[f(12) = 24 - x] Pequenas vitórias
No capítulo anterior:
Quando ela me tocou, eu vi.
Eu e Jimin juntos. Em centenas de realidades alternativas.
Tão rápido quanto a luz viaja pelo espaço, minha mente se lotou de imagens de nós dois como se fossem lembranças. Ao fim, minha visão escureceu e uma voz sem som reverberou em minha consciência.
Jimin é nosso destino. Cumpra nossa promessa.
[...]
🔮
— Jungkook? — A voz de Yoongi me alcança, arrastando-me para fora do que parece ter sido um transe.
Depois de piscar com total letargia, eu olho para ele. Por um momento, eu me sinto anestesiado, mas então minha atenção recai em Jimin, que finalmente começa a se levantar do chão.
Quando seu olhar encontra o meu, minha mente é bombardeada mais uma vez, tornando ainda mais vívidas as imagens de nós dois que o toque de Seon Yeong despertou em mim.
Minha mente gira tanto que meu corpo perde o equilíbrio e eu recuo com um passo, tentando me manter de pé.
— Jeon? — Agora é Jimin quem chama, mas eu apenas continuo olhando-o com os olhos arregalados, balançando a cabeça em negativas constantes.
Meu peito se aperta como se uma mão invisível me esmagasse inteiro e meu coração dispara contra os dedos que me aprisionam.
— Jeon, você está tendo outra crise? — Mais uma vez, Jimin pergunta. Ele ainda não recuperou a cor, mas sua preocupação está inteiramente voltada para mim.
Quando ele dá o primeiro passo em minha direção, um som abafado escapa por meus dentes cerrados com força e eu recuo mais uma vez, lançando um último olhar desesperado em sua direção antes de, quase instintivamente, correr para longe dele.
Eu corro por todo o hospital, ouvindo enfermeiros, médicos e seguranças chamando minha atenção até que eu chego ao lado de fora. Com o sol me encontrando mais uma vez, eu paro somente por mais um instante antes de voltar a correr.
Não pode ser. Não pode ser. Eu e Jimin nunca estivemos juntos, então por que as imagens não saem de minha mente?
Aquela mulher me deixou louco, exatamente como ela é. Então eu corro até levar meu corpo à exaustão, tentando assim exaurir minha mente até deixá-la vazia, livre de tudo que está acontecendo.
Mas minha força acaba antes que minha mente sofra qualquer efeito, então eu desabo na calçada, com as costas apoiadas contra a fachada de uma loja qualquer sem me importar com todas as pessoas que passam de um lado para o outro.
Taquicárdico, eu levo a mão ao meu peito para sentir as batidas aceleradas e descompassadas esmurrando minha palma e fecho meu olhos com força quando aperto o tecido de minha blusa.
Por que tudo isso continua acontecendo comigo?
Por que parece que, agora, eu estou completamente interligado a Jimin?
Nada disso faz sentido.
Levado pelo caos interno, eu reúno minha reserva de energia e me apoio na parede para me reerguer até olhar ao redor. Quando encontro o primeiro supermercado nas proximidades, eu vou direto até ele e compro um maço de cigarros baratos, rasgando o plástico que envolve a caixa antes de deslizar o primeiro para fora.
— Tem fogo? — Eu pergunto ao segurança, que me olha com desinteresse antes de negar. — Ótimo. — Resmungo sozinho, mantendo o cigarro em mãos quando caminho até a parada de ônibus, depois por todo o percurso até chegar em casa.
Ao entrar e percebê-la vazia, eu vou direto ao meu quarto e reviro meu armário em busca de meu isqueiro antigo. Quando o encontro, eu sento no chão e acendo o primeiro fumo, tragando fundo enquanto meus olhos continuam focados num ponto qualquer em minha cama bagunçada.
No silêncio de minha própria companhia, eu deixo a nicotina penetrar e se espalhar por meu corpo em busca de algum alívio, mas tudo que sinto é vontade de vomitar, de chorar e de morrer.
Mesmo assim, eu acendo o segundo e terceiro quase em sequência, até a fumaça se acumular em meu quarto, transformando-o numa cabine cancerígena que me envenena ainda mais.
Quando os cigarros não fazem efeito algum, eu os deixo de lado para ir até a cozinha, onde abro o armário mais alto e encontro uma garrafa de gin pela metade, a mesma que durante as noites, secretamente, minha mãe mistura com tônica e limão para beber sozinha. Talvez para adormecer o oceano revolto de sentimentos ruins que mora dentro dela.
Agora, é a minha vez.
Minha consciência turbulenta implora pela dose que acabo de preparar, mas a boca do copo mal chega à minha e eu ouço o som agudo das dobradiças sem lubrificação da porta ao se abrir.
— Hyung? — Então Junghee me chama ao aparecer na porta da cozinha, segurando as alças da mochila em suas costas, o uniforme da escola um pouco sujo e amarrotado.
Eu volto a afastar o copo, apertando minhas sobrancelhas ao olhar para o relógio ao lado da geladeira, depois de volta para meu irmão.
— Você deveria estar na escola. — Não preciso perguntar. Ainda está muito cedo para ele ter sido liberado das aulas.
A despeito de ser pego no flagra, ele não se abala muito.
Junghee nunca foi muito expressivo. Ele sempre foi tímido, ainda mais que eu costumava ser, e bastante introspectivo. Mas desde o acidente e consequente morte de nosso pai, ele parece ter se retraído ainda mais numa bolha de quietude e apatia. Por isso, ele ergue os ombros num gesto de desleixo, sem se alarmar.
— Você deveria estar na universidade. — Então dá o troco, caminhando até pegar a garrafa de água na geladeira. Quando também para ao meu lado para pegar um copo limpo, ele olha para o que tenho em mãos, depois seus olhos arredondados e castanhos sobem lentamente até meu rosto. — Você está bebendo, hyung?
