Minha Mente
Na alvorada fria de uma manhã de domingo, Jake abre os olhos, satisfeito. "Muito obrigado, Meu Deus." Pensa ele, lembrando dos mínimos detalhes de quando fez Gray rezar pela sua vida enquanto cortava pedaços de pele de seus braços. Problemático? Com certeza! Mas, Jake não se importa, ele adora sonhar com isso. "Pelo menos isso de bom.". Destaca ele, em mente.
Levanta-se bem devagar, agora, sem sono algum, está pronto para encarar uma missão difícil de soltar seu prisioneiro. Soltar? Claro que não. Mas, soltar mesmo assim. Jake olha para a cabeça pendurada e pede perdão à ela antes de descer as escadas. Prepara uma xícara de café semelhante a da noite passada e observa os ossos que prometeu juntar.
Depois de organizar seus pensamentos e sua sala, Jake se dirige ao porão e para em frente a porta. Consegue escutar sons baixos e abafados de gritos e súplicas de liberdade. Jake sorri espontâneo e abre a porta do porão ainda com a xícara em mãos.
Ao fechar a porta e ascender a luz, pôde escutar xingamentos e ameaças mal formuladas de Gray, dizendo que ligaria para a polícia. Seus passos pesados sobre a escada velha de madeira, eram barulhentos. O cheiro de mofo tomava conta do ar do porão e o aspecto cinza e sem vida deixava o ambiente ainda mais pesado. Sem janelas, não havia como circular ar puro lá por dentro.
— Vá em frente. Ligue — diz Jake pegando uma cadeira capenga cheia de pedaços estranhos de material espesso e se sentando à frente da mesa inclinada. Gray conseguia enxergar as ferramentas enferrujadas em cima do balcão atrás de Jake.
— Por que está fazendo isso? — indaga Gray em tom de puro desespero.
— Simples, lembra quando me fez essa mesma pergunta? Minha resposta não mudou. Estou me divertindo com isso. Além do mais, você parecia precisar de um amigo, ou de um pouco de... entretenimento — tagarelou, com o mesmo sorriso problemático e assustador que havia oferecido na noite passada, antes mesmo de bater a sua arte contra a cabeça de Gray.
— Isso é entretenimento pra você, filho da puta!? — grita Gray, se esticando na mesa, apesar dos cintos limitarem seus movimentos.
— Com certeza — responde Jake após uma gargalhada. Vai até Gray e vira sua mesa em 180 graus, mostrando a ele que o cheiro horrível que era emanado daquela sala vinha de restos mortais de pessoas. Haviam braços, cabeças, pernas e outros membros, o cheiro de mofo das paredes e móveis, eram misturados com o cheiro de defuntos em decomposição. Tudo estava incompleto. Jake vira a mesa, deixando-a novamente na posição inicial. — Isso pode ser entretenimento para nós dois, Gray.
Gray não responde, sua vontade de fugir dali nunca o perseguiu tanto. Seus olhos arregalados eram o reflexo de seus pensamentos mais oportunos de fuga, ou até mesmo de morte. Suas mãos, presas pelos grossos cintos, suavam frio e a inalação do cheiro de corpos ficou ainda mais intensa. Ele observa a cabeça pendurada incessantemente e Jake se pronuncia.
— O nome dessa dessa maravilha é Chris. Vocês podem ser amigos — murmureja Jake, dando risada.
Gray permanece em silêncio e faz uma expressão estranha de desesperança. Seus olhos se fecham com força e Jake ri ainda mais. Lembrou dessa pessoa instantaneamente, desapareceu a nove meses e ninguém soube o que houve, ou onde está o seu corpo. Pensar nisso como se ele fosse a próxima vítima, assustou Gray ainda mais.
— Hoje é domingo, tenho futebol daqui duas horas e meia e você vai vir comigo — afirma. Gray se perguntou se ele era algum tipo de psicopata que havia escapado de um hospital psiquiátrico, pois as conversas não estavam fazendo o menor sentido.
