Capítulo 14
No dia vinte de novembro, quatro meses após ter recebido aquela ligação, Ângela embarcou para o Rio de Janeiro para receber uma homenagem por seu ato de cidadania.
Ao tentar ajudar Maria Joana a se livrar da violência do marido, ela havia se tornado também uma vítima dele, e ao invés de fazer uma reportagem, tornou-se parte dela. Fazia vários meses, mas ela se lembrava bem. Havia se atracado com Claiton após ele ter derrubado a mulher grávida de sete meses e começado a chutá-la. Eles lutaram, ela se machucou, e contra todas as probabilidades o derrubou, golpeando-o na cabeça com uma panela de pressão. Após derrubá-lo, desmaiou. Acordou no hospital com a perna esquerda fraturada, um olho roxo, e três costelas quebradas. Claiton foi preso em flagrante e Andréa usou as imagens da luta para divulgar o caso, que ficou famoso.
Após sair do hospital Ângela passou um tempo na casa de Malu, e quando pode voltar para casa, havia um convite para ela participar da noite mais importante da premiação da imprensa do Brasil.
Ela chegou ao Rio, instalou-se em um hotel qualquer, indicado pelo taxista, e foi para o evento. O teatro estava lotado de jornalistas de todas as partes do país, quando um casal de apresentadores famoso da TV iniciou a apresentação. Quando chamaram pelo seu nome, ela caminhou até o palco e recebeu o seu troféu. Amplamente aplaudida, ela olhou para o teatro em volta e sentiu orgulho de si mesma pela primeira vez naquele ano. Discursou brevemente sobre os motivos que a levaram a se arriscar para ajudar aquelas pessoas, e então voltou ao seu lugar na primeira fila.
Tempo depois, eles anunciaram as três reportagens finalistas para o prêmio de melhor reportagem do ano. A vencedora, a reportagem "Mulheres sem alma", consistia em uma denúncia sobre uma quadrilha de mulheres, na maioria ex-prostitutas, que dominava o tráfico de pessoas e o turismo sexual em dois estados brasileiros. Quem ganhou foi Marcos Andrade.
Então Ângela o viu, caminhando seguro, com um sorriso orgulhoso, para receber o seu prêmio. Ele também fez um discurso rápido, agradeceu a todos e foi aplaudido de pé pelos colegas.
A festa acontecia no mesmo centro de eventos, em uma grande tenda ao ar livre. As mesas eram bem dispostas, a decoração clean e as toalhas de linho, tudo muito requintado.
Na mesa de Ângela havia jornalistas de vários veículos diferentes. Aldo era repórter de moda, homossexual assumido e muito divertido. Assim que eles se conheceram ele a analisou da cabeça aos pés e disse que ela estava uma diva com seu vestido vinho tomara que caia de busto marcado. Além dele havia um jornalista econômico, descendente de japoneses, uma colunista de meio ambiente que usava assessórios sustentáveis e tinha ar de hippie, um jornalista investigativo e uma apresentadora arrogante que tinha um programa feminino na internet. Os dois últimos eram perfeitos um para o outro, pois tinham os mesmos pensamentos e as mesmas ambições. Antes do fim da noite eles já estavam prevendo seu futuro juntos.
Graças a Aldo, aquela mesa foi a mais divertida da festa. Ele tinha uma energia incrível. Não deixava ninguém parado, contava piadas, fofocas do mundo da moda, inventou apelidos para todos e os fazia rir sem parar enquanto tomavam champanhe de alta qualidade. Algumas horas depois, o casal ambição, como Aldo os apelidou, estava dançando, enquanto a hippie e o economista, sem nada em comum, já haviam ido embora. Ângela ouvia o amigo analisar cada homem do evento quando Marcos se aproximou de sua mesa.
— Olá — disse ele, fazendo os dois emudecerem.
— Oi — Ângela respondeu tímida. A noite toda sentira vontade de falar com ele, só não o fizera porque não sabia o que dizer. Já havia esquecido o assunto, mas ficou secretamente feliz que ele tivesse tido a iniciativa que não se permitiu.
— Prazer, sou Aldo Fashion — Aldo se apressou em dizer, estendendo a mão para Marcos e derrubando a bolsa-carteira de Ângela no chão.
— Como vai Aldo Fashion? — disse Marcos, estendendo a mão.
— Melhor agora. Diz aí gato, você veio aqui por mim ou por ela?
— Por ela — respondeu ele, e em seguida olhou para Ângela.
— Nesse caso, sorte sua amiga — disse Aldo, e se pôs a juntar as coisas dela que caíram no chão. Ângela se levantou para cumprimentar Marcos.
— Oi, tudo bem? — perguntou enquanto o abraçava.
— Tudo, e você?
— Tudo bem também. Nossa! Quanto tempo! — ela divagou.
— É verdade. Faz o que, uns três anos? — ele puxou da memória.
— É, por aí.
Eles ficaram em silêncio, apenas se estudando.
— Gente, percebi que estou sobrando aqui — disse Aldo, fazendo-os se lembrarem da sua presença. Ele entregou a bolsa para Ângela, beijou sua mão e completou: — Eu vou nessa. Vocês deveriam fazer o mesmo. Está uma noite perfeita para curtir a "Cidade Maravilhosa".
— Tchau, Aldo — despediu-se ela, pegando a bolsa da mão dele.
— Tchau, Diva. Tchau Deus Grego.
Aldo se foi e os dois ficaram sozinhos.
— É muito bom te ver de novo — Marcos comentou, com um olhar que a levou imediatamente ao passado. Três anos de repente haviam se evaporado.
— É muito bom te ver também, senhor: "Jornalista Premiado". Você parece estar indo muito bem — ela afirmou com um sorriso, sentindo-se um pouco mais à vontade.
— É, mas a estrela da festa foi você — ele rebateu.
— Só porque eu quase morri e fiquei famosa — ela brincou.
— Não, porque você foi corajosa e brilhante. Quando eu soube o que aconteceu fiquei orgulhoso... e com pena também.
— Isso é bom. A maioria ficou tão irritada comigo que se esqueceu da pena e do orgulho. Mas o que eu podia fazer? Aquela mulher ia acabar morrendo...
— Sei como é — ele comentou. — Todo jornalista no início de carreira quer salvar o mundo. Com o tempo, depois de tantas tragédias, acabamos nos acomodando com os problemas do mundo. Até noticiamos, mas já não permitimos que nos afete tanto.
Ela assentiu, e houve um novo momento de silêncio.
— Você está linda! — ele disse primeiro, percorrendo-a com os olhos.
— Você também, como sempre — ela respondeu sem pensar e ficou sem jeito.
Ele hesitou por um momento e olhou para ela.
— Quer dar uma volta, sair para beber alguma coisa? — perguntou por fim.
— Quero — ela se ouviu responder prontamente, sem refletir antes. Ele pareceu satisfeito e sorriu. Desde que a tinha visto no auditório quis falar com ela, esperou apenas pelo momento certo. Ângela havia sido uma das garotas mais interessantes que tinha conhecido nos últimos tempos e ele queria saber como andava a vida dela, se tão incerta como quando se conheceram ou não.
Ângela ainda estava abalada por todos os problemas dos últimos meses, incluindo o fim do seu noivado. Aceitou sair com Marcos para relaxar, em parte porque sentia saudades das conversas de anos antes, e também porque queria saber como iam os planos de cinco anos dele, já que os seus estavam indo ladeira abaixo.
Eles se levantaram e caminharam juntos para a saída.
— E a sua vida, continua complicada? — ele perguntou enquanto dava a partida em seu novo SUV preto.
— Você não faz ideia...
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro