso desconhecido, deixou seu olhar pousar curiosamente sobre a aparência da Matriarca. Só agora ela havia percebido a maneira discreta e despojado que a outra se vestia. É de imaginar que, uma rainha de posses como ela não economizaria em ornarias e vestes espalhafatosas para demonstrar sua importância e prestígio. No entanto, Nariah não parecia desfrutar desse mesmo pensamento: vestia apenas uma calça Preta sem adornos e uma blusa da mesma cor de mangas cumpridas com seu habitual broche de girassol, seus cabelos estavam presos com presilhas prateadas em um coque que deixava alguns fios encaracolados caírem livres sobre seu rosto palido e tênue. O mais esquisito, pensou Haabel aversiva, era que mesmo assim, sua aparência não era desprovida de beleza e impotência. Não era necessário adorno nenhum pois Nariah conseguia emitir brilho e nobreza a quilômetros de distância.

— Sabe o que eu me toquei só agora? — Nariah resmungou com tenacidade, no entanto sua expressão tinha uma leve sombra de desprazer.

Haabel franziu o cenho e prestou a atenção na fala da Rainha. Outra coisa que pareceu lhe incomodar era a forma com que Rebecca parecia a olhar como se ela estivesse fazendo algo muito errado. Haabel a olhou rapidamente tentando pensar em algo que ela poderia ter feito para desagradar as duas. Pensou e pensou e não conseguiu chegar a nenhuma conclusão.

— Haabel? — a chamou com leveza —Por que é que você acha que não deve se reverenciar? —Falou devagar, ela bateu o cílios e sorriu — Não que eu me importe, mas isso é muito curioso.

Haabel arregalou os olhos,"era isto!" Pensou querendo se bater. Ela definitivamente não precisava fazer muito esforço para se mostrar indigna, conseguiria demostrar isso querendo ou não. Então, Instantaneamente ela se curvou desajeitadamente.

— Me desculpe — sussurrou timidamente após se reeguer.

De alguma forma, Haabel havia se sentido extremamente desconfortável fazendo aquela tipo de gesto. Era como se ela mesma não tivesse sido criada para aquele tipo de atitude, algo estranho e alheio a sua personalidade. E, para o seu azar, as duas pessoas paradas que a observava atentamente notaram isso também. Elas encaravam Haabel com um semblante estranho e peculiar, por um momento, a sala foi tomada pelo mais completo silêncio até que, finalmente, Nariah riu levemente e com um sinal de indiferença dispensou o ato de Haabel com um simples abanar de mão.

— Não há necessidade de fazer algo só porque se sentiu na obrigação, Haabel — disse Nariah, seu tom era semelhante ao de uma professora tentando ensinar algo a um aluno confuso.

— E-e não...— Haabel gaguejou — Não quis desrespeita-la Alteza.

— Eu sei que não — Nariah assentiu em entendimento, isso não significava, é claro, que estava contente — você só não pensou nisso, não é? A ideia de se curvar ou de se submeter a alguém nunca sequer passou por sua cabeça. Sei disso.

A operária franziu o cenho sem entender onde a outra queria chegar. Mesmo não querendo admitir a fala da Rainha tinha algum sentido; Haabel nunca tinha pensado em se curvar ou reverenciar-se a rainha, não genuinamente pelo menos, e isso não era porque ela era uma rebelde ou coisa parecida, simplesmente a ideia nunca havia cruzado sua cabeça, era algo tão incomum como pensar em usar guarda chuva em um dia ensolarado. Em parte, a operária se sentia culpada, mesmo querendo ser dispensada do sacrifício um ato tão insultuoso como o de não demonstrar sua lealdade a rainha era de gravidade suficiente para coloca-la na prisão pelo resto de sua vida. Para sua sorte, a julgar pela aparência tranquila da Matriarca, aquilo não iria acontecer.

A capitã por sua vez não parecia nada surpresa, mesmo estando a pouco tempo na presença de Haabel ela já tinha o mesmo pensamento de muitas operárias que a conheciam: que Haabel seria capaz de tudo, principalmente de não demonstrar nenhuma delicadeza ao estar diante a Rainha de toda Colméia. Apesar disso, Haabel podia notar que havia visto um brilho de satisfação no olhar da capitã da Guarda este que passou tão rápido quanto veio.

— Desculpe se foi isso que deixei transparecer, Alteza. — Haabel murmurou com o olhar cabisbaixo. Sentia-se em um saia justa e só queria que tudo aquilo terminasse.

Nariah levantou o olhar parecendo contemplar o peso das falas de Haabel, quando voltou sua atenção para a operária ela sorriu, mas sem nenhuma cordialidade, a rainha levou as mãos até cabeça de Haabel e deu leves batidinhas ali:
— Não se preocupe "Andrenidae", logo nós iremos ser tão íntimas a ponto de você oferecer sua vida á mim. Nesse caso, o que é um mero gesto de reverência, não?

Andreni... o quê? Se perguntou confusa, porém ela nada disse e não demonstrou nenhuma reação, não estava em posição de nada naquele momento. A Rainha então se afastou de Haabel e comentou algo em sussurros com Rebecca, esta que apenas acenou levemente e lançou um olhar na direção da operária. E, mais uma vez, Nariah saiu deixando a ingênua operárias a mercê de suas palavras. Aquilo já estava se tornando maçante para Haabel, o mais pertubador, pensou ela pela milésima vez, era que a outra sequer tinha preocupação em como suas palavras poderiam soar impróprias e maldosas, indignas do tipo de rainha que a colméia acreditava ter.

— Do quê ela me chamou? — perguntou por fim virando-se para a capitã.

Rebecca fez um pequeno estalo com a língua antes de mandar Haabel se calar e a seguir. A meta era terminar aquele tour o mais rápido possível e Haabel, que antes estava disposta e encorajada com o passeio, agora só queria que este terminasse. A Rainha e suas falas ameaçadoras haviam conseguido acabar com todo o clima de divertimento. E mais uma vez a ideia de quê estava ali apenas para morrer lhe assombrou a mente.

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