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84. Livre Arbítrio

Se estavam loucos, não sabiam dizer. Talvez a dor enlouquecesse, e isso eles já tinham vivido de sobra. Mesmo assim, quando pisaram em Cinzas, o frio glacial pareceu não mais atacá-los. A brisa ainda era congelante demais para ficarem sem agasalhos, mas guardaram peças de roupa extra e a única coisa que caía do céu agora era uma garoa fina.

Cinzas não lhes mostrou nada demais. Pelo menos não naquele limiar com Vocra. As árvores eram parecidas, igualmente dispersas e de altura similar. Nada de novo a não ser a terra que fazia jus ao nome. Era cinza como as histórias, cinza como nas lembranças distantes dos que lá nasceram.

Aquela caminhada pela floresta foi sem pressa alguma. Tinham acabado de alcançar o destino daquela viagem e não estavam felizes, tampouco sabiam o que fazer dali para frente. Foi um silêncio sem fim, pelo qual Azura guiou e Aurèlia apenas seguiu, mal mandando nas próprias pernas. Quando a Kino pediu para pararem, nenhum deles discutiu. Levantaram acampamento e, sem preocupações, acenderam uma fogueira. Se Cinzas era uma terra morta, de nada tinham com o que se preocupar. Assim, isolaram-se com seus próprios pensamentos.


Deitada de bruços em um amontoado de folhas caídas e tentando não se importar com as formigas que hora e outra a escalavam, Azura tentava distrair-se com a terra sob seu corpo, cinzenta como em suas lembranças. Estava começando a temer que aquela viagem tivesse sido em vão e a explicação para tudo aquilo estivesse longe dali.

A dor lancinante em suas costas nuas despertou-lhe dos devaneios. Segurou até o último segundo um grito de dor, que escapuliu de sua garganta como um ganido. Seu corpo já esfriara e agora sentia perfeitamente cada toque de Ginevra, por mais delicado que fosse, manuseando e limpando a ferida em suas costas.

- Está feio? - Azura indagou.

- Não - Ginevra mentiu.

- Mais um para a coleção - brincou com um humor ácido. - Vai precisar me costurar?

Ginevra pensou com uma breve pausa.

- Não sei se vai aguentar, Az. Talvez seja desnecessário.

- Eu diria que aguento, mas...

- Está exausta.

- Sim, estou.

- Eu também.

Elas olharam ao redor, para os amigos dispersos em volta da fogueira. Alaric dormia em uma posição que não parecia confortável, sentado nas raízes de uma árvore e com a cabeça apoiada no tronco, jogada para trás, como se tivesse resistido até o último segundo à exaustão. Apagou logo depois de Ginevra tratar de seu braço. A arandiana apenas limpou o sangramento e o estancou, assim como fazia com Azura.

Caiden finalmente dormira. Não quis que percebessem que chorava, mas todos perceberam. As lágrimas não cessaram até que pegasse no sono. Só ele sabia o que se passava na própria mente após perderem Frey.

Düran estava do lado oposto ao de Azura, olhando-a ser socorrida através do fogo. Seus olhos pescavam e prometiam logo ceder ao cansaço.

Aurèlia isolou-se e todos lhe deram razão. Estava próxima, conseguiam ouvir seus soluços esporádicos, mas não queria estar perto.

- Podem dormir - Kohan cochichou para Azura e Ginevra. As duas levantaram o olhar para ele. Kohan parecia ser o mais disposto entre eles, mas a feição carregada ainda carregava o pesar que todos compartilhavam. Ninguém conseguiu tocar no assunto. - Não estou com sono.

As duas acabaram por concordar. Azura aconchegou-se ao seu lado e Ginevra encontrou seu canto. Já estava sentindo falta dos roncos de Azriel. Aquele lugar silencioso onde apenas o trepidar das chamas podia ser ouvido lhe causava calafrios.

Kohan mentiu. Estava cansado, sim, mas não conseguiria dormir. Vendo-se o único acordado, distraiu-se na visão da fogueira apagando aos poucos. Não quis alimentar as chamas. Deixou-as morrer. Estava inquieto e sabia bem o motivo. Finalmente estava em Cinzas, na terra onde nasceu, onde sua mãe conheceu a mãe de Azriel, onde tudo deslanchou. O resto eram histórias. Aquelas, entretanto, diferentes de todas as demais que dispersaram-se pelo Vale de Awa como folhas ao vento, ainda eram um mistério angustiante.

Seu pai a preparara para tudo. Para lutar, para governar, para ser amada e respeitada. Para a vida e todas as suas intempéries. Para a morte, entretanto, Cássio não conseguiu.