— E como sabe que não vou escapar de você na primeira oportunidade que eu encontrar e te entregar para a polícia? — Sua voz tensa destaca o medo e a raiva que sente. Jake sentiu-se desafiado.
— Primeiro, os policiais daqui são todos uns cuzões incompetentes. Segundo, você não terá oportunidade nenhuma. E, terceiro, você não vai querer fugir. — Jake se levanta e pega uma gargantilha de couro com detalhes de prata, colocando-a bem na frente de Gray. — Sabe o que é?
— Não, e nem quero saber! Me tira daqui seu cuzão! — brada Gray, furiosamente. Sua voz sai trêmula, o que com certeza não foi planejado.
Jake não perde tempo e tenta colocar a gargantilha em Gray, que começou a gritar por ajuda e se contorcer, negando utilizar o tal objeto. Jake se afastou e pressionou um botão no balcão que instantaneamente deixou os membros de Gray imóveis, os cintos o apertavam com toda a força e ele não conseguia movimentá-los. Ele aproximou uma máquina esquisita até perto de um de seus dedos.
— Sua cabeça é a única coisa que você consegue movimentar no momento, mas, caso o faça com muita brutalidade, esse dispositivo vai cortar a cabeça do seu dedo. Vai deixar eu colocar a gargantilha ou não?
Jake se aproximou e Gray tentou ceder, mas começou a se contorcer de novo, jogando brutalmente a cabeça para os lados. O dispositivo fechou duas lâminas paralelas e sua falange distal do seu dedo indicador esquerdo foi desconectado de seu corpo rapidamente.
Gray expressou sua dor da única forma que conseguiu. O grito foi verdadeiro e estridente, refletindo a dor intensa que sentiu. Jake deu risada em meio ao choro de Gray. Pegou o dispositivo ensanguentado e posicionou na sua glande, cada lâmina roçando dos lados.
— Vamos tentar mais uma vez. — Gray observou Jake se aproximar mais uma vez com a gargantilha em mãos, olhou para o lado e viu seu dedo incompleto deixando o sangue ser derramado. Olhou para baixo e um arrepio intenso tomou conta do seu corpo.
De repente sua cabeça pendeu e não houveram mais movimentos ou resmungos. Ele havia desmaiado. Jake afastou o dispositivo de Gray e com mãos firmes e precisas, aproximou o couro ao seu pescoço quente. O barulho da fivela sendo lacrada foi alto, mas não acordou Gray, que continuava com olhos fechados e corpo extremamente adormecido. Levou a mesa até a posição horizontal e soltou os cintos que aprisionavam Gray. Passou grande parte do tempo trabalhando na sutura do dedo incompleto (o pedaço desconectado de seu corpo, se juntou à pilha de decomposição no canto do cômodo), vestiu-lhe com roupas confortáveis, deixou-o descansar no sofá e saiu de casa depois de verificar cada possível canto onde Gray poderia encontrar uma saída.
...
Gray abre seus olhos lentamente. Uma dor de cabeça quase insuportável invade seus pensamentos furtivos. Ainda não havia acordado, senta-se no sofá e retira as cobertas de cima de si. Olha para seu dedo dolorido e enfaixado e sentiu enorme repulsa ao lembrar da quantidade de sangue que havia visto. Ao se dar conta de que era tudo real e que ele provavelmente estava sozinho por conta do futebol mencionado anteriormente, Gray viu uma ótima oportunidade surgir diante de si. Foi em direção à porta e... trancada.
Passado um tempo, ele já havia checado todas as janelas da casa e... todas trancadas. Não havia esperança, ou será que havia? Ele até cogitou ir à garagem para escapar, mas a porta dos fundos também estava trancada. Havia também um quarto específico no andar de cima que estava trancado, Gray, são conseguiu imaginar o motivo que levou Jake à trancar aquela porta, o que se esconde por trás dela?
"É claro que ele não me deixaria fugir. Que idiotice. Tomei no meu cu." Pensa Gray. Há quanto tempo Jake havia deixado sua casa? Gray não faz a mínima ideia. Mas sabe que ele vai voltar. Age como um bom menino e espera a volta de Jake? Se esconde e foge na primeira oportunidade? Ou se rebela e provoca para que possa matá-lo sem sofrer as consequências, dizendo que foi em "legítima defesa". Cada opção paira sobre ele e seus pensamentos, e imploram para que sejam escolhidas. Ele está confuso.
