10 | CAPITÃ ARISTOCRÁTICA
Taylor definitivamente havia perdido pelo menos metade dos seus compromissos na manhã seguinte à festa de Owen Huard. Então, quando acordou às oito e meia, ao som do vento batendo contra a janela, cancelou tudo o que tinha para o resto da manhã, decidindo que começaria o dia no início da tarde.
O quarto de Eden estava silencioso, as cortinas ainda fechadas, mas a duquesa não parecia estar em lugar nenhum. Taylor se levantou e abriu o armário de madeira no corredor por onde ela teve que passar para chegar ao banheiro. Por ser uma construção antiga, tudo em Birch parecia absurdamente "demais". O banheiro do quarto era dividido por um corredor, onde havia dois armários para roupas de cama e toalhas. No próprio banheiro, de paredes brancas, havia duas banheiras, uma ao lado da outra, antigas, em frente a um enorme espelho. As janelas tinham cortinas, mas estavam todas levantadas e o chuveiro ficava do outro lado. Não muito longe, num canto, ficava a pia.
Taylor caminhou pelo espaço, pegando toalhas limpas e uma escova de dentes fechada. Ela demorou um pouco para se arrumar, mas quando saiu do banho, estava envolta em um roupão branco, e não se preocupou em atravessar o quarto e ir até o closet pegar algumas peças de roupa.
O estilo de Eden era oposto ao de Taylor. A mais nova não tinha medo de usar cores e adorava absolutamente todas as peças caras que pudesse ter; saltos, casacos, todos os acessórios possíveis. Eden tinha muitas roupas polidas, em tons mais escuros, vários cardigans e casacos maiores, sobretudos, botas Chelsea, mocassins, calças retas, camisas de botão e camisetas brancas - muitas camisetas brancas. Todas as peças eram de marca e pelo menos metade delas eram de marcas italianas. Parecia um padrão. Ela se vestia bem, isso Taylor não podia discutir.
Estava frio e, honestamente, a ideia de Taylor era descer e entrar no carro de Eden para depois pegar a estrada em direção a Londres. Então ela quis estar confortável para uma hora atrás do volante, e terminou se enfiando em calça preta de corte reto e os mesmos sapatos da noite anterior. Uma camiseta branca foi o complemento, junto com um sobretudo preto que estava entre dezenas de outros sobretudos, jaquetas e casacos.
A mais nova estava saindo do closet quando a porta do quarto se abriu, e então Eden entrou, puxando a camisa creme que usava por cima do corpo, dando uma visão do que ela usava por baixo – o que não era nada. Ela estava com um casaco na mão, em tom caramelo, misturado com outros tons marrons em padrão houndstooth, e colocou esse casaco no balcão no meio do espaço do closet. Taylor parou e se apoiou no arco da porta, vendo Eden pegando uma camisa de flanela escura.
— Danny derramou café na minha roupa — comentou a mais velha, quebrando o silêncio. Ela olhou para Taylor, antes de começar a abotoar a camisa, e a viu ali, apenas a encarando — Bom dia.
— Bom dia — Taylor respondeu de volta, e se afastou da porta, caminhando em direção a Eden e cortando espaço enquanto a ajudava a abotoar o resto da camisa. Ela ajeitou a gola na ponta, passando a palma da mão ao longo da peça também, removendo qualquer amassado que tinha insistido em ficar pelo caminho. Eden sorriu suavemente.
— Você dormiu bem? — ela perguntou, suas palavras saindo calmas e quentes contra a pele de Taylor enquanto ela se apoiava em seu pescoço. Ela era inebriante e não havia nenhuma sugestão de que a manhã terminaria como a noite anterior, mas havia desejo, o que era bastante óbvio, e o contato era agradável, mesmo daquela maneira.
— Eu deveria ter ido embora ontem à noite — disse Taylor, contornando a pergunta que ouvira. Ela fechou os olhos, sentindo os lábios em seu pescoço, e inclinou um pouco a cabeça, passando os braços em volta dos ombros de Eden.
— Mas você não foi... — ela disse — Que bom que você não foi. Hm... — Eden se afastou, mas só um pouco, ainda mantendo uma distância mínima. Taylor abriu os olhos e olhou para ela — Você está com fome? Archie pediu que o café fosse servido lá fora, ele está praticando sua mira.
