[HARRY] Eight
8
TÃO BEM QUANTO DÁ PARA ESTAR
A água da mangueira espirra para todo lado enquanto direciono o jato para um dos para-brisas do Corvette C1, que está levando um trato estacionado de frente para a república. Lavar o carro é o tipo de atividade que a maioria das pessoas acha um porre, por isso acabam optando por um lava-jato, mas eu acho estranhamente terapêutico. Ver a lataria azul escura brilhando me traz algum tipo bizarro de conforto e silencia meus pensamentos cacofônicos.
Também me distrai do fato de que não falo com minha namorada há dias.
— Preciso te confessar, Sanders: tenho uma inveja fodida do seu carro. — Teddy surge na calçada, cruzando os braços enquanto examina o meu trabalho. Ele circunda o capô e me lança uma expressão presunçosa. — Por que não vai até um lava-jato?
— Gosto de fazer isso. — não presto muita atenção nele.
Meu humor, que já não é dos melhores nem quando está tudo nos conformes, está pior do que nunca. Amanhã é o primeiro jogo da temporada regular e eu deveria estar empolgado, mas tudo no que consigo pensar é que Ambrosine não vai estar aqui.
— Já que gosta de lavar carros, você podia lavar o meu qualquer dia desses. — Teddy segue tentando ser meu brother.
Eu não sei de verdade o que pensar desse cara. A presunção dele me enche a paciência, mas ao mesmo tempo não o desprezo. É claro que só me aproximei dele por interesse no começo. Ele é um dos chefões da república e eu nunca conseguiria entrar para a Omicron sem o seu apoio. Mas agora que já estou dentro não sei se gosto de toda essa proximidade.
É óbvio que ele sabe que eu faço sucesso nas festas e por isso quer garantir que eu seja sempre visto próximo dele. Talvez se ele não namorasse aquela pé-no-saco eu não me importasse tanto com isso. É até divertido beber e fumar com ele nas festas, mas não deixo de ficar com um pé atrás. Não acho que posso confiar em ninguém além de Ed.
— Vai achando. — é tudo o que digo.
— Ei, meninos, precisamos de ajuda com os engradados para a festa de amanhã. — escuto Claudia gritar em algum ponto atrás de mim.
— Vai que é tua, meu mano. — Teddy volta para dentro da casa na maior cara de pau.
Esse maldito é um preguiçoso descarado.
Viro-me apenas ver Claudia e Pamela abrindo o porta-malas de um Chevrolet e dando a vida para tirar as cervejas de dentro. Desligo a mangueira e vou até elas.
— Por que não mandaram um dos calouros buscar? — pergunto enquanto me aproximo.
— O dono da distribuidora dá um desconto maior quando é mulher comprando. — Claudia revira os olhos claros, demonstrando sua irritação com esse fato. — Cadê o Ed?
— Dormindo ainda. O que você fez com ele? — provoco. Ela dá de ombros, convencida.
— Vai ficar só olhando, Sanders? — Pam me fuzila com um misto de irritação e sarcasmo.
Fecho a cara e pego o engradado da mão dela.
— Já estou fazendo mais que o seu namorado, garota.
— Nem se você quisesse muito. — ela me lança um sorriso convencido. — Mas adoraria ver você tentar.
Claudia faz uma cara de "eita, caralho" que me irrita ainda mais do que a provocação barata de Pam. Essa garota é simplesmente maluca.
— Prefiro virar eunuco. — retruco sem pensar duas vezes.
Claudia e Pam começam a rir ao mesmo tempo, mas eu não vejo graça.
— Sanders, você é o máximo. — Pam suaviza o olhar prepotente e me dá um empurrão de ombro. — Você sabe que é só brincadeira, né? Eu me divirto te tirando do sério.
Só brincadeira? Será possível que as dezenas de frases atravessadas dessa garota são apenas sarcasmo e eu estive levando a sério à toa?
— Sei. — digo sem muita segurança. Empilho três engradados como dá nos meus braços e começo a caminhar para dentro da casa.
