Capítulo - 67
Janeiro/2019
Dizem que o tempo é nosso maior aliado em várias sentidos, no entanto eu sinto que o tempo está passando mais rápido do que deveria, afinal, hoje é o aniversário de 20 anos da nossa Borboletinha e tenho medo que quando o momento dela encontrar os seus pais - que eu sinto está se aproximando -, eu possa ser esquecida, ou até mesmo rejeitada, mesmo que eu não saiba de fato o real motivo para que ela não estivesse com eles, mas se isso vier acontecer e eu não ver mais o amor daqueles olhos azuis ou ter aquele sorriso sincero e radiante em minha direção, fragmentará o meu coração de uma forma que talvez não seja possível reparar.
Quando penso nisso, uma parte de mim, a parte sensata e lógica grita que eu deveria ter negado ser conivente com as atitudes do Marco e recusado o pedido do Padre Lutero, para cuidar de uma criança que foi tirada de seus pais ao nascer. Mas a parte emocional de uma mãe que queria apenas proteger aquele bebezinho tão pequeno e indefeso, diz que mesmo sendo errado, foi o certo a ser feito. Isso é tão contraditório, porém não vou negar que faria tudo novamente se fosse preciso.
- Bom dia, Ângela! - Sorrio sendo desperta dos meus pensamentos e olho para Padre Lutero, entrando na cozinha, pronto para sair.
- Bom dia, Padre Lutero! O Senhor não irá tomar o café da manhã?
- Irei tomar café com o Marco, mas virei para almoçar com a nossa aniversariante. - Ele observa dentro do forno e sorri. - Você está fazendo os brioches recheados de chocolate, que são os preferidos da Ana? - Eu sorrio e assinto, retirando-os do forno e ele suspira. - Espero que a Thaís não implique com isso, logo hoje. - Ele nega com a cabeça e me olha. - Bom, estou indo, Ângela. Até mais tarde!
Ele sai e dou um suspiro, pensando como duas pessoas que foram criadas da mesma forma, recebendo a mesma atenção e cuidados, podem ser tão diferentes. Pois Ana é tão carinhosa, educada, gentil e com o coração maior do que eu sequer poderia imaginar, enquanto a Thaís se afunda cada dia que passa na amargura, sendo rude e muitas vezes cruel de forma proposital, apenas com o intuito de machucar a pessoa alvo de sua raiva, o que quase sempre é a Ana. E eu me sinto péssima por presenciar isso e me preocupo pelo fato de que às vezes é necessário que eu fique um pouco mais na casa do Matteo, sabendo que as duas estarão apenas com a companhia do Padre Lutero, pois a Thaís não o respeita de forma alguma, o que me deixa completamente envergonhada.
No entanto, quando ligo para saber como elas estão e o Padre Lutero quem atende, dizendo que Ana, após preparar o jantar, está em seu quarto, estudando - mesmo depois de chegar do trabalho - e que a Thaís saiu sem dizer para onde iria, o meu coração dói, justamente por não saber onde a minha filha está e muito menos com que tipo de pessoa que ela anda. Assusto-me, quando ouço batidas na porta e mesmo confusa, por não fazer ideia de quem possa ser, saio da cozinha e vou abrir a porta.
Sorrio por ver Caleb, o melhor amigo da Ana e confesso que por um tempo acreditei que ele estivesse interessado nela, romanticamente, mas vê-los juntos é impossível negar a amizade deles. O cuidado que ele tem com ela e a forma que se implicam de forma tão natural, como se fossem amigos a vida toda. Porém hoje, ele não está sozinho e sim, acompanhado por mais três pessoas.
- Bom dia, Tia Ângela! - Sorrio, pois desde que me conheceu começou a me chamar de Tia e não parou mais. - Viemos tomar o café da manhã com aquela peste, ela já acordou?
- Bom dia, Meninos! Entrem, por favor! - Dou passagem para que eles passem e observo-os, vendo o rapaz um pouco mais alto que Caleb, muito bonito, mas diferente dos outros três, parece ser muito sério. - Ela ainda está dormindo, mas eu estava pronta para ir acordá-la quando vocês chegaram. - Eles sorriem e olho entre eles e Caleb bate a mão na testa, me fazendo sorrir.
- Desculpe-me, Tia, mas esses aqui são meus amigos, Eloise e Pietro Johnson. - Sou surpreendida, ao receber um abraço deles.
- A Ana fala tanto da Senhora, que eu sinto como se a conhecesse. - Pietro fala com um imenso sorriso e sua irmã concorda, também sorrindo.