Deita-se no sofá novamente e liga a enorme TV. Não gostava de admitir, mas aquele sofá era um dos mais confortáveis que ele já havia se deitado na vida. Era marrom e macio. Não era tão duro a ponto de deixá-lo desconfortável e nem tão macio ao ponto de ele afundar. Era... perfeito.
Entra na Netflix e procura alguma coisa para assistir. Na lista dos filmes curtidos de Jake, estava a saga inteira de "Jogos Mortais" e apenas isso, na fila "Assistir novamente" apenas filmes de terror. Gray imaginou que Jake fosse um fanático fã de filmes sangrentos e por isso surtou daquele jeito, mas Gray não podia negar o fato de que estava correndo sério perigo.
"Tenho certeza que ele não vai querer arrancar só a cabeça do meu pau.". Pensa Gray, sentindo um nó no estômago. Procura alguma série infantil e adormece lentamente. Não havia saída, e ele não conseguiria nada procurando por testemunhas provavelmente mortas. Então, essa foi a única ideia que lhe percorreu à mente e que ele achou extremamente útil, além de tentar quebrar aquelas malditas janelas com vidro blindado, ou talvez fosse vidro temperado... é, não sabia a diferença.
Tanto faz.
...
Jake, você finalmente voltou.
Não era a hora do almoço quando Jake retornou à sua casa. Ainda está cedo. Ele não acorda Gray. Vai em direção à cozinha e faz um café da manhã bem simples com o que trouxe do mercado. Quando ele termina, percebe Gray acordando aos poucos com o barulho. Não perde tempo e se dirige à ele, agachando-se ao seu lado.
— Vamos Gray, você precisa comer alguma coisa — diz Jake ao seu lado.
Gray abriu os olhos lentamente e Jake de repente sentiu-se estranho, apaixonado. Sua franja castanha é hipnotizante, ainda mais em conjunto com seus lindos olhos verdes.
— Ei! O que você pensa que está fazendo!? — indaga Gray em voz alta, enquanto senta-se no sofá e puxa as cobertas para se esconder. Era provável que havia se assustado com a proximidade, então, ou o medo, ou a raiva, o fizeram reagir no impulso. Jake o acha fofo quando está tomado pela raiva ou pelo medo.
— Calma, estou apenas te chamando para tomarmos café juntos. E falta apenas duas horas para o futebol agora. Não temos muito tempo — responde.
Gray pensou em recusar e começar seu plano para matá-lo, mas não contava que quando desmaiou pela madrugada após perder uma falange, acabaria abrindo mão de sua liberdade por toda eternidade.
Jake então, se levanta e senta-se na mesa. Começa a degustar um pão com doce de leite e um café preto para acompanhar. Gray está pensando em como fará com que Jake se distraia para acertá-lo no pescoço com uma faca, um plano completamente ambicioso e nada esquemático.
— Você não vem? — questiona Jake. Gray sai de debaixo das cobertas e anda até a mesa com passos incertos e lentos.
— O que... o que isso faz? — pergunta Gray (se referindo ao objeto preso ao seu pescoço) com voz trêmula, urdindo que Jake diria que lhe apertaria até que o sufocasse. Seu medo era palpável e Jake, por míseros nanosegundos sentiu pena de sua pequena presa.
— Quer mesmo saber? — Jake sorriu divertido e deu um gole breve de café preto. Gray o observa tirar um pequeno controle do bolso, haviam três botões, um verde, um amarelo e um vermelho, semelhante a um semáforo.
Gray não respondeu, estava ponderando as possibilidades e todas elas eram péssimas. Ele, de repente se convenceu de que morreria de qualquer jeito, e que a única solução eminente seria tirar a vida de Jake.