— É sério, adoraria que a gente fosse amigo. Não precisa me olhar como se eu fosse te atacar a qualquer momento. — ela pisca para mim e toma a minha frente, entrando antes de mim e Claudia na casa.
Olho para Claudia de soslaio.
— Acha que ela tá falando sério? — pergunto.
Claudia franze o cenho e então dá de ombros.
— Não faço a menor ideia. Mas ela não é tão ruim. Ela até me enviou os trabalhos antigos dela do freshman.
Pela hora seguinte, ajudo as meninas com a logística da festa de amanhã. Estamos todos esperançosos de que será uma festa de comemoração pela vitória contra a BYU amanhã, mas se perdermos servirá como um excelente afogar de mágoas. A real é que para mim vai ser uma merda de qualquer jeito, com ou sem vitória.
Saco o meu celular do bolso para verificar as horas. Tenho cerca de uma hora antes de precisar ir para o ginásio para o último treino. Procuro também por alguma mensagem de Ambrosine, algum sinal de que ela se sente minimamente culpada por não vir para Palo Alto quando eu mais preciso dela. Porra, não é possível que ela está esperando que eu vá atrás dessa vez. Se ela não me ligar antes do jogo, não sei mais o que pensar.
— Sanders, será que dá para você largar esse celular e ajudar com as luzes? — Claudia me grita de cima da escada, nos fundos da casa. Alguns calouros aparam a grama e limpam a piscina — que não via uma limpeza decente desde a vez que JJ e Dylan a mijaram inteira em uma competição de quem tinha o jato de urina mais longo — enquanto Claudia insiste em pendurar malditos pisca-piscas por toda a cerca que dá para o vizinho. — Ela não vai te ligar, desencana.
— Ela quem? — Pamela pergunta enquanto entrega mais luzes coloridas para Claudia.
— Não é da sua conta. — corto-a, mas em seguida lembro que talvez ela não seja tão terrível quanto eu pensava, então acrescento: — Nem é da sua conta também, Claudia. E não estou esperando a ligação de ninguém.
— Tá não, imagina. — Ed aparece, vindo da cozinha. Ele está com a cara toda amassada das longas horas de sono e não teve a decência de vestir uma calça. Coça o saco através da cueca vermelha ridícula e faz uma careta de quem não dormiu o suficiente. — Tem bem uns quatro dias que ele não fica fazendo vozinha de bebê no telefone com a Rose. A abstinência tá como, mano?
— VOZINHA DE BEBÊ? — avanço para cima dele e lhe dou uma chave de braço. Ele tenta socar minhas costelas para se livrar, mas sou mais forte do que esse linguarudo de merda.
— Me solta, caralho!
Mas a essa altura metade da galera no quintal já escutou o que ele disse e começa a rir. Claudia desequilibra da escada com o acesso de riso e por um triz não se estabaca no chão.
— Eu não sabia que você era desse tipo, Sanders. — Pam provoca.
— Não faço vozinha nenhuma, inferno. — bem quando digo isso Ed acerta um soco certeiro no meu estômago. — AI, FILHO DA PUTA!
Ele consegue se desvencilhar de mim e corre, colocando-se atrás da escada para se proteger do meu ataque.
— Foge mesmo, covarde. — mostro meu dedo do meio para ele.
Bem nessa hora, meu celular vibra no meu bolso. Distraio-me imediatamente da vontade de esmurrar Ed para defender minha honra e reputação, puxando o aparelho do bolso com uma urgência que o faz sambar na minha mão e cair na grama com um baque surdo.
— Meu Deus, olha só a pressa de atender. — Pam diz, observando-me com óbvio divertimento. — Parece até que a garota é a rainha da Inglaterra.
Mas a voz dela é um eco distante. Quando pego o meu celular, nem me dou o trabalho de verificar quem é, atendo rapidamente.
— Até que enfim, gatinha. — começo a me afastar do bando de curiosos em busca de um lugar reservado para conversar com ela. Não estava nos meus planos usar a palavra gatinha para cumprimentá-la quando ela finalmente ligasse, porque ainda estou puto com o fato dela ter escolhido ficar em LA ao invés de vir para cá. Eu queria demonstrar algum orgulho, só que na afobação isso simplesmente evaporou da minha mente.
