Capítulo 3- O Garoto Sem Rosto
A biblioteca que lá estava era diferente de todo o resto, como se não pertencesse àquele lugar, nenhum sinal de queimada ou algo que indicasse que fosse abandonada. Todos os livros estavam extremamente organizados e um delicioso cheiro de hortelã penetrava em suas narinas a fazendo respirar um ar completamente puro.
Se tivesse tempo e disposição talvez ficasse um tempo ali, pois como bibliotecária ela adorava ler livros, até o dia do trágico acidente mudou a sua vida de cabeça baixo. Mas agora tinha uma tarefa que cumpriria a todo custo.
Tocando sobre a maçaneta metálica da porta a empurra vagarosamente enquanto escutar seu rangido melancólico. Colocando apenas sua cabeça junto da lanterna do lado de fora para verifica qualquer sinal de perigo, que felizmente não pareceu.
Tomando coragem dá o primeiro passo antes do seguinte e logo se viu cercada pela escuridão da noite que diferente da outra não apresentava qualquer sinal de perigo, apenas seu de mistério. Respirando começa a atravessar o local e com a lanterna procurava qualquer sinal que fosse lhe ajudar.
Os sussurros não paravam, gostaria de saber o que diziam, contudo eram indecifráveis, como se fossem em outro idioma. O som da mateira estalando começava a ecoar cada vez mais forte, como se a perseguisse, cada vez mais perto e então ela se virou para ver o que tinha atrás dela.
E não viu nada além das sombras da meia noite do velho hospital abandonado, talvez fosse mais preocupação, contudo isso não quer dizer que não havia perigos ali. Só que outras dúvidas começavam a surgir e se os filhos dela fossem pegos pela escuridão? Haveria uma maneira de salvá-los?
O local era enorme e não havia ideia de onde começar e passando andar por andar procurando qualquer coisa que pudesse ajudá-la, até que passos foram escudados. Sua lanterna focou na origem do som e a única coisa que viu foi um pequeno vulto entrando calmamente em um dos quartos. O que seria isso?
Enquanto estivesse com a luz o mal não poderia chegar perto, seria sua zona segura o que lhe permitia investigar o que era. Sua curiosidade falava mais alto e aos poucos o local se iluminava com a presença dela e finalmente pode perceber que estava num refeitório. Andando em meio as mesas queimadas procurando por aquele vulto misterioso, até que o que ela viu a paralisou por completo.
Era o que parecia ser uma criança, envolta por uma névoa negra que parecia devorá-la lentamente. Um sorriso mostrando um pouco seus dentes, mas sua face não possuía olhos ou nariz, estava completamente lisa.
"Eu não quero nada com você, por favor" a pobre moça parecia suplicar por algum tipo de misericórdia enquanto a chama oscilava.
"Não se preocupe, não tenho medo de você e o oposto também pode acontecer" falou o menino tranquilamente enquanto balançava suas pernas.
"Eu só estou procurando meus filhos, você viu alguma outra criança por aqui? Só responde isso e irei embora" a mulher focava nos curtos cabelos negros do menino que pareciam flutuar.
"Tem várias crianças aqui, vai ter que ser mais específica. MAS não, não vi nenhuma nova nos últimos dois anos, há quanto tempo seus filhos morreram?" perguntou curioso.
"Faz um ano hoje, eu ouvi a voz deles. Eu tenho que achar eles rápido antes que..."
"A escuridão achar eles?" completou a frase a interrompendo. "A escuridão só ataca os vivos, os mortos só são pegos por aqueles que a abraçam de boa vontade"
"Meus filhos nunca aceitariam isso, eles nunca aceitaram essa coisa monstruosa." A mão ficou inconformada por pensar na possibilidade de seus filhos terem se estragados ao vazio.
Porém o menino apenas riu sem demonstrar qualquer sentimento. "Mas se pensar bem..." o menino parecia puxar algo de sua memória a fazendo ficar curiosa. "Faz um bom tempo que não vou na ala pediátrica, se não se importar eu posso te acompanhar até o local"
A mãe não estava em condições de recusar ajudar, mas o frio emitido por ele era algo tão sinistros que parecia que até os ossos de seu corpo fossem congelar. "Tudo bem, mas não tenho nada para lhe dar em troca de sua ajuda"
"Não se preocupe, não tem nada que você possa me oferecer que eu possa querer. Apenas me siga, só quero passar o tempo"
O menino passou por ela que mesmo assustada decidiu o acompanhar pelos corredores assombrados do Local. A lanterna não tinha nenhum efeito sobre ele, o que a deixava mais curiosa sobre quem seria esse menino, diferente das sombras solidas que se afastavam com a presença dela.
"Por que isso gosta de assustar as pessoas" perguntou a mulher.
"Os mortos não fazem mal aos vivos, a não ser que eles o procurem. Você veio no território deles, não ao contrário" informou o menino que caminhava indiferente a ela.
"Eu só quero os meus filhos, só isso. Depois disso irei embora e deixarei vocês em paz, tem como falar isso para eles?"
