99. Pó De Sono
O escuro, aliado traiçoeiro, os encobria. Do barco que tomava a dianteira, Azura vislumbrou os pontos de luz que vinham do Porto das Rosas. Aproximavam-se mais e mais em um mórbido silêncio encoberto pelo bater nos barcos mais agitado das marolas que se transformavam em ondas enquanto avançavam. O violento tapete do Mar das Pétalas agora era uma imensidão negra assustadora sem Morgana, a Deusa que trazia conforto aos aventureiros.
- Gine! - Azura gritou para a escuridão. Tentou esconder o pânico que apertava seu coração. Escuro, mar. Estava tudo, menos só, o único dos medos de infância que não roçava em seu pescoço. Ginevra já estava na metade do caminho até a petrichoriana quando a ouviu chamar.
- Estou aqui - murmurou a bruxa, colocando-se ao lado dela no púlpito. Por além das asas batendo de Tohrak, estudaram juntas a encosta do Porto das Rosas. O relevo de Crisântemo era de um estudo interessante. Azura apenas ouvira conversas sobre como o Porto das Rosas estava ali, ao nível do mar, inundando em tempos de chuva, abrigando os desafortunados, quando a cúpula e alta sociedade de Crisântemo moravam lá em cima, subindo o tapete de pedras asfaltadas, sendo que o ápice daquelas terras era o nada humilde palacete da coroa, um bom lugar para olhá-los de cima. As duas conseguiam ver perfeitamente dali, mesmo no escuro. As luzes das tochas acesas que dispunham-se pela cidade eram mais de centenas, uma iluminação que ironicamente procurava simular o sol.
Azura olhou para a bruxa e segurou em sua mão, apoiada nas madeiras gastas da embarcação.
- Pronta? - indagou à amiga.
Ginevra esperou que ela tivesse visto sua cabeça concordando. A resposta engasgou-se em sua garganta quando tentou pronunciá-la. Mesmo assim, não deixou que o medo a tomasse. Este, por sua vez, só despertou a adrenalina adormecida no sangue da bruxa. Ela caminhou a passos largos até a popa.
De lá, respirou fundo. Era para isso que estavam ali, na linha de frente. A bruxa fechou os olhos e pensou em tudo o que lhe motivava. Seus pensamentos viajaram até a avó. A mulher lhe dizia todos os dias o quanto Ginevra era especial. Mexiam nas panelas, preparavam aqueles pequenos elixires de cura juntas. O começo do trajeto que lhe levou ali. Pensou em Holga e Tron, os pais que foi obrigada a deixar para trás. Viu Arande tombar por causa dela. Suas mãos tremeram. Da ponta de seus dedos, a luz branca tomou forma. Não era como o fogo que habitualmente conseguia fazer tilintar dali. Era branca como as areias de Petrichor, como as nuvens do céu que sentia falta, como os cabelos de Rhama. A mulher abriu os olhos e viu que a luz a circundava como um espectro. Ela era a luz no meio do Mar de Pétalas. As outras embarcações a viram. O sinal que esperavam, o combinado que escondiam. Ela viu, de cada um dos barcos, os bruxos invocarem aquela luminosidade esbranquiçada assim como ela.
Os vagalumes nasceram outra vez, vestidos com véus brancos de esperança. Eram mais vibrantes que as chamas, quase tão gritantes quanto a iluminação da terra firme que os esperava.
As luzes brancas intensificaram-se. Os olhos de Ginevra embranqueceram. A bruxa olhou para os céus. Sentiu o poder, a linhagem de seu povo correndo pelo sangue em suas veias.
Suas mãos rumaram para o céu, vagarosamente, e o tempo parou. Ninguém ouvia mais as batidas fortes das ondas nos cascos e nem o vento soprando ameaçador em seus ouvidos.
Quando aquela frota tornou-se um imenso farol no meio do oceano, impossível de não ser visto, a bruxa uniu as mãos sobre a cabeça.
Uma explosão de energia os circundou. A luz se dissipou por completo, mas as reverberações da explosão expandiram-se por todos os lados, inclusive para o Porto das Rosas, a Cidade de Crisântemo. Os resquícios da luz branca correram pelo mar como um enorme maremoto e alcançaram a terra, varrendo tudo o que estava pelas ruas, estilhaçando vidraças e apagando todas as tochas, uma por uma, do Porto ao palacete.