— Praticando? — Taylor ergueu as sobrancelhas por um momento.
— Eu sei, eu sei... depois do que aconteceu, isso não é muito emocionante — disse ela — Mas Lottie e Danny estão o fazendo companhia enquanto Ethan dispara o lançador.
— Bem, isso parece tentador... — disse o mais novo, afastando-se de uma vez por todas e cortando completamente o contato — Mas eu preciso ir embora. Ainda tenho mais de uma hora pela frente e adiei todos os meus compromissos para a tarde, então...
Eden assentiu e murmurou alguma coisa, interpretando mais do que talvez Taylor esperasse que ela fizesse.
Para a mais nova não parecia muito tentador aquele arranjo. Ela não precisava sair com tanta pressa quando faltavam quase cinco horas para a primeira reunião que tinha marcado no seu escritório, na academia de boxe. Mas ter estado com Eden na noite anterior não significava que elas iriam fazer alguma coisa daquilo, especialmente quando o cenário aparente era a duquesa a chamando para um "café em família". Haviam certas coisas que Taylor sentia que precisavam se manter como estavam, e aquela distância era uma delas. Ela não queria ter de sentar na mesma mesa que a mãe de Eden, os irmãos e a cunhada dela e agir como se fizesse parte daquele espaço, porque era um conceito diferente, e ela não estava especialmente animada para a coisa toda. Claro, ela tinha adorado o contato da noite anterior- e definitivamente não reclamaria se repetisse aquilo outras vezes. Mas, como tinha planejada, Taylor foi embora, e foi acompanhada, depois de Eden insistir para que seu motorista a levasse. As duas se despediram na frente de casa, e trocaram um encostar de lábios.
Minutos depois, Eden estava voltando para a parte de trás da casa, onde o café tinha sido montado. Todos ainda estavam por ali, mas enquanto Archie parecia especialmente investido em suas táticas sobre como acertar os discos no ar, Charlotte e Mary conversavam sobre qualquer coisa envolvendo uma viagem das duas para Londres naquela tarde. Danny estava longe da mesa. Tinha arrastado a cadeira para mais perto de Ethan, e estava tomando seu terceiro copo de café - depois de derrubar aquele que seria realmente o terceiro na roupa de Eden. A duquesa encheu uma xícara de chá e completou com leite, depois foi se juntar ao irmão mais novo, parando ao lado dele.
— Ah! Eddie, trocou a camisa? — ele perguntou, e não esperou realmente uma resposta, porque estava apenas puxando assunto, de qualquer forma — Hm, o que a chefe estava fazendo aqui?
A pergunta foi feita mais baixa, e ninguém além de Eden realmente ouviu. Archie parecia tão focado no que fazia, enquanto Ethan estava o dando dicas casualmente - coisa que, pela primeira vez, em muito tempo, o irmão Hadfield mais velho, parecia disposto a ouvir sem realmente retrucar como sempre fazia.
— Nós estávamos na festa daquele americano ontem à noite — ela respondeu. Tinha comentado com ele algo sobre no dia anterior, e Danny já sentia que conhecia Owen bem demais depois de algumas boas horas o buscando no Google. O que não era realmente difícil de achar. O homem vivia rodeado de gente influente em Nova York, e tinha um império de drogas do outro lado do Atlântico. Mas então, ele tinha cruzado o mar e se estabelecido na Inglaterra, vivia num castelo antigo e parecia mesmo empenhado em fazer seu caminho pelo negócio de cannabis de Scott Swift — Ela precisou dirigir na volta-
— Bebeu demais?
— Eu tive um problema no apartamento de Jethro — Eden deu de ombros, e não se incomodou em levantar parte da barra da camisa que usava, mostrando o curativo que tinha trocado naquela manhã. Danny foi realmente o único que viu, já que todos os outros ali estavam engajados em suas próprias conversas e atividades.
— Ah... — o mais novo acenou, um pouco surpreso — Claro. E falando do Jethro... só por curiosidade, ele vai ficar até quando enfiado no estoque lá de baixo?