Agora é minha vez de dar de ombros. Eu não preciso dar satisfações a um moleque de quinze anos, principalmente nas circunstâncias atuais.
— E está fedendo a cigarro. — Ele aponta mais uma vez, parecendo decepcionado, um tanto mais triste que o normal. — Achei que tinha decidido parar de fumar.
— Você é meu irmão mais novo, Junghee. Pare de agir como se fosse responsável por mim.
Ele continua me olhando, silêncio preenchendo a cozinha até que o estalo das pedras de gelo no meu copo parecem arrancá-lo de seu transe.
— Então você deveria começar a agir como se fosse o irmão mais velho. — Ele diz.
Eu não o respondo. Apenas fico em silêncio, copo na mão, enquanto ele finalmente bebe sua água e devolve a garrafa à geladeira, saindo da cozinha sem parecer ter qualquer outra coisa para falar. Mas então ele para e me olha, ali da porta.
— Mãe ficou preocupada. — Ele avisa, com um peso que quase me passa despercebido. — Ela foi te acordar de manhã cedo e você não estava em casa, mas seu celular estava. Avise a ela que você está bem, pelo menos.
Ele volta a segurar as alças da mochila, brincando com as pontas antes de voltar a pousar os olhos apáticos em mim.
— Ela queria que você fosse me levar na escola e me pegasse depois da aula, pra ficar comigo, porque ela tem um encontro depois do trabalho. — Ele parece cauteloso, agora, mas ainda amargo. — Não seja um babaca sobre isso, hyung. Deixa ela tentar voltar a ser feliz. Eu não aguento mais ouvir ela chorando no meio da noite.
Depois de tudo, eu esqueci sobre o suposto encontro de minha mãe, assim como deixei esquecida a raiva que senti sobre isso. Agora que lembrei, eu novamente sinto a mesma queimação na boca do estômago, minhas narinas dilatando quando puxo o ar com mais força.
Eu não consigo aceitar. Eu não consigo ver como isso não seria uma traição ao nosso falecido pai.
Da mesma forma, Junghee não parece disposto a aceitar qualquer resposta diferente da que ele espera. Então ele finalmente sai da cozinha e, sozinho, eu desconto toda a minha frustração e confusão no copo de gin e tônica.
Quando o álcool mostra seus primeiros efeitos depois da segunda dose, eu deixo o copo sobre o balcão e vou até meu quarto. Com a porta trancada, eu espero esquecer que o mundo exterior existe.
Eu espero esquecer das palavras de Junghee, do encontro de minha mãe... de Jimin e das imagens de nós dois que não saem de minha mente.
A falta de sucesso me agonia. Minha mente continua a mil enquanto eu não encontro qualquer distração, às vezes andando sozinho pelo quarto pela insuportável incapacidade de ficar parado, corpo tão agitado quanto mente.
Horas se passam até que eu gastei tanta energia quanto possível, deitado no chão do quarto, olhos focados no teto, sensação de aperto no peito me acompanhando há horas, desde que saí do hospital.
No silêncio quase absoluto do meu refúgio, o som do celular vibrando em minha cômoda soa mais alto do que deveria. Por pura falta de alternativas para me distrair, eu vou até o aparelho. Na tela, a notificação de uma nova mensagem de um número desconhecido.
Jungkook. (21:11)
? (21:12)
É Jimin. (21:12)
Onde você conseguiu meu número? (21:12)
Perguntei a todos os seus colegas de curso até encontrar um que tinha. (21:13)
Delete. Não me mande mensagens, menos ainda me ligue. (21:13)
Eu não precisaria mandar mensagens se você não tivesse corrido daquele jeito. Eu fiquei preocupado. O que aconteceu? (21:13)
Você está bem? (21:13)
Jimin, por favor. Só me deixa em paz. (21:14)
Eu estou preocupado, Jungkook. E nós estamos juntos nessa, então conversa comigo, por favor (21:14)
Você bloqueou este número.
Eu deixo o celular de lado, sentindo meu peito ainda mais apertado. Todos os sentimentos ruins de antes, agora, somados a uma sensação de arrependimento quase instantâneo. E me confunde ainda mais, porque eu não entendo o motivo de me sentir tão mal por ter, mais uma vez, afastado Jimin.
Não é a primeira vez que eu tento repelir sua aproximação, mas é a primeira vez que isso me faz sentir um nó na garganta, uma vontade de voltar atrás.
Mas eu não o faço. Eu me forço a aceitar em silêncio, na solidão, todos os sentimentos que me dominam. A noite passa. Junghee bate em minha porta, me chamando para jantar. Eu o ignoro. Ignoro o som discreto de minha mãe chegando em casa mais tarde que seu horário usual, depois de seu encontro. Ignoro quando ela também bate em minha porta.
Mas minha mãe não decide me ignorar.
— Jungkook... — Ela me chama, abrindo a porta com cuidado. Seus passos quarto adentro são o som seguinte que escuto.
Eu continuo calado, olhos abertos, o aperto no peito me consumindo por inteiro.
— Seu irmão me ligou para dizer que você estava em casa. — Ela fala ainda baixo. Sob a pouca luz que vem dos postes na rua, eu a vejo usando uma calça branca. A blusa é bonita e os cabelos parecem presos num penteado um pouco desajeitado, porque minha mãe nunca teve muito jeito para isso. Ela deixa a bolsa em cima da cama. É de couro sintético, de uma marca pouco luxuosa. Eu quem comprei para ela com meu primeiro salário, anos atrás, e ela ainda a usa em ocasiões que considera especiais. Então ela não se importa em se ajoelhar no chão ao meu lado com sua calça clara, mas tem o cuidado de deixar a bolsa velha e barata sobre o colchão. — Eu estava preocupada.
Meus olhos continuam pousados na bolsa. O nó na garganta se aperta, eu me sinto sufocar e minha visão se torna ainda mais comprometida, completamente turva.