- E esse aqui, é o meu irmão mais velho, Richard Grey. - Ele se aproxima e pega a minha mão.
- É um prazer conhecê-la, Senhora Molina. - Antes que eu fale algo, Caleb bufa e revira os olhos.
- Ah, estamos na casa da Ana para comemorar o aniversário dela ou para fazer alguma Transação Comercial, Richard? - Richard apenas encara o irmão e consigo ver a sombra de um sorriso em seus lábios e é nítido o amor entre esses dois.
- Caleb tem razão, podem me chamar de Ângela, ou Tia, como esse rapazinho aqui. - Eles assentem, enquanto eu abraço Caleb que abre um grande sorriso, mas me afasto rapidamente. - Fiquem à vontade, que irei acordar aquela preguiçosa.
- Não conte para ela que somos nós, Tia, quero ver a cara de assustada daquela peste. - Caleb fala e dá uma risada, sendo acompanhado por Pietro e Eloise, enquanto Richard apenas nega com a cabeça. - Enquanto isso, nós iremos pegar algumas coisas no carro e vou invadir a sua cozinha, tudo bem?
- Caleb, você é de casa. Não precisa pedir permissão, Menino. - Ele me dá uma piscadela e saí junto aos demais e eu sorrio, caminhando para acordar a Borboletinha aniversariante do dia.
(...)
Observar Ana com os seus amigos e ver o quanto ela é amada por eles, me dá uma alegria tão grande que nem consigo calcular. Ainda mais por saber o quanto ela cresceu uma menina sozinha, que ficava apenas focada entre seus cursos de idiomas e o Colégio, quando morávamos em Portland.
Lembro-me claramente, quando Ana chegou da Universidade, em seu primeiro dia de aula, falando sobre seus novos amigos e devo admitir que eles realmente fossem como ela havia descrito. Pietro e Caleb são muito engraçados, claro que a veia dramática pertence apenas ao lindo rapaz de olhos cinza e cabelos acobreados, assim como a espontaneidade e leveza pertence ao Pietro. Eloise é igualmente leve e carismática, sem contar o quanto se parece fisicamente com o seu irmão. E Richard, apesar de ser um pouco mais velho que o Caleb, também é muito jovem, mas tem uma aura séria e protetora. Além de ser tão lindo quanto o irmão, mas que diferente dele, tem os cabelos negros como a noite e olhos extremamente azuis e sagazes.
O momento de cantar parabéns, Caleb fez questão de pegar o bolo - que eles trouxeram juntamente com alguns salgados, doces e bebidas - enquanto eu o ajudava com as bandejas e quando pediu para que ela fizesse um pedido antes de apagar as velas, eu sabia exatamente o que ela estava pedindo, pois isso acontece todos os anos e sinto um aperto no coração por imaginar que o seu desejo esteja mais perto de acontecer do que ela possa imaginar.
No entanto eu ignoro essa sensação desagradável que insiste em atormentar o meu coração e aproveito o momento na companhia desses lindos jovens, até que Thaís aparece na sala, interrompendo-os e sendo grossa como sempre. Consigo ver o quanto situações como essa deixam Ana envergonhada, porém ver que seus amigos estão dispostos a enfrentar quem for para defendê-la me faz acordar do meu estupor e pegar a Thaís pelo braço e arrastá-la para fora da sala.
- Você está louca! Solta o meu braço que está me machucando. - Ela tenta desvencilhar do meu agarre, mas não permito.
- Cala essa boca, Thaís! - Falo entredentes para não chamar atenção dos meninos na sala e ela me olha com espanto, afinal, tenho sido sempre paciente com ela. - Guarde a sua amargura e revolta sem sentido para outro dia, pois hoje é aniversário da Anastásia e você não irá estragar o dia dela com os amigos.
- Estragar o dia dela? E quanto o meus dias, que ela estragou desde que chegou à nossa casa? - Ela fala com raiva, mas agradeço por não estar gritando. - Sinceramente Ângela, eu fico impressionada com o quanto você deixa evidente a sua preferência por ela, quando eu que sou sua filha, sou repreendida o tempo todo. - Sinto meus olhos marejarem quando ela me chama pelo nome e não por mãe, mas respiro fundo.
- Você está enganada, minha Filha, eu não tenho preferência por nenhuma das duas, pois...
- Deveria ter! - Ela altera o tom de voz, interrompendo-me. - Eu sou a sua filha. A única! O que isso deveria bastar para você preferir a mim e não aquela bastarda que não é nada sua. - Suspiro e solto o seu braço, enquanto nego com a cabeça.