— Vamos resolver isso logo — Eden garantiu — Eu, hm... — ela sorveu parte da bebida em sua xícara — Estou esperando algumas visitas durante a tarde.
*
— Uau... hm... — Taylor puxou a cadeira de madeira no lado oposto onde Scott estava sentado. Era horário do almoço, e eles estavam no terraço da prisão de Brixton — As receitas da mamãe? — ela encarou a mesa posta, vendo ovos escalfados perfeitamente com aspargos e molho holandês, além de cordeiro com um molho de ervas. No meio da mesa havia uma garrafa de vinho barolo, já aberta.
Scott estava cumprindo sua pena em Brixton, a prisão mais antiga de Londres, no sul da cidade. Ele estava realmente perto de casa, e vivia a vida como se não tivesse deixado a mansão da família em Richmond. Scott tinha uma ala inteira para si mesmo, junto a um staff que incorporava seu alfaiate - um senhor de mais idade que trabalhava a quase quatro décadas na Ede & Ravenscroft -, um barbeiro da Truefitt & Hill que ia o encontrar uma vez por mês, e um chef de cozinha que preparava, todos os dias, quatro refeições. O americano tinha feito daquele lugar sua casa e, de maneira honesta, não estava com pressa para que o tempo passasse. Tendo Taylor do lado de fora, cuidando de grande parte de seus negócios, nos últimos anos era quase como se a vida fosse mesmo apenas aquilo.
— Hm-hmm... isso parece delicioso — Austin murmurou, se sentando ao lado da irmã. Scott alcançou a garrafa de vinho e encheu as taças dos filhos — Obrigado.
— Você gosta disso, Birdie? — o mais velho disse, apontando para a mesa, para o prato de cordeiro. Taylor teria revirado os olhos ao apelido se fosse qualquer outra pessoa, porque normalmente odiava que usassem qualquer outra coisa se não seu nome, mas Scott a chamava de "Birdie" desde que ela conseguia se lembrar — É a receita da sua mãe.
— Sim, eu posso ver — ela falou — Dorian fez isso do zero?
— Ele é um ótimo chefe, Birdie — Scott falou — Talvez precise de alguma coisa ou outra, uh... a última parte da receita se perdeu. Aquele livro velho de receitas... — ele balançou a cabeça — A página estava um pouco apagada, acho que foi quando Austin derrubou chá nela.
— Eu sinto muito por isso — Austin disse — Mas eu tinha sete anos, foi realmente sem querer.
— Estamos bem, Kid — Scott garantiu — Vocês foram a visitar recentemente? Logo fará vinte e dois anos. No próximo mês.
— Parece bem menos do que isso — Taylor murmurou.
— Sim, sim... parece, Birdie — Scott concordou, mas mudou de assunto logo em seguida. Do outro lado da mesa, Austin tinha levado um vape até a boca, e o mais velho suspirou alto — O que eu lhe disse sobre esse hábito nojento? Hm, hm... — ele revirou os olhos e viu o filho deixando o vape de lado, apoiado na mesa — Se você quiser fumar, faça-o corretamente. Como as pessoas costumavam fazer antigamente.
— É — Taylor implicou com o irmão, não que realmente se importasse, mas era parte da dinâmica entre eles, e o mais novo revirou os olhos — É embaraçoso.
— O que eu fiz para merecer você? — ele murmurou na direção da irmã.
— O que EU fiz para merecer você? — ela devolveu.
— Ok, ok, como vocês estão? — Scott puxou a atenção para si, quebrando o assunto entre eles.
— Com fome — Austin respondeu.
— Nós temos aquela outra coisa para conversar — Taylor passou direto pela pergunta, sem querer realmente se estender. Não era como se não gostasse daqueles momentos, mas ela tinha mesmo um dia cheio partindo dali, então o quanto antes resolvesse certas questões, seria definitivamente melhor.
— Você não contou para ele?
— Me contou o quê? — Scott disse.
— Raleigh Raine está "desaparecido" — ele fez aspas com os dedos.
— Por que isso? — Scott acenou, e então imitou o gesto.
