~15~
Lizzie
Ensaiei uma música do filme da Cinderela para a eliminatória. A Dream Is A Wish Your Heart Makes é uma das minhas preferidas desde criança. Aprendi a tocá-la com uma das irmãs do orfanato onde cresci. A irmã Marie era a freira mais maluca e engraçada de lá, ela sempre contava histórias de casais apaixonados e tocava músicas que não eram "aceitáveis", mas era tão boa em escapar da madre superiora Edith que nunca era pega.
- Você terá uma vida brilhante, Elizabeth. - dizia irmã Marie quando me ouvia tocar e cantar.
Quando papai estava vivo, ele sempre me levava de volta ao orfanato para visitá-la, mas depois que morreu, acabei diminuindo as idas até lá... faz tanto tempo que não a vejo. Está decidido, quando essa coisa de reality show acabar, vou fazer uma visita as irmãs.
Estou na sala de música agora. Minha apresentação já está pronta, mas quero garantir que não vou errar nenhuma nota. Tocar piano ao vivo para uma porção de gente que vai julgar meu talento pode ser bem aterrorizante.
Começo a teclar o piano e a música ganha vida pelo ambiente antes silencioso. Canto a primeira parte e me deixo embalar pela canção.
- Está ouvindo, Frederica? - ouço a voz de Arlete vinda do lado de fora da sala. - Essa música... é aquela música irritante da Disney que Elizabeth vive tocando em casa!
Paro de cantar e continuo apenas tocando, tentando prestar atenção na conversa.
- Sim! É aquela canção da Pequena Sereia. - Frederica responde. - Ou será da Bela e a Fera? Não. É do Aladdim!
Meu Deus. Reviro os olhos e solto um riso baixinho.
- É da Cinderela, Frederica! - Arlete corrige a irmã. - É a cara da Elizabeth... Qual das meninas deve estar ensaiando aí?
Droga! Paro com a música imediatamente e acabo tocando uma nota errada. Será que vão notar que sou eu? Eu não pensei nas consequências ao escolher minha música preferida para a eliminatória. Uma canção da Bela Adormecida seria menos chamativa.
- Vamos entrar e ver. - Frederica sugere.
- Não. Deixa pra lá, tenho que fazer meus exercícios vocais. - escuto passos pelo corredor e respiro aliviada, porém, Frederica não acompanhou a irmã e entra na sala.
- Oi. - ela acena. - Ouvi você tocando, é a música preferida da minha irmã que não está no programa. - se aproxima.
- Ah, é mesmo? - fixo o olhar nas teclas do piano. - Legal.
- Eu nunca admito, mas gosto quando ela canta. - ri e sorrio. Tenho bons momentos com Frederica quando éramos crianças.
- Por que não diz isso pra ela? - quero saber.
- Porque... não sei. Arlete diz que ela não gosta de nós e que devemos mostrar quem manda.
- Isso não é verdade! - protesto. Quando fui viver na casa do papai eu adorava o fato de ter duas irmãs quase da minha idade, gostava de brincar com elas, mas depois que papai morreu, parece que Ivone fez a cabeça das filhas e elas passaram a brincar menos comigo. Ficaram malvadas, e quando crescemos a coisa piorou bastante. Na escola, as duas fingiam não me conhecer, bom, Frederica almoçava comigo de vez em quando ou fazíamos trabalhos juntas, mas sei lá... ela sempre me esquecia logo em seguida. Nunca entendi direito o que aconteceu com a gente. - Quero dizer... - engulo em seco. - Certamente sua irmã gosta de você. Talvez você não tenha dado chance para ela demonstrar isso.
- Acha que pode ser isso? - ela senta ao meu lado na banqueta.
- Talvez. Muitas vezes as pessoas não falam o que pensam e os outros acabam tirando conclusões precipitadas, acabam se afastando sem saber o que está acontecendo, simplesmente decidem deixar para lá.
- Isso não é bom, não é?
Nego com a cabeça lentamente.
- Não mesmo.
Frederica solta uma longa respiração e diz:
- Talvez eu converse com ela quando voltar para casa. Isso se minha mãe a tiver encontrado.
Arregalo os olhos.
- Como assim? - me faço de desentendida.
- Ela fugiu quando nós chegamos aqui. Ou se perdeu no aeroporto. Não sei. - dá de ombros. - Espero que esteja bem.