— Ahn... Obrigada, eu acho. — a voz da minha mãe é um balde de água fria que gela até os ossos. — Não fazia ideia de que você estava tão ansioso por uma ligação minha, filho. — ela ironiza.
— Oi, mãe. — murmuro, mas Ed escuta e começa a rir alto enquanto entro na casa.
— OUVIRAM ISSO? É A MÃE DELE. — e as meninas riem com ele.
— Filhos da puta. — resmungo.
— COMO É QUE É, HARRY? — Anne indaga, incrédula.
— Foi mal, mãe, estava falando com os idiotas daqui. — desculpo-me. — Como você está?
— Estou ótima, mas pelo visto você não. — ela ri. — Seus amigos estão te enchendo a paciência?
— Como sempre. — digo, resignado. — Vai conseguir vir mesmo para o jogo amanhã?
— Mas é claro! Eu não perderia por nada o seu primeiro jogo oficial como titular.
— Na verdade, eu vou ser reserva. Mas já é muita coisa ter sido convocado em tão pouco tempo. — explico. Eu sequer achava que participaria da temporada regular, para ser sincero.
— Vou estar vibrando por você na arquibancada. A Rose vai também?
O bolo na minha garganta volta a incomodar.
— Não. Ela não quis vir. — digo enquanto subo as escadas dois degraus de cada vez até finalmente alcançar a porta do meu quarto.
— Não quis? Como assim? Vocês não estão bem? — Anne despeja sua enxurrada de perguntas, o que me faz lembrar Ambrosine. Talvez aquele lunático do Freud tivesse mesmo razão sobre acabar se casando com a mãe. Elas duas são assustadoramente parecidas às vezes.
— Sei lá, mãe. — atiro-me na cama, suspirando alto. Eu normalmente gosto de conversar com Anne sobre tudo, mas não sei se estou no clima agora. De todo jeito, vou ter que sair daqui a pouco para o treino. — Deixa quieto.
— Nada disso. Me conta tudo. O que está acontecendo com vocês?
Dou uma checada no relógio. Ok, acho que posso desabafar alguns minutos.
— Ambrosine é egoísta para caralho. Ela sabia o quanto eu queria que ela estivesse no meu primeiro jogo, falo disso há meses com ela. Mas ela está toda estranha comigo tem tempo, ela acha que sou idiota e não percebo. E sabe o que mais? Eu sei exatamente o motivo: ela odeia o fato de que não sou a porra de um cachorro que ela pode manter em uma coleira. Ela faz o que bem entende na UCLA e eu não dou um pio, mas ai de mim fazer o mesmo aqui. Ela pode não falar nada em voz alta, mas eu sinto a frieza dela a milhas de distância e...
— Uau, Harry! Muita informação. — Anne ri do outro lado. Não vejo graça nenhuma, mas me limito a ficar calado. — Vamos com calma. Primeiro, o jogo. Ela não vai poder ir simplesmente porque não quer ou tem algum motivo plausível?
— Se você considerar o aniversário do chihuahua de estimação dela como plausível...
— Chihuahua?
— Sabe aqueles cachorros de madame que andam numa bolsa como se fossem chaveiros?
— Ela adotou um cachorro?
— É o novo melhor amigo dela, um maldito mauricinho. Não aguento mais ouvir o nome do pau no cu.
— Harry, olha lá como você fala do garoto. Conheço você bem o suficiente para saber que está só deixando o ciúme afetar seu julgamento.
O lado bom de ter uma mãe que adora sua namorada é que elas se dão super bem e você nunca vai precisar se preocupar com rivalidade ou ciúme infantil entre elas. Mas o lado ruim é que sua mãe vai sempre defender sua namorada, mesmo quando tudo o que você quer é reclamar em paz.
— Você não deveria ficar do meu lado, Anne Kent? Eu que saí do seu útero, não Ambrosine. — resmungo, já querendo desligar o telefone. E foda-se se sou mimado.