- Não é porque ela não foi gerada no meu ventre que é diferente, minha Filha. - Suspiro e tento sufocar o nó que se formou em minha garganta. - A Ana é tão minha filha quanto você, Thaís. E diferente do que você pensa, eu não tenho preferência por ela. O problema é que você é repreendida justamente por suas atitudes e ações, enquanto a Ana nunca me deu trabalho. Nunca contradisse um pedido meu e muito menos, tentou me submeter a isso que você está tentando fazer. - Nego novamente com a cabeça e seco uma lágrima que deslizou por meu rosto. - Ana sabe que amo as duas e nunca tentou tomar o seu lugar de filha, pois a única coisa que ela sempre tentou fazer, foi se aproximar de você. Ser sua amiga, companheira e confidente, como deveria ser a relação entre duas irmãs.
- Aquela órfã desgraçada, nunca foi minha irmã e nunca será! E eu nunca irei aceitá-la como tal, está me ouvindo? Nunca!
Ela sai me deixando sozinha na frente da casa e respiro fundo algumas vezes, para voltar à sala, mesmo estando morrendo de vergonha pelas atitudes da minha filha. E assim que abro a porta, tenho o olhar de todos em mim, inclusive os preocupados de Ana.
- Desculpem-me por isso. A minha filha é... Complicada.
- Não há nada pelo qual você precise se desculpar Ângela. - Richard se pronuncia com um sorriso contido, mas reconfortante nos lábios. - Sabemos como é ter um filho um pouco mais rebelde em casa, então de conflitos familiares entendemos bem. - Fico sem entender e Caleb bufa, enquanto se aproxima me abraçando pelos ombros.
- Mais rebelde? Temos uma tempestade junto a uma nevasca em casa, isso sim. - Continuo confusa e ele me dá seu sorriso típico. - Nosso irmão mais novo é complicado também, Tia, mas nem por isso o amamos menos. - Eu assinto e fico mais confortável pelo o que aconteceu. - Agora vamos comer? Quando estive na cozinha mais cedo, eu vi alguns brioches de chocolate nos quais quero muito devorá-los.
Eu assinto e ele se afasta indo para a cozinha, enquanto olho para Ana que está me encarando com seus olhinhos azuis culpados, mas sorrio para tranquilizá-la. E infelizmente eu sei que nada disso tem haver de fato com a Ana e sim a Thaís sendo o que sempre foi desde criança e não vou negar, pois isso muito me preocupa.
(...)
- Ângela, você sabe onde estão os meus óculos? - Sorrio, pois essa é uma pergunta que Rute Sawyer faz com frequência, desde que comecei a trabalhar na casa do seu filho, Matteo.
- Seus óculos estão sobre sua cabeça, Rute. - Ela me olha por um momento e leva a mão aos cabelos e sorri, retomando a nossa caminhada pelo jardim da casa.
Esse é um dos sintomas do Alzheimer no estágio inicial, no entanto, diferente de outros pacientes que tive contato durante o tempo que trabalhei no Mercy Hospital de Portland, ela está muito bem. Às vezes esquece coisas simples, como agora, por exemplo, mas ainda está muito lúcida, mesmo sabendo que o tempo é o grande inimigo para pessoas portadoras de DA.
Rute é uma mulher de 70 anos, muito bonita e elegante. Gosta de sempre estar bem vestida e é muito vaidosa, mantendo seus cabelos sempre loiros, destacando os seus olhos azuis. Ela sempre gostou muito de ler e fazemos isso todas as tardes ao lado da cascata de pedras que vi a primeira vez que vim a Mansão, no dia da minha entrevista de emprego.
O local foi feito para ser um jardim terapêutico, muito tranquilo, com bancos confortáveis e cobertura parcial com pergolado de madeira. Além de ter plantas medicinais como a camomila, equináceas, abrótano e confrei, assim como lavanda e erva-cidreira que exalam perfumes relaxantes, deixando o ar extremamente agradável.
- Você não é casada, Ângela?
- Não, eu sou viúva, Rute. - Ela assente e se senta na cadeira confortável e eu, faço o mesmo ao seu lado.
- Assim como meu filho. - Ela lamenta e meu coração acelera toda vez que ela menciona o filho. - Meu menino sofreu tanto. O meu neto também. - Ela fala desgostosa, mas nunca entrei nesse detalhe, afinal, a vida pessoal do Matteo não me diz respeito.
- Perder alguém nunca é fácil, Rute.
