Capítulo - 49
Sempre acreditamos que o nosso sofrimento é maior do que de outra pessoa. Sempre acreditamos que ninguém nos entende, por não ter passado o que passamos e por muitas vezes nos trancamos, nos isolamos e afastamos as pessoas que amamos por nos fazer de vítimas das situações, ou até mesmo por acreditar que dessa forma estamos nos resguardando de futuras decepções.
No entanto, eu pude confirmar o quanto eles foram fortes em meio ao turbilhão de emoções que passou a serem suas vidas, ao ouvir a história de Raymond e Carla desde que tiveram a filha sequestrada e se não bastasse isso, Raymond ainda teve que enfrentar o luto por perder o pai de forma tão hedionda, assumir suas responsabilidades na Empresa que passou a ser sua, anulando a sua própria dor para que não demonstrasse fraqueza e deixar a sua Esposa se afundar ainda mais no sofrimento e mesmo assim, desistir nunca foi uma possibilidade, pois eles sempre acreditaram que iriam encontrar a filha em algum momento.
Ouvir tudo isso apenas me fez ter a certeza do quanto eu estava sendo egoísta com a minha família, por ter me afastado deles – por uma mulher que não valia a pena, o meu tempo –, por tê-los magoado, os tratado com indiferença e tão friamente. Isso me fez ver também o quanto eu tenho sido um péssimo filho e irmão. Porém devo admitir que eu estivesse tentando não recuperar o que passou, mas tentando não mais errar, apesar de ter certeza que ainda poderei fazer isso, afinal, sou humano e tal qual como, estou longe de ser perfeito.
Estando nessa sala, sentindo a intensidade das palavras do Raymond, presenciar o choro sentido de Carla e Anastásia que aperta a minha mão como se eu fosse a sua âncora, para que dessa forma ela não se perdesse em seus pensamentos e angustias por ouvir a sua história faz com que eu perceba que Richard estivesse mesmo certo, sendo que eu precisei passar por tudo que passei para me fortalecer, pois dessa forma eu serei capaz de ser o porto seguro que ela precisa que eu seja.
Eu posso não ter conhecido o Padre Lutero, o Marco ou a Ângela como os meus irmãos, mas pela forma que vejo como a Anastásia foi criada, eu posso dizer que eles eram boas pessoas, o que me faz ter pensamentos dúbios em relação às atitudes do Marco, sendo que ele foi o responsável pelo sequestro de uma criança e a mantendo longe de seus pais durante 20 anos. Porém eu tenho convicção que suas intenções – mesmo que suas atitudes tenham sido erradas –, foi por uma boa causa, afinal, a segurança dela era de fato a prioridade.
Eu consigo entender a revolta e o sentimento de ter sido traído pelo homem que Raymond tinha como um amigo, por outro lado, é impossível negar que esse mesmo homem amava a Anastásia e que sempre fez tudo por ela, disposto a arcar com consequências dos seus atos – se não tivesse sua vida ceifada como teve –, se isso garantisse que ela estivesse sempre segura e protegida. E é pelo amor que a Ana sente por eles, que não permitirei que a Ângela seja incriminada, até mesmo porque não sabemos até que ponto ela está envolvida ou tem conhecimento de toda essa história.
Mas eu conheço o Raymond e sei que ele jamais seria capaz de fazer algo que pudesse magoar a sua filha – e posso usar esse termo, por não ter nenhuma dúvida que de fato ela seja –, sendo que se ele insistisse em fazer algo contra a Ângela, ele poderia perdê-la, antes mesmo de conquista-la como tal.
No entanto ver que o responsável por Ana estar magoada, por ouvir que eu havia solicitado um levantamento de seus antecedentes me deixa angustiado e me sinto culpado por vê-la perdida em pensamentos, ainda mais quando ela tentou se afastar do meu toque. Não posso negar que a princípio eu tenha sim feito isso para preservar o meu irmão e depois foi para tentar me convencer que poderia haver alguma coisa para afastá-la em definitivo antes que eu pudesse sequer me aproximar, mas agora... Não consigo me imaginar longe dela, mesmo que tenhamos tão pouco tempo juntos, apesar de que a sensação de reconhecimento faz parecer que nos conhecemos há muito tempo.