— Eu fico do lado da razão e você não está sendo racional. Então ela tinha um aniversário para ir e ficou em LA. Não me parece uma falta muito grave. — minha mãe diz de um jeito gentil que me dá nos nervos.
— É meu primeiro jogo. Até você está vindo para cá. Sabe o que eu acho?
— O quê?
— Ambrosine não está sendo muito diferente do Desmond. Ele também não vem por algum motivo bosta que nem me lembro. Quer dizer, caguei se ele vem ou não, eu nem mesmo o convidei, mas você foi abrir a boca e contar para ele do jogo, e aí ele me mandou mensagem dizendo que vinha, mas adivinha? Avisou ontem que não vem mais.
Anne fica em silêncio por alguns instantes do outro lado da linha.
— Seu pai te ama, Harry. E Ambrosine também.
Reviro os olhos.
— É claro que você diria isso. Você tem essa mania de sempre ver o lado bom nas pessoas. Já te ocorreu que às vezes as pessoas não são tão boas assim? Às vezes elas simplesmente não se importam. — a minha sinceridade crua pesa o clima quase que imediatamente.
Não vou retirar o que eu disse.
— Você está certo, mas não é o caso do seu pai. Você sabe que foram anos terríveis depois do divórcio e ele ainda não sabe lidar com essa versão sua mais acessível...
— Para alguém que queria tanto reconquistar o filho, ele não deveria fazer um esforço? — faço a pergunta, mas não aguardo a resposta. — Tanto faz, mãe, ele nem é o assunto. A ausência dele nem fede nem cheira para mim. As únicas pessoas que eu realmente faço questão são você e Ambrosine. A ausência dela é a única que vou sentir.
Anne suspira do outro lado.
— Se você a ama tanto assim, por que não conversa com ela sobre as coisas que me contou? Não sei se entendi bem, mas você disse que ela quer te colocar numa coleira? Não me parece algo que ela faria...
— Você tá por fora, mãe. — digo sarcasticamente. — Você conhece a versão nora boazinha. Eu conheço a versão não-ouse-respirar-sem-me-avisar-antes.
Mamãe começa a rir alto.
— A quem você puxou tão dramático assim?
— São apenas fatos.
— E em que sentido ela tenta te controlar? O que você anda fazendo para deixá-la cabreira?
É, talvez não convenha desabafar sobre tudo com Anne. Eu conto muito a ela, muito mais do que a maioria dos caras da minha idade, mas até ela surtaria com minha rotina aqui. Ela e Ambrosine tem essa mania irritante de tentar me proteger o tempo inteiro como se eu fosse um filhote indefeso.
Mesmo que Ambrosine não tenha feito nenhum comentário direto sobre suas insatisfações a meu respeito desde que voltou para LA após sua breve visita, eu sei que ela está incomodada. Estou sempre avisando para ela cada maldito passo que dou, envio mensagens detalhando meu cronograma como se ela fosse do FBI e eu estivesse sendo investigado.
Mas fica a pergunta: qual tem sido o meu crime? Curtir com meus irmãos da fraternidade, desestressar com a galera depois de um dia exaustivo? Não me meti em nenhuma aposta que ela não fosse gostar e ligo para ela o máximo que consigo. Isso antes dela tacar o foda-se para o meu jogo, claro. Agora estamos nessa droga de guerra de silêncio e eu nem mesmo sei se alguém vai dar o braço a torcer. Por que sempre tem que ser eu?
Levo alguns segundos a mais para responder, perdido em pensamentos.
— Filho?
— Tá tudo bem, mãe. Enfim, não é importante. Acho que é só a distância cobrando o seu preço. É uma merda, sabe? A gente mal se vê. Às vezes um desentendimento pequeno vira uma coisa enorme. Nunca sei o que ela tá pensando.
— É nessas horas que uma comunicação eficiente faz a diferença. Tenho certeza de que ela se importa com você e está triste por não poder ir ao jogo amanhã. Talvez, se vocês conversassem, essa chateação se resolveria.
Como se fosse fácil assim. Mas sei que Anne está só tentando ser conciliadora. Ela adora Ambrosine e ficaria arrasada se nós terminássemos algum dia.