— Filho... — Ela me chama, a preocupação subitamente mais visível em sua voz quando ela arrasta os joelhos pelo chão até parar ainda mais perto de mim, sua mão tocando meu rosto. — Por que você está chorando?
Eu não respondo, mas dessa vez não é por falta de vontade. O que me falta é coragem. Coragem para enfrentar tudo que está acontecendo. A mesma coragem que me faltou para viver depois que meu pai deixou fazê-lo e que continua se arrastando, piorando dia após dia.
Eu me sinto tão covarde. Tão ruim. Porque minha covardia me fez transformar toda a minha tristeza em raiva e isso machucou as duas pessoas que eu mais amo. Isso machucou minha mãe e meu irmão mais novo. Por minha causa, nossa família não perdeu somente o pai. Nós perdemos também o filho mais velho.
Nós estamos todos fragmentados, distantes uns dos outros, há três anos. E a culpa é minha.
— Jungkook... Filho... — Ela volta a me chamar, desesperada quando meu choro se torna audível, soluços e gemidos de dor escapando enquanto eu me sinto afogar de vez. — Meu menino, por favor... — E pede, desajeitadamente deitando ao meu lado e puxando meu corpo tão maior que o seu, tentando me proteger dentro de um abraço que eu não sentia há meses.
Minha mãe não demonstrava real afeto por mim há tanto tempo, sempre sendo afastada por minhas explosões de mal humor. E me machucava ainda mais sentir que ela tinha desistido de mim.
Mas agora enquanto ela me abraça e me pede desesperadamente para dizer o que está acontecendo, eu sei que ela nunca desistiu de verdade. E isso me faz chorar ainda mais.
Então eu choro até o ar faltar, até meu peito queimar. Eu choro até não ter mais nenhuma lágrima ou soluço, até não sentir força restante em meu corpo. Mas minha mãe não perde a sua sequer por um segundo. Seu abraço sempre protetor, sempre me segurando como se quisesse me proteger de todo o mal do mundo.
E finalmente exausto, eu dormi. No frio do chão, mas no calor de seu abraço.
No último instante antes de ceder ao sono, eu desejei que pudesse ficar assim por muito mais tempo. Mas horas depois, eu acordei sozinho.
Nenhum traço de minha mãe estando em meu quarto comigo, em nenhum lugar. Ela não estava ao meu lado, sua bolsa não estava em minha cama, a porta não estava parcialmente aberta, como ela a deixou depois de entrar.
Puxando o celular, eu vejo que são três da manhã. Já passou da meia noite. Um novo 21 de outubro começou. E tudo que aconteceu aqui, todo o choro, toda a fragilidade, todas as palavras carinhosas que ela disse enquanto me consolava... nada disso existe para ela. Não mais.
A solidão parece ainda maior, engolindo meu corpo por inteiro, e eu me arrasto até a cama, onde me encolho sem um abraço para me consolar e proteger. Onde contemplo o que parece ser o castigo mais doloroso já imposto a alguém.
E durante a madrugada, a sensação não alivia. O sono não volta a me embalar, por mais exausto que eu ainda me sinta. Eu apenas sinto a passagem de cada segundo, cada minuto e cada hora torturando minha existência até que o sol nasce mais uma vez.
— Jungkook, acor—
Apesar da luz irradiando janela adentro, eu não percebo que o dia já amanheceu até que minha mãe entra pela porta do quarto mais uma vez. Como eu já sabia, sem qualquer resquício de lembrança sobre a noite passada.
Mesmo assim, sua voz falha quando ela me vê já acordado, encolhido, com olhos inchados e lágrimas secas no rosto.
— Filho — Assim como na noite anterior, sua voz rapidamente se carrega com desespero e preocupação quando ela se apressa ao se aproximar. — O que foi? O que aconteceu?
Eu olho para ela, já está vestindo o uniforme da MoonMoon, e me sobe o impulso de dizer exatamente tudo que aconteceu. De jorrar tudo que eu venho sentindo há três anos.
Mas qual o ponto? Ela nunca lembrará.
Então eu tento não gemer tanto ao sentir meu corpo estalar com dores ao me mover para tentar sentar. Ao perceber meu esforço, ela coloca as mãos em meus ombros e me faz continuar deitado.
— É para levar Junghee na escola, não é? — Mais uma vez, eu tento levantar, mas seu toque continua me mantendo na mesma posição. — Eu já vou.
— Não, Jungkook. — Ela nega, tocando em minha testa como se para checar minha temperatura. — Fique deitado. Eu levo seu irmão.
Eu não tenho força para discutir, mas também não tenho tempo. Após me lançar mais uma olhadela preocupada, minha mãe sai do quarto. Muitos minutos depois, ela sai de casa com Junghee.
Sem qualquer impulso para enfrentar mais um dia que será apagado, eu mal me movo quando ouço meu celular vibrar continuamente. Apenas olhando para a tela, eu vejo que é o número de Jimin. É claro que o reset faria seu número deixar de estar bloqueado em meu telefone. Diante disso eu suspiro, silenciando a chamada antes de me virar na cama, escondendo minha cabeça debaixo do travesseiro para assim me esconder do resto do mundo.
Distraído em minha própria mente, eu não percebo o momento em que alguém entra em casa, o que me provoca um sobressalto violento quando sinto uma mão tocar em meu ombro.
— Eu pedi folga no trabalho para cuidar de você — Minha mãe diz, voltando a checar minha temperatura. — Vá tomar um banho, filho. Eu vou preparar uma vitamina para você enquanto isso.
Eu pisco, levemente desacreditado. Minha mãe nunca falta no trabalho, mas aqui está ela. Para cuidar de mim.
Sem reação, eu apenas assinto num gesto surpreso e desacreditado, percebendo o sorriso carinhoso que ela me direciona antes de acariciar meu rosto e beijar minha bochecha.
— Vá. — Ela insiste, puxando o lençol para longe de meu corpo. — Você está fedendo.