Aurèlia não sofrera com perdas durante sua vida. Sentia a dor dos enlutados quando um ou outro morria na Pedreira, mas o dia em que realmente sentiu o luto ainda era recente, vendo as pessoas que cresceram como seu povo sendo dizimadas pelos soldados do rei. Aquela cena machucou-lhe. Machucou tanto que por diversas noites seguidas Aurèlia não conseguia dormir. Todas as vezes em que fechava os olhos, as lembranças voltavam.

Dessa vez, entretanto, descobriu os limites de seu sofrimento. Leu em algum lugar que é possível morrer de tristeza, sim. Seu corpo libera adrenalina e cortisol e de repente seu peito parece que vai explodir. Seu coração acelera e você fica sedento pela dopamina que não vem. As artérias se enrijecem e você morre aos poucos. Lembrou-se de achar aquilo mórbido demais. Ninguém morre de tristeza, pensou. Pessoas morrem por doenças, por idade, por terem suas vidas tiradas, por infortúnios acidentes do destino, mas de tristeza, não.

Entretanto, naquela frígida noite sem fim, sozinha e tentando tragar o cigarro que roubou da casa que os abrigou em Vocra, Aurèlia teve certeza de que estava enganada. Apenas parara de chorar porque não tinha mais lágrimas para saírem. Seus olhos estavam ressecados e ardendo. Ela sentia desesperadamente o coração bater em seu peito com força e cada vez mais rápido. Parecia que aquilo nunca acabaria.

- Quer ficar sozinha?

Tampouco assustou-se com a pergunta repentina. Ouviu-o aproximar-se e esperou que fosse embora. Ela logo reconheceu a voz de Caiden. Aurèlia deu de ombros e pouco se importou se ele conseguiu enxergá-la na escuridão.

Sem saber a resposta, Caiden aconchegou-se ao seu lado.

Ficaram em silêncio, como se estivessem novamente sós. Conversaram pouco, os dois, durante o tempo em que se conheceram. Estavam sempre com um intermédio. Esse intermédio, entretanto, era o motivo dos dois estarem acordados quando queriam dormir.

- Não consegue dormir? - o daviliano arriscou outra vez. Vez ou outra via o rosto da Kino aparecer na escuridão, iluminado toda vez que ela tragava o cigarro. Fazia isso com sede, como se quisesse que aquele pequeno objeto em suas mãos pudesse matá-la logo.

- Você consegue? - Aurèlia debateu. Ela ofereceu o bolado ao homem, que o aceitou sem pestanejar. Quando tragou, Aurèlia viu seus olhos inchados e delineados por olheiras. Imaginou que ela mesma estivesse assim.

- Quer falar sobre isso?

- Sobre o que?

- Sobre ela.

Aurèlia debochou.

- Não sei como você lida com suas perdas, Caiden, mas eu não funciono assim.

- Prefere guardar as mágoas para si?

- Prefiro, sim - a Kino remoeu. Percebeu o quanto suas palavras foram incisivas e grosseiras. Talvez ele precisasse falar. - Eu só... não quero me lembrar.

- Eu não quero esquecê-la.

- Não estou falando de me esquecer dela, Caiden.

- Então do que está falando?

- Estou falando de me lembrar da hora em que ela morreu, porra! Bem na nossa frente, horas atrás. Eu quero só...

- Enterrar, eu sei - Caiden encontrou os olhos dela. Estavam vermelhos, assim como a ponta de seu nariz. - Podíamos só...

- O que?

- Fazer o que fizemos para Bron.

- Aquele filho da mãe não merecia um segundo do nosso tempo - a Kino levou dois dedos ao centro da testa e a massageou. Estava sentindo os efeitos da desidratação.

Caiden pensou em perguntar o motivo do ódio, mas não queria desviar do assunto que lhe importava.

- Fazer melhor, então - resmungou. - Eu acredito que... se externalizarmos a dor, se só colocarmos um ponto final nisso, nós conseguimos seguir em frente.

Aurèlia respirou profundamente. Percebeu que não queria seguir em frente.

Novamente, deixou a conversa morrer. Caiden observava sua silhueta, mas não conseguia decifrá-la. Pelo menos dois minutos ficaram em silêncio, lado a lado. Caiden ameaçou levantar rumo ao seu posto, mas percebeu que aquele tempo era apenas um momento necessário para a Kino. Sua voz saiu arrastada quando desenterrou o passado.

