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82. Três Flechas

Planos têm margens de erro, planos B's e C's, todos sabiam disso, principalmente Aurèlia. Entretanto, situações como aquela apareciam sem aviso prévio. Situações em que pensar rápido salvaria-lhes as vidas, mais do que um plano bem feito o faria. Nesses casos, não havia margem para erros. Era tudo ou nada, onde improvisações poderiam ser necessárias, principalmente por Aurèlia ter lhes dado apenas poucas palavras e ordens rasas.

A Kino sentiu a palpitação no coração ao separar-se do grupo. De um lado, Caiden, Azura, Düran e Kohan seguiram. Do outro, ela, Ginevra, Frey e Alaric. Queria ter olhos nas costas ou qualquer coisa parecida que lhe ajudasse a dizer que estão todos bem.

Sentiu uma mão envolver a sua com ternura enquanto andavam rapidamente. Olhou para o lado. Frey, segurando as caretas de dor e andando o mais rápido que seu corpo lhe permitia, tentou sorrir, um gesto que Aurèlia não esperava de uma situação como aquela.

Relaxe - leu dos lábios da quase irmã. - Estamos chegando.

Aurèlia apertou-lhe a mão de volta. Agradeceu mentalmente pela força que um pequeno meneio lhe proporcionou. Olhou para Alaric e Ginevra. Estava na hora de se separarem mais uma vez.

A bruxa a seguiu sem questionar, pisando devagar pelos galhos da floresta como se não pesasse nada. Aprendera um pouco em seu tempo com os Kinos. Alaric, para ganharem tempo, passou um dos braços de Frey por seus ombros e a levantou por debaixo dos joelhos da Kino, deitando-a em seus antebraços. Frey segurou um urro de dor, mas a adrenalina que voltara a correr por suas veias era um anestésico ainda melhor que as ervas de Ginevra e qualquer álcool que ingerira outrora.

À distância, um som fez-se presente, sobressaindo a qualquer murmúrio da floresta até então. Alaric e Frey se entreolharam, reconhecendo os gritos de afronta das iscas que chamavam de amigos e irmãos.

- O que fazemos? - Düran indagou, andando ao lado dos outros e ofegando de nervoso e cansaço.

- Barulho - Kohan respondeu, ríspido, como se a resposta fosse óbvia.

Afastavam-se cada vez mais da ponte e a sensação era de nadar contra a corrente, rumo a um destino que não lhes era o objetivo.

- E quando vierem atrás de nós? - Düran reforçou, frustrado. Não teve tempo de debater.

- Os matamos - Caiden respondeu.

- Nos escondemos - Azura retrucou. Os outros três a olharam procurando por respostas. - A ideia não era matá-los. Era só afastá-los da ponte.

- Podemos acabar com eles - Caiden reforçou. - Já fizemos isso uma vez.

- A que custo? - Azura fuzilou-o com o olhar. - Não precisamos comprar mais uma briga.

Caiden abriu a boca para discutir, mas a petrichoriana estava certa. Por mais que sentisse sede de sangue e vingança por aquelas criaturas, principalmente pelo que fizeram com Frey, ele sabia que era um risco a mais enfrentá-las por vontade própria. Conseguiam sentir o cheiro de Cinzas, estavam perto demais de um destino que até então lhes era incerto e duvidoso. Não podiam colocar tudo a perder.

Quando afastaram-se o suficiente, pararam. Brevemente se entreolharam antes de começarem a arruaça pelas matas limiares de Vocra.

De uma distância segura, Aurèlia e Ginevra estudaram aqueles animais, estáticas como pedras, escondidas por árvores de madeira frágil e úmida e folhagens secas. Mesmo de onde estavam, sem uma visão perfeita, aquelas criaturas eram assustadoras. Conseguiam vê-las melhor, apesar da ausência de uma clara fonte de luz. Hora andavam sobre quatro apoios, hora eretos como homens. Não tinham músculos, mais parecendo puras estruturas ósseas com extremidades compridas e pontiagudas como se carregassem nas mãos adagas prontas para cortar gargantas a sangue frio. Vagavam por aí sem seus olhos, apurando a audição para ouvir suas presas. Um deles, próximo a elas, levantou-se rapidamente quando ouviram os gritos de agitação distantes. À princípio Aurèlia e Ginevra não entenderam, mas logo decifraram as vozes de seus companheiros de viagem. Esconderam-se melhor atrás das árvores quando as criaturas grunhiram e dispararam como flechas em direção à mata, distanciando-se da ponte que lhes era o destino.