Eu olho para a roupa que estou usando já há mais de quarenta e oito horas, então sua observação faz sentido. Por isso, eu sigo calado até o banheiro.
— Fala sério, Junghee... — Mesmo me sentindo morto por dentro, eu não consigo ficar calado quando vejo que a privada está entupida mais uma vez. E nem é somente pelo loop. Junghee tem mesmo uma bosta massiva que entope nosso vaso quase religiosamente.
Depois de dar um jeito na merda alheia, eu me meto debaixo do chuveiro. A ducha quente cria um choque contra minha pele, me fazendo relaxar os músculos enquanto sinto a água escorrer de meus cabelos, por meus ombros até se chocar contra o chão e descer pelo ralo, apenas interrompendo o banho quando minha mãe bate na porta, dizendo que o café está pronto.
Indisposto, eu saio do banheiro para vestir um conjunto de moletom velho, porém limpo, depois sigo até a cozinha com a toalha pendurada em meu ombro, preguiçoso demais para secar meu cabelo apropriadamente. Quando me sento à mesa de quatro lugares, minha mãe coloca um prato com torradas e ovos mexidos ao lado de um copo de vitamina.
Já faz algum tempo desde que eu me sento para tomar café. Eu sempre tentava sair sem comer, mas na maioria das vezes ela me fazia parar na cozinha para comer o que já tinha deixado preparado para mim, coisa que eu fazia na completa má vontade, sequer me sentando para aproveitar sua comida ou sua companhia.
— A vitamina está muito gelada? — Ela pergunta, caminhando até parar atrás de mim.
Eu me assusto por um segundo quando sinto suas mãos puxando a toalha para secar meus cabelos, amassando-os suavemente para absorver a umidade enquanto espera minha resposta.
Com os olhos baixos, eu balanço a cabeça para os lados.
— Está boa. A comida também. — Digo, mesmo afetado demais para sentir o gosto do que mastigo.
Ela não diz mais nada, mas seu toque cuidadoso e maternal segue secando meus cabelos até que ela usa as pontas dos dedos para pentear os fios ainda úmidos.
— Está se sentindo melhor? — Pergunta quando me vê terminar de comer, suas mãos ainda carinhosamente acariciando meu couro cabeludo.
Eu não uso palavras para dizer que sim. Ela não diz nada. Num instante, suas mãos parar de me acariciar e eu percebo que ela parece mais tensa, até que, hesitante, cuidadosamente puxa minha cabeça até deitá-la contra seu ventre.
— Eu não lembro qual a última vez em que você me deixou cuidar de você dessa forma... — Então confessa, o receio tão óbvio em sua voz.
Receio de que eu volte a afastá-la a qualquer momento, exatamente como fiz durante os últimos anos.
Mas agora eu não consigo. Eu não consigo transformar toda minha dor e confusão em raiva. Finalmente, minha tristeza é fiel à sua natureza. Eu estou dolorosa, incuravelmente triste e nada mais.
Então eu apenas me permito ficar exatamente da forma que estamos agora. Minha cabeça repousando sobre seu ventre, que me abrigou e me protegeu desde o primeiro vislumbre de minha existência. Mesmo agora, ela ainda me protege como se eu fosse uma parte sua.
Eu não sei quanto tempo ficamos assim, mas parece uma eternidade até que ela me dá um beijo carinhoso no topo da cabeça.
— Vá descansar mais um pouco. Me chame se precisar de alguma coisa.
Eu a observo quando lentamente se afasta de mim para pegar a louça suja na mesa e levá-la até a pia, permanecendo sentado até que arrasto os pés da cadeira pelo chão e me ponho de pé, incapaz de tentar prolongar nosso momento juntos. Eu não posso fazer isso se mais uma vez ele será completamente apagado de sua memória, fazendo-a esquecer do primeiro momento de paz que tivemos em tanto tempo.
Então eu me mantenho no quarto, criando tão poucas memórias quanto possível, porque é doloroso demais ser o único a carregá-las.
À medida que o dia passa e a tarde se aproxima da noite, Junghee e minha mãe começam a preparar o jantar, mas meus planos de continuar quieto, no entanto, são interrompidos quando eu ouço a campainha ecoar dentro de casa, alcançando meu quarto.
E eu gostaria de fingir que não sei quem está em nossa porta, mas a sensação no fundo do meu estômago diz o contrário.
Então meu coração acelera e eu quase prendo a respiração, meus olhos focados na porta fechada de meu próprio quarto até que acontece o que eu já esperava e batidas suaves são dadas nela.
— Jeon, sou eu — Do outro lado, Jimin diz.
Eu me movo sobre a cama até sentar no colchão coberto pelo lençol bagunçado, e de repente minha roupa de moletom parece apertada demais quando eu me sinto sufocar em antecipação, sem saber o que ver Jimin pode provocar em mim.
Quando ele desiste de esperar uma resposta e gira a maçaneta, eu aceito que vou descobrir agora.
Então a porta se abre. Jimin aparece em minha frente, sem sair do lugar. Um casaco enorme cobrindo seus braços, quase engolindo suas mãos, os cabelos caídos na testa e a respiração parecendo mais tensa que o normal.
Nossos olhos se encontram no silêncio, nem ele, menos ainda eu, falando qualquer coisa. Quando tempo demais se passou, ele pergunta: — Vai conversar comigo ou vai me mandar embora?
O tom ressentido de sua voz me faz sentir como se uma agulha perfurasse meu coração. Eu não entendo o porquê, mas a sensação me faz querer dizer para ele ir. Porque me assusta perceber que, agora, eu estou muito mais vulnerável a Jimin e ao que ele demonstra sentir em relação às minhas atitudes.
No entanto, algo age mais forte. Algo como um impulso, talvez um instinto, e minha voz sai sem que eu realmente pense em minha resposta.
— Fique...
