Capítulo XV: Coração e Mente
Observando o lago Ram, próximo ao monte, estava Mordred. O feiticeiro molhava seus pés na água enquanto senta-se na borda. Sua face é pensativa. Ele usa sua magia para criar um retrato, onde uma mulher de cabelo castanhos e olhos esmeraldas aparece, com roupas típicas do início da idade média. Uma lágrima desce de seu olho direito enquanto continua a observar a mulher.
— Ainda chora por ela? — pergunta Nahemah, se aproximando dele.
A demônio toca em seus ombros e o abraça por atrás.
— Ela era o meu mundo, e eles a tiraram de mim — o retrato some — Ela era tudo. Era a pessoa que eu mais amava no mundo, mas um dia, isso acabou. É bom saber que as pessoas que fizeram isso com ela pagaram caro.
— Está falando da destruição de Avalon? — quis saber.
Mordred assente.
— Compreendo, foi bom fazer aquilo — disse Nahemah — E melhor ainda será quando tudo isso acabar e nós vencermos — ela alisa o cabelo dele.
— E nós vamos! — o mortal diz.
Nahemah senta-se ao lado dele e entrelaçam as mãos.
— O que fará depois daqui? — perguntou ela.
— Eu não sei — respondeu Mordred —, definitivamente não sei. Talvez, reconstruir minha vida, e você? — a fita.
— Eu também não sei — Nahemah sorri — Eu ainda tenho alguns trabalhos a fazer, talvez precisem de mim ainda, ou melhor, vão precisar. Mas você não, você poderia ir embora quando acabar.
— Sim, poderia — ele concorda —, mas não sei se devo. Já passamos por tanta coisa por aqui, que eu nem sei mais.
— Você gosta da minha companhia? Eu sou importante para você? — ela surpreende com a pergunta.
— Nahemah, claro que é — respondeu o mortal — Você é uma das pessoas mais importantes pra mim. Eu a acompanhei durante a jornada da vida, e nos últimos dias você me acompanhou. Obrigado!
Eles apertam as mãos um do outro e seus ombros se tocam. Nahemah encosta a cabeça no ombro dele.
— Vocês me mostraram que eu ainda posso ter uma família — disse Mordred — Eu vou fazer de tudo para continuar fazendo parte dela.
— Fico feliz de ouvir isso, mas nosso tempo está se esgotando — ela revela — Venha, temos trabalho a fazer, e mais sangue a derramar se for preciso.
Mordred se levanta e caminha com ela ao lado, onde se encontram com Ronglu, que vigiava.
— E então? — pergunta Mordred.
Usando sua magia, Nahemah invoca um livro marrom com runas na frente e atrás. Ela o folheia rapidamente procurando o que deseja.
— A última vez que todas as dimensões se alinharam, foi há quase 5 mil anos. Naquela época, a humanidade ainda estava no início da antiguidade. No inìcio, todas eram uma só, mas há 500 milhões de anos se separaram. A primeira vez que voltaram a se juntar foi há 100 milhões de anos — responde a demônio — Há 5 mil anos, o rei de Babel usou o alinhamento para fortalecer sua magia e capturar seres de outros mundos. Nimrod criou um vasto exército místico e tentou impor sua soberania pelo Oriente antigo. Ele proclamou a si como um deus, e também tentou libertar Shemihazah, mas acabou executado.
Ronglu e Mordred se entreolham.
— Quando o alinhamento acontece, as portas de todas as dimensões se abrem por um tempo. Seres distantes conseguem se ver e ouvir, e passar para o outro lado — ela continua — A conexão com a Árvore da Vida se torna mais forte do que nunca. No alinhamento, tudo e todos são um só. Mas isso tem um preço. A força do alinhamento pode dizimar dimensões inteiras e matar civilizações inteiras se não for natural. E como eu disse, a última vez foi há 5 mil anos, e a próxima deverá ser na batalha do fim dos tempos.
— O que acha que acontecerá se der errado aqui? — questionou Ronglu — Eu sobrevivi ao príncipe dos anjos, não quero morrer aqui.
— No mínimo, vai destruir metade do Universo, incluindo a galáxia e a Terra. O impacto vai partir o planeta ao meio, e depois torna-lo em nada — responde Nahemah — Nem os anjos sobreviveriam a ele, todos nós iríamos morrer. Não há resistência quando o alinhamento destrói.
Mordred passa a mão no queixo e pensa um pouco. Ronglu faz o mesmo, enquanto Nahemah continua com o livro aberto.
— Quer mesmo fazer isso? As consequências podem ser catastróficas — alertou ela.