Término. A palavra tem um gosto amargo mesmo sem nem ter sido proferida. Afasto a ideia imediatamente.
— Você está certa. Valeu, mãe. Agora me conta como estão as coisas por aí.
E então Anne me distrai com histórias sobre suas aulas de yoga e sobre seu namorado Sean. A distração é bem-vinda e eu permaneço no telefone até dar a hora de me aprontar para o treino, focado em esquecer ao menos temporariamente a confusão em que meu relacionamento está.
• • •
— Cara, acho que nem vou conseguir dormir essa noite de tanta ansiedade. — Ed comenta enquanto JJ vira a segunda carta na mesa de pôquer. Quatro de copas, não me serve de porra nenhuma. Inferno, minha mão está uma porcaria.
— Desde que você não atrapalhe o meu sono, foda-se. — digo sem muita expressividade.
— Cinquenta pratas. — Teddy joga uma nota amassada na mesa.
— Tô fora. — descarto meu jogo.
— Arregão. — Claudia diz.
Estamos jogando há cerca de uma hora em uma mesa de plástico no jardim da frente. Deve ser umas dez da noite, o céu está limpo e está frio, mas o álcool ajuda a aquecer. Só que não estou bebendo de verdade, não quero acordar com ressaca no dia D. Preciso estar na minha melhor forma amanhã.
Só Claudia e Teddy sobram na rodada e termina com ela levando a grana dele.
— Adoraria jogar mais, mas vou vazar cedo hoje. — Teddy se levanta, espreguiçando-se. — Vejo vocês no jogo, otários. — e ele pisca para Pam, que está fumando um do outro lado do jardim com umas garotas que não lembro os nomes.
O maldito vai transar a noite inteira para controlar a própria ansiedade. Nem sei mensurar a inveja que estou dele neste exato momento. Em seguida, Ed o imita, esticando os braços e arrastando a própria cadeira para longe da mesa. Ele encara Claudia com um sorriso malicioso. Ela finge desinteresse, mas eu sei exatamente o que vem a seguir: o quarto interditado para mim.
Ótimo, mais um maldito casal feliz trepando enquanto eu fico a ver navios.
— Podem encontrar outro buraco para se comerem. — tento estragar a noite deles de propósito. — Vou dormir cedo também. E não vai ser naquele sofá nojento da sala, quero a minha cama.
Claudia estreita os olhos azuis para mim, contrariada.
— Você deveria descontar a sua frustração na punheta e não na gente, Sanders. — ela diz com deboche.
— Tudo bem, Cloudy, a gente vai para o seu quarto. — Ed não demonstra nenhum ressentimento.
A incapacidade dele de ficar puto é uma benção a maior da parte do tempo, mas às vezes confesso que queria conseguir tirar esse monge budista do sério.
— Você sabe que tem outras meninas lá. — ela diz.
— É só convidá-las para se juntarem a vocês. — JJ diz enquanto recolhe as cartas do baralho.
— Eu bem que queria, mas Ed é um certinho de merda. — Claudia dá de ombros e lança um olhar atravessado para Ed, que fica vermelho que nem um tomate.
Ele está apaixonado pela garota enquanto ela o vê apenas como uma foda casual. Pobre Ed.
— Vocês podem usar o meu. — Madison, uma das garotas que passou a frequentar as nossas festas, aproxima-se de repente. De onde ela surgiu?
Ela é alta, deve ter quase um metro e oitenta. Escutei por aí que ela já foi modelo de passarela, mas se envolveu em alguma polêmica envolvendo testes de sofá e prostituição no meio da moda e acabou desistindo da carreira. Dizem que ela nunca fez nada de errado e foi apenas mais uma vítima da indústria. Saiu fora porque não quis continuar vendendo sua imagem para velhos tarados.
Ela não estuda em Stanford, mas mora em Palo Alto e está sempre no meio dos universitários como se fosse uma de nós. Tem mais ou menos a nossa idade, então se mistura muito bem. Faz alguns dias que ela começou a colar na nossa fraternidade, foi Claudia quem a convidou.