Ele não demonstra felicidade, mas também não consegue esconder a forma como seu corpo reage em alívio imediato. Sua expressão relaxando assim como seus ombros, seus pés finalmente se movendo sobre o chão para que ele se aproxime de mim.
— Como você descobriu meu endereço? — Pergunto.
— Da mesma forma que nós planejávamos descobrir o de Hoseok. — Ele responde, olhando para o espaço livre na cama antes de olhar para mim. — Posso sentar?
Eu assinto silenciosamente, um pouco acuado quando o vejo sentado sobre o colchão estreito, tentando parecer sutil enquanto passa os olhos por meu quarto. Me deixa um pouco constrangido, porque é um lugar pequeno e muito mais simples que o seu próprio quarto.
Mas Jimin não parece fazê-lo com julgamento. Ele parece genuinamente curioso, os olhos vívidos varrendo cada pedaço de meu esconderijo bagunçado até que pousam numa parede recoberta por pôsteres de algumas bandas e um banner já envelhecido, mas ainda orgulhosamente posicionado no centro de todos os outros. Então ele sorri, lendo a única frase gravada na tela.
— Quanto mais nos elevamos, menores parecemos aos olhos daqueles que não sabem voar. — Lê em voz alta. — Você realmente gosta de Nietzsche.
— Você também. — Surpreendentemente, eu consigo lembrar.
— É. — Ele mantém o sorriso, agora voltando seus olhos para mim. — Então... você vai me dizer por que voltou a me afastar desse jeito tão de repente? Ou prefere continuar conversando sobre filósofos para evitar o assunto?
Eu me recosto na parede, esfregando as mãos sobre minhas coxas para tentar aliviar a sensação de ansiedade que preenche meu peito enquanto eu lembro do motivo. Na verdade, como eu posso lembrar de algo que sequer esqueci por um segundo que seja?
— Eu não sei o que dizer, Jimin. — Digo, me sentindo vulnerável por permitir que minha voz tremule tanto.
— Só me diz a verdade, Jeon. — Ele pede, parecendo tão ansioso quanto paciente. Como alguém que se aproxima de um animal acuado, ele se move na cama até ficar de frente para mim, sua mão receosamente tocando minha perna como se para me assegurar de algo. — Nós estamos juntos nessa, não estamos?
— É insano. — Eu anuncio, ainda sem coragem de dizer em voz alta que eu tive visões de nós dois juntos em infinitas realidades. — É completamente insano, Jimin.
— E não é tudo insano, agora? — Ele questiona, seus olhos sempre buscando os meus, firmes, mas suaves, à espera da minha rendição. — Não importa o que seja, você pode me dizer. Mesmo que eu não seja sua pessoa favorita, você pode confiar em mim.
Algo em meu coração ainda me faz querer relutar, mas as palavras de Jimin despertam mais força em meu lado racional. Porque elas me fazem lembrar que nós só temos uns aos outros para tentar encontrar uma saída para o caos que estamos vivendo. Por isso, ainda que parte de mim se negue, eu sei. Nada de bom pode resultar depois de manter algo como isso em segredo.
Então eu tomo toda a coragem que consigo juntar, fechando meus olhos para não sentir o peso dos seus.
— Quando Seon Yeong me tocou, ela me disse que eu sabia o que fazer. E...
— E...? — Ele incentiva, sempre paciente.
— O toque dela fez alguma coisa comigo. Eu vi coisas, Jimin. Eu vi nós dois. Juntos. Mas eram versões completamente diferentes do que nós somos.
— Como... universos paralelos?
— Eu não sei. Eu não sei, mas as imagens bombardearam minha mente. Elas estão vivas até agora como... lembranças. E... — Eu sinto minha boca seca, minhas mãos trêmulas com a lembrança, um calafrio percorrendo meu corpo. — Eu ouvi novamente. Aconteceu pela primeira vez depois do acidente, mas eu não lembrava. Não até ouvir outra vez.
— O que você ouviu, Jungkook?
— É essa... voz. Parece minha própria voz, mas não tem som. Como algo que ecoa em minha própria consciência. É familiar, mas completamente estranho ao mesmo tempo. E era como alguém me dizendo que você é nosso destino. Que nós fizemos uma promessa que precisa ser cumprida. Mas eu não sei que promessa. Eu não sei quem somos nós. E... eu entrei em pânico. Eu entrei em pânico e corri de você e te afastei novamente porque eu não sei mais o que fazer, Jimin.
— Ei. — Ele me chama, se aproximando ainda mais. Suas duas mãos percorrem o caminho até encontrar as minhas, apertando-as com firmeza, mas também gentileza. Só então eu percebo o quanto elas estão suadas, tremendo. — Calma. Respire fundo, sim?
— Jimin, eu...
Eu estou com medo.
— Shh. — Ele pede, dando um novo aperto em minhas mãos. — Respire. Devagar, comigo. Só respire, Jungkook.
Eu olho para ele, vendo-o puxar o ar lentamente. Depois de prendê-lo por alguns instantes, ele o soltou numa lufada arrastada. E novamente. Repetindo o passo a passo até que eu começo a imitá-lo.
— Isso, muito bem — Ele diz carinhosamente, um sorriso orgulhoso brincando em seus lábios quando, mesmo agora, suas mãos continuam segurando as minhas. Eu ainda estou completamente perdido, mas algo em seu exercício me acalmou o suficiente para que eu tenha saído da beira do precipício.
Sem perceber, eu fecho os olhos mais uma vez e aperto suas mãos de volta, segurando-o para que ele não me solte.
Eu não entendo. Eu não entendo muitas coisas.
Agora, principalmente, não entendo como Jimin consegue ter tanto poder sobre mim. Como ele, subitamente, está tendo uma influência tão poderosa sobre como me sinto.
Mas assim como as outras respostas, essa é mais uma que não me será dada. Ao menos não por enquanto.
— Isso é tão inesperado... — Jimin aponta, o tom de voz distante, mas satisfeito de alguma forma, e minha pele parece mais sensível no lugar onde seus polegares deslizam, acariciando o dorso de minhas mãos.