Sinto sinceridade nas palavras de Frederica e dou um sorriso de verdade.
- Frederica? - faço com que ela olhe para mim
- O quê?
- Não deixe que sua irmã Arlete e sua mãe lhe digam o que fazer ou ditem quem deve ser. - a encaro. - Faça o que seu coração mandar e seja quem você quer ser. Nunca mude para agradar a ninguém a não ser você mesma.
Ela assente com convicção e escutamos a voz de Arlete gritar por ela:
- Frederica? Onde você se meteu, garota?
- Vou trabalhar nisso que você me disse. - se levanta. - Agora eu preciso ir. - corre até a porta, mas se vira para acenar antes de sair.
Talvez, se eu tentar passar um tempo aqui dentro com minha irmã, as coisas possam vir a ser diferentes lá fora, mesmo que ela não saiba quem sou eu de verdade nessa casa.
*
Muito bem, chegamos ao dia de mais uma eliminatória. Jess, o maquiador e cabeleireiro que me arrumou da última vez, está aqui novamente.
- O que acha de fazermos um coque? - ele tenta pegar em minha peruca, mas Dayane o impede, ficando na sua frente.
- Não! - ela quase grita apavorada.
- Ai, calma. - ele põe a mão sobre o coração. - Por que todo esse drama, criatura?
- Liza tem uma cicatriz na nuca. Ela detesta coques. - minha amiga inventa mais uma mentira genial e fecho os olhos agradecendo aos céus por ter conseguido sair dessa.
- Sério? - Beca sai de sua cama e vem até mim. Ela está com a cabeça cheia de bobes. - Posso ver?
- Bom, é um pouco feia. Não vai querer ver. - digo.
Ela faz careta e se comunica com Kitty. Sua amiga ri.
- O que você disse? - Dayane pergunta.
- Falei que vou esperar Liza dormir, então tentarei ver a cicatriz. - Rebeca ri malvada.
- Nem pense nisso! - aponto, tento fazer cara de brava, mas estou rindo também.
- Tudo bem, tudo bem. - Jess chama atenção para si. - Deixe os cabelos soltos, Liza. - diz decepcionado. - Vamos começar a maquiagem? - pega um pincel grande sobre a penteadeira do quarto e o balança.
Afirmo com a cabeça e sento na cadeira para que ele possa aplicar todos esses produtos em meu rosto.
Quando Jess está quase finalizando a maquiagem, uma moça da produção aparece e traz consigo a roupa que Beca e eu teremos que usar essa noite. São dois vestidos; o dela é cor-de-rosa e tem alças finas e brilhantes, a cintura é bem marcada e a saia longa é coberta por uma camada de tule.
- O que acham? - Beca pede nossa opinião após vesti-lo.
- Você está MA-RA-VI-LHO-SA! - Jess acaba minha maquiagem e bate palmas.
- Está incrível, Beca. - digo. - Ninguém vai conseguir tirar os olhos de você!
- Não vão mesmo. - Dayane comenta. - Parece uma princesa!
Kitty elogia sua amiga com libras e ela agradece da mesma forma.
- É melhor você se vestir também. - Rebeca me abraça. - Boa sorte na eliminatória.
- Boa sorte, Beca. - falo com sinceridade. - Sei que vai ser ótima.
Ela sorri e segura a mão de Kitty para saírem do quarto.
O meu vestido é azul. O corpete com decote em V é coberto por pedrinhas brancas que parecem perolas de verdade, essas pedrinhas continuam até os ombros onde elas caem como se estivessem grudadas em minha pele. A cintura é marcada por uma fita e a saia cobre meus pés. Há também uma espécie de véu preso nas costas do vestido que vai até o chão. Acho que nunca usei nada tão lindo assim em toda minha vida.
- Se Cinderela existe mesmo, você é a própria! - Dayane me encara com um brilho no olhar.
Jess solta um suspiro como se estivesse apaixonado e diz:
- E se não acabar conquistando o público com sua voz, vai conquistar com essa beleza!
Eu sorrio agradecida.
Poucas vezes tive a chance de me sentir bonita e hoje tenho a certeza de que mais pessoas deveriam ter essa sensação.