Propositalmente colocaram os alvos nas costas. Queriam que soubessem que estavam ali.
Passos vagarosos avançavam por corredores familiares e estranhos. Odile queria mais tempo. Queria que se deslocassem ainda mais detidamente, mas o rei a guiava com ansiedade em direção ao grande saguão.
Chegaram enfim aos grandes portões que os dividiam de murmúrios até então distantes.
A rainha sentiu o coração palpitar dentro do peito, bater tão forte que ela teve medo de que subitamente parasse. De soslaio, viu que Sohlon a olhava.
- Não se preocupe, meu amor - sussurrou em seu ouvido. - Será uma noite memorável.
Pode apostar que sim, pensou ela.
A mulher sentiu pena de Sohlon, apenas por um segundo. Tentava lembrar-se a cada instante das atrocidades a que aquele homem submeteu todo o seu povo. Ela também não se safava da equação e sabia. Pagaria seus pecados. Pelo menos, entretanto, tinha ciência deles.
Odile olhou dos olhos castanhos do rei para seu pescoço. As veias pulsavam, a vida emanava daquele ser amaldiçoado. A mulher sentiu a lâmina da faca sob o vestido e pensou o quanto seria fácil matá-lo ali. Entretanto, suas pernas fraquejaram só de pensar na possibilidade. Teria o arrojo necessário para tirar a vida de quem já amou? Talvez preferisse que Roto o fizesse. Depois, então, a lâmina gélida teria um destino sem empecilho algum.
Antes que o rei pudesse indagar por onde divagava a mente de sua esposa, os guardas abriram as portas. A iluminação deu-lhes as boas-vindas junto com o silêncio da corte.
À contragosto, Odile avançou ao lado de Sohlon. O mísero som de seus passos reverberou pelo extenso saguão. Ela viu, então, uma cena que lhe trouxe familiaridade: os bajuladores estavam todos lá. Os mesmos que a xingaram quando ela retornou. Os que cuspiram injúrias e desejaram a ela e ao filho cenas horríveis. Tão voláteis quando lhes interessava, todos eles. Odile sentiu nojo.
Quando Sohlon sorriu, a rainha entendeu sua deixa, assim como os músicos. Os violinos tocaram, suaves.
Desceram lado a lado os degraus do salão, os braços dados. A mulher olhava para todos os lados, perdendo a pose da rainha que um dia tinha por tão natural. O medo a assaltou.
Ela viu o comprido tapete vermelho que outrora não estava lá, ela se lembrava. Se lembrava perfeitamente da noite em que perdeu Kaha, antes de tê-lo de novo. Foi a última vez em que pisou ali, meses antes. Tudo era diferente. O tapete percorria do início da escada a um estrado que ladeava o salão. O tapete parecia solo sagrado, onde nenhum daqueles ousava pisar.
Chegaram ao fim da escada e a mulher olhava para rostos conhecidos, mas com quem nunca sequer chegou a ter uma conversa honesta. Sorrisos falsos lhe davam boas-vindas e ela via em todos os braços a marca de Pouri que queriam também incrustar nela. Esperava estar morta antes que a obrigassem a fazê-lo.
Finalmente olhou para frente, para onde deveria ter olhado desde que botou os pés ali. Percebeu que o receio transformou-se em um pavor tão grande que, se não fosse pelo apoio no braço de Sohlon, já teria ido ao chão. Covardia, pensou. Recomponha-se.
Implorou silenciosamente para que fossem mais devagar, porque ali, no estrado, Roto a esperava com a coroa nas mãos. Sorriu para ela, um sorriso que só ela viu e só ela entendeu.
Tempo, queria mais tempo. Este era deixado para trás à medida em que ela avançava.
- Sohlon - cochichou tão baixo que o som da orquestra cobriu até o movimento suave de seus lábios direcionados ao rei - disse que confiava em mim.
Ela não o olhou, mas sabia que Sohlon estava impassível. Era uma das habilidades que tanto ele quanto ela aprenderam a desenvolver - não demonstrar nada quando convinha.