- Sorte quem teve fui eu, que me divorciei do traste do meu marido há muito tempo. - Dou risada, pois ela me contou essa história ontem. - Você acredita que ele teve coragem de manter um relacionamento com outra mulher, que tinha um filho dele e mesmo assim se casou comigo, mantendo-a como amante?
- Acredito sim, Rute. Nem todos os homens são iguais, mas alguns extrapolam a regra do bom senso. - Ela faz uma careta e um gesto desdenhoso com a mão.
- O meu filho é um ótimo homem, agradeço muito por não ter herdado o mau-caratismo do pai. Não posso dizer o mesmo do meio-irmão dele.
Não aprofundo o assunto, mas pelo que ela sempre conta, o meio-irmão do Matteo não é uma boa pessoa, sendo ambicioso a ponto de não medir esforços para conseguir o que quer. Ele e Matteo não têm um bom relacionamento, para falar a verdade, eles não têm relacionamento nenhum. E isso acarretou que Matteo não usa mais o sobrenome do pai, assim como seu filho não usa o da mãe e isso é outra história que não entendi bem os motivos, pois sempre faço de tudo para mudar de assunto.
- Seu filho e seu neto são homens bons, porque tiveram uma mulher excepcional que sempre esteve presente na vida deles.
- Ora sua bajuladora! - Dou risada do desdém dela, mas o sorriso está em seus lábios. - Mas você pode continuar, pois eu gosto quando enaltecem os meus valores como mulher, os quais aquele salafrário não soube valorizar. - Acabo dando risada da forma espontânea que ela diz isso e nego com a cabeça.
- Ah, Rute, só você mesmo para dizer isso assim, de forma tão natural, mas vamos começar a nossa leitura?
- Aprenda com essa mulher que tem muita experiência na vida, Ângela, pois remoer o que passou com quem não te valorizou apenas te deixará doente da alma e machucará seu coração. - Engulo em seco, pois ela é tão sábia e fala algumas coisas que mexem mesmo comigo. - É impossível recomeçar se continuar presa no passado, então apenas tranque no canto mais oculto da memória e se permita viver mais uma vez, quem sabe a felicidade não está mais perto do que possamos imaginar? - Apenas balanço a cabeça, afinal, não tenho o que dizer sobre isso. - Agora vamos ler esse livro, pois estou ansiosa para saber o que irá acontecer com a Gilberte.
Sorrio e começo a fazer a leitura de O tempo Descoberto, o sétimo e último volume da série Em Busca do Tempo Perdido, do autor Marcel Proust, mas não pude deixar de ficar pensando no que Rute disse, apesar de não ser tão fácil como ela fez parecer, pois eu sei que assim como eu sofri com a traição do meu marido, ela deve ter sofrido também.
No entanto uma coisa realmente é fato, pois cada pessoa reage diferente ao fardo que precisa carregar, alguns superam e seguem em frente, enquanto outros apenas se martirizam e se entregam a miséria da situação e essa última opção, não é a que quero para mim, não mais.
(...)
- Ângela, podemos conversar por um momento? - Tenho um sobressalto, ouvindo a voz de Matteo atrás de mim e viro-me.
- Claro Matteo! - Entrego o livro para Rute, que está com um sorriso nos lábios. - Pode continuar? Estarei de volta assim que possível.
- Querida, fique tranquila. Sou velha, mas ainda consigo ler, apesar de gostar muito de ouvir a sua voz enquanto faz isso, eu só preciso achar os meus óculos. - Sorrio e não a respondo. Apenas o pego de sua cabeça e a entrego. - Oh, sim! Eu havia me esquecido.
- A Senhora vai ficar bem, sozinha, por um momento, Mãe? - Ele se aproxima dela, e se abaixa para beijar os seus cabelos, mas ela faz novamente um gesto desdenhoso com a mão.
- Menino impertinente, por que eu não ficaria? - Ele sorri carinhoso para a mãe e assente. - Apesar de gostar muito da companhia da Ângela, eu consigo perfeitamente ficar por alguns minutos, ou talvez até mais do que isso, sozinha.
Vejo-o ficar vermelho e sem saber o motivo, o meu rosto também fica aquecido, mas desvio o olhar e me levanto, acompanhando-o para o interior da casa, mas diferente do que pensei que iria fazer, ele não segue para o escritório e sim para sala, sentando-se no sofá e faço o mesmo, numa distância seguro para a minha sanidade.
No entanto, Matteo fica me olhando por um momento e se o meu coração já estava acelerado por sua aproximação repentina no jardim, agora o sinto ainda mais agitado, mas ele engole em seco e suspira, começando a falar.