Aurèlia respirou profundamente e tomou a dianteira outra vez, como já estava habituada. À contragosto, Ginevra a seguiu. Passos mais pesados foram dados, mas não olharam para trás para ver se foram seguidas. A balbúrdia e gritaria que os quatro geravam do lado oposto ao delas era o suficiente para encobri-las.

Aurèlia parou aos pés da ponte. Estava ainda mais degradada do que esperava. Era consideravelmente estreita, um espaço que com certeza não era uma rota oficial de Vocra para Cinzas em tempos distantes. A Kino calculou um metro e meio de largura e o que lhe pareciam infinitos em comprimento, em uma sequência de tábuas de madeira cobertas por neve e duvidosamente estáveis que se perdia na escuridão onde seus olhos não enxergavam. Viu uma luz acender-se atrás dela e virou-se.

Ginevra acendeu uma tocha e a fincou na terra, aos pés da ponte. Acendeu outra e a estendeu a Aurèlia. Esta quase se esquecera de que, em seus próprios planos, iria na frente. Engoliu em seco.

- Faça sua mágica, Gine - Aurèlia pediu, ainda cochichando. - Não me deixe cair.

Ginevra respirou profundamente. Estava fora de forma. Não treinara tanto durante aquele tempo na Pedreira quanto poderia. Suas preocupações iam longe e nem ao menos sabia se um dia tornaria a fazer o que um dia fez na Clareira com os Kinos, defendendo-os bravamente. Pelo menos, não sabia se o faria com sua bruxaria.

A bruxa ajoelhou-se aos pés da ponte, ao lado de Aurèlia, e inspirou profundamente. Quando disse que conseguia, disse sem pensar. Achava que alguns truques poderiam fortalecer uma fraca estrutura. Mas uma estrutura como aquela, que não parecia segurar nem uma Aurèlia sozinha, lhe pareceu um desafio impossível.

- O que acha que tem lá embaixo? - sua voz falhou ao perguntar.

Aurèlia inclinou o corpo para frente do abismo. A escuridão não lhe disse nada.

- Não quero descobrir - ignorou o nervosismo na voz de Ginevra. Enquanto olhava para trás, surpreendeu-se ao sentir a terra mover-se sob seus pés.

Ginevra fechou os olhos e contou com a proteção da Kino. Talvez da outra também. A essa altura, Frey já deveria ter uma boa visão delas - e uma boa mira. A bruxa estendeu as palmas das mãos sobre a terra e sentiu os resquícios da frígida neve queimarem sua pele pouco calejada. Lembrou-se das palavras de sua avó toda vez que lhe diziam que seria poderosa, uma bruxa que se daria bem com os elementos, com a natureza. Sendo assim, Ginevra evocou a terra.

A arandiana sentiu as vibrações da vida que, apesar da situação escassa em que se encontrava, persistia, assim como eles. A natureza não lhes deixou na mão.

Aurèlia estudou-a tão quieta que se esqueceu de respirar. Viu quando pequenas raízes surgiram de dentro da terra e pareceram ganhar vida própria. Deu um passo para trás. As pálpebras de Ginevra movimentavam-se, como se seus globos oculares estivessem inquietos por debaixo delas. Aos poucos as raízes aumentaram e cresceram e se fortificaram. Rumaram velozmente em uma dança síncrona com o vento em direção às estruturas daquela ponte precária, envolvendo-as como se em tranças que ligavam-se à terra firme.

O queixo de Aurèlia caiu ao ver toda a ponte - todas as cordas e tábuas frívolas - serem engolidas por raízes de árvores. Ginevra abriu os olhos. Segurou um sorriso ao ver a reação da Kino.

- Acha que resolve? - indagou.

- Sabia que trazer você era uma boa.

