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Capítulo 07: A Cena Do Crime

CAPÍTULO 07 – A Cena Do Crime
DELILAH DANVERS

Em momento algum pude evitar de reviver o meu passado. Revivo os detalhes surdos de pequenos momentos. Os detalhes que a maioria das pessoas não costuma perceber. Isso não é e nunca foi, pessoalmente, um problema, mesmo que com frequência eu costume cismar sozinha ao me lembrar de sentimentos e pessoas que já se foram. E não me refiro somente à morte.

Após o assassinato de Lisa, passei a observar muitas coisas que andavam despercebidas. Uma delas é que ninguém realmente se importa com você enquanto você ainda é capaz de respirar.

Todos do salão apressavam-se em direção a saída do hotel, já em total caos. As pinturas nas paredes já não estavam mais emolduradas e as mesas já não mais equilibravam-se.

A máscara de festividade desmoronou diante da brutalidade daquela cena. O salão, outrora cheia de vida, tornou-se um palco sombrio. Agora, entre o tumulto, todos se esquivavam, lançando olhares nervosos para os lados.

Camille pegou o seu brinco do chão e correu atrás de mim, enquanto eu tentava puxá-la pelo punho até o local de onde, supostamente, os tiros aconteceram.

— Para onde está indo, Delilah? — Camille me puxou para trás, automaticamente fazendo as minhas pernas balançarem e o meu tornozelo direito contrair-se. — Meu Deus, Delilah, me desculpa. Mas enlouqueceu? A saída é lá na frente!

Me soltei dela.

— Mas o barulho veio de lá de cima — eu gritava enquanto subia, sem cautela alguma, a enorme escadaria escura do salão do hotel, sem esperar por Camille ou um sermão.

Independentemente da dificuldade de caminhar devido a dor em meu tornozelo, eu corri, passando por inúmeras portas fechadas e uma grande varanda interna com colunas altas nas extremidades do largo corredor. Eu e Camille, que até então me seguia, adentramos a área das saunas e banheiros.

O que vi foi uma pequena movimentação no banheiro feminino. O que vi foi o corpo pálido, gelado e sangrento de Lisa Castillo jogado no chão de uma das cabines. Os cabelos quase louros desgrenhados de seu coque. O que vi foi o terror em seus olhos verdes semiabertos.

— Mas que...

Miles acabara de chegar. Joshua estava vermelho de raiva ou por excesso de lágrimas e soluços, talvez as duas opções. Ele tentava acordar Lisa. Lauren caminhava de um lado para o outro enquanto Devon estava parada, em silêncio, com as mãos cobrindo a boca. Ryan berrava por socorro e, ao receber nada além de suspiros e prantos conhecidos como resposta, correu para pedir ajuda.

Depois, não me lembro de ter visto quase nada. Minha visão embaçou e tudo que via era a morte em minha frente.

"Chére Delilah,
Até onde a sua curiosidade a levou? É lamentável ver o que as pessoas são capazes de cometer por orgulho, não concorda?
Olhe ao seu redor. Preste mais atenção as pessoas próximas à você. Preste mais atenção à Lisa bem em sua frente. O tempo lhe fará perceber como esse corpo sem vida ainda lhe trará tantas memórias ruins.
Isso só está começando. Até breve.
– ASMFC."

Era tudo o que estava escrito de tinta preta no tule branco do vestido de Lisa.

— ASMFC? O que é? — Lauren questionou, a agonia transparecendo em sua voz. — Um codinome? Uma sigla? Nenhum de vocês sabe?

Senti o olhar de Devon em mim. O seu ar era de indiferente. Ela não chorou, não bravejou. Sequer pretendeu angústia. Manteve-se estática até o final e eu nunca a estranhei por isso. Cada ser age como deve agir.

— Quem faria isso? — Camille se jogou no chão, atordoada, chorando em cima das pernas de Lisa.

Eu dei um passo a trás, analisando atentamente o modo despojado como o sangue nos azulejos da cabine alinhou-se. Analisando a caligrafia no vestido e como ela me aparentava, de certa forma, familiar.

— Não toquem no corpo — mandei. — Liguem para a polícia.

Absorta em minhas reflexões, não fui capaz de escutar os passos de alguém se aproximando.