- Na sexta-feira eu preciso ir para Alemanha, pois terei uma reunião com o Diretor de um Centro de Pesquisas que estão interessados em fechar negócio com a minha Empresa, ao adquirir ferroliga para Equipamentos Hospitalares. - Assinto e aguardo que continue. - No entanto, ficarei fora por 10 dias e eu gostaria de levar a minha mãe, afinal, ela gosta muito de Frankfurt, porém eu... - Ele hesita por um momento, mas engole em seco novamente e prossegue. - Você poderia me acompanhar a essa viagem? Quer dizer, para ficar com a minha mãe, é claro. - Sorrio do seu embaraço, até mesmo como uma forma de dissipar um pouco o nervosismo que me assolou agora e assinto.
- Claro que sim, Matteo. Não tem nenhum problema em acompanhá-los. - Ele suspira aliviado e sorri. - Sairemos na sexta mesmo?
- Sim, provavelmente no fim da tarde, mas não se preocupe que meu motorista irá buscá-la após o almoço. - Arregalo os olhos por ele adivinhar o que eu iria pedir e ele sorri de lado. - Eu sei que você gostaria de passar um pouco mais de tempo com as suas filhas, até mesmo porque serão 10 dias sem vê-las, estou certo?
- Sim, mas não há necessidade de...
- Eu faço questão, que o motorista lhe busque, ficarei mais tranquilo quanto a isso. - Ele se aproxima um pouco e pega a minha mão. Sinto o meu rosto arder, mas não me afasto do seu toque.
- Tudo bem, obrigada. - Fico presa em seus olhos azuis, mas lembro-me que Rute está sozinha e afasto delicadamente a minha mão da sua. - Há mais alguma coisa que você precise me informar? - Ele nega com a cabeça, mas continua me olhando. - Bom, acho melhor voltar para ficar com a Rute. - Levanto-me e ele faz o mesmo.
- Ângela, eu... - Ele volta a se aproximar, pegando novamente a minha mão, antes de focar seus olhos em mim. - Você gostaria de jantar comigo hoje? - Assusto-me com o seu pedido tão direto, apesar de não ser a primeira vez e eu saber o que ele quer com isso.
- Matteo, nós já conversamos sobre isso e eu não acho apropriado, desculpe-me. - Volto a me afastar de seu toque e dou um passo atrás.
- Ângela, nós dois somos adultos, eu sei a excelente profissional que você é e não há ninguém que nos impeça de uma possível aproximação. Então qual é o problema? Você está preocupada com o que as suas filhas irão pensar, é isso?
- Matteo, você é o meu Empregador e isso não é correto. - Apesar de ter medo do que um simples jantar possa ocasionar, eu completo em pensamento.
- Ângela, o fato de eu ser o seu Empregador em nada impede que possamos jantar. E muito menos quero me aproveitar desse fato para me aproximar de você. Eu pensei que você tivesse percebido o tipo de homem que eu sou? - Percebo que ele ficou magoado, mas essa não foi a minha intenção.
- Essa não é a questão, Matteo, mas eu... - Ele me interrompe pegando novamente a minha mão.
- Tudo bem, Ângela, não quero forçá-la a nada. Eu sou seu amigo antes de tudo, mas você sabe que a minha intenção vai muito além da amizade, pois não gosto de rodeios ou joguinhos e prefiro sempre ser sincero quanto o que eu quero. - Ele suspira e passa a mão em seus cabelos curtos. - Eu sou um homem paciente e esperarei o seu tempo, quando você perceber que as minhas intenções com você são sérias e não apenas um chefe querendo se aproveitar de sua funcionária.
- Eu nunca pensaria isso de você, Matteo, eu só...
- Você não está pronta, eu sei! - Ele acaricia o meu rosto e sorri de lado. - Eu também pensei que nunca estaria pronto e estava conformado com a ideia de apenas cuidar da minha mãe e meu filho, mas então eu te conheci e meus pensamentos mudaram. - Engulo em seco pela intensidade do seu olhar preso ao meu e o cheiro do seu perfume que me inebria. - Mas como você sabe que serei sempre sincero e direto, saiba que eu não irei desistir de você, a menos que você realmente não me veja como nada mais que um amigo e seu Empregador, mas eu sinto Ângela, eu sei que você está tão afetada quanto eu. - Eu não falo nada, afinal, ele tem razão, mas eu não posso. - Estarei no escritório para qualquer coisa que precisar e não se esqueça de trazer o seu passaporte a amanhã, por favor.