E mais uma vez não consigo parar de pensar que a culpa por eu agir como um idiota inseguro, paranoico e controlador sejam daquela mulher. Que foi por causa dela que eu me transformei em um homem amargurado e que afasta as pessoas sem muito esforço. Eu sinto a raiva querer se apoderar de mim, ciente que eu posso perder a Menina-Mulher que alcançou o último resquício de bondade que havia dentro de mim justamente por eu ser um homem frio e que por muito tempo tivesse esquecido que havia um coração capaz de sentir o que estou sentindo agora.
– Pode parar com isso, Christian! – Pisco algumas vezes e encaro Richard que chama a minha atenção assim que Anastásia e seus pais saíram da sala.
– Parar com o quê?
– Eu sei muito bem o que você está pensando nesse momento, mas a Ana irá entender os motivos que o levou a fazer um levantamento dos antecedentes dela, e ela não irá te deixar. – Eu nego com a cabeça e suspiro.
– Por quanto tempo ela irá entender as minhas razões ou os meus motivos? Toda vez que eu agir como um babaca, Richard? Você viu o quanto ela ficou magoada? Tanto que ela tentou se afastar de mim e isso me incomodou.
– Christian, vocês estão começando a ter um relacionamento agora e ainda terão muito que aprender um do outro. – Não falo nada, apenas fico o encarando. – Mas você tem que aprender a ter mais fé nos seus sentimentos e acreditar que os dela são tão verdadeiros quanto os seus e que se tiverem diálogo e saberem resolver as diferenças, tudo será mais fácil. É assim que funciona se você quer que o seu relacionamento com a Ana dê certo.
– Além do mais, Christian, a Ana entenderá que foi graças a esses levantamentos que você fez que foi possível chegar à conclusão que ela era a filha que Raymond e Carla estavam procurando por 20 anos. – Caleb que chegou a pouco, fala sério como poucas vezes acontece e eu assinto.
— Sabe, Christian? Quando a Ana contou que vocês haviam se beijado, naquele dia no aniversário do Richard, confesso que eu tenha ficado com receio que apenas ela poderia estar apaixonada e no fim sair machucada caso não fosse correspondida. — William, que esteve calado desde que Raymond começou a contar a sua história, começa a falar. — Quando conheci a Ana na Universidade há dois anos, eu senti uma conexão imediata com ela e isso no início gerou até mesmo um desconforto com a Eloise. — Arqueio uma sobrancelha para ele que sorri de lado e nega com a cabeça. — Não precisa se preocupar, porque irei te falar o mesmo que falei para a minha namorada. Eu sentia que deveria proteger a Ana, como eu faria com a minha irmãzinha se ela estivesse aqui, mesmo que eu fosse mais calado e reservado, porém sempre estive atento a ela, dividindo esses cuidados com o seu irmão que a via da mesma forma.
– Claro! Aquela peste me conquistou desde o momento que a salvei de trombar com uma pilastra que não iria sair da frente dela. – Caleb fala com o seu sorriso debochado, e eu apenas nego com a cabeça, enquanto William dá risada.
— Mas a questão é que hoje consigo entender que de fato a conexão, a familiaridade que tive com a Ana, foi mesmo fraternal. Porque ela é a prima que aprendi a amar, desde que a minha Tia estava grávida, quando eu tocava a sua barriga e ela chutava a minha mão. — William continua e vejo seus olhos marejados, mesmo que esteja sorrindo. — Da mesma forma que consigo ver que os sentimentos que a Ana tem por você, Christian, são correspondidos, porque você está tão apaixonado quanto ela. — Sorrio de lado mesmo me sentindo incomodado com a sua observação, porém não posso negar, e ele continua. — E devo admitir que, é impossível negar o laço muito forte que vocês desenvolveram em tão pouco tempo, e é por essa razão que digo, que se você ainda não percebeu, logo irá perceber o quanto aquela Menininha é especial e que não se abala por pouco. — Ele fala com tanta certeza que me faz sentir um pouco mais aliviado. — E nesses dois anos que conhecemos a Ana... — Ele para de falar e olha para Caleb que concorda com um sorriso. — Sabemos que ela sempre tentará conversar com você antes de ficar de fato chateada ou se afastar, porque acredite se até mesmo com a Thaís, sendo uma desequilibrada, ela nunca a tratou mal ou sequer se afastou, pode ter certeza que com o homem que ela é apaixonada não será diferente, mas eu só te peço uma coisa, seja sempre sincero e nunca minta para ela. — Eu assinto, porque isso jamais passou por minha cabeça.