— Ok, se vier até mim fazer o que está tramando, pode esquecer que verá a luz do dia outra vez — ameaça Jake num tom brincalhão. Coloca a xícara na pia e sinaliza para que Gray sente-se à mesa.
Gray, titubeou por um momento, mas depois, seguiu em direção à cadeira em que jantou no dia anterior e sentou-se. Jake não perde tempo. Levanta-se de seu lugar e para atrás de Gray, segura seus cabelos dos dois lado e os puxa para o lado direito, falando em seu ouvido.
Gray gemeu involuntariamente e Jake sorriu. Não foi de prazer e sim de dor.
— Consegue tirar? — indaga Jake, com uma breve alusão ao objeto no pescoço de Gray.
— N-não — Gray murmura alto o suficiente para que seja ouvido. Nunca havia imaginado que Jake já desconfiava de seu mirabolante plano.
— É claro que não consegue — afirma Jake, rindo. Solta Gray violentamente e arrasta sua cadeira para trás. Jake agacha na frente de Gray e deixa o controle parecido com um semáforo à mostra. — Eu chamo essa brincadeira de "atenção ao trânsito". Você deve ficar atento, o tempo todo, um desvio... e você pode bater. Carros explodem, Gray. Vou explicar quem é você nessa brincadeira.
Jake aponta para o botão verde.
— Este, você sabe o que significa, não é? — Gray permanece em silêncio. Não sabia se devia responder ou não e, para garantir, não abriu a boca. — Não é!? — brada Jake, ávido a apertar os botões daquele controle colorido.
— Sim! — respondeu Gray, com afinco, temendo as funções de cada um dos botões.
— Responda quando eu falar com você... e o que significa? — Gray permaneceu em silêncio, estava aparentemente pensando, uma coisa bastante idiota... aprendemos sobre o semáforo no segundo ano do fundamental? Ou é no primeiro? — Uma dica, tem dois significados — ajuda, com um sorriso de canto. Sua mente enigmática estava ansiosa para obedecer os comandos cerebrais tão esperados. Quer vê-lo se contorcer. Gray fica em dúvida do que responder, os semáforos nos querem dizer apenas uma coisa, não é? Ou pelo menos é isso que se lembra.
— Significa... que você pode seguir em frente — supõe Gray com pusilanimidade evidente.
— Resposta correta. E o outro significado? — indaga Jake com tom divertido. Gray sentiu enorme vontade de chorar, mesmo enfatizando suas respostas, não sabia ao certo o que deveria arriscar, afinal, coisas de importante valor para ele estavam em jogo. Sua própria vida é um ótimo exemplo.
— Ah, Jake... eu não sei — rende-se Gray, afinal.
— Vamos, lá! Nenhum palpite? — questiona Jake. Sua cabeça se vira para o lado, como se estivesse sendo debochado, o que confundiu a cabeça de Gray. "Isso, por acaso, é algum tipo de jogo de manipulação psicológica? Eu mal consigo pensar direito!". Pensa Gray.
— Nenhum! Fala logo o que isso faz! — diz Gray, já exasperado. Jake sorri em sua direção e responde.
— Significa 700 volts. — De repente, Jake arregalou os olhos e seu sorriso lunático e alucinado não estava mais presente.
Gray se assustou e antes que pudesse dizer algo, foi surpreendido por uma onda de dor intensa, em conjunto com um formigamento estranho como se seu corpo estivesse sendo perfurado por agulhas, sente um desconforto gigantesco. Seu susto foi o que mais o atormentou. Percebeu estar à mercê de Jake e, nesse momento, não sabe mais o que fazer. Sente-se perdido no meio do deserto e não enxerga um único poço. Será mais difícil do que foi no livro do pequeno príncipe.
"O mais bonito do deserto é que ele esconde um poço em algum lugar."
Mas ele não está num livro de fantasia infantil. As frases de esperança são mentiras dolorosamente bonitas para que as pessoas não percam a fé e a confiança em algo que elas não sabem se é verdade.