Ele beija a minha testa, demorando um pouco mais no contato e se afasta, acaricia o meu rosto mais uma vez e sorrindo de lado, segue para o escritório, deixando-me sozinha na sala, parada igual uma estátua, pois parece que perdi a capacidade de me mover e falar.
(...)
Depois de me despedir da Ana e ouvir as suas insinuações sobre mim e o Matteo, volto para o meu quarto para terminar de fazer minhas malas e penso no que ela disse. Não posso negar que Matteo me atraiu desde a primeira vez que o vi, fazendo-me ter sensações e reações que não senti por nenhum outro homem durante esses 20 anos que estou viúva, mas também não posso negar que eu tenha medo. Medo do que possa acontecer, caso eu me envolva em um novo relacionamento e também sobre a reação da Thaís, principalmente por ela me culpar por ter sido traída e abandonada e consequentemente pela morte de seu pai.
Thaís! Pensei que poderíamos passar um pouco mais de tempo antes que eu viajasse, mas ela simplesmente ignorou o momento que eu contei sobre isso, saiu com uma bolsa grande e disse apenas, "Estou saindo e não volto para casa hoje" e isso faz exatamente dois dias. Não recebi um único e breve abraço de despedida, como Ana fez hoje, antes de ir para Universidade e por um momento, permito-me pensar apenas em mim, como uma mulher de 50 anos que está a 20, sozinha, vivendo apenas para as meninas, no qual uma não faz a mínima questão de estar próxima, quanto à outra demonstra o tempo todo o seu amor por mim.
Será que eu poderia continuar pensando apenas em mim, ignorar a possessividade agressiva da Thaís e me permitir pelo menos ver o que uma possível aproximação com Matteo poderia dar? Não vou negar que me sinto uma adolescente quando estou perto dele. A sua voz, o seu perfume e até mesmo seus toques despretensiosos mexem comigo, mas ainda assim, eu tenho medo.
Mesmo que eu já tenha percebido que ele é um bom homem, porém eu... Interrompo meus pensamentos, ouvindo o som da porta se abrir e fechar em seguida e penso por um momento que a Ana possa ter esquecido algo, ou até mesmo o Padre Lutero que esteja retornando da missa mais cedo, mas me assusto quando vejo quem está entrando em meu quarto de forma apressada.
- Marco! - Coloco a mão no peito para tentar acalmar meu coração e ele se aproxima.
- Desculpe-me entrar assim, Ângela, mas eu vi o momento que Anastásia saiu para ir para Universidade e eu precisava falar com você enquanto estivesse sozinha.
- O que aconteceu? - Vejo que em sua mão há uma pequena caixa e uma pasta.
- Ângela, mesmo que eu não tenha contado nada do que aconteceu para que precisássemos cuidar da Ana, você ainda não se opôs a me ajudar a cuidar dela. Dedicando seu tempo, mudando-se de sua casa para uma Cidade nova, sem medo de enfrentar o que viesse pela frente e sem medo de arcar com as consequências de tudo isso. E você não sabe o quanto sou grato por isso.
- Marco, eu não estou entendendo. Por que você está falando isso agora? O que aconteceu? - Ele suspira e puxa a cadeira do canto da parede para se sentar e eu faço o mesmo, porém em minha cama.
- Hoje eu preciso que você mais uma vez confie em mim e me prometa que irá fazer o que eu te pedir. - Fico atordoada com a intensidade de suas palavras, mas hoje não. Hoje ele não irá me deixar no escuro.
- Marco, você sabe o quanto confio em você e sei que jamais seria capaz de fazer algo errado, mas se essa conversar tiver relação com o passado da Ana, eu quero sabê-lo. - Ele me olha e por seu olhar, eu sei que não está disposto a me contar muito coisa. - Marco!
- Ângela, você sabe que eu nunca fui apenas um Segurança Particular e muito menos apenas um Fuzileiro Naval comum, correto? - Sim, eu já havia percebido isso, apesar de sempre ter respeitado a sua privacidade, mas não falo nada, apenas assinto e ele continua. - Quando comecei a trabalhar na casa dos avós da Ana, eu não fui apenas porque eu queria ter uma vida mais tranquila, longe das missões que constantemente eu precisava ir, mas sim porque eu fui indicado a trabalhar para essa família.
- Como assim? Indicado por quem?