— O que?
— Eu te tocando dessa forma sem que você se afaste bruscamente — Confessa, me fazendo perceber que seus olhos continuam mirados em nossas mãos unidas. Só então eu percebo de verdade que estava segurando-o e, num sobressalto sutil, deslizo minhas palmas para longe das suas, apoiando-as de volta em meu colo. Jimin então sorri, sem muita felicidade. — Eu deveria ter ficado calado.
Eu pisco desajeitadamente, virando meu rosto para fugir de seu olhar. Por sorte, meu resgate chega quando Junghee aparece na porta do meu quarto.
Ele para ali por um instante, curiosamente olhando para Jimin, que também olha para ele, por cima do ombro, quando percebe minha própria atenção voltada para aquele ponto.
Meu irmão deve estar sendo corroído por confusão e curiosidade, já que muito provavelmente nunca me viu receber visitas em casa e minha mãe sempre dizia que o apocalipse chegaria antes da minha vontade e coragem de trazer amigos aqui.
Bem, não é o apocalipse per se. Mas considerando que a linha do tempo já não funciona mais, talvez seja o presságio. Então, no fim das contas, ela sequer estava errada.
Mas apesar de alguma suposta vontade de comentar sobre isso, Junghee apenas dá um aviso rápido antes de marchar de volta para a cozinha: — O jantar está pronto. Mãe convidou seu amigo para comer com a gente.
Somente em companhia de Jimin mais uma vez, eu o olho sem dizer qualquer coisa, percebendo que ele volta a mover a cabeça em minha direção.
— Então acho que eu já vou. Eu te ligo para terminarmos de conversar, quando você puder.
— Você tem alguma disfunção, Jimin? Meu irmão acabou de dizer que você está convidado para o jantar. Não precisa ir agora.
Sim, eu percebo que acabei de tentar convencer Jimin a não ir embora, para poder ficar mais tempo comigo. Mas apesar de estar absolutamente assustado por tê-lo feito tão naturalmente, quem mais se assusta é ele.
— Oh. — Ele murmura, sem saber o que dizer, ao que me parece. Não é comum vê-lo sem jeito, mas logo sua expressão confusa é substituída por um sorriso que se abre gradativamente, devagar, até tomar todo o seu rosto quando fica grande demais, as maçãs de seu rosto se evidenciando mais e os olhos se fechando completamente sem que ele pareça ter controle sobre isso. — Então eu vou ficar.
Eu não entendo por que ele parece tão feliz, mas também não entendo por que meu coração acelera ao vê-lo com um sorriso tão puro. Então eu não tento entender nenhum dos dois e apenas levanto antes que ele veja minhas bochechas coradas mais uma vez.
Sensacional. O gênio do departamento de matemática, das tatuagens e da cara sempre fechada, agora constantemente fica vermelho por causa de outro homem.
Fala sério.
— Ei. — A causa de tudo isso diz, me provocando um sobressalto ao segurar meu pulso quando já estou caminhando até a cozinha. Eu o olho, completamente assustado, e ele levanta uma sobrancelha: — Lavar as mãos, Jungkook.
Eu não digo nada, apenas viro para voltar até o banheiro sem fazer qualquer movimento brusco para força-lo a me soltar. Mesmo assim, Jimin solta.
Então nós lavamos as mãos, em silêncio, antes de seguirmos até onde minha mãe e irmão estão, terminando de arrumar a mesa para o jantar.
— Caramba. — Jimin exclama, parecendo surpreso ao entrar na cozinha e ver um banquete servido. Eu também estou em choque. Nós sequer costumamos fazer refeições juntos, quem dirá servir jantares tão abundantes. Mas Jimin logo contorna sua surpresa com um sorriso educado que parece encantar minha mãe: — Tudo parece muito bom. Obrigado por me convidar para jantar com vocês.
— Não precisa agradecer. — Minha mãe diz, guiando-o para se sentar numa das cadeiras. — Eu fiquei muito feliz de saber que você e Jungkook são amigos. — Confessa, já colocando uma porção de arroz generosa diante de nosso convidado. Então ela olha para mim, um sorriso discreto brincando em seus lábios, os olhos brilhando com o mais próximo de alegria que eu já vi em seu rosto nos últimos três anos. — Jimin sempre vai na MoonMoon. Toda segunda-feira ele compra dois lanches e dá um para o senhorzinho que fica na porta, então eles comem juntos. Lembra que você também sempre fingia ficar satisfeito só para poder levar metade do seu sanduíche para esse mesmo senhor?
— Lembro... — Respondo com os ombros baixos, pegando um pedaço de carne desfiada na tábua.
Mas eu não estou triste ou incomodado.
Eu estou... surpreso. Porque há muito tempo eu não ouvia minha mãe falar com esse tom de alegria e orgulho, e só agora percebo o quanto senti falta disso. Mesmo que ainda não seja a alegria que antes irradiava. Mesmo que seja só uma lembrança discreta do que ela costumava ser. Ainda assim, me surpreende e me encanta.
— É muito bom te receber aqui, Jimin. — Ela diz. — Agora só falta Junghee também trazer os amigos.
Meu irmão mastiga lentamente, as bochechas quase estufadas de comida.
— Eu preciso estudar para melhorar minhas notas, mãe. — Ele diz baixo, cheio de vergonha, alguns instantes depois.
— Você está com dificuldades na escola? — É Jimin quem pergunta, surpreendentemente ainda prestando atenção na conversa.
Junghee encolhe os ombros, ainda envergonhado. — Eu não sou inteligente como Jungkook hyung.
— Não fale assim. Existem muitos tipos de inteligência. Vocês só possuem inteligências diferentes. — Jimin diz, disposto a consolar meu irmão.
— Meu tipo de inteligência não está ajudando em nada, porque eu só levo bomba em matemática — Sei que no fundo ele se sente mal por isso, mas não o demonstra enquanto fala.