– Ah! E cuidado com os dentes, pois aquela peste morde se estiver irritada.
Caleb fala, rindo em seguida, sendo acompanhado por William e eu fico sem entender, mas antes que eu pergunte sobre o que ele está falando, o telefone do William começa a tocar e ele pede licença, dizendo ser a sua namorada e sobe as escadas, deixando-me com os meus irmãos.
– Christian, eu sei que esse é um assunto que você não gosta de falar, mas você precisa contar para a Ana sobre o seu passado. – Richard volta a falar depois de alguns minutos de silêncio na sala e Caleb me olha sério também, mas eu me levanto sentindo-me sufocado.
– Richard, esse assunto em nada irá influenciar no meu relacionamento com a Anastásia. – Soa mais rude do que eu gostaria e ele suspira.
– Você tem razão, mas mostrará que você confia nela e que está disposto a seguir em frente. Mostrará que o seu passado não tem mais peso sobre a sua vida e muito menos que poderá atrapalhar o seu relacionamento por possíveis mal-entendidos. – Não respondo nada, mesmo que eu já estivesse pensando em conversar sobre isso com ela, mas ainda não é o momento e muito menos estou pronto para tocar nesse assunto, por essa razão apenas fecho minhas mãos em punho controlando a minha irritação.
– Transparência, diálogo e sinceridade, lembra, meu irmão? – Caleb pergunta e antes que eu responda, ouvimos passos se aproximando.
Sinto um solavanco no peito quando seus olhos azuis encontram os meus e a passos rápidos ela caminha em minha direção me abraçando, fazendo com que eu solte a respiração que nem percebi que havia prendido e a envolvo em meus braços. Ela se afasta e me dá um sorriso que tranquiliza o meu interior e sinto que ela está tentando me consolar por alguma razão, quando na verdade, eu que deveria estar dando-a apoio e demonstrando que estarei ao seu lado. Principalmente agora que ela deve estar cheia de receios e incertezas de como será ao lado de seus pais, mas por ora, eu fico apenas preso no encanto de seus olhos fixos nos meus, que através do silêncio, falam tanto e nada ao mesmo tempo, mas que me deixa satisfeito, apenas por olhá-los e tê-la em meus braços.
(...)
Depois que Alana, avó da Ana, chegou e as apresentações foram feitas, fomos convidados para ficar para o almoço e eu sei que tanto Carla quanto o Raymond querem passar o máximo de tempo ao lado da filha e eu percebo que eles estão cautelosos por medo de pressioná-la e afastá-la, antes que pudessem estreitar seus laços, que poderá levar um tempo até que Anastásia se acostume com a sua nova realidade.
Pude observar também a forma que Alana esteve avaliando a Anastásia durante o tempo que ficamos à mesa, como se ela não estivesse convencida de que ela fosse de fato sua neta. Mas quanto a isso não há a menor dúvida, o que será com toda certeza confirmado com o resultado do Exame de DNA. Porém, não vou negar que eu tenha ficado um pouco incomodado com o seu tom de voz quando disse tê-la conhecido na Loja da Vanessa, mas logo mudou de postura quando Raymond disse que ela era a filha que esteve procurando por todos esses anos.