Sem mais nada dizer e deixando o comentário pairar pelo ar, Aurèlia deu o primeiro passo na tábua reforçada da ponte, em direção a Cinzas.

Frey enganchou-se nos emaranhados troncos de uma árvore escolhida a dedo por ela e seus instintos. Alaric ajudou-a sem questionar. Viu a cada passo e escalada que a Kino segurava seus gemidos de dor, mas nunca viu tanta determinação nos olhos daquela mulher. Supôs que fosse a necessidade de ser útil. Frey fora carregada por toda Vocra e agora tinha a chance de tornar a usar seu arco e flecha para retribuí-los.

- Pode ir - ouviu da boca da Kino quando esta finalmente conseguiu encaixar-se em uma posição perfeita nos altos troncos daquela árvore. Tirou a flecha da aljava e a aprontou no arco com uma habilidade que vinha de infância. Mirou na ponte para ter certeza de que seu alcance era perfeito. Por entre os galhos, a luz das chamas da tocha nos pés da ponte conseguia iluminar seu rosto cansado. Viu Ginevra e Aurèlia. Ainda não tinha certeza de onde a ponte terminava, mas estava convicta de que o lugar era perfeito para exercer a tarefa que Aurèlia lhe impusera.

- Vai ficar bem? - Alaric precisou confirmar.

Frey puxou-o para mais perto e beijou sua têmpora com força.

- Já fez demais por mim - sorriu. - Agora atravesse aquela ponte que vou cuidar da retaguarda de vocês.

Alaric sorriu em agradecimento vendo aquela determinação. Desceu dos galhos tranquilo e convicto de que a veria novamente.

Planos têm margens de erro, planos B's e C's, eles sabiam, mas estavam vivendo na base de uma perigosa improvisação.

Após a algazarra que provocaram há metros da ponte, os quatro esconderam-se ao ouvir os grunhidos animalescos aproximando-se de onde estavam.

Azura inspirou profundamente e certificou-se de que nenhum som saía de sua respiração. Cobriu boca e nariz com a mão livre. A outra segurava o arco e flecha. Optou pela arma de longo alcance. Não queria ter que enfrentar aquelas criaturas de perto. Fechou os olhos e recostou-se nos troncos de uma árvore. Ali, de olhos fechados, mentiu para si mesma que era uma criança novamente e brincava de esconde-esconde em Petrichor com Düran e as outras crianças vizinhas. Ela raramente perdia, mas vez ou outra era encontrada. Não se deixaria ser encontrada dessa vez.

Azura abriu seus olhos novamente quando os grunhidos aproximaram-se o suficiente deles para fazer seus cabelos da nuca se eriçarem de medo e nervosismo. Ela olhou para os lados e não encontrou nenhum dos outros três - nem Kohan, nem Düran, nem Caiden. Torceu para que também fossem bons de esconde-esconde.

Ginevra acompanhou-a com o olhar até que Aurèlia chegasse segura do outro lado, em terra firme. Teve certeza de que a Kino estava desesperada para comemorar, assim como ela. Viu quando Aurèlia fincou a tocha do outro lado da ponte, em Cinzas, como se fosse uma bandeira que anunciasse que finalmente chegaram ao destino.

Trêmula de medo e excitação, a bruxa deu o primeiro passo na ponte que ela mesma reforçou.

Alaric percebeu-se sozinho pela primeira vez desde que saíram da Pedreira. Não gostava do escuro, apenas o tolerava quando este era confidente de suas noites ao lado de Viorica. A lembrança da esposa fez seu peito doer de saudades e medo por ela. Esperava que estivessem bem na Pedreira, protegidos pelas barreiras que criaram, longe daquelas criaturas que pareciam ter saído dos livros de história que contavam sobre a era das trevas do Vale de Awa. Ele era cético até então. O corte que doía em sua clavícula era a prova de que monstros existiam.

Alaric seguiu a luz da tocha para não se perder, mas estava distraído. Seus passos pesados quebraram um galho seco sob seus pés. Algo próximo ouviu.