— Você deveria pedir a ajuda de seu irmão. — Jimin sugere. — E talvez você pudesse ajudá-lo a... — Ele olha para mim, um sorriso provocativo brincando nos seus lábios cheios. — A ser uma pessoa mais agradável, talvez? Ele é um gênio para matemática, mas um desastre em relações interpessoais.
Eu não acredito que Jimin está na minha casa, falando essas coisas na frente de minha família com tanta naturalidade.
E eu não acredito que Junghee sorri. O moleque nunca sorri.
— Eu sei. Mas Jungkook hyung não gosta muito de mim, então eu não gosto de pedir ajuda. Não quero que ele fique ainda mais irritado do que já é — Meu irmão diz, usando os hashis para brincar com a comida.
O sorriso de Jimin diminui, Junghee mantém os olhos baixos e eu o encaro com os olhos arregalados e o coração doendo.
Eu fiz meu irmão acreditar que eu não gosto dele? Quando ele é, literalmente, uma das pessoas que eu mais amo?
— Qual o seu problema, moleque? — Eu pergunto, olhando para Junghee. — Eu sou seu irmão. É claro que eu vou te ajudar.
Junghee volta a levantar o rosto, os olhos cheios de surpresa, finalmente demonstrando algo além de apatia.
Eu não sei muito bem como fazer isso. Como colocar em palavras ditas que eu o amo, então faço o melhor que posso: — Eu desentupo sua bosta colossal todo dia e você me vem com essa conversa de que não pode pedir minha ajuda? Na moral, Junghee.
O clima confuso fica subitamente mais leve quando Jimin ri de minha declaração, e até Junghee sorri um pouco mais.
Ao meu lado à mesa, minha mãe não dá qualquer atenção à comida que preparou, silenciosamente olhando para nós com os olhos brilhando por lágrimas não derramadas. Quando me vê olhando para ela, logo pisca e funga suavemente, começando a comer.
— Coma antes que a comida esfrie. — E diz, com seu tom autoritário de sempre.
Eu assinto, logo voltando a comer enquanto novas conversas se iniciam e se transformam ao longo do jantar, todas geradas pelos esforços de Jimin.
Jimin, que eu sempre jurei odiar tanto. Jimin, que agora está em minha cozinha, fazendo minha família parecer isso outra vez. Uma família.
Ao fim da noite, ele se oferece para lavar os pratos, coisa que só consegue depois de discutir com minha mãe. Depois, ele discute comigo para que eu o ajude, já que não ajudei a preparar o jantar.
Enquanto me passa a louça limpa para que eu seque e guarde, Jimin cantarola uma música que eu não conheço, e eu sinto minha respiração mais tensa sempre que estou parado ao seu lado esperando uma nova panela ou prato para secar.
— Você não perguntou sobre Hoseok, nem sobre Yoongi. — De repente, ele diz.
— Eu... esqueci. — Digo, sentindo seus olhos ferinos pousados em mim enquanto ele usa um pano limpo para secar as mãos.
— Hoseok está em minha casa. Não está bem, mas... acho que vamos precisar descobrir como resolver isso também.
— E Yoongi? O reset já o fez esquecer de quando nos levou para conhecer Seon Yeong, não foi?
— Certamente.
— Da última vez nós precisamos que Hoseok estivesse no hospital para convencer o babaca de que estávamos falando sério. — Eu lembro, coçando a nuca. — Vamos descer o cacete em Hoseok e meter ele numa cama de hospital de novo, ou o que?
Jimin me olha com a expressão séria, até que eu percebo que está segurando o riso. Quando eu aperto as sobrancelhas para isso, ele explode numa gargalhada, seu corpo inteiro se curvando quando os sons gostosos da risada escapam por seus lábios.
— Jesus, você é impossível — Ele diz, gaguejando aqui e ali pelo riso.
— O que?! Seon Yeong disse que nós vamos precisar da ajuda dele!
— Sim, meu deus, mas não precisamos quebrar ninguém no soco para isso. — Jimin anuncia, ainda com resquícios da risada escapando entre intervalos curtos. — Yoongi já resolveu isso. Da próxima vez, ele vai acreditar em nós.
— Ah.
Jimin me olha, um sorriso ainda no canto dos lábios, até que ele balança a cabeça para os lados.
— Você é adorável de um jeito muito inesperado, Jeon.
Eu o olho sem saber como reagir, vendo-o deixar o pano de prato pendurado antes de olhar para a pia já limpa. Depois, ele olha para mim novamente.
— Foi tão difícil assim?
— Secar os pratos? — Questiono, confuso.
Jimin nega suavemente. — Se dar bem comigo. Foi tão difícil assim, Jeon? Ou ruim?
Eu continuo olhando-o sem saber que resposta dar. Mas não foi. Não foi difícil. Definitivamente, não foi ruim.
Foi o completo oposto. Foi... bom.
— Olha. — Ele me chama, olhando para mim com sinceridade. — As coisas estão caóticas e nós ainda não sabemos como resolver. E eu honestamente não sei o que suas visões significam, mas se elas fazem parte da resposta, nós precisamos descobrir. Juntos, Jungkook.
— Eu sei.
— Você sabe. — Ele reafirma. — Então por que complicar ainda mais o que já está tão complicado? Por que continuar alimentando seu ódio por mim quando isso só vai atrapalhar?
Eu pondero minha resposta. — É difícil desgostar menos de você quando você literalmente senta em minha cozinha e fala mal de mim com minha família, na minha frente.
Apesar de tudo, Jimin percebe o tom leve por trás de minha acusação, o que o faz rir.
— É verdade. Eu disse que você é um antissocial esquisito, não foi? Então agora tenho que dizer algo que gosto em você. — Ele pondera, ainda sorrindo.
— É melhor ir com calma nas ofensas. Daqui a pouco você não vai ter mais nada de bom para dizer.