- Isso é sigiloso, mas a questão é que eu me apeguei ao avô dela, por lembrar muito do meu pai, pois ele sempre foi um homem de princípios e caráter invejável. Bondoso, generoso e que amava o filho mais do que tudo e nessa época eu ainda não o conhecia, mas conheci a mãe da Ana, que trabalhava na casa deles, porém essa é uma história que não precisa ser mencionada por enquanto. - Assinto, pois vejo que ele olha em seu relógio, possivelmente por ter que voltar ao trabalho. - O avô da Ana sempre gostou muito dessa jovem, que apesar de vir de uma família humilde, tendo apenas um pequeno rancho onde moravam, era tão pura e carinhosa e gostava muito dele, sem esperar nada em troca ou por segundas intenções, pois eles sempre foram muito ricos.
- A família da Ana é rica? - Arregalo os olhos e ele sorri de lado.
- Você não faz ideia do quanto, Ângela, ainda mais agora que o pai dela conseguiu praticamente quadriplicar seu patrimônio.
- Nossa! Mas então por que... - Ele me interrompe, imaginando que eu iria perguntar o motivo real deles não estarem com a filha, continuando com a história.
- A princípio eu fiz amizade com a mãe da Ana, afinal, ela era uma funcionária como qualquer um de nós, mas então, alguns meses depois, o filho do casal retornou para casa, nas férias, a atração entre ele e a funcionária foi inevitável e você pode imaginar o que aconteceu.
- Sim, eles se apaixonaram, tiveram a Ana e o resto eu não faço ideia, porque você nunca me contou absolutamente nada. - Falo séria, mas ele apenas assente.
- Desculpe-me, Ângela, mas quanto a isso, ainda não irei falar nada, mas voltando ao motivo de eu estar aqui, eu preciso que você guarde isso para mim. - Ele abre a pasta e retira dois envelopes me entregando, juntamente com a pequena caixa que estava em sua mão. - Eu quero que você saiba que tudo que eu fiz, foi para proteger a Ana e tudo que eu vier a fazer será por esse mesmo motivo, pois você sabe o quanto aquela menina é importante para mim.
- Marco, você está me assustando.
- Fique tranquila, Ângela, está tudo bem. - Assinto não muito convencida e ele continua. - Às vezes precisamos tomar atitudes que não nos agradam muito e eu fiz isso há 20 anos, mas se for necessário e isso vier acontecer novamente, não se preocupe, pois como eu disse tudo que eu vier a fazer, será para o bem estar da nossa Borboletinha.
- Marco, seja franco comigo, o que está de fato acontecendo? E não venha me dizer que o quanto menos eu souber será melhor, pois não irei me contentar com isso, não mais. - Ele me analisa por um momento e assente.
- Quando eu comecei a trabalhar para essa família, como eu disse foi por indicação, mas apenas porque a pessoa que me colocou na casa, estava desconfiando de algo que a princípio não foi compartilhado comigo. - Assinto apenas para ele ver que estou acompanhando-o. - Mas então não passou de suspeitas e eu permaneci na casa. No entanto, alguns meses depois, a mãe da Ana foi embora da casa, sem se despedir até mesmo de mim ou do dono da casa. Aparentemente sem motivo e de repente, então eu comecei a observar situações estranhas, conversas sem sentidos por parte de alguns Seguranças e falei novamente com o meu contato.
- Mas por que ela foi embora?
- Não sabíamos, mas então o... Enfim, o dono da casa, pediu para que eu investigasse sobre onde ela poderia estar, pois ele não ficou convencido, quando conseguiu falar com ela por telefone e disse que estava voltando para Kansas, à cidade natal dela, apenas porque o pai estava doente. E assim eu fiz e descobrimos que ela na verdade, estava grávida.
- Ela... Ela traiu o... - Ele nega enfaticamente me interrompendo.
– Não! Claro que não, mas essa história não pertence a mim, até porque nem eu sei o que de fato aconteceu, pois ela sempre foi muito discreta, apesar de eu imaginar que nem o marido dela saiba de toda a história por trás disso ou o que de fato aconteceu, o que eu acredito que eles preferiram enterrar essa parte do passado, preocupando-se apenas em encontrar a filha.
- Não julgo, pois eu faria o mesmo. - Ele assente e continua.
- Mas onde quero chegar com isso tudo, Ângela, é que quando a Ana nasceu eu precisei fazer algo que não me orgulho muito, que foi tirá-la de seus pais e comecei a investigar o porquê de ouvir um dos meus companheiros de trabalho numa ligação, que precisava pegar a criança e dar um fim nela...
- Meu Deus! - O interrompo espantada e ele assente. - Quem mandou fazer isso, Marco? - Ele passa a não na cabeça, quase sem cabelos, frustrado e vejo que isso está o consumindo de alguma forma.