Carla apresentou Anastásia a sua madrinha de consideração, Margarida, que também é Governanta da casa, que esteve conosco durante o almoço, afinal ela não é apenas uma funcionária, mas também um membro da família na qual Carla e Raymond tem tanto apreço. Opinião que pude perceber não ser compartilhada por Alana, que demonstrou não estar satisfeita em dividir a mesa com Empregados — palavras dela e não minhas —, mas que logo foi repreendida por Raymond, encerrando o assunto.
Por um momento, a tensão pairou no ambiente, mas logo foi amenizada com as perguntas que tanto Carla quanto Raymond faziam a filha, sobre a Universidade e seu trabalho, evitando falar sobre a sua infância e os seus Tios. E aos poucos fomos contemplados com o seu sorriso e carisma ao conversar com seus pais. Talvez não demore tanto tempo como pensei para que eles sejam, enfim, a família que deveriam ter sido desde o início.
– Christian, Richard, podemos conversar por um momento no meu Escritório? – Raymond pergunta assim que retornamos à sala e assentimos. Viro-me para Anastásia e sorrio, antes de selar seus lábios com os meus, deixando-a com as bochechas coradas.
– Seu expediente na Loja começa às 14h00, não é? – Ela assente e verifico o horário, vendo que falta um pouco mais de uma hora.
– Christian, eu posso levá-la, não se preocupe. – Caleb se pronuncia e eu penso por um momento.
– Você está com a sua Escolta? – Ele revira os olhos e bufa, mas assente e vejo que Ana ficou confusa, talvez nunca tenha os percebido.
– Como se eu pudesse despistá-los tão fácil.
– Tudo bem. – Respondo a contragosto, mesmo querendo eu mesmo deixa-la na Loja, mas sei que o que Raymond tem para falar é importante. – Irei buscá-la à noite, mas qualquer coisa me ligue tudo bem? – Ela sorri e assente e mesmo tendo a atenção de sua família em nós, eu a envolvo em meus braços.
– Não precisa se preocupar, Christian, eu ficarei bem.
Dou um beijo casto em seus lábios, mas nos afastamos assim que ouvimos um pigarrear e vemos Raymond, sério e com os braços cruzados nos observando e não apenas ela ficou envergonhada, mas eu também, afinal, essa é a primeira vez na minha vida que preciso lidar com um sogro, mas ouço a risadinha da Carla, por saber que o marido fez de propósito e confirmo isso por ver a sombra de um sorriso em seus lábios.
No entanto, eu ignoro a tentativa que Raymond teve para me intimidar e direciono a minha atenção para Caleb, que assente discretamente o meu pedido mudo, ciente que ele deve ficar com Anastásia até que ela esteja em seu trabalho, pois não quero que ela se sinta desconfortável por ficar sozinha com a família que ela ainda precisa reconhecer como sua e assim, caminho com Raymond e Richard – que pegou novamente a pasta preta que chegou com ela em mãos sobre o aparador – até o seu Escritório.
(...)
– Eu achei melhor não aprofundar sobre o assunto, pois não queria que Anastásia ficasse incomodada com o que poderia ouvir sobre o Marco, mas depois de estar com a cabeça fria e pensar com coerência, estou intrigado com algo que li na carta que ele enviou tanto para ela quanto para mim. – Raymond fala assim que nos acomodamos no Escritório e aguardamos que ele continue. – Ele afirmou que estava protegendo-a, mas eu não consigo entender, como ele chegou a essa conclusão, que um bebê precisava ser protegido? Como ele estava no exato momento em que Carla deu entrada na maternidade e pegou a nossa filha logo depois do parto?
– Raymond, eu tracei várias possibilidades do que poderia ter acontecido e nenhuma delas me leva a ter certeza do que aconteceu de fato. – Richard quem responde e prestamos atenção para que ele continue. – Mas você por um acaso não pensou o porquê da Carla não ter te contado sobre a gravidez? Será que ela não poderia ter sido ameaçada e o Marco possa ter escutado? Ou até mesmo ela possa ter contado para ele, sendo que ambos trabalhavam na sua casa na época em questão e talvez pudessem ser amigos? Você já conhecia o Marco antes de receber a ligação daquela mulher avisando que Carla estava no Hospital e retornar para Seattle? – Raymond pensa por um momento, mas nega com a cabeça.