O palco no jardim já está pronto para receber as participantes de hoje. A decoração dessa vez é diferente, parece um baile do ensino médio aqui, com luminárias imitando o formato de estrelas por todo lugar. Não tenho boas lembranças do meu baile de formatura. Além de Arlete e Frederica me infernizando, havia uma garota chamada Kristen na minha turma. Ela era a menina mais popular da escola, namorada do capitão do time de futebol e a líder cruel de um grupo de garotas que só se importavam consigo mesmas. Minhas irmãs podiam reinar dentro da nossa casa, mas no colégio, a rainha era Kristen. Arlete vivia correndo de um lado para o outro com Frederica para fazer tudo de Kristen pedia só para serem do grupo dela; nunca conseguiram. Ela era exigente demais e adorava pegar no meu pé.
Mas o que ela fez no baile foi a gota d'água.
Será que ela está me assistindo na televisão? Bom, por mais que esteja, não vai saber que sou eu.
- Vamos entrar ao vivo em cinco minutos! - Rosie, a diretora do programa, grita em seu megafone e todas ocupam seus lugares na platéia enquanto Nick e os outros jurados se posicionam no palco.
Nick está de smoking... como um dos garotos do time de futebol no dia do baile. Como Gabe Scott.
Engulo em seco. Esse maldito dia! Já se passaram quase quatro anos e ainda me apavoro com o que Kristen fez. Se eu já tivesse assistido Carrie, a Estranha naquela época, eu jamais teria ido ao baile com Gabe.
Dayane e eu vamos para nossos lugares na platéia, ficamos ao lado de Beca e Kitty, e Nick me vê. Ele acena de onde está, no palco, e apenas sorrio para cumprimentá-lo.
É nesse momento que noto dois rapazes entrando no jardim e ocupando os lugares vagos na fileira da frente - onde vão ficar Nick e os jurados durante a eliminatória. Um tem a pele negra e é alto, o rosto tem um sorriso travesso de dentes brancos e olhos brincalhões, castanho-escuros. O outro é loiro, e tem lábios vermelhos como se tivesse acabado de comer morangos. E que olhos tão azuis são esses? Ele parece o ator daquele filme Quero Ser Uma... Estrela? É esse o nome?
- Meu Deus! - ouço a voz de Sam vinda da fileira de trás. - É Fleth Gregori e Dan Curtis!
Isso é o bastante para fazer as outras começarem a gritar automaticamente.
- Oi, meninas! É um enorme prazer estar aqui. - o garoto loiro se levanta, com um jeito de galã e acena. - E aí, Nick? Você é o cara! - aponta para Nicholas, que está tendo o cabelo penteado por Jess uma última vez antes de ir ao ar.
- Fleth? Dan? - ele diz confuso. - Ah, meu Deus. - aperta o nariz na altura dos olhos e pede licença para Jess. - O que estão fazendo aqui? - diz Nick ao descer do palco.
- A gente veio te ver, amigão! - o outro rapaz, o tal de Fleth, fala empolgado e abraça Nicholas quando fica de pé. - É ótimo te ver, irmão.
- Dan! Fleth! - Arlete se aproxima com Frederica. Atrás delas estão as outras meninas.
- Adoramos seu último filme, Dan! - diz Lola, animada.
- Pode me dar um autógrafo? - pergunta Marta.
- De volta ao seus lugares, meninas! - Rosie se aproxima com seu megafone. - Vocês terão muito tempo para paparicar esses dois. - ela sorri. - Eles ficarão na casa pelo resto do reality.
As participantes do programa gritam de novo. Dessa vez ainda mais felizes.
- Agora é sério, sem gritos, vão para os seus lugares. Já vamos entrar no ar! - Rosie respira cansada. - Parece que estou de volta ao ensino médio. - sai rindo.
- Pessoal, é ótimo ver vocês, mas por que estão aqui? - Nick quer saber quando os rapazes já estão sentados novamente.
- Eu terminei com Calie. - diz Fleth. - Ainda não foi a público, mas logo ela vai postar no Instagram. - dá de ombros. - Então liguei para Rosie, queria saber se havia alguma maneira de falar com você, estava precisando do meu amigo, e ela me disse que seria uma ótima ideia se eu entrasse no programa.
- Fleth, isso explica você estar aqui, mas e você, Dan? - Nick olha para o loiro, agora impaciente.
- Bom, Los Angeles estava chata. Fleth me convidou. - sorri de lado.