Seu susto durou alguns segundos e Jake se divertiu por todo esse tempo, não segurando a gargalhada que queria tanto vivenciar. Se arqueia por conta da dor na barriga e lágrimas de felicidade caem sobre seu rosto. Gray, ao parar de tremer, sente sua cabeça latejar, seu peito aperta e respirar é difícil. Esse jogo físico, estava mexendo mais com seu psicológico.
— E o que você acha que significa o botão amarelo?
— Significa... — Gray respira fundo, é como se o ar que inala não fosse suficiente. — que deve estar atento — ele conclui.
— Correto... e o outro significado? Hum? — pergunta Jake, roçando seus dedos por cima do botão.
A respiração de Gray fica mais acelerada e o ambiente à sua volta parece ficar mais escuro, apesar do sol do lado de fora. Jake espera a resposta pacientemente e aponta para o botão amarelo como forma de provocação.
— O amarelo... o amarelo quer dizer... 1000 volts?
— Nem passou perto! — exclama Jake com felicidade ambígua. Gray arregalou ainda mais os olhos e sua respiração estava cada vez mais opressora, como se algo apertasse seu tronco, sem o deixar respirar. — O amarelo quer dizer... 2 mil volts.
Gray fechou seus olhos esperando a próxima descarga elétrica, que seria mais intensa, porém, não aconteceu. Jake começou a gargalhar e zombar mentalmente do mais novo.
— Relaxa, eu vou deixar você experimentar cada um dos botões, mas vou deixar bem claro que essa experiência vai depender de você. E outra, eu não sei a voltagem de nenhum deles. Sei que a intensidade vai aumentando e só — ele riu outra vez e guardou o pequeno semáforo no bolso.
Gray respirou fundo e suas lágrimas voltaram involuntariamente. Jake começa a recolher os utensílios da mesa.
— Não vai me ajudar? — pergunta, dramático. Gray, respirou fundo e mandou ele se ferrar mentalmente, depois o ajudou a recolher os utensílios, desde pratos e talheres, até os potes de café e açúcar.
Ao passarem pano na mesa, Jake de repente para com o que estava fazendo e olha para Gray com olhos arregalados. Gray, ao perceber o olhar incessante e atento preso ao seu ser, se assustou e tornou a questionar.
— Tem algo de errado comigo? — questiona Gray. Jake não o responde, apenas o observa como se não tivesse outra coisa para observar. Mas seu olhar atento estava preocupando e assustando Gray, que agora respirava ofegantemente e sentia-se ameaçado.
— É claro que não. — Jake se aproxima lentamente de Gray que se sente encurralado e parece estar desesperado.
"Como é horrível arrancar partes suas e mesmo assim, sentir que você ainda não é meu..." Pensa Jake, chegando ainda mais perto.
Jake finalmente encurrala Gray contra a geladeira, colocando suas mãos de cada lado da cabeça do mais novo. Gray, fecha os olhos, assim que Jake preocupantemente chega perto demais. Suas bocas estavam a centímetros de distância, porém, Jake de repente desferiu um soco na geladeira, ao lado da cabeça de Gray, que se assustou e praticamente pulou em seu lugar. Encarou Jake seriamente e com olhos arregalados enquanto os olhos de Jake começam a lacrimejar.
— Porcaria — murmura Jake enquanto observa a profundidade do golpe desferido na geladeira. Gray continua com as costas apoiadas no eletrodoméstico, ainda não assimilou o que aconteceu. Está assustado demais para reagir. — Desculpa por isso, desculpa — diz enxugando suas lágrimas que tanto insistiam em cair. Ele sentou no sofá e continuou chorando. A mão direita estava sangrando.
"Que merda é essa!?" Indaga Gray, em pensamento. "O que... eu devo fazer? Devo... ajudar?" Gray estava devidamente dividido entre o que deveria fazer. O choro de Jake estava se tornando mais alto e provavelmente ele vai começar a gritar de desespero. Gray já havia visto isso antes e não estava disposto a assistir àquilo outra vez. Dejavu.
"Que droga, não posso fazer isso de novo... não posso!" Grita Jake na sua própria cabeça. Lembrou de Kael, que adorava maratonar séries infantis e que dizia que Jake era um filósofo incompreendido... infelizmente, Jake o proporcionou um trágico final. "Não posso fazer isso de novo! Kael, me desculpa por ter te matado daquele jeito... eu te amava Kael... não posso..."
