Epilogo • Pós-crédito
Aiden despertou com o canto dos pássaros, respirou fundo enquanto esfregava os olhos sentando-se na cama lentamente. Uma das paredes do quarto dava uma bela vista, com uma grande janela que ocupava quase que a parede inteira, o lado de fora mostrava belos tons de verde, quase que brilhando com a luz do Sol batendo sobre as folhas das árvores. Ele sorriu enquanto levantava-se da cama lentamente, e vestiu uma calça e camiseta, em tons de um azul turquesa. Prendeu o cabelo em uma trança embutida — ainda mantinha o seu moicano platinado, porém estava maior, caindo até abaixo do pescoço.
Com um apertar de um botão pequeno na cabeceira da cama, o cantor dos pássaros silenciou-se e a janela enegreceu, mostrando a verdadeira paisagem do outro lado do vidro — Alexandria. Ele saiu do quarto e dirigiu seus passos até a cozinha, avistou Caliope sentada à mesa em seu desjejum. Aiden sentou-se de frente para ela.
— Bom dia. — Ele sorriu, pegou um pote e encheu de cereais e leite.
— Bom dia. — Ela devolveu o sorriso.
— Alguma novidade? — Ele olhou ao redor — Parece que Stalker saiu cedo...
— Uma reunião com o Conselho foi convocada está manhã.
— Algo urgente? — Ele arqueou uma sobrancelha.
— Eu não sei... — Ela quase sussurrou.
Aiden sorriu e cruzou os braços. Ele olhou fixamente para Caliope; a jovem desviou o olhar, respirando fundo.
— O Stalker não queria te preocupar com isso, mas parece que Arcádia está dando problemas com o novo acordo.
Aiden manteve-se em silêncio, ainda olhando-a, como quem espera por mais.
— Há alguns boatos de que devam abrigo político para fugitivos de Alexandria.
Aiden ainda esperava por mais.
— Parece se tratar do Corvo.
- Então Arcadia não aceitou o Novo Tratado Revolucionário dos Super-atos e Normatizas, mas abrigaram o Corvo? Algo não faz sentido. O que você está ocultando, Cali?
— Nada... — Ela desviou o olhar.
— Suas visões não disseram nada?
Ela balançou a cabeça em negação. Aiden respirou fundo, encheu a boca com o resto dos cereais e dirigiu-se para a lava louças. Caliope o acompanhou com os olhos, havia algo em seu rosto que Aiden não conseguia entender, e isso lhe deu um aperto no peito.
— Eu vou para a reunião. — Ele disse quase que resmungando.
— Ela está sendo transmitida ao vivo, como todas as outras. Não há a necessidade de subir até lá.
— Mas eu preciso falar com eles.
— Você pode...
— Cali, eu quero ir lá. — Ele a olhou com certa angústia. A garota abaixou a cabeça.
Aiden caminhou até a saída, e a garota chamou por ele. Aiden parou à porta, e olhou para ela de relance.
— Eu preciso te contar algo. — Ela tinha a voz fraca e o olhar passivo, Aiden percebeu isso, mesmo observando-a de lado.
Um pouco relutante, ele voltou a sentar-se a mesa. Caliope respirou fundo, antes de começar.
— É sobre a Samantha...
— Cali, não foi culpa sua... Já lhe disse isso. A morte dela foi horrível, mas olha o que veio depois. Nós mudamos o governo não só de Alexandria, mas o de todas as outras Metrópoles... com exceção de Arcádia-
— Não... — Ela o interrompeu.
Os dois se olharam tão fixamente que Aiden quase pôde sentir a dor que Caliope expressava em seu rosto.
— Foi culpa minha. — Ela deixou uma lágrima escapar. — Quando eu tenho uma visão, não tenho somente a de um futuro, mas a de vários. Não tenho acesso à todas as possibilidades e nem todos os futuros, mas àqueles que são passíveis de mudanças a partir de minhas decisões. Entende?
— Então é como se você visse o fim de cada caminho que você pode traçar?
— Basicamente, sim. Os futuros criados a partir de suas decisões não são acessíveis a mim, por exemplo, mas as minhas decisões sim. E quando eu vi Samantha cruzando meu caminho, eu vi todos os futuros possíveis com esse encontro... E em todos eles, a tirania continuaria existindo em Alexandria, com exceção de um futuro. Em apenas um, as coisas mudariam...
Ela falava hesitante e lentamente, e Aiden sentia-se incomodado pela sua. postura.
— Eu não entendi...
— Eu vi que se eu fizesse meu irmão te rejeitar, se eu fizesse o Conselho me ter como prisioneira e se eu servisse ao Conselho por alguns anos, mesmo com perdas e mortes significativas, o Conselho se dissolveria, e um novo governo surgiria... Um novo governo justo para todos em Alexandria...
— Eu não entendo...