— Houve um incidente envolvendo a propriedade de Birch — Taylor falou — O irmão drogado da nova duquesa e uma dívida de oito milhões. A coisa é que... — ela balançou a cabeça negativamente — Já resolvemos isso, ou... bem, pelo menos estamos no caminho para resolver isso.
— Ok — foi realmente tudo o que Scott disse.
— Você poderia agir um pouco mais preocupado, tipo, "Pelo amor de Deus, Birdie! Que merda você está fazendo?" — Austin comentou.
— Ei! — Taylor empurrou o irmão de lado, sem usar muita força, mas o suficiente para que ele perdesse parte do equilíbrio.
— Taylor! — o mais novo ralhou.
— Não, só estou... — Scott suspirou — Tenho certeza de que sua irmã sabe o que está fazendo, e não quero me preocupar com o que não preciso. Eu estou tendo um ótimo tempo dentro dessas paredes, por que estragar isso?! — ele sorriu para Austin — E você, peça desculpas à sua irmã.
— Eu nem mesmo falei sério — o garoto se defendeu.
— Não me importa, agora, vá e peça desculpas a ela — Scott falou, mas não aumentou o tom, ele estava apenas sendo mais irritante com o filho pela graça da coisa toda — Estou falando sério, Austin!
— Meu Deus, eu te odeio, Taylor — o garoto sussurrou, mas o fez "alto" o bastante para que ela escutasse, o que rendeu uma risada anasalada por parte da mais velha — Mas me desculpe.
— Hm... — Scott sorveu parte do vinho em sua taça — Vocês escutaram que Clay O'Malley morreu na última semana?
— Esse é o cara da propriedade em Gales? — Taylor franziu as sobrancelhas.
— É... — o mais velho assentiu — Era um cara engraçado.
*
— Houve um ping repentino vindo do rastreador do carro que ele usava — Gospel se apoiou na parede direita, ao lado do arco que dividia os dois ambientes do escritório de Eden, ouvindo um de seus rapazes, Errol, falar.
A duquesa estava parada frente a sua mesa, em pé, com o irmão mais velho logo ao lado. Gospel tinha aparecido em Birch de surpresa, junto a um de seus homens. Era manhã, início do dia, e Eden tinha sido surpreendida quando viu o carro de Ron passando pela entrada e estacionando logo na frente do palácio. Ele não tinha avisado ninguém, e Eden até teria gostado de um aceno.
— Nós o encontramos estacionado perto do cais dos barcos de pilotos no rio Tâmisa — Gospel disse — Isto estava no bolso dele — Eden desviou o olhar para o outro homem, quando Gospel acenou para ele. O mais alto tirou do bolso um celular, e o desbloqueou, mostrando a tela e o vídeo de Archie dançando, que Eden tinha gravado depois de algum custo — Então... parece que tudo estava certo, afinal.
— É esse o vídeo — Archie murmurou — Uau...
— Seu coração não estava realmente nessa performance, estava? — Gospel disse.
— Ah, não sei — ele deu de ombros, sem conseguir encarar realmente o homem do outro lado da sala — Na verdade, eu coloquei muito esforço nisso.
— Bem, de qualquer forma, isso não é importante — o scouse se levantou — Acontece que Jethro era sorrateiro.
— Hm, como assim? — Eden fingiu interesse.
— Ele assassinou dois homens e desapareceu com todo o dinheiro! — Gospel aumentou o tom, irritado.
— Você o encontrou? — Archie perguntou.
— Ainda não, mas vamos o encontrar. Não se preocupe com isso — o mais velho garantiu — Há apenas uma pequena coisinha... a arma com a qual meu irmão foi baleado — ele acenou na direção de Errol, que antes segurava o celular, e o viu se inclinar na direção do sofá, para então tirar a mesma espingarda que Archie tinha usado para executar Raleigh, de dentro de uma arrumação de panos — Isso foi encontrado no porta-malas do carro com o corpo. É uma espingarda esportiva bastante boa, de fabricação inglesa. Aparentemente, isso vale mais de £ 200.000. O que me faz questionar, como Jethro conseguiu uma arma assim?
A sala caiu em silêncio. Archie sentiu sua mão suando, e mexeu os dedos. Ele, que antes não conseguiu encarar Gospel, de uma hora para outra não conseguiu desviar o olhar do scouse. O traficante esperava uma resposta, e Archie não a daria, porque não poderia pensar em nada que fizesse qualquer sentido. Por outro lado, Eden parecia estranhamente calma.