— É o único jeito — responde Mordred — Não há ninguém que consiga desfazer o selo de Shemihazah sem as rochas, e para que ele seja liberado, precisamos que as dimensões se alinhem. Assim, ele pode passar para cá mais facilmente.
— E se der errado? Todos nós vamos morrer! — disse Ronglu.
— Vai dar certo, confiem em mim — disse ele — Não pode dar errado. Tem que dar certo.
— Mas e depois, Mordred? — pergunta Nahemah — Você sabe que jamais seremos servos de Shemihazah, faz parte de um plano maior.
— Eu sei — respondeu Mordred —, eu sei. Vamos usar Shemihazah para nosso objetivo, ele não desconfiará de nada.
Os três se olham por mais algum tempo, até que Mordred pega uma pedra e a joga no lago. Ele encara Nahemah.
— Precisamos ter todas as rochas para começar? — pergunta — Se sim, devemos ir até a ave imediatamente.
— Estou pronto para transformar ela em meu jantar! — Ronglu bate sua foice no chão.
Nahemah os olha pensativa, abre o livro e depois o fecha rapidamente.
— Não é necessário — responde —, já temos 3 rochas, podemos iniciar sem a quarta.
— Mas vai dar certo do mesmo jeito? — insistiu Mordred.
— Vai sim — fala Nahemah — Esse ritual leva um pouco de tempo, é o que precisamos para sobreviver a Ziz. Nós vamos iniciar e deixar tudo preparado. Se tivessemos as quatro rochas, poderia ser mais rápido, mas não temos. Temos três, usaremos elas para iniciar e a quarta para concluir. E tem uma vantagem também: É bom iniciarmos antes que chamemos atenção deles.
— Ela tem razão — concorda Ronglu — Vamos começar, antes que os inimigos venham.
— Sim, quanto antes iniciarmos, fica mais difícil deles interromperem — ela prossegue — Quando o ritual explodir e chamar atenção deles, já será tarde, e não dará para interromper.
— Então inicie — autoriza Mordred —, porém espero que não seja mais um de seus truques.
Nahemah se ofende e cruza os braços.
— Acha que eu usaria truques assim? – questiona Nahemah — Mordred, eles podem aparecer a qualquer momento e nos interromper. Precisamos ser agéis. Lembre-se que eu não poderei te proteger da fúria da ophanim caso ela saiba da nossa localização antes da hora.
Ele vai até ela e a encara nos olhos. Os dois se observam por alguns segundos, quando a mão direita de Mordred toca na esquerda de Nahemah.
— E caso Miguel desperte? — questiona ela — O golpe de Ronglu não vai segurá-lo por muito tempo, ele se cura muito rápido. Se ele aparecer, estaremos mortos.
— Ok então, vamos começar — disse Mordred — Ronglu, prepare os movimentos. E você, Nahemah, cuide das palavras. Onde é a localização exata do alinhamento?
— Estamos sobre ele, o lago Ram — ela respondeu — Foi aqui que Nimrod capturou as criaturas no seu tempo e as escravizou no Eufrates.
Ronglu se aproxima e segue Nahemah. Ela flutua sobre a água e usa seus poderes para que Ronglu faça o mesmo. Nahemah se senta no ar e abre o livro folheando as páginas.
— Preparado, monstro? — perguntou Nahemah.
Ronglu assente. Ela lança uma magia contra o golem, que a rebate com a foice, e a utiliza para bater na água. A água se divide em duas partes, com colunas de cada lado. Mordred pula entre elas e dá um forte soco no chão, cujo impacto se estende até o topo do Hermom.
Nahemah fecha o livro e o faz desaparecer. Sobre a coluna direita, ela gira uma vez, pula para trás, invoca feixes mágicos e com eles rodeia o lago, fitando Mordred. O mortal conjura duas adagas, uma em cada mão, e dispara com elas. Os disparos se transformam em energia escura, que logo envolve todo o lago. De repente, essa energia se materializa e se transforma em pedras com runas. Os três se afastam do lago e o veem sendo coberto pelas pedras, a água some. Ronglu pula sobre elas e com um golpe de foice as atinge. Ele salta de volta e vê um imenso altar surgindo no meio.
— Inicie a contagem — disse Mordred.
Nahemah conjura as três rochas do caos em sua posse e se aproxima do altar, onde as solta no ar e elas começam a girar ao redor dele.
— Está quase pronto — disse ela.
Mordred lança seus poderes mais uma vez e envolve as rochas com ele. O feiticeiro mortal então os dissipa, e uma corrente aparece ligando as rochas umas as outras e com o altar de runas. Nahemah se aproxima dele e fala palavras indecifráveis enquanto o rodeia. A demônio ativa seus poderes e continua falando as palavras, quando de repente, um pequeno tremor é sentido por eles. No centro do altar, as rochas começam a brilhar, e no chão a figura de portais começa a aparecer.