Aquele grito cortou o peito de Azura como uma espada. A mão escapou de sua boca e um pesado arfar fugiu por entre seus lábios. Ela reconheceu o agoniante brado de imediato. Não era próximo, nem de Caiden, Kohan ou Düran.

- Ric? - seus olhos se arregalaram. A tentativa de fazer o mínimo de qualquer som possível foi esquecida por um precioso segundo. Alaric gritava de agonia e ela não conseguiria apenas esconder-se. A mão rapidamente tomou uma flecha e a posicionou no arco. Percebeu as pontas dos dedos trêmulas. Não esperava ter que lutar.

Aquela árvore onde mantinha as costas coladas pareceu minúscula. Com agilidade e calculando seus passos, girou sobre as pontas dos pés e espiou as criaturas que os rondavam. Estavam distraídas, mesmo que próximas. Todas, sem exceção, como se por um instinto predatório, estavam de pé, voltadas para os gritos de Alaric, como se prontas para atacar. Ela não deixaria. Azura armou o arco e apontou para a cabeça do primeiro que grunhiu e ameaçou dar meia volta. Antes mesmo de disparar a flecha, outra acertou seu alvo. A criatura gritou de dor e caiu na terra escura da floresta de Vocra. A arqueira olhou para o lado direito e reconheceu a sombra em cima da árvore ao seu lado. Caiden juntara-se à briga com ela. Aparentemente era hora de seguirem o plano dele.

Já na metade da ponte, Ginevra olhou para trás, apavorada. Aquele grito perscrutou todo o abismo e a alcançou como se a petrificasse nas tábuas frágeis recém reforçadas por ela própria. Sua mão segurou o próprio coração, aflita.

Alaric! - gritou a todos pulmões. Seu grito determinou o início de uma guerra não mais às cegas.

- Corra, Gine! - Aurèlia gritou do outro lado da ponte. Estava com o próprio arco armado e apontado para a extremidade daquela frágil estrutura. Suas mãos não tremiam, mas sentiu medo. Estava só daquele lado. Era cedo para seu plano escapar de seu domínio tão cedo.

Ginevra olhou de um lado para o outro, sentindo a indecisão machucar-lhe o peito. Queria voltar por Alaric, mas queria fugir para a segurança de Cinzas.

- Ginevra! - por sobre o alvoroço, Aurèlia gritou-lhe novamente. Precisava garantir a segurança de pelo menos uma.

A bruxa sentiu vontade de vomitar. Fechou os olhos e por instinto - ou covardia - correu para esconder-se atrás da saia de Aurèlia.

Foi rápido como um raio. Alaric mal sentiu-se ser atingido. Estava próximo ao limiar entre Vocra e Cinzas e conseguia até mesmo sentir o cheiro das terras novas. Sua motivação para chegar ao fim daquela viagem foi tão grande que lavou sua cautela, levando-o ao descuido de pisar entre galhos pesados e folhas secas que estalaram sob seus pés.

Ele mal sentiu quando a lâmina atravessou seu bíceps, apenas gritou com o choque e o pavor de ter algo tirado de suas mãos tão rapidamente. De repente não via mais a ponte. De repente caiu no chão, as costas estiradas na terra, e foi quando a dor veio. Ele viu aquela criatura claramente pela primeira vez, de pé, à sua frente, com a boca entreaberta e que, mesmo que não o visse, sabia que estava ali. O animal gritou, Alaric também. Já era tarde para se esconder. Antes que a criatura finalizasse o que começou, Alaric contra-atacou.

Odiava o escuro tanto quanto odiava a solidão. Odiou-o ainda mais quando foi obrigada a lutar às cegas contra criaturas com audição apurada e sede por seu sangue - e o de seus amigos. A neve não mais caía, mas sua memória estava presente em cada milímetro daquela terra frígida, atrasando-os e afligindo-os.

Os instintos de Azura mandaram-na correr, mas ela não o fez.

Venha me pegar, seu animal - murmurou. - Não tenho medo de você.

Mentira. Suas poucas palavras atraíram a atenção do mais próximo, que voltou-se para ela e se esqueceu de Alaric. Este veio para cima dela, mas ela já trocara o arco e flechas pela adaga de seu velho pai. Antes que ele a atacasse, ela atacou.