Gray, então, caminhou lentamente até Jake, que chorava alto como uma criança. Gray, por um momento se perguntou se Jake estava passando por um momento de reflexão ou luto. Sentiu pena dele. Quando estava perto o bastante, sentou-se ao lado de Jake no sofá e colocou suas mãos no ombro de Jake. Jake, então, se virou para ele e o envolveu num abraço apertado, Jake sentiu-se confortável, tendo em vista a impressão de que Gray estava tentando lhe ajudar. Gray pensou em matá-lo naquele instante, mas algo dentro dele diz que não deve.
— Kael... — murmura Jake com voz trêmula e baixa. — Me perdoa. — Foi baixo, mas alto o bastante para Gray escutar. De quem ele estaria falando, afinal? Gray sentiu-se confuso, pois foi um pedido de perdão muito sincero, e ele não espera o mínimo de humanidade vinda de Jake, então com certeza foi algo muito estranho.
Gray o abraçou com mais força e sentiu seu dedo latejar.
— Ah! Está doendo Kael!!! — Jake se solta do abraço e começa a espremer a própria cabeça. Gray se assusta, não sabe ao certo o que fazer para ajudar, então segura as duas mãos dele e tenta fazer com ele escute.
— Jake, olha pra mim! — Segura as mãos de Jake com firmeza e olha dentro de seus olhos. — Jake, olha pra mim e conta comigo, um... — Ele inspira profundamente e Jake tenta o acompanhar. — Isso, dois... — Solta o ar que prendia.
Gray repete o ato até eles chegarem no número dez. Jake estava serenamente mais tranquilo, sua respiração acelerada e pesada voltou ao normal e seus olhos pararam de lacrimejar.
— Obrigado... — diz Jake, com olhos fechados. — Me sinto envergonhado, havia apenas uma pessoa que costumava me ver assim, tão vulnerável. E mesmo assim... você não tentou nada para escapar. Isso é pena... ou gosta de mim? — indagou Jake, agora com olhos vermelhos abertos e que olhavam intensamente para Gray. Não havia ódio em seu olhar dessa vez, havia empatia e atração.
— Não posso te dizer que minha resposta é uma das opções... — hesitou Gray, Jake sorri verdadeiro para ele.
— Eu sei. É medo, não pena. É medo, não amor. Como imaginei, você é nojento. Igual o Kael. — Ele solta uma risada nasal enquanto suas lágrimas voltam. — Vai tomar banho para sairmos, vou preparar uma cesta para um piquenique depois do futebol. Eu vou tomar banho lá. — Jake pega uma cesta típica e começa a colocar bolachas e guloseimas dentro da mesma.
Gray não responde. "Ele quer... ele quer se sentir amado? Isso é a razão por trás disso tudo?"
— Jake... você quer que eu te ame?
Jake não responde. Não quer dizer que sim, para não demonstrar fraqueza, mas não quer dizer que não para não se mostrar um monstro sem sentimentos. Afinal, ele não era assim, ele sabe gostar das pessoas, só não sabe como demonstrar esse amor da forma sociavelmente correta. Ainda bem que não foi isso que aconteceu com o Kael. Merda.
— Vai tomar banho — diz, finalmente.
— Mas... — tenta Gray.
— Gray... não me faça apertar o botão amarelo, por favor. — Sorri para Gray, que desiste e vai em direção ao banheiro.
Ele separa a roupa que usará no piquenique e veste a roupa costumeira das manhãs de domingo. Suas pálpebras pesam e nem é culpa do sono. Seus olhos ardem, fazia tempo que não chorava desse jeito, com tanta intensidade. Senta-se no sofá, com a cesta saborosa ao seu lado e espera Gray voltar com os olhos fechados.
...
— Jake. — Kael fala em toz de voz razoavelmente alto. — Me tira daqui! — diz em voz baixa.