- Quando eu era pequena, achava que os Deuses faziam tudo por nós. Literalmente. Eu não sei quantos anos eu tinha, mas eu tenho essa memória tão vívida. Achava que Eles tinham um roteiro pronto onde dizíamos bom dia, boa tarde, que tropeçávamos naquela pedra no meio do caminho, que chovia determinada hora do dia e que nosso destino estava literalmente escrito, palavra por palavra, e nada dependia de nós. O que me fez questionar muito quem eu era e porque estava aqui, sendo uma peça nesse jogo que é a vida - Aurèlia fitava o vazio, recordando lembranças distantes. - Fui entender depois o que é o livre arbítrio e... ao mesmo tempo que me deu tanto alívio, me deu tanto medo. Quando eu achava que os Deuses mandavam na minha cabeça, podia culpá-los por qualquer deslize. Pelos micos que eu pagava, pelas noites em claro com cólica, pelas palavras ditas e as não ditas, mas quando percebi que tudo dependia apenas de mim... Eu não tenho a quem culpar - sua voz soou embargada. Foi quando Caiden percebeu que ela chorava. - Eu errei aquela flecha, Caiden. Eu poderia ter dado mais uma chance a ela, que fosse. Se não existisse livre arbítrio, eu poderia culpar os Deuses e ficar aqui sentada questionando o porquê de terem escrito o caminho de Frey assim, mas a culpa foi minha. O plano foi meu.

Aurèlia levou uma das mãos à boca e abafou um soluço. Seus olhos ardiam.

Caiden não soube o que falar. Talvez fosse exatamente o que ela precisava, ou talvez apenas tivesse tocado em uma ferida tão recente que nem ao menos parara de sangrar. Resolveu também jogar suas dores na fogueira.

- Eu não voltei por ela - viu quando os olhos marejados de Aurèlia voltaram-se para ele. - Eu fui embora. Seu plano era que... a ajudássemos a vir para cá. Que passássemos por aquela árvore e a trouxéssemos. Mas ela me mandou ir embora e eu... eu fui. Eu, covarde, fui. Dei as costas para ela e...

- Não foi culpa sua.

- É onde eu quero chegar, Aurélia - o homem cochichou. - Não foi minha culpa. E nem sua. Se carregar esse fardo, vai afundar cada vez mais. Ninguém devia carregar uma bagagem tão grande. Eu não posso deixar isso acontecer.

- E por que se importa? - Aurèlia estranhou.

- Porque ela não ia querer isso.

Aurèlia olhou para as palmas das mãos, mesmo que não as enxergasse claramente repousadas em seu colo. Fechou os olhos.

- Eu nunca a entendi, sabia? - lembrou. - Quando ela chegou, era uma pirralha irritante. Sempre foi. Eu cresci sendo a mais bonita, a... a mais vaidosa, talvez. Mas era por ela que todos caíam.

Caiden riu.

- Eu sei bem.

- Ela tinha lábia, não é? - Aurèlia riu. - Alguma coisa naquele cabelo frisado e naqueles olhos castanhos era... era demais. E eu não vi. Você, tão pouco tempo ao lado dela, viu, não viu?

O daviliano concordou.

- Eu lembro do dia em que... nos iniciaram. Para os Kinos, digo. Ela estava bêbada e deu em cima de mim.

- Muito descaradamente, eu lembro.

- É, acho que não escondemos bem - Caiden riu.

- Todo mundo viu - Aurèlia o acompanhou.

- Eu acordei na manhã seguinte sem ela do lado. Achei que tivesse sido só uma transa, uma noite boa, mas... ela voltou com um chá. Um chá horrível, por sinal. Perguntou dos meus problemas e... eu não quis mais desgrudar dela - Caiden lembrou. - É assim que vou lembrar dela.

- Hm? - Aurèlia estranhou.

- Assim. Feliz, confidente, parceira. Tinha um lindo sorriso e um beijo... - Caiden passou a língua nos lábios, sentindo falta do contato. - É assim que eu vou lembrar dela. Não nessa noite. Essa noite não aconteceu e eu vou apagar da minha memória. Eu vou lembrar dela como eu a conheci, suada e descabelada jogando bola na clareira ou... bêbada e divertida, com gosto de hidromel e cheiro de jasmim.

Aurèlia abaixou a cabeça. Sentiu seus olhos pescarem cada vez mais. Ela repousou o corpo na grama, deitando-se de lado. Esperou que Caiden desse aquela conversa como findada.

Logo, o daviliano entendeu. Levantou-se e a deixou só. Esperou que aquela breve prosa tivesse feito tão bem para ela quanto fez para ele. Sempre foi assim, um homem de soltar a dor, e não retê-la.

Aurèlia fechou seus olhos. Queria também uma boa recordação da irmã. Assim como Caiden, apagaria aquela noite de sua memória. A que decidiu por ficar no lugar foi o dia em que uma pequenina Frey disse que ela seria a melhor.

- Não, Frey - confidenciou ao vento. - A melhor foi você.

Assim que murmurou a última palavra, conseguiu dormir.