Não era como lutar contra os soldados do rei. Kohan acertou quando disse que aquelas criaturas eram estúpidas. Em nenhum momento deram sinal de serem seres pensantes como eles, apenas animais com instintos como qualquer outro. Era essa a vantagem que tinham.

Jogou-se naquela luta sem medo, a petrichoriana. Foi como se seu pai soubesse que um dia ela precisaria lutar no escuro e agradeceu mentalmente por todas as vezes em que a fez lutar de olhos vendados.

Quando finalmente relaxou por ter vencido um deles, o infortúnio puxou-lhe o tapete sob seus pés.

- Azura! - ouviu a voz de Kohan gritar por ela. Não, não por ela, para ela. Era um alerta. Nem ao menos conseguiu procurá-lo na escuridão quando sentiu as garras afiadas rasgarem a carne de suas costas e a levarem de peito ao chão, em uma miscelânea de gritos de dor e pavor.


Azura ouviu a flecha que atravessou o ar e acertou seu agressor ao seu lado. Sabia que Caiden lhe dera cobertura quando ouviu o último grito de dor da criatura antes desta morrer.

Fortes braços envolveram seu tronco com cuidado e desespero e a puxaram para cima. Mesmo no escuro, reconheceu o toque de Kohan.

- Vão! - a voz de Düran emergiu do breu. Aquilo não acabara.

Azura arfou, olhando para todos os lados, mas não os encontrou. Eram apenas sombras e silhuetas perdidas. Kohan a puxou para longe, em direção à ponte. Ela permitiu. Orou aos Deuses para que Caiden e Düran viessem logo em seguida.

Alaric puxou-se para longe, chegando à margem da ponte, aos pés do abismo. A criatura, ferida, o seguiu. Quando o homem voltou o peito para cima, exausto de lutar e sentindo o sangue fugir de seu corpo cada vez mais rápido, ouviu a criatura grunhir de dor. O animal voltou-se em direção às árvores e o arandiano viu quando outras duas flechas atravessaram aquele crânio desfigurado. A criatura caiu aos seus pés ao tempo em que ele se levantou. Procurou por sua salvadora na escuridão e conseguiu decifrar Frey onde a deixara. A Kino sinalizava para que ele seguisse caminho. Não queria ir. Não sem ela.

- Ric! - ouviu Ginevra gritar do outro lado da ponte. Estava bem, segura, iluminada por uma fraca tocha, assim como ele. O arandiano vislumbrou a feição de Frey uma última vez antes de pisar na ponte. Ela estava determinada como nunca, parecia mais viva do que antes de se ferir.

Vá! - leu de seus lábios. E ele o fez.

- Kohan - Azura murmurou, apoiando-se no homem por todo o percurso até a ponte. Pararam apenas quando se viram banhados pela luz da tocha que Ginevra acendera.

- Estamos quase lá - o homem respondeu sem olhá-la, apenas focando em frente, ao destino e segurança do outro lado.

- Não podemos deixá-los - Azura, por sua vez, olhava para trás. Não conseguia segurar os gemidos de dor esporádicos que insistiam em subir por sua garganta.

- Você vai, eu volto por eles - Kohan colocou-a aos pés da ponte. Viu Alaric chegar ao fim de seu trajeto. Quando Azura pisasse em Cinzas, já seriam metade em segurança.

- Não - esbravejou.

- Agora não, Azura - o homem cuidadosamente direcionou-a para a ponte. Beijou-lhe a testa, mas não lhe deu espaço para que voltasse atrás.

- Não vou sem você - os olhos cinzentos da garota brilharam à luz amarelada. Envergonhou-se da voz chorosa.

- Eu vou logo atrás - Kohan mordeu o lábio, nervoso. - Eu prometo. Agora vá, Azura.

Não queria, mas foi. Sentiu o sangue escorrer por suas costas, mesmo que a ferida não mais doesse. Ela sabia que era temporário. Deu as costas para Kohan e subiu na ponte. Esperou indefinidamente que ele logo se juntasse a ela.

Kohan puxou o facão e esperou.