Ela tem cabelos loiros ondulados e olhos claros, não sei precisar o tom exato, é o tipo de garota que vira pescoços por onde passa. Não serei hipócrita em dizer que ela não é atraente, porque obviamente é, e o fato de não ser uma vaca como noventa por cento das garotas com essa aparência a torna ainda mais atrativa. Mas é claro que enxergo isso de uma forma completamente impessoal. Ela é gata, e daí? Eu tenho a minha gata e isso basta para mim.
— O seu? Mas você nem mora aqui na rua, Maddie. — Claudia pergunta, encarando a garota com os olhos em chamas.
Mas não são chamas de ódio nem nada. Está mais para tesão. Claudia é bissexual e não esconde de ninguém que faria qualquer coisa para ter uma chance com Madison Ray.
— Vocês podem usar o meu apartamento, não me importo. Fica a uma milha daqui só, te mando o endereço. Vou dormir com Tina na casa rosa hoje. — ela se senta na cadeira vaga que Teddy deixou. Só então ela volta o olhar para mim. — Você é um amigo sacana, Sanders.
— Esses dois trepam no meu quarto o tempo inteiro. Mereço um pouco de paz ao menos na véspera do meu primeiro jogo. — retruco, incomodado com a acusação dela.
— Nosso quarto. — Ed rebate. — Esqueceu que o quarto já era meu antes de ser seu?
— Tudo o que eu toco se torna meu. — respondo com superioridade.
— Uau. — Claudia e Madison ressoam ao mesmo tempo enquanto JJ e Ed me xingam de todos os nomes que podem.
— Acho bom então você manter as suas mãos longe da Cloudy. — JJ ri. — Ed morreria.
— Sai fora. — Claudia revira os olhos. — Odeio os metidos à besta que nem o Sanders. Por mim ele pode ir para a casa do caralho com esses olhos verdes hediondos. — ela me olha como se eu fosse nojento.
— Mas os olhos verdes do Ed você gosta, sua fingida. — devolvo o olhar de nojo na brincadeira.
— Ficam bem nele. E ficam incríveis em você também, Maddie. — ela volta sua atenção para a garota como se eu e Ed nem existíssemos.
— Obrigada. — Madison diz, atenciosa. — Mas ficam bem no Sanders também. Na verdade, os dele tem um tom bem único. Você sabe que as garotas de Stanford te chamam de garoto dos olhos de matar, né, Sanders?
Ergo uma sobrancelha.
— Essa é nova.
— Pelo amor de Deus, não infle mais ainda o ego dele. — Claudia reclama. — Ele já se acha demais sem receber nenhum elogio.
— Olhos de matar... Gostei. — testo o apelido em voz alta. — Espero que seja matar no sentido que estou pensando.
— Espero que seja no sentido de matar de vergonha alheia. — Claudia continua tentando estragar meu júbilo.
— Fecha a boca, Claudia. A baba está escorrendo. — provoco-a.
Ela me chuta por debaixo da mesa. Madison intervém:
— É no sentido que você está pensando. Dizem que quando você encara uma garota o coração dela perde o compasso. — ela continua a inflar o meu ego, mas não parece ser de forma sarcástica nem maldosa. Ela parece só estar sendo sincera.
Se fosse Claudia dizendo essas palavras, eu certamente teria feito uma piada do tipo "então vamos testar essa teoria" e a teria encarado com alguma careta ridícula até fazê-la rir. Mas Madison não é Claudia, definitivamente não é, então desvio o olhar com certa urgência.
— Eca, vou ter pesadelos com isso. — Claudia se levanta. — Vamos nessa, Ed. Deixa o Sanders ter o quarto para ele hoje. Ele pode bater uma fantasiando com cem garotas chamando-o de olhos de matar.
E, com essas palavras, ela se manda com Ed. Ficamos só JJ, Madison e eu, mas ele logo se levanta e vai se juntar à galera fumando. Fico sem graça de me levantar logo após ele e deixar a garota sozinha.
— Sabe... Você não precisa fantasiar com garotas te chamando de olhos de matar. — ela diz de forma bem-humorada.