— Nah. Você ficaria surpreso em descobrir quantas coisas eu gosto em você. Aliás, — Ele deixa a língua aparecer por um breve instante, seu sorriso ainda firme quando umedece o próprio lábio e deixa que seus olhos vaguem lentamente por meu corpo. — eu gosto de como você consegue ficar tão bonito usando moletom. — Ele repousa o quadril contra o balcão, braços cruzados sobre o próprio peito e seus olhos voltando a encontrar os meus depois de demorarem tanto tempo observando todas as outras partes de meu corpo: — Logo quando eu achei que não poderia me sentir ainda mais atraído por você...
Eu pisco como um abestalhado, até usar um pigarro para tentar nortear minha fala.
— Ok. Isso serve. — É tudo que digo, também umedecendo meus lábios quando estendo apenas uma mão, deixando a outra em minha nuca, massageando-a para aliviar a tensão repentina. — Então é uma trégua. Acho que vamos tentar ser amigos, agora.
— Parece bom o suficiente para começar. — Jimin ainda me mostra um sorriso que parece puro demais para o tom de sua voz. Mesmo assim, ele aperta minha mão para selar nosso acordo: — Amigos, então.
— Ok.
— Ok.
Ele sorri, ainda mantendo nossas mãos juntas. Eu também não faço qualquer menção de soltá-lo.
Subitamente, uma sensação aconchegante parece irradiar por todo o meu corpo, nascendo no ponto onde minha pele toca a de Jimin. Como se minha existência inteira sentisse que uma peça que esteve fora do lugar por todo esse tempo finalmente se encaixou onde deveria.
Então eu continuo olhando para Jimin, nocauteado pela sensação inesperada, mas tão prazerosa. Ele, no entanto, olha para outro ponto, seu rosto assumindo uma expressão de surpresa.
— Esse relógio está certo? — Ele pergunta, olhando para o aparelho redondo na parede da cozinha. Eu sigo seu olhar, me assustando ao perceber que já é tão tarde.
Eu sequer percebi o tempo passar.
— Meia noite. — Eu digo, com um peso no coração. Agora, tudo voltou para a posição zero. O jantar com minha família não existe em nenhuma outra lembrança, apenas na minha e na de Jimin. — Acho que iniciamos um novo loop. Mais um 21 de outubro para a conta.
— É... — Ele concorda. Só então eu percebo que nossas mãos já se separaram. — Então Pandora já está em minha garagem. Você poderia ser um bom amigo e me levar em casa.
Eu reviro os olhos. — Não abuse tanto. É nosso primeiro dia de trégua. — Resmungo, mas ridiculamente começo a caminhar para fora da cozinha para pegar o capacete extra para poder levá-lo.
Mas então eu entro na sala e meu corpo congela imediatamente. Jimin para atrás de mim, olhando para a mesma cena que eu.
Minha mãe e meu irmão estão no sofá, os dois cochilando diante das cenas finais de algum filme.
— O ponto de partida deles é no quarto. Eles deveriam estar dormindo na cama, não aqui. — Eu pondero, com os olhos arregalados.
Jimin demora mais alguns segundos antes de se adiantar até a janela ao lado da porta principal, soltando um ofego surpreso ao ver algo. Quando volta a me olhar, seus olhos estão completamente arregalados.
— Pandora ainda está aqui.
Nós nos olhamos por segundos inteiros de silêncio, meu coração batendo forte com um misto de medo e esperança. Mas enquanto eu não tenho força para me mover, Jimin usa a mão trêmula para pegar o próprio celular no bolso da calça.
Então ele vê a tela. Seus olhos se arregalam mais, seu corpo parece perder a força por um instante. E ele me olha outra vez, a respiração completamente caótica quando tenta anunciar a causa. Mas sua voz não sai, então eu mesmo corro até onde meu celular está.
Como se minha força fosse drenada, o aparelho escorrega até o chão.
Porque não é mais dia 21 de outubro. É dia 22.
↬ Continua no próximo capítulo.
Esse capítulo foi bem maior que a média das atualizações até aqui, mas eu não queria dividir porque os eventos aqui precisavam ser narrados de uma vez só, para fazerem mais sentido. Espero que não se importem!
Mas então! Primeiro,
Jungkook f i n a l m e n t e cedeu. E ele continua com os olhos fechados para todas as investidas do Jimin, mas uma coisa de cada vez, né?
Segundo... o loop parou. F i n a l m e n t e também é um novo dia. Isso quer dizer que a fanfic está perto do final? Não. Quer dizer que as coisas já se resolveram? Menos ainda :x
Ainda existem muitas pontas soltas. Uma delas é a do capítulo passado, quando o Jimin quase botou as tripas pra fora durante a conversa sobre o acidente que matou o pai do Jungkook. Eu vi que vocês se dividiram principalmente entre duas teorias sobre o por que de ele ter passado tão mal e já adianto que nenhuma das duas é boa, mas: uma delas está certa. O que vocês acham que é?
Enfim, gostaria de deixar registrado aqui que o Jungkook é um bebêzão. Ele pode ter a pose de bad boy, ser cheio de tatuagem e tudo o mais, mas no fundo ele é só uma pessoa que não sabe lidar com a própria tristeza. Só um bebê assustado demais ): e claro que isso não é motivo para que ninguém tenha as atitudes que ele teve em alguns momentos, mas a evolução faz parte da vida e eu juro que sou perdidamente apaixonada por tudo que ele ainda vai evoluir
Esse deveria ser meu capítulo favorito (até então), e realmente estava sendo! mas aí eu li todinho pra revisar e... não sei mais. Mas isso sempre acontece ): Espero que vocês tenham gostado tanto quanto eu gostei dele inicialmente!
Obrigada pelas mais de 300k de views e por cada voto e comentário! Me despeço aqui, como sempre, deixando esse espacinho para que vocês discutam quaisquer alterações nas suas teorias <3 beijos e até o próximo!
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