– Quando eu voltei para casa, na intenção de buscar ajuda com o meu pai para encontrar a minha filha, eu estava tão atordoado que não observei muito quem seria o Segurança Novato que me aguardava, mas depois eu me lembrei de que da última vez que eu estive com a Carla, ele já trabalhava na casa, mas não tivemos muito contato, sendo que o meu tempo era apenas para ficar com ela e meus pais. – Assentimos e ele continua. – E sobre a gravidez, a Carla alegou apenas que não queria que eu voltasse antes de concluir a minha Especialização, sendo que faltava tão pouco, pois dessa forma ela acreditou que eu não precisaria ficar dividido entre o que deveria fazer e o que queria fazer, mas nada sobre ameaças, caso contrário, ela teria me contado.
– É complicado traçar uma linha de investigação quando não se tem um início para começar. – Richard fala frustrado e eu não estou diferente. – Sem o Marco, não saberemos o que de fato aconteceu, no entanto, Raymond, seja quem for e se de fato ela estiver correndo perigo, como ele frisou diversas vezes em ambas as cartas, se manteve oculto por todo esse tempo, pois nunca tentaram se aproximar da Ana de qualquer forma.
– E se o motivo para que ninguém tivesse tentado se aproximar dela, foi por que o Marco sempre tomou as medidas necessárias para mantê-la longe e segura? – Eu falo e Raymond me encara temeroso, pois ele deve ter pensando o mesmo.
– Isso é uma possibilidade, Christian. – Richard concorda e prossegue em seguida. – Ele teve todo um trabalho para mantê-la longe de Seattle e eu acredito que se ela não tivesse sido aceita na Universidade e escolhesse vir para a Cidade, ele a manteria em Portland até que ela completasse a maioridade.
– Isso é outra questão que eu não consigo entender. – Raymond se levanta e passa a mão nos cabelos, frustrado. – Se ele queria mantê-la longe até que ela completasse 21 anos, a ponto de querer leva-la para o Brasil, por que permitiu que ela viesse para Seattle?
– Raymond, durante o tempo que conheço a Ana, eu não me encontrei com o Marco, mas de uma coisa você pode ter certeza que tanto a Ângela quanto o Padre Lutero jamais negariam algo que fosse da vontade dela, ainda mais se tratando de sua formação acadêmica, desde que não a colocassem em situações de risco, tanto que ambos abandonaram suas vidas em Portland apenas para acompanhá-la. – Richard o responde e ele assente, sentando-se novamente.
– Estou começando a acreditar que essas pessoas realmente amavam a minha filha. – Ele fala num tom amargurado, soltando um suspiro cansado em seguida.
– Pode ter certeza que sim, Raymond. – Richard afirma e ele o encara. – Quando você conversar com a Ângela verá que ela ama a Ana, tanto quanto ama a própria filha e com o Padre Lutero não era diferente, sem contar que ele era um homem muito sábio e bondoso. Realmente ele foi um grande homem.
– E você, Christian, os conheceu também? – Eu suspiro e balanço a cabeça em negação.
– Não! – Eu estava mais preocupado enterrado na minha própria miséria e me isolando do mundo, penso, mas não verbalizo. – Porém é impossível negar o amor que Anastásia tem por eles. – Ele assente e suspira resignado. – Mas há outra questão, Raymond, que eu preferi não mencionar na sala que é referente à quantia que há em uma conta no Banco de Portland em nome da Anastásia e se eu lembro bem, o Marco disse na carta, para que ela não se preocupasse, pois não havia feito nada ilegal, além dos documentos falsos.