- Esteja pronto quando eu precisar de você - sussurrou uma última vez antes de sorrir falsamente pela primeira vez e subir ao estrado, recebida de volta por uma salva de aplausos pérfidos e superficiais.
Então era isso. Não tinha escapatória. Pensou em Kaha e sabia que Roto fazia o mesmo. Esperava que o filho estivesse longe. Não queria ter que sacrificá-lo também.
Um plano tão vago punha seu pescoço em risco. Rose, entretanto, não parecia se importar. Impressionou a si mesma com a ausência do medo que sentia enquanto carregava o príncipe nos braços para longe daquela balbúrdia.
Desde que Gaia nascera, a primogênita, Rose virou uma redoma de medo. Não que deixasse transparecer para as filhas. Sob o olhar das duas, a mulher era a fortaleza que precisavam. Uma vez, Rose matou um rato que entrou em sua casa. Gaia e Nafré estavam apavoradas em cima da mesa. A loira, bebê de colo, chorava nos braços da irmã. Gaia estava boquiaberta ao ver a cena e Rose temeu ter assustado sua filha. Se surpreendeu, entretanto, quando a pequena disse:
- Mamãe, você é incrível!
Rose sorriu ao lembrar-se da cena, um pesar no coração. Mataria quantos ratos precisasse, mas não desafiaria as injustiças que sofriam. Até então. Teve tanto medo quando soube estar grávida de Nafré que pensou em abortar antes mesmo de se afeiçoar ao que nascia dentro dela. Teve medo que fosse um menino. Tinha tanto medo guardado no peito que sentiu vergonha. Suas filhas estariam orgulhosas dela agora. Gaia estaria. Estava fugindo com Kaha como ela fez sem pestanejar, determinada a salvar a vida do pequeno príncipe, disposta a morrer em breve se o que planejaram funcionasse.
Rose fez os próprios aliados ali dentro. Entrou na gigantesca cozinha do palacete com o carrinho de chá e percebeu que não chamava a atenção dos outros criados. Andou a passos largos até a despensa e ali encontrou quem já esperava por ela. Trancou a porta pela qual passou. Shirley colocou-se ao seu lado em um segundo.
- Onde ele está? - indagou, o ar faltando.
Rose tirou os cabelos loiros esbranquiçados do rosto e prendeu-os em um rabo de cavalo baixo. A mulher abaixou-se e, de dentro do carrinho, tirou uma pequena cesta aberta. Kaha dormia, quieto, aconchegado na própria manta e abraçado ao lenço da mãe, embalado por seu cheiro.
Shirley, chefe de cozinha e amiga de Gaia ali dentro, logo aproximou-se de Rose. Esta não lhe contara toda a história, mas confiou que a mulher poderia lhe ajudar. Shirley olhava deslumbrada - e apavorada - para o pequenino enquanto Rose tirava aquelas vestes de serviço. Por debaixo, já estava pronta. Estava com roupas discretas, casuais.
Kaha resmungou, entreabrindo os olhos. Shirley prendeu a respiração como se fosse cair dura.
Rose olhou ao redor, procurando pelos outros rostos em quem podia confiar. Berter tinha uma bandeja em mãos e parecia pronto para servi-la no saguão. Ao seu lado, um garoto mais jovem parecia não ter mais do que a idade de Nafré. Ela supôs que fosse o filho do homem, o qual ele mencionou. Estava igualmente vestido, pronto para servir à coroa naquela festa.
Rose, exausta, pegou a bolsa em mãos. Vazia, funda, de algodão cru. Olhou dela para Kaha, de Kaha para Berter.
- Tem certeza, Rose? - o homem, trêmulo, indagou. Não acreditava no plano da mulher até ver o príncipe com os próprios olhos.
- É claro que tenho - resmungou. Não tinha. Sua voz a denunciou.
O filho de Berter tinha os cabelos arruivados, Rose percebeu assim que ele entrou na luz da fraca tocha que os iluminava. O garoto deixou uma bandeja com quitutes sobre o balcão e tirou algo da mochila. Caminhou a passos largos em direção ao príncipe que começara a chorar, procurando por conforto. Rose o tomou nos braços, mas este não se acalmou.