— Há uma explicação simples para isso — a duquesa fingiu um sorriso, tentando parecer gentil, mas não tão gentil — É minha. A arma. Ou, pelo menos, agora é minha. Pertencia ao nosso pai — ela estendeu o braço para frente, puxando Archie pelo ombro. O mais velho quase tropeçou, mas entendeu o movimento e apenas acompanhou, acabando ao lado da irmã — Percebi que a arma tinha desaparecido depois que você saiu naquele outro dia. Descuidadamente, o armário das armas é muitas vezes deixado destrancado, porque... bem, normalmente não recebemos muitas visitas e, naquele dia em questão, Jethro ficou sozinho por algum tempo.
— Sim, pensei que poderia ser seu — Gospel não discutiu — Não é exatamente a arma preferida para um traficante de drogas na linha de frente de Liverpool — ele riu, e o homem que o acompanhava também riu. Archie acabou rindo também, muito mais de nervoso do que qualquer outra coisa, e Eden sorriu sem muita animação, e não passou disso — Enfim, este é muito mais o seu ambiente natural. É por isso que eu trouxe de volta. Achei seguro devolver a mão à luva, por assim dizer.
— Acho que é ao contrário — Archie murmurou — A luva à mão.
— O que você disse? — Gospel o encarou sério.
— Nada — o hadfield acenou de um lado para o outro com a cabeça, e deu mais um passo para trás, terminando por se recostar na mesa de mogno do escritório.
— Bem, curiosamente — Gospel retornou ao assunto — No caminho para cá, eu senti uma conexão sobrenatural começando a se desenvolver entre mim e aquilo... — ele apontou para a arma — Aquela vara do julgamento. Agora, isso pode ser uma pergunta com resposta difícil... mas você acha que eu poderia ficar com aquela arma por um tempo?
— Uh, legalmente, isso pode ser estranho para nós, infelizmente — Eden disse, mas Gospel não parecia disposto a ceder, e ela não queria problemas, não quando o plano todo estava caminhando exatamente para o lugar certo — Embora... acho que você pode sim ficar com ela.
— Isso é muito gentil — o mais velho disse, e como se tudo estivesse resolvido, ele deu as costas e acenou para o homem do outro lado da sala, deixando claro que estavam indo embora. Mas o scouse parou antes de cruzar o arco em direção a saída — Ah, uma última coisa, o julgamento será manifestado logo. Ele chegará, e quando chegar, a arma será devolvida.
Na entrada da casa, alguns minutos depois, Eden e Archie estavam acenando para Gospel, enquanto o viam sumir de vez na propriedade. Archie fez o sinal de cruz algumas vezes, e então deixou a respiração, que nem sabia que estava prendendo, sair. Ele suspirou muito alto quando viu Gospel longe, e Eden o encarou.
— Acho que precisamos agradecer a Jesus por isso — ela falou.
— Amém, irmã — ele murmurou — Agora, podemos, por favor, voltar para uma vida tranquila?! Eu não aguentava mais esses dias sem fim.
Eden sabia que a "vida tranquila" de Archie se referia a vida que ele tinha se habituado a levar nos limites de Birch, com a diferença de que desde que a coisa toda com Gospel tinha se desenrolado, ele parecia mesmo mais calmo - ele acordava, tomava café da manhã do lado de fora, treinava com Ethan e então passava o dia seguindo a esposa no que ela decidia fazer. A vida de Eden parecia mais fácil. Mas, se a duquesa tinha algo claro diante de toda a situação, era a de que não estaria seguindo os mesmos passos do pai. Ela sabia que a família que tinha não era a mais certa, mas eles estavam ali, e de alguma forma ela estava mesmo tentando fazer com que a relação entre eles mudasse - ela tinha passado quinze anos longe de casa, e então estava ali, de volta ao mesmo lugar do que tinha fugido por tanto tempo.
— Quando você diz "vida tranquila"... quero dizer, você já se perguntou de onde vem o dinheiro que paga pelas suas contas?