— Você vai sair, é domingo. — Responde Jake, pacientemente. Jake se levanta da cadeira do porão e solta Kael dos cintos de couro projetados para seus generosos braços. — Droga Kael, deve ser de madrugada ainda.
— Desculpa, eu não sei que horas são. — Jake o segura com as mãos para trás e o leva para dentro da casa escadas a cima.
— Jake, meus tornozelos estão doendo.
— Você vai esconder eles, não se preocupe. — replica Jake, tentando não parecer tão autoritário.
— Mas, Jake... — Sua frase é interrompida por Jake o mostrando o pequeno semáforo.
— Kael. Não me faça te machucar de novo. — Kael não ousa contrariá-lo. Selam seus lábios num beijo sincero, suas mãos começam a se explorar e... tudo fica escuro.
De repente, o que era para ser uma lembrança aleatória, mudou de cenário. Estavam num quarto escuro. Kael estava na cama e sem vestimentas.
— Vamos lá, Jake... uma última vez. — Essa frase o lembrou de quando desprendeu ele de vez dos cintos de couro, de quando não usava mais a gargantilha, de quando saíram para tomar sorvete juntos uma infinidade de vezes. Droga, Jake acaba de o perder para sempre.
Jake se junta a ele, ignorando a corda presa ao teto. Se amaram pela última vez, um ato sincero e que vinha do fundo do coração pulsante de ambos. Após a poeira baixar, Jake acorda e se depara com a mesma cena de alguns anos atrás. Kael está com o pescoço pendurado àquela corda. Seu corpo sem vida está gelado e seu cabelo cobre seus olhos fechados. Jake grita alto, repercutindo a dor execrável que sente em seu peito, um aperto veemente que quase não o deixa respirar, sua cabeça está perdida em meio a pensamentos duvidosos e súplicas de explicações autênticas. Como seu primeiro e verdadeiro amor pôde fazer isso com ele mesmo? Por quê fez isso? De quem era a culpa?
...
— Jake! — brada Gray desesperadamente enquanto vascoleja o corpo de Jake com desígnio evidente. — Jake, acorda!
Jake finalmente abre seus olhos. Sua respiração pesada revela indícios de que seu cochilo não resultou em uma experiência tão agradável. Suava frio e suas mãos estavam tremendo.
— O que está acontecendo com você? Isso são crises de pânico? — indaga Gray, curioso e presumivelmente preocupado. Jake se perguntou o porquê de ele estar agindo assim, por que não age como Kael? Por que ainda não tentou nada contra Jake como todos os outros?
Sua presunção lhe disse que Gray era mais um, não era diferente das outras pessoas que ele havia levado para sua casa, porém, sua cabeça parecia estar montando um quebra-cabeça com peças minúsculas e infinitas, Gray era diferente. Uma linha tênue de esperança percorreu seu corpo num arrepio intenso quando pensou nisso.
— Gray... — Começa Jake, ofegante.
— Diga, quer conversar antes de sairmos de casa? Estou te ouvindo. — redarguiu Gray, embolado em meio as palavras. Estava com olhos atentos presos a Jake, que se sentiu estranho e resolveu não se mostrar mais vulnerável, pois ao que parecia, pegava pessoas na rua para escravizá-las e fazer delas uma vítima do seu amor doentio.
— Vamos. — diz, afinal. Segura Gray pelo braço que não há ataduras e segue pela porta da frente com a cesta na outra mão.
— Mas, Jake, olha o seu estado! Não quer conversar sobre... — Começa Gray, mas foi estupidamente interrompido.
— Eu disse para irmos! — brada Jake, de repente. Gray arregala os olhos, assustado e abruptamente, pensa que a vulnerabilidade repentina de Jake é apenas uma breve trégua de sua violência extrema. Ficou com medo e se calou de imediato. — Não quer nos atrasar não é?
Ao dizer isso, Jake mostra o pequeno semáforo a Gray e o mais novo se encolhe.
— Nem pense em fazer nenhuma gracinha. — diz, ameaçador. Gray sacoleja a cabeça em sinal positivo e os dois vão para fora da casa.
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