– Quantia? Quanto? – Olho para Richard que pega a pasta com os levantamentos dos antecedentes de Anastásia, entregando para ele que começa a lê-los de imediato. – Pelo que consta aqui, há apenas entrada, mas nunca retirada e isso começou quando ela tinha apenas sete dias de vida. – Ele levanta o olhar para nos encarar e assentimentos, mas logo volta a ler os documentos, antes de focar sua atenção em nós novamente. – Anastásia sabe sobre isso? – Negamos com a cabeça e ele joga a pasta sobre a mesa. – Onde ele conseguiu esse dinheiro? – Ele murmura com um olhar perdido e ficamos em silêncio, dando o tempo que ele precisa para absorver o que acabou de ler. – Marco sempre foi um funcionário leal, nunca deu motivos para que desconfiássemos da índole dele, além de eu tê-lo como um amigo. Porém eu não vou negar que ele sempre demonstrou certa tristeza no olhar e por diversas vezes, o peguei com a mesma expressão triste enquanto olhava para mim e Carla, mas eu atribuía isso a um possível trauma por ter sido Fuzileiro Naval ou até mesmo por ter perdido o pai em Campo, mas agora eu vejo que o que ele sentia era culpa. Ele se sentia culpado por saber todo esse tempo onde estava a nossa filha, mas preferiu permanecer calado. – Ele fala irritado e eu o entendo, mas ele está vendo apenas o lado negativo dessa história, mesmo que não há nada de positivo no final de contas, não para um pai que ficou 20 anos longe de sua filha.
– Raymond, vamos pensar um cenário diferente, onde o Marco não tivesse "sequestrado" a sua filha e quem quer que seja que estivesse disposto a fazer mal a ela, tivesse obtido êxito. – Ele não fala nada, apenas absorvendo as minhas palavras. – Você parou para pensar que poderiam tê-la matado, não apenas a Anastásia, mas a Carla também? Você mesmo disse que durante sete meses manteve contato com a Carla apenas por telefone e dessa forma, você nem saberia o que de fato teria acontecido, sendo que poderiam muito bem dizer que perderam as duas na sala de parto, ou quem sabe, quem quisesse fazer mal a ela, se a intenção fosse atingir a sua família por causa da sua fortuna, como ele também ressaltou na carta que te enviou e a maltratassem, um bebê indefeso, até que tivessem o dinheiro que queriam.
– Christian! – Richard me repreende, por eu estar sendo duro e suspiro, mas Raymond nega com a cabeça.
– Não, Richard, o Christian tem razão. – Raymond passa as mãos no rosto e vejo o quanto esse assunto é desgastante para ele. – Eu estou apenas focado na raiva, porque o Marco tirou a nossa filha de nós e a manteve longe por 20 anos. No entanto essa ameaça sendo real como ele alegou ser, eu deveria agradecê-lo por tê-la salvado, mesmo achando tudo isso sem sentido, mas... Mas não é fácil, saber que perdi 20 anos da vida da minha filha, ainda mais por saber que ele com toda certeza esteve presente em todos os acontecimentos da vida dela. Os primeiros dentes, os primeiros passos, as primeiras palavras, os aniversários, tudo. – Engulo em seco por ver uma lágrima deslizar por seu rosto que logo a trata de secar e respirar fundo. – Eu só queria saber por quê? Por que quiseram fazer mal logo a minha filha?
– Raymond, nós entendemos e estamos preocupados com essa situação também. – Eu falo tendo a atenção dos dois novamente em mim. – Desde o momento que eu percebi que a Anastásia poderia estar correndo perigo de alguma forma, isso tem me assombrado, antes mesmo que eu pudesse sequer cogitar a possibilidade de ter um relacionamento com ela, pois ela era amiga do meu irmão gêmeo, sendo alguém importante para ele e eu...
– Se apaixonou por minha filha. – Ele afirma me interrompendo, com uma sobrancelha arqueada e Richard sorri de lado, me deixando envergonhado. – Depois iremos conversar sobre isso, Christian Grey, pois agora que tenho a minha filha de volta, ela veio acompanhada com um genro no pacote? Eu não sei se isso me agrada muito, pois ela só tem 20 anos. – Ele fala sério e sinto a irritação querendo me dominar e antes que eu consiga me controlar me levanto apoiando minhas mãos sobre a mesa para poder olhar em seus olhos azuis, tão iguais ao de Anastásia.