— Tarakumaispajatyram! Polmagimortusvultare! Juntem-se, seres vivos! — exclama Nahemah abrindo os braços e disparando rajadas — Somos UM ÚNICO MUNDO, UNIKARAJEMAI! — gritou.
Mordred e Ronglu a observam. Nahemah continua disparando seus poderes enquanto um vento forte atravessa a paisagem. Trovões e relâmpagos tomam conta do Céu e luzes de diferentes direções atravessam o altar. Uma pequena explosão acontece e lança Nahemah para trás, caindo ao lado dos outros dois.
— Você está bem? — Mordred se abaixa e pega sua mão direita.
Mais um trovão é ouvido, e então se dissipa. Nahemah desperta e o mortal a ajuda a se levantar.
— Está concluído — ela diz ofegante — Quase perdi minha magia com isso, a explosão pra valer será pior do que essa. Mais um pouco e minha aura apareceria revelando onde estamos.
— É, não destruiu a galáxia — disse Mordred.
— Ainda não, mas pode destruir — alertou Nahemah — Tive sorte de aprender esse feitiço com o melhor mestre.
— Está indo lentamente, quase não se move — disse Ronglu ao saltar até os dois.
— Claro que não, golem burro — retruca ela — Ainda falta uma rocha.
Após cinco minutos, eles voltam para a margem, Mordred e Nahemah juntam as mãos. O humano e a demônio sorriem satisfeitos. Depois de um tempo, um sussurro conhecido é ouvido.
— Ele está chamando — disse Mordred
O mortal se afasta do golem e da demônio alguns passos e vai na direção do monte. Quando está próximo, abre um portal de fogo, e uma figura envolta pelas chamas aparece para ele.
— Há quanto tempo, meu aliado — disse a voz.
— Meu senhor, é ótimo vê-lo — disse Mordred — Estamos quase prontos. Conseguimos três rochas, só falta uma.
— É bom mesmo, Mordred — diz a voz — Porque eu estou cansado de esperar. Nós esperamos por milênios esse momento.
— Não se preocupe, grande lorde, eu cumprirei minha promessa, e espero que os vigilantes cumpram também — avisa Lefay.
— Claro que vamos, claro que vamos — responde a voz.
— Mesmo sem a quarta rocha, conseguimos iniciar o alinhamento — relata Mordred — Peço um pouco mais de paciência, a abertura vai demorar mais, porém será mais segura. Quanto menos os inimigos souberem, menos irão interferir. Quando eles nos sentirem, já será tarde, nós já teremos iniciado a abertura totalmente.
— Paciência é uma virtude, e eu odeio virtudes — disse a voz — Vou confiar só mais uma vez em você, espero que não me depecione como Nimrod me decepcionou.
— Peço a sua confiança, grande Shemihazah — Mordred se ajoelha — Falta pouco para retomar seu reino.
— Os guardas já devem ter nos ouvido, não sei quanto tempo mais posso mante-los fieis, mas eu vou acreditar na sua palavra — disse Shemihazah — Mas, se estiver mentindo para mim, eu juro que despedaçarei sua carne e a darei para o grande leviathan.
— Sim, meu senhor — disse Mordred.
— Preciso ir, espero que a próxima vez que nos vermos seja pessoalmente.
— Assim será! — o portal se fecha.
Mordred volta para perto de Nahemah e Ronglu.
— Como foi com ele? — pergunta ela.
— Normal, ele está mais impaciente, contudo, ainda confia em nós — disse Mordred.
Ronglu faz um semblante de indiferença.
— E quando partiremos? — questionou o golem.
— Agora! — responde Mordred — Espero que ninguém apareça aqui até voltarmos. Nahemah, quanto tempo temos?
— Menos de duas horas — disse ela — Cada segundo conta para nós.
— O passarinho vai conhecer a verdadeira dor — Ronglu passa a mão por sua foice.
— Eu não seria tão confiante assim se fosse você — alerta Nahemah — Dizem que esse passarinho já sabe que iremos até ele. Dizem que o passarinho consegue ver tudo e todos, seus olhos vão até os confins da existência. E não importa se você tem alto conhecimento em magia britana, nórdica ou demoníaca, ainda é magia arcana nas suas mãos, e pode não ser o suficiente — fita Mordred.
— Veremos se realmente não é o suficiente — disse Mordred —E depois, preparem-se para a guerra.
Os três caminham juntos, até um portal ser aberto por Nahemah e eles passarem para o outro lado, uma floresta fechada. No altar, as rochas começam a brilhar mais intensamente.
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