♥Capítulo 2♥
— O que está fazendo trancada aí? — Minha irmã pergunta, batendo na janela do meu carro como se fosse um policial em uma blitz. E me assustando demais.
Salto em meu banco, batendo levemente a cabeça no teto do carro. A sorte de Dee é que o seu café está bem seguro no banco ao lado, porque se ele estivesse em minhas mãos, eu estaria encharcada de cafeína neste instante. E teria que matá-la por me assustar dessa forma. Respiro, baixando vagarosamente o vidro e encarando-a com uma carranca de desagrado.
— Você é uma idiota, Dee... por que me assustar desse jeito?
— Isak saiu um minuto para fumar e eu o acompanhei. — Ela para um instante e ri, me fazendo automaticamente revirar os olhos. — Foi quando eu vi o seu carro e esperei que descesse, mas você permaneceu aí dentro.
— Então você achou que era uma oportunidade perfeita para me matar do coração?
— Eu só caminhei até seu carro e quis ver o que estava fazendo parada aqui. Estava pensando em quê? Ou em quem?
Em Nathan e em como, aparentemente, ainda tenho alguns sentimentos por ele. Talvez muitos.
— Em nada — eu desconverso.
— Tudo bem então... — diz, tentando espiar o interior do carro. — A propósito, me diga, pelo amor de Deus, que trouxe o meu café e as rosquinhas que eu pedi.
— Você está grávida outra vez? — eu pergunto, girando o meu dorso para pegar as suas rosquinhas ao lado. — Porque está se comportando como se estivesse. Agindo feito uma morta de fome assim.
— Você está doida? — ela exaspera, mas seus olhos brilham para o café da manhã que trouxe. — Ainda estou amamentando o Will e isso me deixa faminta.
— Ele já tem um ano, Dee. Aposto que só mama à noite.
— Tanto faz.
Seus olhos se reviram para mim enquanto saio do carro. O estacionamento e tudo ao redor está quieto por causa do horário. Encosto-me em meu carro e Dee morde a sua rosquinha, feito uma mulher descontrolada.
— Como a vovó está? — pergunto ao observá-la mastigar. — Seja sincera.
— Ela está ótima, melhor que nós duas juntas — ela responde, com os lábios cheios de açúcar, o que me causa um sorriso ligeiro. — Óbvio que, como eu disse antes, a sua saúde é frágil, mas ela está muito bem e muito ansiosa para a sua festa de noventa anos.
— A festa não será adiada? — questiono, surpresa. — Quer dizer... será que algo tão agitado, repleto de pessoas e barulhos. Isso não pode prejudicar ainda mais a sua saúde?
— E você acha que a vovó deixaria que fosse adiada? Ela está mais animada que nunca.
— Ai, meu Deus! — Suspiro, afastando alguns fios de cabelo sobre os olhos. — Eu vou subir para vê-la, qual é mesmo o quarto?
— Trezentos e quinze — diz, limpando o açúcar em seus dedos e agarrando o copo de café sobre o capô do meu carro. — Papai e mamãe estavam aqui até pouco tempo, mas foram para a casa tomar banho e comer algo. É provável que eles voltem logo.
— Ok!
Abro a porta do motorista mais uma vez e pego minha bolsa no banco traseiro. Fecho o meu carro e deixo Dee usá-lo como mesa de piquenique enquanto me afasto.
— Eu subo assim que terminar aqui — promete, apontando para a caixa aberta.
— Onde as crianças estão?
— Elas ficaram com a mãe do Isak.
— Coitada... — Rio sem me conter, enquanto Dee luta contra o vento que espalha o cabelo longo e castanho sobre o seu rosto redondo.
— Meus filhos são uns anjos, Alex — ela replica, fingindo ofensa.
Eu amo os meus sobrinhos, porém, nunca me arriscaria a dizer que são anjos. Louis, Mel e Will estão com respectivamente seis, quatro e um anos agora e exigem muita energia e tempo. Não sei como Dee ainda não fugiu de casa, mas aposto que ela pensa nisso com frequência.
— Você sabe que eles enlouquecem qualquer um, a começar por você.
— Filhos são exatamente assim, espere até ter os seus.