— Ah, eu não vou. — dou de ombros. Meu ego é meio inflado, confesso, mas não sou tão narcisista assim.
— Eu quis dizer que você não precisa fantasiar porque pode viver isso. Na prática. — ela diz de forma lenta.
Merda, ela está flertando comigo?
— Ah, eu estou bem assim. — fico estranhamente envergonhado. Normalmente quando alguma garota dá em cima de mim eu tiro de letra, mas dessa vez fui pego completamente desprevenido. Nunca tinha reparado em algum interesse para além da amizade vindo de Madison no pouco tempo em que a conheço.
— Foi mal. Fui longe demais? — ela baixa o olhar, parecendo tão constrangida quanto eu.
— Relaxa, tá tudo certo. Pensei que soubesse que eu namoro. — jogo verde para colher maduro. Será possível que ela não sabe?
— Você namora? Caramba, não fazia ideia. Mil desculpas. — ela parece verdadeiramente envergonhada.
— Relaxa, Madison. É claro que não estou ofendido. Na real eu adorei saber que tenho olhos de matar. — brinco.
Ela ri e então se levanta.
— Tem mesmo. — ela começa a se afastar, mas antes de ir muito longe ela se vira e me encara por alguns segundos. — Se algum dia você estiver solteiro...
Ela deixa no ar e sai. E é aqui que eu faço algo que não deveria: olho-a por tempo demais enquanto se afasta. Um segundo ou dois a mais do que o necessário, muito mais do que eu olho para qualquer garota que não a minha namorada. Meus olhos me traem e encaram a bunda de Madison por um milésimo de segundo e eu sacudo a cabeça, incrédulo com o que acabo de fazer.
Mas sei que isso não é sobre Madison. Não tem a ver com o fato dela ser gostosa, mesmo que de fato seja. Tem muito mais a ver com a carência latente que nunca desaparece do fundo da minha mente. Mesmo quando estou na quadra, no meio de um jogo, ou quando estou jogando pôquer, bebendo, rindo e me mantendo distraído como posso, ela ainda está lá.
Não Madison. Ambrosine. Como ela pode estar lá e ao mesmo tempo não estar? Como ela pode ser o que mais me anima e também o que estraga o meu dia?
Sentindo-me mais solitário do que nunca, eu volto para dentro da casa e me tranco no meu quarto. Não consigo mais ser orgulhoso. Não falo com a minha namorada há dias e isso está me mantando aos poucos. Se eu não resolver isso antes do jogo, minha estreia vai ser um fiasco.
Como se lendo os meus pensamentos de forma sobrenatural, Ambrosine surge no visor do meu celular. Ela está me ligando. O alívio me engole como um tubo de sucção.
— Te amo. — é como eu a atendo. Nem sei por que disse isso, só saiu. Acho que eram as palavras que estavam entaladas depois de tantos dias de silêncio.
— Ah, Harry, eu te amo mais! — ela se derrete no telefone e eu juro que me sinto derreter como uma manteiga na frigideira. Inferno, ela me transforma em um emaranhado de emoções bregas sempre que fala comigo e estou rendido demais para sentir vergonha. Faria vozinha de bebê para a Califórnia inteira ouvir se isso significasse fazê-la sorrir. — Desculpa por não estar aí com você. E me desculpa também por ter sido orgulhosa todos esses dias. Eu estava me contorcendo por dentro, louca para te ligar.
— Não tem mais importância. Nem lembro mais por que brigamos. Eu estava desesperado para ouvir a sua voz, gatinha. Estava prestes a te ligar, mas você foi mais rápida.
— Estamos sintonizados. — ela ri, então geme de forma melosa. — Por favor, não vamos mais fazer isso. Eu tive um teste surpresa antes de ontem e tenho certeza de que zerei. Não conseguia me concentrar em nada sem estar bem com você.
— Estou de acordo. Sem mais greve de silêncio.
— Você ainda está chateado por que eu não estou aí? — ela pergunta com cautela.