"Desculpa, a gente ainda não se comunica direito. Mas logo farei parte da escuridão" o tom de voz dele continha uma certa alegria que ela pode notar, o que causar uma certa estranheza.
"E isso não é ruim?" enquanto caminhava distraída olhando pelas janelas dos quartos, algo ao seu encontro a faz parar, o menino interrompeu seu trajeto.
"Porque seria?"
"Você seria apagado da existência, tudo que faz parte de você deixaria de existir. Como isso é bom?" Enquanto questionava o rapaz, ele pode notar que um cheiro de queimado surgia e cada vez aumentava.
"Responde-me primeiro, quando você perdeu os seus filhos o que você fez? Continuo vivendo normalmente ou desejou que tudo apenas acabasse?" A pergunta parecia ter atravessado seu peito a fazendo sentir mal.
"São duas coisas diferentes, eu jamais me entregaria para aquilo" rebateu a mulher, só que isso não fez o menino mudar de ideia.
"Eu imagino a mesma coisa com os meus pais, a dor que eles sentem e que ainda sentem. Eu estraguei a vida deles e me odeio por isso, não quero ficar pensando nisso para sempre nos pós vida, se a apenas me entregar a escuridão toda a dor e culpa acabará e assim poderei descansar para sempre" o menino seguiu o seu caminho, mas sua voz parecia mais melancólica.
"Você não pode desistir desse jeito" falou inconformada.
"Você desistiu, por que eu não posso? E não adianta negar, vejo isso pela sua aparência e pela lanterna, muito mais fraca que a luz da senhora. A senhora conseguia evaporar as criaturas, você no máximo afastá-la, o que por ora é o que você precisa."
Gostaria de dar um reposta, mas não tinha nada, os seus atos falavam por ela e então sobrou nada para fazer, nada além de o acompanhar. Só que o cheiro piorava com o tempo e logo o cheiro de carne queima revirava seu estomago quase fazendo ela vomitar.
"Meu deus, o que está acontecendo? Como alguém pode ficar nesse andar, isso aqui está pior que meu apartamento" falou a mulher que tampava o seu nariz sentindo um grande nojo.
"Não é só aqui, é em todo lugar. Foi nesse horário que o médico colocou fogo aqui e durante uma hora o cheiro volta, como se fosse uma memória. Durante uma hora isso fede igual o inferno."
No momento que os dois chegaram em frente ao seu destino a luz ilumina a placa a frente deles, Pediatria. Ao empurrar a porta percebe-se que algo a trancava, um peso enorme proibia a entrada deles. Após jogar o seu corpo contra a obstrução, ela não fez nada além de se mexer um pouco, respirava fundo e tentava mais uma vez.
Boom, o som da batida e a próxima era mais forte que a última, porém a única coisa que consegiu foi uma dor no ombro e risadas do fantasma ao seu lado.
"Qual é a graça?" Pergunto a mulher que esfrega o ombro.
"Sabe, as vezes é melhor pedir ajuda do que tentar fazer algo sozinho" em um piscar de olho ele atravessou a porta como se não existisse nada em seu caminho e logo após o que impedia era removida e a porta era passagem aberta.
"Por que não falou que conseguia fazer isso desde o começo?" para a pergunta da mulher ele apenas deu a costa e seguiu em frente.
A lanterna tinha um brilho fraco, mas varria cada canto daquele lugar a procura de algum sinal de seus filhos. O menino apenas assistia a mulher procurando.
"Você poderia me ajudar a procurar eles, por favor" pediu gentilmente e garoto apenas acenou e saiu olhando pelas proximidades.
Embaixo da cama, dentro dos armários, banheiro, não tinha nenhum canto que não fosse vasculhado. Porém a única coisa que a luz iluminava era moveis queimados e cinzas que pareciam flutuar. Então ela decide gritar pelos seus nomes.
O garoto apenas saltou em sua direção e tampou a boca dela, um simples gesto mostrava o que ele queria, silencio. A escuridão em sua volta parecia o devorar de grão em grão o que deixava ela assustada.
"A gente veio conversando o caminho todo, qual o problema? Eu não estou segura com isso, você mesmo falou. Eu preciso achar meus meninos"
"Ele não gosta de gritos, isso entrega quem está vivo. Os mortos só sussurram" respondeu o menino a fazendo exibir um olhar assustado.
"ele quem?" indagou para o rapaz.
Antes de responder sons de correntes sendo arrastada eram escudados, o murmuro dos mortos cessou por breves segundos. Seus passos pareciam trovões em meio á tempestade. A atenção dos dois é roubado os fazendo olhar para porta.
Surgindo em meio escuridão algo que parecia ser feito de carne apodrecida, quase alcançando o teto, seus braços pareciam duas toras de arvore e em uma das suas mãos uma lâmina ensanguentada, seus olhos eram completamente vermelhos. Ele não possui expressão ou algum rosto, apenas seu olhar focando a mulher.
"corre" sussurrou o menino.
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