- Por mais que eu seja bom no que faço, eu não consigo chegar à chave de tudo isso. E você não sabe o quanto isso me deixa frustrado, pois parece que o responsável é tão bom quanto eu, mesmo que não saiba quem esteja investigando, ou pelo menos não sabia. - Ele desvia o olhar do meu por um momento e sinto um aperto no coração.
- Marco, o que você não está me contando?
- Nada que você precise se preocupar, mas... Esse envelope há algo que você só irá entregar para Ana, quando ela fizer 21 anos. - Ele muda completamente de assunto, apontando para o primeiro envelope que há o nome dela e continua. - E este você irá entregar para os pais da Ana, quando encontrá-los, juntamente com o conteúdo dessa caixinha, caso algo aconteça comigo. - Analiso o segundo envelope, não havendo destinatário, mas meu coração se aperta com suas palavras.
- Marco, não fale assim. - Ele sorri e pega a minha mão.
- Não se preocupe Ângela, essa é apenas mais uma mania de um fuzileiro naval, no entanto nada irá acontecer e com certeza eu mesmo irei entregar isso a eles. - Ele se levanta e eu faço o mesmo. - Agora eu preciso ir, pois sei que você tem que continuar a organizar suas malas para viajar.
- Marco, fala-me quem são os pais da Ana. Eu não irei falar nada para ela e muito menos tentarei saber mais sobre eles, mas eu preciso apenas saber o nome deles, por favor! - Ele suspira e assente.
- Tudo bem, eu devo isso a você, mas terá que me prometer que nunca irá pronunciar esses nomes na presença dela e esquecerá por enquanto quem são.
- Eu prometo! - Falo com sinceridade, pois jamais trairia a confiança dele.
- Os pais da Ana, são Carla e Raymond Steele. E hoje é uma das famílias mais ricas de Seattle. - Arregalo os olhos e ele sorri de lado. - O pai dela é conhecido como o Rei do Petróleo, Ângela, por ser o maior Empresário do ramo petrolífero do nosso País, com indicação que seja inclusive o maior do mundo.
- Meu Deus! - Coloco a mão na boca, pois jamais imaginei isso.
- Agora você entende que tudo que tenha acontecido no passado e que ainda poderá acontecer no futuro, caso eu não faça o que for necessário, tem ligação com ambição e poder? Que seja quem mandou que acabassem com um bebê e que acredita que esse bebê está morto poderia ser capaz de fazer tudo para alcançar os seus pais, se souberem que ela está viva, apenas por interesse ao patrimônio deles?
- Marco, isso é muito sério. Então eles nunca poderão saber que ela está viva. E se alguma coisa acontecer com ela?
- Não se preocupe Ângela, quando a Ana for maior de idade em todos os sentidos, isso quando ela fizer 21 anos de idade, há um documento que garanta a segurança dela, mas antes disso é arriscado que ela apareça e conheça seus pais.
- Não estou entendendo. Como você sabe desse documento? - Ele arregala os olhos por ter dito demais e se aproxima beijando a minha testa.
- Esqueça isso, pois eu tenho tudo sob controle, Ângela. A única coisa que você precisa saber é que sempre a manterei em segurança ou morrerei para garantir que isso aconteça.
Ele não espera que eu fale mais nada e sai do meu quarto e eu pisco atordoada com tudo que ele disse, mas sinto um arrepio estranho percorrer minha coluna, sentindo o peso de suas palavras. No entanto eu ignoro isso e guardo os envelopes e a caixinha que ele me entregou e sei que posso confiar nele. Eu acredito que ele fará até mesmo o impossível para sempre manter a Ana segura e bem, pois aquela menina é sem dúvida a vida dele.
Ah, Ângela! Manda a Thaís ir para a China e vai ser feliz, pelo amor de Deus 🙄🙄! Vai desperdiçar essa oportunidade com um homem desse, que também quer ser feliz 🤔🤔? Pois já pudemos sentir que o passado do Matteo também não foi fácil, não é mesmo 😏😏?
Vixi! Marco cheio de mistérios e com palavras profundas! Bom, já sabemos o que aconteceu depois desse encontro, não é 🤧🤧🤧?
Ps.: Meninas, este seria o último capítulo bônus da Ângela, porém ele ficou com quase 10 mil palavras e achei melhor dividi-lo. No entanto ainda teremos mais um capítulo da Tia Ângela na sexta-feira, ok? Até mesmo porque eu sei que é o momento que vocês estão esperando, que é o encontro da Ângela com os pais da Ana 😜😜!
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