— Os meus? Já está pensando em vários? — pergunto, estremecendo de forma involuntária. — Às vezes tenho dúvida se chegarei a ser mãe.
— Claro que será — Dee afirma, convicta.
Sacudo a cabeça e sorrio ao lhe dar as costas. Dee não imagina, mas a maternidade é um assunto delicado para mim. Sei que ainda tenho muito tempo para engravidar, mas às vezes eu temo nunca encontrar o cara certo para ser pai dos meus filhos.
Se Nathan e eu ainda estivéssemos casados... sim, eu detesto quando qualquer frase em minha mente começa dessa forma e há muitas que se iniciam exatamente assim. Mas se ainda estivéssemos juntos, talvez já tivéssemos um bebê a caminho. É uma triste constatação e me torturar com esse pensamento não me trará nada de bom agora, eu sei.
Corro pelo estacionamento, avistando Isak — esposo de Dee — quando piso no primeiro degrau da recepção. Eu lhe aceno com rapidez, me apressando até o balcão de informações. Sorrindo para a recepcionista do outro lado do balcão, recito os dados da minha avó e o número do quarto. Em segundos eu recebo um adesivo de visitante e ando até o elevador mais próximo.
O quarto fica no quinto andar, na área da cardiologia. É fácil encontrar o leito da vovó Jo, mas preciso aspirar lentamente antes de bater e entrar com lentidão. Estou ansiosa para vê-la, é fato, só que estou ainda mais ansiosa com os iminentes questionamentos sobre Nathan que possam surgir.
— Alex! — Vovó exclama exultante, assim que piso no quarto.
Sua voz é rouca e frágil, assim como a sua aparência. Seu corpo quase some embaixo dos lençóis brancos e pesados. Tiro a minha bolsa do ombro e deixo-a sobre a poltrona ao lado da porta. Corto o pouco espaço até a cama no centro do quarto e sento-me ao lado de vovó.
— Olá, doninha! — murmuro com um sorriso amoroso, estendendo a minha mão para agarrar a sua. — Como a senhora está?
— Bem, querida. — Ela ri, descansando a cabeça no travesseiro para me observar sob os cílios finos. — Foi apenas um susto, mas estou perfeita.
— Tem certeza?
— Sim, não se preocupe.
Concordo, com um sorriso gentil, me inclinando para beijar o seu rosto. O seu costumeiro perfume de talco me envolve e traz aconchego imediato. Vovó sempre teve esse cheiro até onde posso lembrar e abraçá-la é como voltar à infância. É porto seguro cheio de amor.
Me afasto sutilmente para analisá-la de perto. Vovó sempre foi pequena e magra, mas agora parece ainda menor. Isso, no entanto, nunca foi capaz de roubar a força em seu olhar e em suas atitudes.
Olhos castanhos como os meus, me encaram de volta. Seu rosto está fino e anguloso, acentuando as rugas causadas pela idade avançada. Seu cabelo curto tem pouco volume e está quase completamente branco, porém, esse detalhe não é capaz de roubar a sua beleza.
Ela é maravilhosa aos meus olhos. Uma mulher que me desperta orgulho e amor incondicionais.
— O que o médico disse? — pergunto sem soltar a sua mão.
— Foi o miocárdio outra vez, obstrução parcial — responde com tamanha lucidez que me causa orgulho.
— Isso é bom, a obstrução foi total no primeiro infarto.
— Eu me sinto ótima, não se preocupe comigo. Ainda não chegou a hora desta velha senhora dar adeus a esse mundo.
— Vovó — eu a repreendo com um tapinha em seus dedos. — Não brinque com isso. É óbvio que me preocupo, toda família o faz.
— Estou bem, meu anjo — reafirma, olhando para a janela. — Melhor do que nunca, acredite.
— Eu acredito. — Suspiro com a sua teimosia. — Dee me disse que ainda está mantendo a festa de noventa anos. Isso é verdade?
Seus olhos voltam rapidamente para os meus, enquanto um brilho de alegria passa por eles. Vovó ama festas, celebrar é com ela mesmo. Juro que nunca conheci ninguém assim, tão pronta para a farra. Ela simplesmente esquece a idade que tem, muito provavelmente porque seu coração é mais jovem que o meu.