— Eu não sei. Nunca me preocupei com isso — Archie a encarou, dando de ombros — Escravidão?
— Por que você foi direto para "escravidão"? — ela franziu a própria expressão facial.
— Porque somos pessoas horríveis, Eddie — Archie falou — O problema desse país é que paramos no tempo. Onde já se viu, "duquesa" em 2023? Eu digo... não faz sentido.
— Ok, ok... — ela balançou a cabeça negativamente — Acho que preciso te mostrar uma coisa, Archie, e não. Não tem nada a ver com escravidão, pelo amor de Deus...
*
Jethro tinha duas malas de dinheiro, mais duas malas de roupa, e um celular novo, junto aos fones de ouvido que Eden fez questão de comprar para o garoto. Ele passaria algumas boas semanas no mar, então fazia apenas sentido que ela tentasse tornar aquilo menos pior. De modo que, era óbvio, Jethro estava na situação por conta de Archie. Eden se sentia um pouco em dívida com ele.
Os dois estavam no deck coberto que levava até onde havia uma embarcação menor esperando pelo inglês. Taylor estava a alguns metros de distância, os encarando a distância. Para o dia, ela tinha optado pelo simples - calça, colete e camisa de alfaiataria, compondo um look em tons escuros, acinzentados. Com um blazer de tweed, jogado pelos ombros e, claro, um par de saltos Christian Louboutin. Do outro lado, Eden tinha se enfiado em jeans escuros, camisa branca e uma jaqueta bomber da Hartford, em tom preto. Nos pés ela tinha botas chelsea, marrom, e também não parecia longe de seu estilo usual
— Esse barco irá levá-lo a um navio mercante, que por sua vez, o levará para a Austrália — Eden disse, ajeitando seus óculos de grau no rosto, por pura mania — É como um trem que para em todas as estações, então vai demorar alguns meses, mas é a maneira mais segura.
— Certo — Jethro concordou, e parecia pronto para se despedir, mas Eden o parou antes que ele pudesse fazer isso.
— Uma última coisa, o que você estava tentando dizer naquela mensagem de texto que enviou para o Gospel?
— "Eles mataram o Raleigh, SOS."
— Como saiu "suave"?
— O corretor, eu suponho — ele deu de ombros — E também é difícil digitar quando você está sendo perseguido em uma floresta por cães furiosos e um cara maluco com uma arma na mão.
Eden balançou a cabeça, e acenou uma última vez. Ela viu Jethro pegando suas malas de roupas - as com dinheiro já estavam na embarcação - e, na verdade, aquilo era mesmo tudo que ele tinha por hora. O resto das coisas, tinha ficado tudo para trás.
– Boa sorte, Jethro.
— Obrigado — ele sorriu sem mostrar os dentes, mas parecia agradecido o bastante, e assim ele se afastou.
Eden o viu caminhar, e o acompanhou até que ele embarcasse de vez. Ela também esperou que o barco saísse - o que demorou pelo menos mais alguns minutos. Quando isso aconteceu, caminhou de volta para onde Taylor estava esperando.
— Bem, não o veremos novamente — a duquesa garantiu, ou achou que tinha feito isso.
— Tenho certeza de que você está certa — Taylor disse, e por um momento quase deixou transparecer que tinha mais naquilo do que ela dizia. Mas Eden deixou passar.
A duquesa estava de frente para Taylor, e ela deu um passo na direção dela, cortando ainda mais o espaço.
— Ouça — ela disse — Agradeço toda a sua ajuda, mas o acordo original foi entre meu pai e seu pai, por mais que a ideia tenha sido sua. E sei que esse não é seu assunto favorito, mas... hm, acho que é hora de conversar com ele. O conhecer.
Taylor a encarou por um momento, um pouco incerta se aquele parecia o passo certo a se dar. Ela desviou o olhar, e então encarou o mar, mas eventualmente voltou a focar nos olhos de Eden.
— Isso pode ser arranjado.
— Bom — a duquesa sorriu gentilmente — Agora, há alguma coisa que eu possa levar para ele? Para deixar claro que estou indo em paz.
— Ele adora um churrasco — Taylor foi honesta.
— Na prisão?