— Já passou, gatinha. — digo. Não sei se realmente passou ou se estou tão aliviado por estar finalmente falando com ela que tudo o mais ficou pequeno em comparação. — É aniversário do chihuahua e você não pode perder e blá blá...
— Harry! Não fala assim dele. E não é só aniversário dele, eu já te expliquei...
— Estou só te enchendo.
— Eu me sinto culpada por não estar com você. Eu até estava pensando em desmarcar com eles e dar um jeito de aparecer aí amanhã, mas Shyla teve uma emergência familiar e só sobrou eu para organizar toda a decoração na casa da Erika amanhã cedo e...
— Ambrosine, tá tudo bem. Divirta-se com seus amigos. — digo simplesmente.
— Tá tudo bem mesmo? — ela insiste.
— Tão bem quanto dá para estar. Sinto sua falta.
— Às vezes a saudade que sinto de você é quase uma dor física. — ela diz de forma melancólica. — Eu só queria voltar para a San Diego High School e poder te ver todos os dias. A gente era feliz e não sabia.
— Ainda sou feliz. Só transo menos, mas ainda sou feliz. — brinco.
Ela me dá uma de suas risadas gostosas. Eu largaria o vôlei e entraria para o circo se fosse para ouvir esse som todos os dias. Existem poucas coisas no mundo que fazem o meu peito vibrar de absoluta satisfação como os momentos em que ela me entrega essa parte de si.
— A gente pode dar um jeito nisso. — ela ronrona do outro lado da linha.
Franzo o cenho.
— O que você quer dizer?
— Abre a nossa conversa. — ela pede e eu obedeço sem hesitar, ainda confuso com as palavras dela.
Assim que abro, uma imagem chega no chat. É uma foto de Ambrosine deitada na cama estreita de seu quarto em LA. Ela está de bruços, os cabelos loiros e lisos esparramados nas costas nuas e nos lençóis. Ela esconde a maior parte do rosto com as mãos, mas os olhos acastanhados encaram fixamente a câmera. Me encaram. Mais embaixo, uma calcinha de alças finas emoldura sua bunda deliciosa e arrebitada. Meu pau se contrai dentro da cueca, reagindo à imagem instantaneamente.
Puta que pariu.
— Puta que pariu. — dou voz aos meus pensamentos. — Ambrosine. Caralho.
Esse é o primeiro nude que ela me manda. Já pensei algumas vezes em pedir, mas nunca tive coragem. Não sei como ela ia se sentir com isso. Quando estamos juntos ela é ousada e topa tudo, mas sei que enviar fotos e vídeos íntimos são outros quinhentos. Eu meio que estava esperando ela ter a iniciativa, caso se sentisse confortável.
— Se você estivesse aqui, ia me ver ruborizar loucamente. — ela ri docemente.
— Não seja por isso. — eu mudo a ligação para vídeo. Estou desesperado para vê-la depois dessa foto. Sinto-me um milhão de vezes pior por ter encarado a bunda de Madison pela fração de segundo que o fiz quando a bunda mais deslumbrante da América pertence à garota em cujo corpo eu me perco. Minha cueca começa a ficar pequena demais para o meu pau e eu aperto meu saco, desconfortável de um jeito bom para caralho.
Ambrosine aceita a chamada de vídeo e sou agraciado pela visão dela ruborizada deitada na cama. Ela tenta esconder o rosto debaixo das cobertas, mas eu sei exatamente o que tem debaixo delas.
— Porra, Ambrosine. Se é isso o que eu ganho com greve de silêncio, vou aguentar mais vezes e mais tempo. Estou duro que nem pedra aqui. — comunico-a.
— Hum... — é tudo o que ela diz.
— O que você vai fazer sobre isso? — ergo uma sobrancelha, deixando claro o que eu quero.
Ela finge pensar. Protela alguns segundos, mas então se senta na cama e coloca o celular apoiado em alguma coisa. Ela está usando um moletom rosa e pelo que consigo ver não está usando calças. Então ela ergue o moletom e o passa pela cabeça até que um par de seios redondos e rosados se exibe para mim, balançando ligeiramente.
Puta que pariu.
É isso, otários. Harry Sanders também vai transar.
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