O Filho de Berter tirou algo do bolso da calça. Era um pequeno frasco de vidro com algo pastoso dentro.
- E você, querido - Rose indagou ao vê-lo abrir o pote. A essência de banana invadiu suas narinas -, tem certeza de que isso é seguro?
O garoto ruivo não respondeu de imediato. Secou as mãos suadas na roupa e tomou um pouco da papa com um dedo indicador. Colocou na boca do príncipe, que devorou a comida. Estava faminto. Assim prosseguiram.
- É natural, uma quantidade minúscula - o ruivo respondeu, finalmente. - Pó de sono.
Os olhos de Kaha começaram a pescar outra vez.
- Vai dormir pesado - Berter defendeu o filho. - O suficiente para não te denunciar enquanto foge daqui com ele.
A ideia era de Odile. O filho de Berter estudava para ser curandeiro. O pó de sono estava em seu estoque. A rainha ficou feliz por ter acesso aos fuxicos de seus criados pela primeira vez. A ideia era dela, mas Rose estava apavorada.
Kaha apagou em seus braços.
Com a ajuda de Shirley, acomodaram o pequeno na sacola e não deixaram de lado o lenço com cheiro de mãe. A mulher o cobriu e colocou sobre ele duas frutas, uma distração tão boba que esperava que funcionasse caso precisasse mentir sobre o que levava com ela.
Estava pronta. Olhou para os três cúmplices que facilmente trouxe para seu lado, mesmo que com poucas explicações.
- Obrigada - murmurou.
- Vá, Rose - Berter exclamou. - Tire ele daqui.
- Pai? - a voz do garoto foi ouvida outra vez.
O olharam. O Filho de Berter olhava pela janela.
Todos congelaram. Sem pensar, aproximaram-se da vidraça para olhar para o lado de fora, para onde o garoto fitava.
Nascendo do meio do Mar de Pétalas, uma luz branca crescia e crescia.
Aquele momento tão divergente pedia por procedimentos diferentes. A coroação não era algo comum de se ver. Acontecia de geração em geração, filho assumindo lugar de pai.
Dessa vez, todavia, Sohlon fizera questão de abrir uma exceção. Queria que todos vissem a coroa novamente na cabeça de sua mulher.
Pisaram no estrado, rei e rainha, e voltaram-se para o seu povo, aquela parte rica que tinha sido convidada para estar ali. Alguns acomodavam-se nas mesas novamente, pegando discretamente os quitutes que os garçons ofertavam. Pararam quando os violinos pararam, em sinal de respeito. Naquele momento, sem exceção, toda a atenção estava voltada para eles. Para Odile.
O único som que perscrutou todo o saguão foi o dos passos do rei sobre o estrado de madeira recém instalado. Ele caminhou em direção ao marechal e tomou de suas mãos, com um sorriso de velhos amigos, a coroa que pertencia à rainha. Estava ainda mais linda do que antes, Odile observou com uma culposa cobiça. O ouro polido carregava novas pedras que assemelhavam-se à brilhantes ônix em um contraste com as esmeraldas que lhe homenageavam.
A rainha esperava ter conseguido esconder o quanto estava nervosa. Sentiu uma gota de suor escorrer por sua testa e conteve-se para não limpá-la. Lá fora estava frio, sabia, o que esquentava era o terror de dentro.
- Estamos aqui mais uma noite - Sohlon murmurou, mais dócil do que costumava ser ao se dirigir aos outros - para celebrar o retorno de Odile de Crisântemo - o homem a olhou -, minha esposa, a rainha.
Uma breve salva de palmas soou falsa aos ouvidos da mulher. Ela perguntou-se se sempre soaram assim. Sohlon prosseguiu, andando de um lado para o outro no estrado com a lábia e desenvoltura que ele tinha de sobra. Convenceu tantos de que seguirem Pouri era a escolha certa. Só alguém muito ardiloso seria capaz de convencer um reino inteiro de que vender sua alma e seu descanso após a morte era o caminho a percorrerem.
- Senhoras e senhores, nós sofremos muito - o homem fez uma pausa. - Foi um caminho difícil até aqui, onde Pouri nos abençoou com suas dádivas.