Ela não se cansava de admirá-lo. Kaha, deitado no sofá, brincava com os próprios pés e seus lindos olhos verdes estavam vidrados no ambiente ao seu redor, reconhecendo cada som, cada luz, cada sensação.

- Ei - Odile sorriu quando seu filho olhou para ela. Um lindo sorriso desabrochou nos lábios de Kaha ao reconhecer a mãe. - Quem é o bebê mais lindo do Vale de Awa?

A rainha beijou a ponta de seu nariz. Kaha riu e puxou seus cabelos, como habitual. Ele sempre tentava levá-los à boca, mas a rainha desenrolava seus fios negros das minúsculas pontas dos dedos do filho e lhe dava outra distração.

- Não conte para ninguém, mas é você.

- Não tenho como discordar.

De trás dela, Lírio apareceu. A rainha sobressaiu-se, mas se recuperou ao vê-lo parado no batente da porta, sorrindo para ela com seu charme ao encontrá-la feliz e distraída do que acontecia do lado de fora.

Dante lhes oferecera a casa. Era grande o suficiente para que ficassem lá com ele, por mais que passasse grande parte do tempo nos braços de um arandiano de olhos cativantes. No andar de baixo, o Kino conversava sobre assuntos diversos com Fin e Lili descobria os reflexos do pequeno Deco. Estavam mais aliviados, todos eles, ao saberem que os pais ainda estavam vivos. Foi quando perceberam que aquela doença afetava cada um de uma forma. Por mais enferma que estivesse Celeste, ainda estava viva. Pöli tinha seus momentos de fraqueza, mas aguentava firme e forte. Outros, entretanto, morriam em horas. Outros adoeciam sem nem ter tido contato com doentes. Viver dentro do Vale de Awa estava cada dia mais desafiador.

Lírio encostou a porta atrás de si ao passar. A rainha levantou-se de onde estava, ajoelhada ao lado do sofá, e sorriu-lhe um sorriso que ele conhecia bem. Era juvenil e cativante, verdadeiro. Odile percebera que não sorria assim em anos.

Os dedos de Nikki envolveram sua cintura e a puxaram para mais perto. Aquela era a melhor hora do dia, quando ele a tomava nos braços depois de exaustivas horas.

- Está se saindo bem, minha rainha - murmurou com os lábios colados em sua têmpora.

- Estou tentando nos dar mais uma chance - Odile sorriu, mas seus olhos a traíram. Nikki percebeu.

- Vai dar tudo certo, Daisy.

- Eu sei que vai - Odile rapidamente olhou para trás. Desfez-se do abraço de Nikki e tornou ao filho. Kaha aconchegou-se em seu colo. Ela o deixou em pé, segurando-o voltado para o mundo e não para ela. Ele parecia gostar. Aqueles olhos esmeralda como os da mãe encantavam-se com Nikki e o carinho com que ele tratava aquela família que não deixava de ser dele.

- É engraçado - o homem passou a ponta do dedo indicador na testa da criança com delicadeza. Gostava da feição do pequeno ao fazê-lo. Parecia sentir o amor emanar de um gesto tão singelo.

- O que é engraçado? - a rainha indagou.

- Um mês atrás eu não tinha nada - Lírio recordou. - Quer dizer, eu tinha. Não vou ser ingrato pela vida que os Kinos me deram. Eu os amei e os amo, mas... de um dia para o outro você apareceu. Voltou para mim. Foi como se o mundo ganhasse cores de novo e... trouxe esse pequeno pacotinho de amor com você - Kaha espirrou, arrancando uma risada do casal. - E aí... meu irmão te seguiu até a minha casa. Não pode ter sido coincidência... E de um dia para o outro eu ganhei três sobrinhos incríveis. O que eu quero dizer é...

Ela entendeu.

- Não vai perder nada disso, Nikki - Odile alcançou o rosto do homem e envolveu-o com uma das mãos. Lírio fechou os olhos e sentiu o toque delicado da mulher. Ele levou uma das mãos à dela e a apertou com ternura. - Eu vou cuidar da gente.

Lírio meneou para frente, a um passo de encostar seus lábios nos dela, quando a porta escancarou-se. Kaha assustou-se com o desespero de Fin e chorou.

- Daisy! - o adolescente gritou.

- O que foi, Fin? - a mulher balançou o filho nos braços, mostrando que tudo estava bem. Ao olhar nos olhos de Fin, percebeu que talvez não estivesse.

- Tem alguma coisa errada - murmurou, quase sem palavras. Odile viu-o engolir em seco.

Fizeram silêncio e os ouvidos se apuraram. Do lado de fora, a balbúrdia cresceu como se ateassem fogo na palha. O estômago de Odile embrulhou-se. Ajeitou Kaha nos braços e não hesitou em correr escadas abaixo, porta afora, rumo ao centro da Pedreira.

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