— Não será necessário. Não por hoje — Trevor Gauthier surgiu, acompanhado de Ryan e mais dois sujeitos fortes e de aparência mais nova. Ele retirou do bolso de seu terno um crachá preto com identificação de Investigador e o pôs sobre a bancada da pia. — Peço à todos que saiam imediatamente do local e esperem do lado de fora.

Joshua se recusava a pôr-se de pé e soltar as mãos de Lisa.

— Não, ela estava bem e então apareceu aqui desse jeito, eu não entendo, não...

Então ele começou à tossir, os olhos inchados e vermelhos.

— Josh — pronuncio seu nome em tom rígido, e daí Morris ficou me encarando feio. — Levanta. Ele sabe o que está fazendo.

Então ele gritou algumas grosserias e murmurou mais insultos contra todos nós durante todo o percurso até de volta o salão.

— Nenhum de vocês vai falar sobre isso? — perguntei em voz alta. Todos sentaram no chão sujo do térreo, quietos. — Lisa está no andar de cima, morta, e nenhum de vocês vai falar sobre isso?

— Podemos falar sobre isso, se quiser, Delilah. Mas e você? — Joshua se pronunciou. — Não vai falar sobre o seu nome estar envolvido? Não vai falar sobre o recado deixado no vestido de Lisa? Aliás, onde estava você quando ela levou três tiros?

Eu dei risada.

— Morris, se quer insinuar algo, te garanto que...

— Não. Não estou insinuando nada. Mas não é o que você quer? Falar sobre isso? — sua voz grave me interrompeu. — Vamos, responda.

— Eu não te devo nada, Morris, não fode — empurro seus ombros. Levantei-me do chão, agarrando meu braços no corrimão dourado da escadaria. — Eu vou subir.

— Não, Delilah. Trevor mandou nós o esperarmos aqui. — Ryan avisou, o olhar no chão.

O ignorei.

Subi os degraus e fui em direção do banheiro feminino. A cena do crime. A porta estava semiaberta. O corpo de Lisa continuava caído sobre o chão e seu vestido branco transformara-se em vermelho de sangue. Detetive Gauthier pontuava as suas opiniões em bom som ao mesmo tempo em que anotava algo em um mini caderno. Escorei-me na porta, observando-o.

— Veem, messieurs? — dizia ele para os outros dois rapazes, enquanto gesticulava com as mãos. — Três furos de balas em três zonas diferentes — ele apontou para a parede que dividia uma cabine de banheiro da outra. — O assassino não acertou a sua vítima de primeira, talvez nem de segunda. Mirou mais uma vez e acertou.

Segui seu raciocínio. Haviam três buracos - provocados por balas - de uma cabine para a outra. Pela lógica, alguém, na cabine ao lado da que Lisa estava, teria atirado uma vez, atirado duas. Na terceira, enfim mirou certo, e então foi quando Lisa teria sido atingida.

— Um revólver 38, talvez — ele conclui. — Miss Delilah. — Gauthier finalmente nota a minha presença e lança um sorriso gentil em meu sentido. — Não é aconselhável que a madame esteja aqui.

— Precisamente. Mas tenho que lhe pedir algo.

— O que deseja?

— Preciso que conclua o caso, senhor. A carta que recebi e... Ah. Vou direto ao ponto. É uma perseguição com o meu nome. Preciso que descubra quem matou Lisa o quanto antes. Te pago o quanto quiser.

Ele se virou de costas para mim. Olhou para um sujeito, olhou para o outro, que deu de ombros. Então voltou-se em minha direção e assentiu.

— Madame, será um prazer ajudá-la. Peço que não se preocupe com dinheiro... Minhas demandas não são altas. — Detetive Gauthier era menor que eu. Não tão menor, porém ainda era necessário que o meu pescoço abaixasse para que eu pudesse vê-lo por inteiro. — Dê-me permissão para que faça interrogatórios gravados com cada um de seus colegas, se não for inconveniência de minha parte.

— Não, inconveniência alguma. Sinta-se à vontade para usar o método que quiser. Eu... eu só quero me livrar de tudo isso.

— Muito bem.

𓈒ׁ♥︎⬞︎ⴾⴾ䕽❜💬!ᰢꫬ"chére" : querida.
• messieurs : rapazes.

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