— Havia um futuro em que Samantha e eu nos conheceríamos na escola, ela não perderia o pai, mas nós duas morreríamos em um protesto contra o Conselho. Em outro eu revelava que ela era a escolhida e ela morria, então o pai dela destruiria toda a cidade, matando todos de Alexandria. Em outro, Carlos te amaria, e ele mataria Samantha quando percebesse o interesse dela em você...
Caliope respirou fundo. Como que se tentasse pensar nas próximas palavras, mas Aiden já entendia tudo aquilo. Ele segurava as lágrimas, enquanto em sua mente fervilhavam as poucas lembranças que tinha de Samantha.
— Então você mentiu... Fez todos entenderem que o Escolhido era Charlie, o pai dela... Disse para Stalker que ele não deveria ficar comigo... E isso desencadeou o presente em que estamos?
— Sim... — Ela consentiu.
— E por que está me contando isso agora? A sua consciência está pesada por ter manipulado tantas vidas? Pela morte de Samantha?
— Não...
— Então por quê?
— Porque independente do tanto que eu tente... Eu não posso ver o dia depois de hoje.
— Então você vai morrer?
— Eu não sei...
Aiden olhava-a sem saber o que pensar ou sentir, e em seu semblante havia uma expressão dúbia, quase apática.
— Eu quero que você entenda... Mesmo com tudo o que sofreu e ainda sofre, pelo menos hoje você tem Stalker... Tem quem amar... Vive em uma cidade justa e digna para humanos e meta.
— Cali... Você não sabe nada sobre o que eu sinto e o que eu sofri... Ou sofro... Você poderia ter sido honesta antes. Por que demorou tanto? O medo da morte faz você querer se livrar dos arrependimentos?
— Aiden... — Ela chorava — Você não sabe merda nenhuma do que é ver tantas possibilidades e mortes e ter que escolher a menos pior. Eu era uma criança e fiz a escolha que julguei ser a certa, não tenho um pingo de arrependimento por isso! Lamento pelo seu sofrimento mas eu não posso fazer nada por você. Eu não sou deus, não escrevo o futuro, eu só escolhi um... E eu só lhe digo isso tudo agora porque quero que você saiba disso... E não que você sinta isso. Não tenho culpa se você sente muito.
Aiden a olhava incrédulo. Não tinha resposta para isso. Apenas viu, em silêncio, quando Caliope levantou-se da mesa e devo retirou dali em passos rápidos.
Ele esfregou os olhos com a ponta doa dedos, respirou fundo e se levantou em um movimento rápido. Em passos apressados, Aiden saiu de casa.
Do lado de fora, passou por uma multidão de pessoas, a maioria delas atentas em mini-telas em seus pulsos, assistindo a reunião do Conselho. Aiden caminhava apressadamente entre aquelas pessoas, desviando da maioria, e não reparando em nada além de seu próprio caminho. As luzes brilhavam nas ruas, imagens de um normatiza e um super-ato se abraçando repetiam incansavelmente em projeções holográficas gigantescas na frente de diversos prédios.
Ele chegou por fim em frente a sede do Conselho, parou por um instante na porta, e fez um breve sinal com os dedos, como uma prece pessoal por Samantha — como fazia todas as vezes que passava por ali. Aiden cumprimentou os seguranças na porta com um aceno e um sorriso, e adentrou no prédio.
O prédio do Conselho não era nada parecido de como quando ele invadiu aquele lugar, desta vez, tinha um ar aconchegante e familiar, projeções holográficas imitando plantas, longos sofás de couro e computadores acessíveis a todos, mostrando notícias e gráficos informativos. Ele seguiu pelo saguão até o elevador e pressionou o último andar.
O elevador dava uma vista ampla de toda a cidade. Dali era possível ver tudo o que a redoma cobria, cada prédio e holograma, e a medida que subiam os andares, mais longe a vista ia, alcançando até mesmo o Ninho, que crescia em uma velocidade impressionante a cada dia, com mais prédios e arranha-céus, servindo de abrigo para todos na Metrópole.
O elevador parou e Aiden seguiu pelo corredor lentamente, cumprimentando cada homem e mulher em seu caminho. Ele parou em frente a uma grande porta de vidro, e observou o lado de dentro em silêncio, de braços cruzados. Quinze pessoas estavam reunidas em uma grande mesa de mármore negro, eram três membros representantes de cada distrito de Alexandria, constituídos por um representante normatiza, um super-ato e um Techno para cada distrito. Stalker representava a Alameda de Todos os Santos, eleito com a maior quantidade de votos após a revolução e principal criador do Tratado, era o Conselheiro mais importante é respeitado pelos demais, e ele estava à ponta da mesa por isso.
Stalker sorriu ao perceber a presença de Aiden à porta e não tardou para encerrar a reunião. Ele saiu após apertar as mão de cada um dos outros quatorze Conselheiros, e recepcionou Aiden com um beijo em seus lábios.
— O que aconteceu? — Seus olhos brilhavam por detrás do óculos grosso.
— Caliope me contou sobre Arcádia. Estão mesmo protegendo o Corvo? — Aiden desviou o olhar quando perguntou, encarando a gravata negra que prendia ao pescoço de Stalker.
— Sim. Tentaremos uma reunião diplomática com eles ao entardecer. Preciso ir até lá.
— E como andam as outras coisas?
— A Fábrica dobrou a produção e no Ninho há abrigo para todos os trabalhadores. — Stalker sorriu, como se desse a melhor notícia possível naquela situação.
— Fico feliz por isso.
— Mas você não parece feliz. — Stalker acariciou o rosto do amado.
Os dois se olharam em silêncio.
— Vamos para a minha sala. — Stalker disse, já iniciando sua caminhada pelos corredores. Aiden o seguiu.
Chegaram em uma sala de paredes brancas, uma janela enorme mostrava a vista de Alexandria, e raios artificiais de sol brilhavam ao contato das estátuas de bronze que decoravam o ambiente. Aiden sentou-se em uma cadeira em uma grande mesa ao centro, enquanto Stalker servia dois copos de água.
— O que houve? — Stalker se sentou de frente a ele.
— Caliope... Ela me disse... — Aiden continha as emoções enquanto contava sobre tudo o que a irmã de Stalker lhe disse.
— Meu querido... Eu entendo a sua angústia, mas não há o que fazer mais. Samantha está morta, e isso também me dói o peito.
— Isso me faz pensar... Você sabia?
— O que? Como eu poderia saber?
— É que você... Você agiu tão rápido. — Aiden continha as lágrimas — Assim que ela morreu, você transmitiu aquela mensagem... Como você poderia ter feito aquilo tão rápido, se não soubesse?
Stalker suspirou.
— Você sabia?
— Aiden... Graças a transmissão que Daria e Oliver foram presos, assim como Fiona! Eles estão sendo punidos pelos seus crimes... Nem a C.A.E.S. nem os Ômega existem mais, e a Ordem trabalha para o povo! Há trabalho e comida na mesa de todos. Super-atos e normatizas finalmente vivem juntos-
— Stalker. — Aiden o interrompeu — Você sabia?
Stalker tremia de nervosismo.
— Enquanto eu controlava o andróide, eu também monitorava as câmeras de segurança do prédio... Só eu tinha acesso a elas e Caliope parecia saber... Ela me contou tudo. Ela ficava repetindo a mesma coisa, e dizia o que eu deveria fazer... Então eu fiz.
— Você sabia que Samantha morreria... E não impediu?
— Caliope disse que era o único jeito...
— O único jeito de que? De trazer paz? De mudar o governo? De ter a mim?
Stalker encarou Aiden em silêncio. E balançou a cabeça afirmativo. Aiden deixou uma lágrima escapar.
— Como vocês puderam?
— Eu-
Stalker não tinha palavras. Aiden se levantou e saiu em passos rápidos, deixando o companheiro sozinho em sua sala. Ele desceu pelo elevador, caminhou pelo saguão e correu apressado pelas ruas da cidade. Correu sem pensar, e em sua mente só havia um lugar em que gostaria de estar.
Parou somente quando chegou à porta de saída de Alexandria, e revelou seu passaporte para os homens que guardavam a porta. Ele saiu, contemplando as árvores do lado de fora da redoma.
Caminhou por entre as árvores, seguindo uma trilha estreita feita de pedras quadradas. Passou por um casal ou dois, ou grupos pequenos de crianças, e acenou com certo esforço para cada pessoa que cruzava seu caminho. Atravessou um arco metálico e viu-se diante a uma grande clareira, com pedras quadradas espalhadas de maneira uniforme. Aiden caminhou até uma grande pedra ao centro, rodeada por flores, vasos, desenhos e fotografias em homenagem àquele corpo por debaixo daquela terra.
—Q Samantha... — Ele sussurrou, colocando a palma da mão sobre a pedra branca.
— Eles sabem que você está aqui. — Uma voz ecoou atrás dele.
Ele se virou em empurrou a pessoa contra outra pedra, mas a pessoa, usando um capuz negro que cobria sua identidade, agiu mais rápido. Ela bateu com a mão no cotovelo de Aiden, girou o corpo para o lado, ficando atrás dele, o puxou para si girando-o também e o pressionou contra a pedra. Aiden levantou as duas mãos, em rendição.
— Quem é você? — Ele perguntou.
— Não sou sua inimiga... Aiden.
Aiden reconheceu aquela voz. Afrouxou o braço e soltou a misteriosa pessoa, que abaixou o capuz.
— Samantha?
— Fico feliz em revê-lo. — Ela sorriu.
FIM
Codinome Sombra chega ao fim, sintam-se a vontade para expressar suas opiniões ❤
Se quer continuar acompanhando as histórias nesse universo cyberpunk, corre para "Clube dos Rejeitados".
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