— É uma prisão aberta — ela deu de ombros — E ele tem certos... privilégios.
*
— É uma peça fantástica. Marmoreado maravilhoso. Quero dizer, lindo lombo. Lindo. Muito gentil da sua parte, Vossa Graça — Scott olhou para a segurança logo ao lado — Georgie, abra esse telhado, sim — Eden observou os movimentos do homem e viu a "cabana" em que estava ganhando um pouco mais de luz solar — Você deve ter um contato muito bom.
— Meu pai mantinha um rebanho de White Park na propriedade. Comercialmente inviável. Mas ele adorava a forma como costumavam expulsar os caminhantes das trilhas. Chifres grandes. Atitude ruim — Eden disse, enfiando as mãos no bolso da calça, deixando claro que talvez estivesse bem mais relaxada do que deveria Ou, pelo menos, do que esperassem que ela estivesse.
— Sempre tive tempo para seu pai. Ele era um bom homem — Scott falou — Pode ir, Georgie.
— Estarei de volta ao pôr do sol, se estiver tudo bem, Sr. Swift — o segurança falou — Não se atrase.
— Quando eu me atraso? — o mais velho brincou.
— O quê? — ele riu — Você está sempre atrasado!
— Ok, vá lá, não me chateie — o americano acenou para fora, e George fez seu caminho pelo campo, em direção aos muros de Brixton. Eles estavam nos fundos da prisão, muito perto de um lago, onde havia essa cabana sem paredes, com o teto retrátil, que parecia perfeito para um dia frio ao ar livre. E era, com certa justiça, um dia como esse — Sabe como esse lombo recebeu esse nome? Nos anos 1600, o Rei James, um parente distante seu, creio que eu — Eden assentiu — Ele estava dando um banquete que apresentou mais de cem pratos. No final do segundo dia, eles serviram a ele um corte nobre de lombo White Park e estava tão... tão macio, tão... saboroso, que ele concedeu-lhe o título de cavaleiro — Scott alcançou a faca logo ao lado e fez o movimento de investidura de um cavaleiro — "Levante-se, Senhor Loin". E o apelido pegou. Isso, como dizem, é história — ele encarou Eden ainda parada ali, de pé — Com licença, pelo amor de Deus, sente-se. Coloque as pernas debaixo da mesa. Aqueça os joelhos.
— Obrigada — ela murmurou, e puxou a poltrona coberta com a pele de algum animal, se sentando. A mesa central era pequena, e um pouco baixa. Scott estava ao lado direito de Eden, e Taylor estava de frente para ela. Linda, se de algo valia a informação.
— Nada pode superar um churrasco no meio do inverno, não é?
— De fato, Sr. Swift — Eden concordou — Mas, hm, devo dizer que... — ela olhou ao redor — Isso não é exatamente o que eu esperava de uma prisão.
— Isso não é nada — Scott se animou — Temos um campo de golfe de nove buracos, uma sauna nórdica, um lago onde podemos nadar. Colossal para a circulação — ele pontuou a última parte.
— E mesmo assim, não há problema com lâminas na prisão? — Eden apontou com o rosto para a faca na mesa.
— Não. O diretor, felizmente, é um grande admirador do trabalho artesanal premiado do Sr. Kawasaki — Scott olhou para o chef que cuidava do churrasco naquela tarde — Que nós estamos nos preparando para apreciar.
— Claro... — Eden murmurou.
— Quer me perguntar uma coisa, Vossa Graça? — Scott a surpreendeu de repente.
— Uh, ele... — ela acenou para o chef — Esta tudo certo falar na frente dele?
— O quê, ele? — Scott riu — Você pode conversar na frente do Sr. Kawasaki. Ele é muito confiável. A menos que tenha a ver com o pagamento de seus impostos — o mais velho brincou — Não é mesmo, Chef?
O chef do outro lado riu suavemente, mas não fez comentário algum. Um segundo depois, ele estava de volta ao que fazia, mergulhando no preparo das carnes.
— Para ser franco, Sr. Swift — Eden limpou sua garganta de leve — Não está claro para mim por que seu negócio em minha propriedade é do meu interesse. Então, eu gostaria de abrir uma conversa sobre o tema renegociação.