- Dois minutos para entrarmos ao vivo! - alguém da produção grita.
- Tudo bem, depois nós conversamos. - Nicholas se dá por vencido. - Tenho que voltar para o palco. - ele olha para mim, para todas as participantes na platéia. - Boa sorte hoje, meninas. - e volta para seu lugar.
- Depois de atuar em Quero Ser Um Astro, Dan Curtis ganhou o prêmio de ator revelação do ano. - Beca comenta se inclinando sobre Kitty para chegar até mim e Dayane
Ah, então é esse o nome do filme!
- Isso mesmo, princesa. - Dan se vira apoiando o antebraço no encosto da cadeira quando escuta minha amiga falar. Está aproveitando a oportunidade para se exibir. - Você deve ser uma fã e tanto. - pisca e sorri de lado.
- Ah, sim. Admiro muito seu trabalho. - ela diz, tímida.
- E eu admiro seus olhos. - ele pega a mão de Rebeca para depositar um beijo nos nós de seus dedos.
- Alerta de conquistador barato! - Dayane simula uma tosse e dou uma risada baixinha. Por sorte, ele não escuta.
- E quanto ao meu trabalho? - Fleth se vira também e aponta para si. - Você também gosta do que faço? - sorri convencido e Rebeca alterna o olhar entre Kitty, Dayane e eu.
- Desculpe, mas não sei quem você é. Você o conhece, Kitty? - ela fala com sua amiga em sinais e ela nega com a cabeça.
- Como é? - seu sorriso some. - Não sabe quem eu sou?
Começamos a rir.
- No ar em 5, 4...
- Ela disse que não sabe quem eu sou, Dan! - reclama para o seu amigo que também está rindo.
- 3, 2...
- Eu tenho 10 milhões de seguidores!
- Boa noite, pessoal! - Harry Forbes aparece no jardim e vai correndo para o palco. - Estamos começando mais uma eliminatória ao vivo do Garota Encantada!
Nós aplaudimos.
- E essa noite temos convidados especiais. - aponta para os dois rapazes. - Dan Curtis e Fleth Gregori!
Eles acenam para as câmeras, Fleth continua irritado por Beca não conhecê-lo, mas força um sorriso.
- Sejam bem-vindos ao programa, rapazes! Eles vão estar sempre por perto agora, então as coisas vão ficar empolgantes, não é, Nick? Não será mais o único galã na casa. - o apresentador provoca.
- Pois é... - Nick enfia as mãos nos bolsos.
- Bem, na eliminatória de hoje vamos ouvir cantar as cinco participantes que a nossa querida Liza escolheu! - Harry aponta para mim. - Mas antes, Julian, explique para o pessoal de casa como serão as apresentações.
- Hoje as meninas vão estar no palco por conta própria. Algumas tocarão seus instrumentos, outras usarão uma base já gravada... Só posso dizer que estou ansioso.
- A escolha de hoje vai ser bem complicada. - diz Hailey. - Eu pude acompanhar alguns ensaios com Nick e elas vão mandar muito bem.
- Isso é demais! - Harry sorri. - Então, vamos começar logo, não é? Jurados, podem ir para seus lugares ao lado de Dan e Fleth.
Quando Nick e os outros saem do palco, Harry olha para uma das câmeras e diz:
- Vamos ouvir nossa primeira garota encantada de hoje! Senhoras e senhores, com vocês... Liza Mcphee!
Meu Deus. Eu não tinha percebido o quanto a lembrança de quatro anos atrás era assustadora.
O baile. O diretor Eddie me chamando no palco. A tinta. Kristen. Gabe.
Esse momento, isso tudo... é igual aquele baile idiota do colégio! Sinto meu coração doer e bater rápido demais em meu peito, fora do normal, e me levanto como um impulso. Mas não vou para o palco, na verdade, corro para dentro da casa.
- Liza! - ouço Dayane chamar por mim, porém, ignoro.
Sumir da face da terra, apagar a minha existência, apagar a lembrança daquela noite, é tudo que mais quero nesse momento.
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Oi, amores! Desculpa a demora pra postar, mas eu estava muito sem tempo, não que agora eu esteja com tempo kkkkk mas fiz um esforço hahaha
Então não esqueçam de votar e comentar, pois é muito importante!
Muito obrigada por estarem lendo!
Até o próximo capítulo!
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