O discurso enojou Odile, estática como uma estátua. De soslaio, viu que Roto a observava. A lâmina gelada que tocava sua pele por debaixo do vestido lhe arrepiou, uma lembrança constante de que teria que pegá-la logo.
- Enquanto eu sofria aqui - apiedou-se de si mesmo o rei -, minha mulher sofria lá.
O homem a olhou. A rainha respirou profundamente, melancólica.
- Eu admito, meus senhores, que me perdi um tanto - prosseguiu. - Senti dor por perder meu único filho e, logo em seguida, minha esposa. Mas não imaginava a coragem desta mulher que chamam de rainha.
Os olhares recaíam sobre Odile como flechadas. Ela as aguentou.
- Odile sofreu o ódio infundado de um povo rebelde - a fúria de suas palavras convenceu outros.
Infundado?, pensou a rainha.
- E manteve-se firme e forte como a líder que é. Tornou à casa outra vez e, para minha alegria e deleite, tinha nos braços o meu filho.
Sohlon olhou para trás e sorriu para ela. Ela retribuiu, esperando que aquele sorriso ensaiado, assim como aquele discurso, convencessem tanto ao marido quanto aos que a olhavam. Roto sorriu também, quase uma risada, mas porque sabia que ela era uma boa mentirosa tanto quanto ele.
O rei tornou dois passos para trás e estendeu a mão para a mulher, que a tomou. Ele a beijou com um sorriso que guardava apenas para ela e a puxou para seu lado, para que ficasse ainda mais evidente aos olhos dos outros, quase como um troféu.
- Está pronta, minha esposa - falou com ela, mas para que todos ouvissem -, para se juntar a nós?
É agora, pensou a mulher, sentindo o gosto de bile na ponta da língua. A coroa, a morte de Sohlon, a morte de Roto e, por consequência, logo a dela. Agora.
Estava pronta para falar, caçar palavras de improviso no seu estoque, quando ouviu um arfar próximo que soou quase como um grito.
A rainha petrificou-se por um instante. Da primeira fila dos bajuladores, uma mulher levou as mãos ao peito. Olhou para a rainha assustada. Não, não para ela, percebeu Odile. Para além dela.
A rainha voltou-se para trás sob os murmúrios que cresciam das pessoas que se aproximavam para ver melhor, cochichando umas com as outras. Correu para o parapeito da janela.
Por um momento, toda Crisântemo congelou. O som tornou-se opaco e o oxigênio rarefeito. Viram, através da vidraça, a luz branca que subia do centro do Mar de Pétalas até o céu.
Uma, outra, como pequenos vagalumes nascendo do mar. Todos temeram, mas não a rainha. Ela soube imediatamente do que se tratava.
Subitamente, a adrenalina que subiu por suas veias carregava uma nova motivação. Não era mais fúnebre e temerosa, mas incrustada com uma esperança gritante de que, talvez, pudesse sobreviver. Tentaria. Estavam ali, seus verdadeiros aliados, e ela lutaria ao lado deles.
Enquanto o caos se instalava pelo saguão, a rainha abaixou-se e tirou da perna a faca.
Gritos ecoaram-se por todo o salão quando a luz explodiu do oceano e percorreu toda a cidade, crescendo até eles, apagando tocha por tocha nas ruas lá fora.
Durou um segundo, apenas, ela viu. Voltou-se para trás e Sohlon olhava para ela incrédulo, ainda mais incrédulo pela faca que ela segurava do que pela cena do lado de fora de sua vidraçaria. Por trás dele, Roto caminhava a passos largos, a própria adaga em mãos, pronto para rasgar o pescoço do rei. Odile viu a movimentação de canto de olho dos guardas que avançavam em sua direção.
Um segundo.
Agora.
Ela atirou a faca na direção de Roto, sabendo que nunca chegaria a tempo até ele. Antes de Roto cortar a garganta de Sohlon, antes da faca alcançar Roto, antes dos soldados findarem a vida de Odile, a explosão alcançou a janela. A vidraçaria estilhaçou, os gritos amplificaram-se, homens e mulheres e cadeiras foram pelos ares e as tochas se apagaram.
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