– Com todo respeito, Raymond, ela é sua filha e eu sei que vocês querem recuperar o tempo perdido, mas nada que você disser irá fazer com que eu me afaste dela, a não ser que ela me peça isso. – Ele fica em silêncio, apenas me olhando, mas vejo algo brilhar em seus olhos, porém estou irritado demais para decifrar o que possa ser.
– Ei! Fique calmo, Christian, o Raymond está apenas brincando. – Richard se levanta e coloca a mão no meu ombro me afastando da mesa e Raymond solta uma gargalhada, me deixando confuso, porém ainda irritado.
– Desculpem-me por isso, mas você continua o mesmo irritadinho de quando era criança, Christian. – Ele fala depois de controlar o riso e eu apenas o encaro. – Eu disse a você naquele dia que fico feliz que a minha filha tenha uma pessoa como você e eu sei que vocês estão apaixonados. Eu não tenho nenhuma intenção em querer separá-los. Mas, agora, sentem-se, por favor, pois ainda temos que conversar sobre a Segurança da minha filha, pois sendo real ou não essa possível ameaça, não pretendo arriscar em perdê-la, logo agora que a temos de volta. – Eu respiro fundo e me sento novamente e meu irmão faz o mesmo. – Mas antes, Richard, você chegou a verificar sobre aquele casal, Mayara e Demétrio Alencar, que o Marco mencionou na carta da Anastásia, para que ela ligasse quando chegasse ao Brasil?
– Sim, Raymond, porém antes do número ficar desativado, que ocorreu um dia após a Ana receber a carta e por mais que tentássemos rastrear de onde veio à última localização, o sinal estava em vários lugares ao mesmo tempo e não apenas no Brasil, mas em outros Países também, impossibilitando executar a triangulação. – Encaro meu irmão, pois eu não sabia dessa informação, mas pelo olhar afiado que ele direciona a mim, eu sei que não devo fazer perguntas agora.
– Como isso é possível? Se este era o número para ela entrar em contato, pois o que eu pude entender, eles iriam protegê-la, até que eu fosse encontra-la em seu 21º aniversário e eram pessoas de confiança do Marco. – Raymond fala confuso, mas Richard apenas nega com a cabeça.
– Raymond, eu preciso que você confie em mim, mesmo que eu não tenha todas as respostas para as suas dúvidas agora, mas eu posso te garantir que esse casal não estava sozinho para fazer a Segurança da Ana na ausência do Marco e arrisco dizer que há outras pessoas envolvidas que estavam cientes dos passos dela, inclusive que ela não acatou a ordem do Tio em ir para o Brasil. – Raymond tenta se pronunciar, mas meu irmão o interrompe. – Por enquanto eu prefiro ter certeza de tudo isso que estou dizendo, Raymond, mas por ora, podemos apenas discutir como será a Segurança da Ana a partir de agora.
Raymond assente, por saber que pode confiar no meu irmão, assim como confio, e passamos mais um tempo discutindo sobre as medidas que tomaremos para manter Anastásia segura, mesmo que eu já tenha falado para Taylor contratar uma Segurança para ficar responsável por ela.
No entanto, Raymond quer estar a par da situação, o que imaginei que não seria diferente. Afinal, ela é a filha dele, mas também é a mulher que está dominando a cada dia que passa mais o meu coração, e eu não iria de forma alguma permitir que algo pudesse me afastar dela, sendo uma ameaça real ou apenas excesso de proteção do Marco.
(...)
– Christian! Graças a Deus! Eu já estava prestes a mandar uma Equipe de resgate, os Bombeiros ou até mesmo a SWAT, pois o seu sumiço em plena quarta-feira estava me preocupando. – É a primeira coisa que Aleksander fala, assim que retorno a sua ligação.
– Eu estava ocupado, Aleksander, mas fala de uma vez o que você quer?
– Seu grosso! Eu vou pedir o divórcio, pois além de ter me trocado por aquela morena de olhos azuis, que por sinal é muito linda, ainda me trata mal, não me dando a devida atenção que eu mereço.