— Óbvio que sim, querida. — Sua resposta é rápida e alegre, ainda que falte forças em sua voz para demonstrar o tamanho da sua euforia. — Eu mal posso esperar por ela.
— Talvez você devesse ir com calma, vó — murmuro com cuidado.
— Farei noventa anos, Alex; não preciso ir com calma.
Contenho um riso, balançando a cabeça em negação. Desde que cruzou a linha dos sessenta anos, vovó faz o que lhe dá na telha. Isso foi o que minha mãe me contou, porque nesta época eu nem havia nascido. Algumas pessoas às vezes me dizem que herdei a sua teimosia. Eu às vezes concordo.
— Onde Nathan está? — ela me pergunta de repente.
— Nathan? — balbucio, desconcertada.
— Nathan — ela repete, franzindo as sobrancelhas. — O seu Nathan... seu marido, ele está lá fora?
Seu olhar ansioso prende-se à porta fechada e se assemelha ao de uma criança sapeca, tramando sua próxima travessura.
— Não, ele não está — murmuro, sem jeito.
— Está no trabalho?
— A essa hora ele provavelmente está dormindo — respondo ao me lembrar da rotina de Nathan.
— Será que ele virá mais tarde? — sonda, cheia de expectativas. — Eu não o vejo há tanto, tanto tempo. O que aconteceu com ele, querida?
O que aconteceu com ele?
Essa pergunta, de repente, me faz pensar que talvez vovó esteja perdendo parte do juízo. Como ela pôde ter se esquecido do meu divórcio? Em dois anos eu estive em sua casa mais vezes do que posso contar e tenho certeza que lhe disse sobre a minha separação.
Eu tenho certeza que chorei em seus ombros algumas vezes também. Muitas vezes, talvez.
— Ele está ocupado — digo por fim, porque soa como a explicação mais simples para o momento. — O trabalho no bar ocupa todo o seu tempo.
— Isso é mesmo uma pena, querida. — Ela sorri, compreensiva. — Mas ele certamente estará em minha festa, não é?
— Eu não sei, vó — meus ombros se encolhem de forma involuntária. — Não sei se ele terá tempo para aparecer.
— Me prometa que irá levá-lo, querida. Sinto saudades de vê-los juntos. — Ela exala sonhadoramente. Faço o mesmo, mas de nervosismo. — Isso me causava tanta alegria, o casal mais lindo que já conheci.
— Vovó, eu não posso prometer... Nathan tem as suas obrigações...
— Prometa. — Ela insiste, sorrindo. — Ah, como seria adorável dançar ao menos uma música com Nathan.
— Nathan não dança — balbucio, ainda mais nervosa.
— Eu me lembro de vê-los dançando no seu casamento.
— Nós dançamos, mas ele não gosta muito.
Nathan diz que não sabe dançar, mas dançamos duas vezes em nossa recepção de casamento. Ele cedeu para me fazer feliz. Disse que nunca havia visto olhos tão brilhantes quanto os meus enquanto dançávamos ao som de Michael Bublé.
Também dançamos em frente à Torre Eiffel, quando ele me pediu em casamento. É uma doce lembrança, e discordo de Nathan... ele sabe dançar, principalmente quando fazia isso comigo.
— Prometa, Alex querida — vovó gorjeia, chamando minha atenção. — Prometa que você e Nathan estarão juntos em minha festa de aniversário.
— Vó, você não se lembra que Nathan e eu... — sussurro com a voz vacilante a cada palavra.
— Vocês o quê? — ela questiona, subitamente apreensiva.
Olho para a sua figura frágil, para o soro conectado ao seu braço e os fios em seu peito ligados ao monitor cardíaco; e sou uma completa covarde. Não tenho coragem alguma em lhe contar a verdade, por isso eu murmuro:
— Nathan estará em sua festa, eu prometo.
— Que alegria, meu bem! — Todo o seu rosto se ilumina com a notícia. — Eu mal posso esperar por esse momento.
— É, eu também não posso, vó! — exclamo em um muxoxo que eu espero queela não note.
♥♥♥♥♥
"Vovó Jo é uma fofa, não é? Espero muito que tenham gostado dela, e do capítulo também. Muito obrigada por estarem aqui, até sábado. Bjs♥♥♥"
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