— Ei, espere um momento — Taylor, que tinha se mantido quieta por todo o tempo, a interrompeu sem nem mesmo um segundo pensamento — Como é...? Não estamos adiantando um pouco o assunto, Eden Sage Hadfield? Isto deveria ser um encontro para que você se apresentasse. Um pouco de cuspe nos dedos antes de alimentar o pônei, querida. Não é uma tela para uma renegociação abrangente.
— Eu tenho a sensação de que seu pai quer ouvir o que tenho a dizer — Eden falou, realmente segura do que dizia enquanto olhava para Scott. Parecia muito óbvio como ele confiava no julgamento da filha, mas ele também tinha ficado intrigado pela postura de Eden. Então quis deixá-la falar.
— O que você tem em mente?
— Quero você fora das minhas terras até o final do ano — Eden foi direta — Em troca, eu garanto que ganharei muito mais dinheiro para você até lá.
— Sr. Kawasaki, uh — Scott acenou para o chef, e designando para os cortes de carne na mesa —Coloque esse lombo na churrasqueira, sim? E nos sirva um bom copo daquele uísque japonês. Acredito que estamos prestes a ter uma sessão adequada.
O plano de Eden não estava cheio de detalhes. Ela queria encerrar operação de Birch desde que tinha ficado sabendo que ela existia - quase duas semanas, se estivesse contando. E, com isso, estava disposta a trabalhar para que o arranjo acontecesse. Ela estava ali, para o que Scott precisasse diante da operação, e a única condição era justamente aquela. Ela estaria fora até o final do ano.
Dizer que Taylor se irritou com a situação era até pouco para pontuar a maneira como ela realmente se sentia. Saindo de Brixton, enquanto caminhava para o carro de Eden, ela estava andando de pressa, com o barulho do salto mais forte do que nunca sob o chão.
— Antes de você falar disso com ele, você deveria ter falado para mim. Você está fora do serviço, você sabe. Então, isso deveria vir para mim primeiro — ela ralhou — Sou eu a pessoa no comando aqui do lado de fora.
— Você teria me desligado sem nem me ouvir — Eden tentou justificar.
— Sim, eu teria mesmo, porra! — ela parou diante da porta do carro, no lado do assento do passageiro — Isso porque você é uma soldada aristocrática, não uma traficante de drogas do sul de Londres. Você não tem ideia do que acontece desse lado das coisas.
— Espere-
— Você deixou isso bem claro quando nos conhecemos — Taylor a interrompeu.
— Ok, você não está errada — Eden fingiu um sorriso — Mas eu estou tentando costurar meu próprio acordo aqui. E, por hora, você precisa que eu te impeça de matar pessoas — ela lembrou da situação com Jethro — Eu te ajudei pra caralho nos últimos dias.
— Não é como se eu gostasse de matar pessoas — Taylor zombou — Quem gosta?! E verdade seja dita, se não fosse pelo seu irmão cheirador de cocaína, não estaríamos nessa confusão. Você não fez nada além do que a porra da sua obrigação. Depois de começar a matança, você deve a terminar, amor — ela disse, e foi tão suspeita pontuando a última parte, que Eden terminou dando um passo em sua direção, apenas para abaixar o tom de voz.
— Só um momento — ela disse — Vamos lembrar do Jethro com mais calma. Nós estamos deixando ele ir embora, certo? — a resposta de Taylor não veio, pelo menos não de imediato, então Eden se esforçou um pouco mais — Ele se foi, não foi?
— Na última vez que o vi ele estava entrando em um barco em direção à Austrália — ela murmurou, sustentando o olhar da mais velha — Eu tenho certeza de que ele está bem.
— Ótimo — Eden falou. Ela não deixou de encarar Taylor, e abriu a porta do carro para que ela entrasse, ainda sustentando aquele mesmo olhar.
Nenhuma das duas parecia realmente satisfeita com a situação. Eden não tinha acreditado em Taylor, e a mais nova não se esforçou para que isso acontecesse. E ainda havia a coisa toda do acordo. Elas tinham começado com o pé errado, dado um passo certo e então tomado a direção errada outra vez. De uma hora a outra, era difícil saber se aquilo se sustentaria ou não.
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