– Aleksander! – Falo irritado, pois ele nunca muda esses dramas e brincadeiras fora de hora.
– Tudo bem, seu insensível. – Eu respiro fundo, pedindo por paciência e ele dá uma risada do outro lado da linha. – Eu te liguei para falar que o Heitor ligou, antecipando a reunião com o Senador Salazar para hoje. Ele disse que o pai precisa voltar para New York amanhã e não queria ir embora antes de ter essa reunião com GNIH e a outra Empresa que também estará presente.
– Para que horas você marcou?
– Para as 18h00 no Four Seasons Hotel. – Verifico a hora e percebo que não terei tempo de ir para Empresa, sendo que demorei mais do que imaginei na casa do Raymond. – Ele reservou a sala privada no Restaurante e eu já estou a caminho, pois pensei que você não fosse chegar a tempo, caso eu não conseguisse falar com você.
– Tudo bem, eu te encontro no Saguão. – Despeço-me e desligo o celular tendo os olhos de Taylor desviando do trânsito para me olhar rapidamente pelo retrovisor interno do carro. – Taylor, vamos para o Four Seasons Hotel, terei uma reunião com o Senador Salazar daqui a pouco.
– Sim, Senhor!
– Você conseguiu ir até a Tiffany & Co., como eu havia pedido?
– Afirmativo Senhor.
Ele pega uma sacola sobre o banco do passageiro e me entrega, fazendo o meu coração acelerar por saber o que está dentro dela. Assim que abro a pequena caixinha azul, vejo as alianças que significam muito mais do que eu imaginei que poderia significar e devo confessar que não vejo a hora de oficializar o meu relacionamento com a Anastásia, apesar de considera-la como minha namorada desde o momento que confessei meus sentimentos por ela.
– Obrigado, Taylor.
Ele apenas dá um aceno de cabeça e continuamos o trajeto em nosso silêncio confortável, no entanto, por mais que eu não tenha ido para a minha Empresa, sinto-me cansado mentalmente, afinal, tratar de uma possível ameaça que até agora é invisível nos faz andar sobre um fio em direção ao desconhecido.
Mas eu entendo a apreensão de Raymond – que é a mesma que a minha –, pois perder a Anastásia não é uma possibilidade, mas como disse o meu irmão, ninguém tentou se aproximar dela por nenhuma razão até agora, o que não descarto a possibilidade disso ter acontecido devido às cuidados que Marco teve em mantê-la segura.
Porém não podemos simplesmente ignorar que algo está por vir, só não sabemos quando, nem de onde virá, ou muito menos a razão para isso acontecer, como pode também não ser absolutamente nada, o que levaríamos a pensar que isso seria excesso de proteção ou simplesmente paranoia do Marco e para ser sincero, não acredito muito nessa opção.
– Boa noite, Senhor, seja bem-vindo ao Four Seasons Hotel! – O Manobrista me cumprimenta assim que abre a minha porta em frente ao Hotel, fazendo-me acordar de meus pensamentos. – Alguma bagagem, Senhor?
– Boa noite. Nenhuma bagagem.
Ele assente e pega as chaves com Taylor, saindo com o carro em seguida, enquanto caminhamos para o interior do Hotel e logo vemos Aleksander sentado em um dos grandes sofás que há no Saguão nos aguardando e assim que percebe a nossa presença, caminha em nossa direção, mas percebo que alguma coisa está errada.
– Christian, você vai precisar manter a calma, pois... Merda! – Ele se interrompe olhando para algo atrás de mim, mas antes que eu me vire, alguém fala a minhas costas fazendo o meu sangue ferver assim que ouço sua voz sarcástica.
– Como vai, Grey?
Eita que o Senhor Esquentadinho ficou bravinho com o sogrão 🤭🤭🤭!
Mas como tudo que é ruim, ainda pode piorar, quem será esse ser que incomoda o Senhor Gelo 🤔🤔🤔?
Ai, ai! Esse tem medo de ser congelado não viu 🙄🙄🙄!
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