Já completamente alheios à discrição que outrora prometeram, Düran e Caiden correram sem olhar para trás. Sabiam que estavam juntos, entretanto. Foi uma boa batalha às cegas e uma dupla improvável mostrou-se forte. Entretanto, mais e mais seres com bocas cheias de dentes e sem olhos vinham de todos os cantos atrás do som daquela batalha, curiosos e furiosos. O destino pareceu-lhes certo quando finalmente viram a luz no fim do túnel, a tocha tremeluzente que os chamava à ponte e à passagem para um mistério de décadas. Azura estava no exato meio da ponte, que balançava sob seus pés à medida que andava, pesada e esgueirando-se por cordas debilitadas e segurando a dor e consciência por mais um instante, que fosse. Poucos metros.

Düran seguiu em frente e Kohan lhe deu passagem. O petrichoriano pisou na ponte. Eram cinco.

Caiden, entretanto, parou. Ele contou os do outro lado. Alaric, Aurèlia, Ginevra. Azura e Düran. Kohan estava ao seu lado. Faltava uma peça importante da equação.

Quando o homem voltou-se para trás, uma das criaturas avançou o perímetro, mas uma flechada certeira na glote não a deixou continuar. Caiden encontrou Frey na copa das árvores. Viu pelo canto de olho quando Kohan subiu na ponte.

Vá! - ele lia da boca da mulher repetidamente. Com o arco armado, estava pálida e assustada, mas determinada. - Vá!

E você? - foi o que conseguiu murmurar.

Frey fuzilou-o com os olhos e Caiden viu-se em um impasse. Ir sem ela ou voltar por ela. Seu lábio inferior tremeu.

Vá, porra! - Frey sentiu vontade de gritar, mas conteve-se. Outra flecha atingiu um animal que aproximava-se de Caiden. Dessa vez, do outro lado da ponte. Aurèlia. Lembrou-se de suas palavras: eu nunca erro.

Quando estava prestes a voltar por Frey, ouviu um súbito som de rompimento. Aquilo não podia significar nada bom. Ele olhou para a ponte e ouviu os três sobre ela gritarem. Um dos lados da corda, escorada em Vocra, estourou. Estavam a um descuido do universo para caírem na escuridão do abismo.

Azura gritou, mais por medo de perder os outros do que por si mesma. Quando a corda estourou, escorou-se do outro lado e agarrou-se sabendo que sua vida dependia de seus braços aguentarem um pouco mais. Ela olhou para um de seus lados. Düran e Kohan estavam bem, segurando mais firme que ela. Olhou para o outro. Uma mão estendida estava lá por ela. Respirou fundo e calculou onde pisaria, cada detalhe. Quando finalmente alcançou a mão de Alaric, este a puxou para a terra firme de Cinzas. Estava finalmente em Cinzas.

Düran e Kohan lutaram contra o tempo. Estavam cada um por si, por mais que quisessem estar todos por todos. Se a corda estourasse, morreriam, sem sombra de dúvidas. Ainda restavam-lhes três pilares que os sustentavam precariamente. Entretanto, ouviram a corda arrebentar fio por fio cada vez mais. Apressaram o passo e não ousaram olhar para baixo.

Caiden estava em perigo, em espaço aberto, à beira de um abismo, mas não podia deixar Frey. Não queria. Entretanto, precisava. Ela estava escondida. Ele, a um passo da morte.

Olhou para a Kino mais uma vez, mas esta não o olhou. Estava focada em proteger seus arredores. Ele queria que ela o olhasse mais uma vez, pelo menos, mas não teve sua atenção. Caiden subiu na ponte, esgueirando-se temeroso, e torceu para que Frey continuasse ali, despercebida. Se precisasse, voltaria para buscá-la.

Frey sentiu como se o coração fosse sair pela boca, tamanha era a adrenalina que percorria suas veias enquanto atirava as flechas nas criaturas parvas que entravam em sua linha de visão. Do outro lado da ponte, Aurèlia juntou-se à ela. Se não estivesse tão tensa, sorriria.Gostava de lutar ao lado dela.

Não eram dois, não eram quatro. Aqueles animais brotaram em dezenas por todos os lados e o nervosismo subiu-lhe à cabeça. As flechas estavam acabando na aljava. Ela parou por um segundo com as mãos trêmulas. Olhou para a ponte. Düran chegara. Kohan estava tão próximo que podia sentir o gosto de Cinzas. Caiden estava no meio.

Frey contou as flechas na aljava. Mais três. Olhou para baixo com lágrimas nos olhos. Eram muitos e, por mais burros que fossem, sabiam que caminho seguir. Não conseguiu conter-se quando um invadiu a ponte.

O coração da Kino parou por um instante. Ela viu a ponte balançar com Caiden sobre ela. Kohan cambaleou, mas pulou em terra firme. Só precisava que Caiden chegasse em segurança. Três flechas. Uma delas acertou na criatura que balançava a ponte. Outra vinha logo atrás, mas Aurèlia cuidou desta. Caiden acelerou o passo. Estava a metros de seu destino. Mãos estavam estendidas para alcançá-lo. Mais uma vez, uma das criaturas subiu na ponte. Caiden sentiu que logo aquela estrutura cederia e não temeu só por ele. Ele estendeu a mão para frente, sentindo a ponte bambear sobre seus pés.

A Kino já percebera seu destino naquele momento. Duas flechas. Posicionou mais uma no arco e mirou. Certeiramente, tirou mais uma das criaturas da ponte. Elas não podiam alcançar Cinzas. Não podiam.

A mão de Caiden estava estendida e faltavam centímetros para que o puxassem para o outro lado.

Frey quis ser forte até o fim, mas sentiu uma lágrima escorrer por sua bochecha, quente e contrastante com o frio.

Uma flecha.

Assim que os dedos de Caiden tocaram os de Alaric, Frey a disparou. Mesmo no escuro, fez jus ao seu título até o final. Sua flecha acertou a corda que segurava a ponte entre Vocra e Cinzas. Esta caiu, arrebentou, levando as insistentes criaturas com ela.


Silêncio.

Frey viu Caiden ser puxado para Cinzas e mais nada os unindo entre aquele abismo. Ela contou. Sete estavam lá. Ela estava sozinha em Vocra em um ninho de animais sedentos.

- Frey! - Caiden gritou. Um grito esganiçado de dor ao entender o que ela fizera.

A Kino tentou segurar o choro, mas falhou. Não se importava mais. Um soluço alto escapou de sua garganta. Quase imediatamente foi puxada de cima da árvore pela perna ferida, encontrada por seus perseguidores.

Frey! - Caiden insistiu. Seus joelhos rumaram ao chão, perdido e sem saber como ajudar. Lágrimas escorreram de seus olhos vidrados ao ouvi-la gritar. Queria voltar.

Eles estavam petrificados, assistindo de camarote e sem ter ao menos como retornar pela mulher que lhes cobriu as costas.

Aurèlia tinha mais uma única flecha. A Kino mirou na criatura. Viu quando esta puxou sua irmã pela ferida aberta na perna e Frey nem ao menos conseguiu reagir, tamanha sua dor. O animal montou sobre ela, que estava com as costas pesadas contra o chão. Por mais que tentasse esquivar-se, parecia saber que não teria como fugir.

Aurèlia tinha esperanças. Ela nunca errara o alvo.

Sua flecha disparou e foi como se o ruído desta atravessando todo o abismo tivesse lhes prendido por horas. A flecha, entretanto, não acertou a criatura. Fincou na árvore atrás dela, que escapou por milímetros. Foi quando Aurèlia abaixou o arco e as lágrimas finalmente brotaram em seus olhos.

Quis desviar da cena. Sentiu quando Düran tentou tirá-la de perto do abismo, mas ela o empurrou, tão desesperada que sentia como se pudesse se jogar naquela infinitude para voltar por Frey.

A criatura ergueu o punho e perfurou com as garras sem piedade entre as costelas de Frey.

Aurèlia nunca errou seu alvo. Sempre acertou javalis nos olhos e aves no coração. Quando mais precisou, quando a situação pedia-lhe para salvar a vida da garota que cresceu ao seu lado como irmã, entretanto, os ventos a desorientaram.

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